segunda-feira, 21 de março de 2022

O DIREITO AGRÁRIO E SEU GRANDE POTENCIAL EVOLUTIVO NO MUNDO JURÍDICO

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

Nathália Caixeta Pereira de Castro

Colaboradora de Homero Costa Advogados

 

 

Embora possa não ser percebido, o Direito Agrário está mais presente no dia a dia do povo brasileiro do que se imagina. Por vivermos em um país em que quase um terço do PIB vem do setor agrário, é de grande relevância que o Direito esteja em constante debate sobre o assunto.

 

Há diversos pontos do agronegócio a serem trazidos para a pauta jurídica, dentre eles o lucro e a exportação de produtos agrários, a devida contratação e profissionalização de produtores rurais, a preservação do meio ambiente em meio à exploração agrícola, e tantos outros.

 

A partir dessa realidade, faz-se necessária uma legislação adequada e específica para tratar do agronegócio no Brasil. Desde 1966, a Lei 4.947/66 já fixa normas de Direito Agrário, dispondo sobre o sistema de organização e funcionamento do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária, e dá outras providências.

 

Surgiu em 2020 a chamada Lei do Agro, Lei 13.986/2020, advinda da Medida Provisória 897/2019, cujo principal objetivo é criar novas medidas para obtenção de crédito e financiamento de dívidas de produtores rurais.

 

Além das supracitadas leis, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, CRA, trouxe para 2022 três novos projetos de Lei envolvendo Direito Agrário para serem votados. Dois deles tratam sobre regularização fundiária, sendo eles o PL 2.633/2020 e o PL 510/2021, cujo relator é Carlos Fávaro (PSD-MT).

 

Também foi remetido à Câmara dos Deputados para ser revisado o PL 486/2020, cuja explicação da ementa é: “Torna a redução das desigualdades sociais e regionais princípio a ser observado pela Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais; e determina ao Poder Público que estabeleça condições especiais para as linhas de crédito rural, para os serviços de assistência técnica e extensão rural e para as ações e instrumentos de política agrícola destinados a agricultores e empreendimentos familiares rurais situados na Região do Marajó”.

 

Segundo o CNA Brasil, “nos últimos 40 anos a produção agropecuária brasileira se desenvolveu de tal forma que o Brasil será o grande fornecedor de alimentos do futuro”. Importante também salientar que, de acordo com o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), a balança comercial do agronegócio fechou 2021 com superávit de US$ 105,01 bilhões, correspondente a 19,8% superior a 2020.

 

O Brasil é o quarto consumidor global de fertilizantes, sendo o maior importador, cerca de 85% de todo o fertilizante usado na produção agrícola nacional, representando 41 milhões de toneladas, o que equivale a mais de US$ 14 bilhões. Fonte: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/ministra-se-reune-com-presidentes-de-empresas-de-fertilizantes-do-canada

 

O senador Plínio Valério (PSDB-AM) afirmou que a solução para a crise no fornecimento de fertilizantes para o agronegócio, agravada pela guerra na Ucrânia, está na exploração do potássio existente na Amazônia. Fonte: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/03/09/plinio-ve-exploracao-do-potassio-da-amazonia-como-solucao-para-a-crise-dos-fertilizantes

 

Conforme pode ser verificado, o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) para 2022 está estimado em R$ 1,208 trilhão, superior em 3,1% em relação a 2021 (R$ 1,172 trilhão). De acordo com a Secretaria de Política Agrícola do Mapa, as lavouras tiveram alta de 8,8% e a pecuária, retração de -9,1%. Fonte: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/vbp-pode-chegar-a-r-1-208-trilhao-em-2022

 

A cada ano, mesmo com tantas adversidades ambientais e econômicas, o setor agrário no Brasil continua em crescimento, ganhando força. É notória, portanto, a importância que tem sido dada ao Direito Agrário no processo legislativo brasileiro. Tal falto se dá pelo enorme espaço que o setor agropecuário tem em nosso país, sendo necessárias essas especificações na letra da Lei e no mundo jurídico.

