quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Das limitações ao contrato de doação

Bernardo José Drumond Gonçalves

Advogado, especializando em direito processual pelo IEC – Instituto de Educação Continuada - da PUC/MG, Professor de Direito Civil da Unifenas-BH

*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 11, em 19/01/2009

Segundo dispõe o Código Civil, “considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade (animus donandi), transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”¹.
Admite-se a realização da doação, via de regra, por meio de instrumento público ou particular, mas, também, é possível de maneira informal (verbal), quando se tratar de bens móveis e de pequeno valor, seguida da sua incontinenti entrega².

Elemento básico para o aperfeiçoamento do contrato de doação, a aceitação do donatário é imprescindível, ainda que tacitamente, enquanto consentimento da vontade – condição de existência do negócio jurídico. Frise-se que, até para a doação de bens a um nascituro, faz-se necessária a concordância de seu representante legal³.

De toda sorte, é lícita a previsão de retorno dos bens ao patrimônio do doador, caso seja o donatário o primeiro a falecer 4.

Em se tratando de doações entre herdeiros necessários, preceitua o Código Civil que importa “adiantamento do que lhes cabe por herança”5. Ou seja, será deduzido o valor doado da parcela de herança a que o herdeiro fizer jus, sob pena de sonegação6.

Destaque-se que, ao renunciar herança em favor de outrem (renúncia translativa), restará também configurada hipótese de doação.

Em recente decisão7, o Superior Tribunal de Justiça confirmou a validade da doação entre cônjuges, na constância do matrimônio, mesmo quando o regime de bens for o da separação obrigatória pelo fato de um dos nubentes possuir mais de 60 (sessenta) anos8. Os principais fundamentos foram (i) ausência de expressa vedação legal; (ii) ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana; e (iii) o estímulo constitucional da conversão da união estável em casamento9.

Ademais, a estipulação da doação em pactos antenupciais de nubentes com regime de separação de bens obrigatória já é permitida, na medida em que o atual Código Civil não manteve o que dispunha o artigo 312 do antigo Código Civil.

Ocorre que há determinadas limitações à doação, não sendo, portanto, irrestrita a disponibilidade do patrimônio. Não é permitida, por exemplo, a doação não remuneratória de bens que possam integrar futura meação do cônjuge, sem sua autorização para tanto, salvo no regime de separação absoluta.

Quanto às pessoas jurídicas de direito privado, sabe-se que a liberalidade para doar está restrita ao que dispuserem os seus atos constitutivos (estatutos ou contratos sociais), sendo que eventuais violações dos seus administradores importará obrigação de restituição ou ressarcimento, além de perdas e danos e lucros cessantes10.

É válido salientar a vedação à doação de bens alheios ou de todos os bens, sem que seja reservada alguma parte ou, pelo menos, renda suficiente à subsistência do doador. Tal impedimento pode ser simplesmente evitado com a gravação de cláusula de usufruto vitalício.

Ao se verificar a transferência de parte excedente àquela que poderia dispor em testamento11, caberá ao herdeiro prejudicado a propositura da ação de redução, visando à redistribuição do patrimônio alienado12.

Nos casos de configuração de adultério, a doação realizada em favor do cúmplice poderá ser anulada pelo respectivo cônjuge “traído” ou seus herdeiros necessários13.

Por fim, como qualquer negócio jurídico, a doação está sujeita à (i) anulação, seja por erro, dolo, lesão, coação, fraude contra credores ou estado de perigo, bem como (ii) nulidade por simulação, incapacidade absoluta do agente, ilicitude, indeterminação ou impossibilidade do objeto ou, ainda, por não revestimento de forma prescrita em lei14.

Sobre a doação, cumpre anotar a incidência do Imposto de Transmissão inter vivos, conforme previsto pela Constituição Federal15, e, em Minas Gerais, regulada pelo Decreto nº 43.981/05 (atualizado pelo Decreto nº 44.964/08), segundo o qual a alíquota é de 5% (cinco) por cento sobre a base de cálculo, ressalvadas as hipóteses de isenção.

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¹ Art. 538 do Código Civil brasileiro.
² Art. 541 do Código Civil brasileiro.
³ Art. 542 do Código Civil brasileiro.
4 Art. 547 do Código Civil brasileiro.
5 Art. 544 do Código Civil brasileiro.
6 Art. 1.847, 1.992 e 2.002 a 2.012 do Código Civil brasileiro.
7 RESP nº 471.958/RS Min. Rel. Nancy Andrighi DJ 18.12.2008.
8 Art. 1.641, II,       do Código Civil brasileiro.
9 Art. 226, §3º, da Constituição da República do Brasil.
10 Art. 1.013 a 1.017 do Código Civil brasileiro e 158 da Lei nº 6.404/76.
11 Art. 549, 1.789 e 1.846 do Código Civil brasileiro.
12 Art. 2.007 do Código Civil brasileiro.
13 Art. 550 e 1.642 do Código Civil brasileiro.
14 Art. 138 a 167 do Código Civil brasileiro.
15 Art. 155, I, da Constituição da República do Brasil.

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