 

Foi instituído o Plano Nacional de Fertilizantes - PNF 2022-2050, com as diretrizes e os objetivos estratégicos estabelecidos no DECRETO Nº 10.991, DE 11 DE MARÇO DE 2022, na busca de diminuir a atual dependência do produtor rural brasileiro em relação aos fertilizantes importados e aumentar a produção nacional, que tem as seguintes diretrizes (artigo Art. 2º):

 

I - a modernização, a reativação e a ampliação das plantas industriais e dos projetos de fertilizantes existentes no País;

II - a melhoria do ambiente de negócios no País, com vistas à atração de investimentos para a cadeia de produção e distribuição de fertilizantes e insumos para nutrição de plantas;

III - a promoção de vantagens competitivas para o País na cadeia de produção mundial de fertilizantes;

IV - a ampliação dos investimentos nas atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação e no aperfeiçoamento da cadeia de produção e distribuição de fertilizantes e insumos para nutrição de plantas do País; e

V - a adequação da infraestrutura para a integração de polos logísticos e a viabilização de novos empreendimentos.

 

A Ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, em viagem ao Canadá, anunciou que este autorizou o início da importação de carne bovina e suína in natura do Brasil, celebrando que o Brasil ultrapassou a marca de 200 novos mercados externos para produtos agropecuários abertos desde o início de 2019. Fonte: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/canada-vai-abrir-mercado-para-importacao-de-carne-bovina-e-suina-do-brasil

 

Estima-se que as importações sejam da ordem de US$ 150 milhões, registrando-se que o Canadá não tributa a importação para suínos. Fonte: thenewscc.com.br

 

Vale registrar a edição da Medida Provisória nº 1.104, de 15 de março de 2022, com o objetivo de alterar a Lei nº 8.929, de 22 de agosto de 1994, que institui a Cédula de Produto Rural, e a Lei nº 13.986, de 7 de abril de 2020, para dispor sobre o Fundo Garantidor Solidário. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Mpv/mpv1104.htm

 

Assim, com o constante fortalecimento do agronegócio no Brasil, faz-se necessária, também, a especialização e qualificação de profissionais de Direito na área, que tem expandido o campo de oportunidades para quem se interessa pelo assunto. (https://www.migalhas.com.br/depeso/340783/direito-e-agronegocio-fortes-aliados-em-um-brasil-exportador). Direito e agronegócio formam uma aliança poderosa em território brasileiro e, juntos, têm tudo para fomentar o processo evolutivo do nosso país.

STJ ESTABELECE QUE A BASE DE CÁLCULO DO ITBI É DESASSOCIADA DA BASE DE CÁLCULO DO IPTU

Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), por unanimidade, ao julgar o Recurso Especial nº 1.937.821/SP, definiu que a base de cálculo do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (“ITBI”) não é associada à base de cálculo do Imposto Predial e Territorial Urbano (“IPTU”).

O julgamento aconteceu sob a sistemática de recursos repetitivos, e diante desta situação, o entendimento deverá ser reproduzido pelos Tribunais de todo o país em processos semelhantes.

De acordo com os Ministros do STJ, a base de cálculo do ITBI deve ser fixada a partir do valor da transação declarada pelo próprio contribuinte. Nesse sentido, caso a Fiscalização Municipal não concorde com a informação, pode questioná-la por intermédio de processo administrativo, com o propósito de arbitrar um novo valor.

A ordem jurídica estampada no Artigo 148 do CTN, equipara-se à medida extrema e extraordinária em que, assegurado o contraditório, os Fiscos Municipais têm o ônus de provar que a declaração do contribuinte está eivada de vícios configuradores da imprestabilidade para o conhecimento da verdade os quais, dada a gravidade, justificam o arbitramento da base de cálculo. O arbitramento de que trata o dispositivo mencionado deve ser feito em cada caso concreto, ao amparo da demonstração de que as informações prestadas pelo contribuinte não são autênticas ou transparentes. Não é admitida a utilização de pautas de valores previstas em ato geral e abstrato.

Ocorre que, segundo os Ministros, a jurisprudência pacífica da Corte Superior é no sentido de que, embora o Código Tributário Nacional estabeleça como base de cálculo do Imposto Predial e Territorial Urbano e do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis o “valor venal”, a apuração desse elemento quantitativo faz-se de formas diversas, notadamente em razão da distinção existente entre os fatos geradores e a modalidade de lançamento desses impostos. 

A recente deliberação do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.937.821/SP, impactará a vida de muitos contribuintes, porque conseguiram decisões favoráveis no Poder Judiciário, com fundamento no Artigo 38 do CTN, para pagarem o ITBI de acordo com o valor venal do imóvel, o que de acordo com o STJ não é o correto.

Com base no julgamento do REsp nº 1.937.821/SP, Relator o Ministro Gurgel de Faria, foram estipuladas pela Corte Superior as seguintes teses jurídicas com eficácia vinculante em sede do Tema Repetitivo nº 1.113: (i) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação; (ii) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (Artigo 148 do CTN); e (iii) o município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

 

IMPENHORABILIDADE DE SALÁRIOS, DE REMUNERAÇÕES, DE PROVENTOS DE APOSENTADORIA E PENSÕES – RELATIVIZAÇÃO

 

Orlando José de Almeida

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

Rafael Euripedes Urquiza de Oliveira

Estagiário de Homero Costa Advogados

 

 

Conforme notícia veiculada no dia 07 (sete) de fevereiro do ano em curso, no site do Tribunal Superior do Trabalho, em julgamento proferido pela 7ª Turma, foi restabelecida a penhora de parte dos proventos de pensão recebida pela sócia de uma microempresa de entregas de São Paulo, para o pagamento de valores devidos em razão de execução trabalhista.[i]

 

Na reclamação trabalhista foi reconhecido, em primeira instância, o vínculo empregatício entre um motoboy e a empresa, sendo esta condenada ao pagamento das verbas decorrentes.

 

Considerando que a empresa não possuía bens, foi postulado e deferido o bloqueio mensal de 30% (trinta por cento) do valor do benefício previdenciário auferido por uma das sócias, em virtude de pensão por morte do seu marido.

 

A referida sócia se insurgiu em relação à penhora ao fundamento de que os rendimentos da pensão são impenhoráveis e, ainda, o pensionamento representava a sua única fonte de renda para manter a sua subsistência. O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) acolheu os seus argumentos.

 

Na sequência, o ex-empregado recorreu ao TST. O seu recurso foi provido por entender a Sétima Turma, em decisão cuja relatoria coube ao Ministro Renato de Lacerda Paiva, que a redação do parágrafo 2º, do art. 833, do Código de Processo Civil de 2015, trouxe alteração acerca do que era até então fixado, apresentando exceção à "impenhorabilidade de vencimentos, subsídios, soldos, salários e remunerações nos casos de pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem.”

 

Por ocasião do julgamento, proferido nos autos do processo nº RR-222500-86.2002.5.02.0079, foi aduzido que a decisão regional “se mostra contrária à jurisprudência reiterada desta Corte”, que autoriza a “penhora dos proventos da pensão por morte (benefício previdenciário) recebidos pela parte executada, para pagamento de prestação alimentícia em favor do exequente, ora recorrente. O entendimento desta Corte com relação à penhora de salários, sob a égide do CPC de 1973, encontra-se consolidado por meio da OJ nº 153 desta Seção Especializada (SDI-2). Após a vigência do novo CPC, considerando a redação do parágrafo segundo do artigo 833, o qual excepciona a impenhorabilidade de vencimentos, subsídios, soldos, salários e remunerações nos casos de pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, a SBDI-2 desta Corte passou a entender que as decisões judiciais determinando bloqueios de valores em conta salário ou proventos de aposentadoria ou pensão, realizadas após a vigência do Código de Processo Civil de 2015, são legais. Nesse sentido, vários precedentes da SBDI-2 do TST.”

 

A decisão seguiu, portanto, a nova orientação contida no CPC, de 2015, ao dispor no art. 833 e no inciso IV, que “são impenhoráveis”, “os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º”.

 

O parágrafo segundo estabelece que “o disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º, e no art. 529, § 3º.[ii]

 

Assim, o Código de Processo Civil de 2015, trouxe uma relativização no que tange a então impenhorabilidade dos salários, vencimentos e proventos de aposentadoria, nas hipóteses em que não foi encontrado outro bem do devedor a ser penhorado.

 

Desse modo, é perfeitamente possível o bloqueio de parte dos vencimentos apontados para fins de pagamento do crédito trabalhista, diante do reconhecimento do caráter alimentar deste, desde que não ultrapasse a 50% (cinquenta por cento) dos ganhos líquidos do Executado (§ 3º, do art. 529, do CPC).

 

Todavia, pensamos que o julgador deve ter bastante sensibilidade ao permitir tais penhoras, analisando criteriosamente a situação do credor e a do devedor. Em muitas ocasiões as parcelas indicadas inciso IV, do art. 833, do CPC, sequer são suficientes para a manutenção ou sustento da família daqueles que as recebem. A aplicação da norma deve observar, dentre outros, os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana.

 



[i] Restabelecida penhora de proventos de pensão para pagamento de dívida a motoboy. tst.jus 2022. Disponível em: < https://www.tst.jus.br/-/restabelecida-penhora-de-proventos-de-pens%C3%A3o-para-pagamento-de-d%C3%ADvida-a-motoboy >.