quarta-feira, 9 de outubro de 2024

O FUTURO DA ADVOCACIA BRASILEIRA

 

Stanley Martins Frasão

                                        Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

   

A advocacia brasileira está em um momento de transformação profunda, impulsionada por uma recente pandemia, avanços tecnológicos, mudanças legislativas e a necessidade de maior eficiência e transparência.

Faço uma pequena reflexão sobre o futuro da advocacia no Brasil, examinando os desafios estruturais, as oportunidades emergentes e as implicações para os Advogados, o Judiciário, o Legislativo e o Executivo.

A advocacia no Brasil tem uma história rica e complexa, que remonta ao período colonial. As primeiras faculdades de Direito, fundadas no início do século XIX, foram cruciais para a formação de uma elite jurídica que desempenhou papéis importantes na construção do Estado brasileiro.

A Constituição de 1988 foi um marco significativo, consolidando direitos fundamentais e fortalecendo o papel do advogado como essencial à administração da justiça.

A legislação brasileira tem passado por diversas reformas que impactaram diretamente a prática da advocacia:

- Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990): fixando os Direitos do Consumidor, a Política Nacional de Relações de Consumo, a Qualidade de Produtos e Serviços, da Prevenção e da Reparação dos Danos, a Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço, a Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço.

- Lei nº 9.099/1995, que criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e revogou a Lei nº 7.244/1984, que regulamentava os Juizados de Pequenas Causas.

- Código de Processo Civil (CPC) de 2015: Visou simplificar e agilizar os processos judiciais, introduzindo mecanismos como a tutela provisória e a mediação.

- Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015): Estimulou a resolução extrajudicial de conflitos, promovendo a mediação e a conciliação como alternativas ao litígio.

- Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011): Aumentou a transparência e o acesso a informações públicas, impactando a prática jurídica e a accountability governamental.

O Judiciário brasileiro enfrenta uma sobrecarga crônica, com milhões de processos em tramitação. A consequência? A decantada e conhecida morosidade judicial é o resultado do problema que é persistente, que afeta a confiança da população no sistema de justiça. A falta de recursos humanos e tecnológicos adequados agrava a situação, tornando a resolução de litígios lenta e ineficiente, gerando muitas vezes a insegurança jurídica, elevando o denominado “Custo Brasil”.

O Brasil possui um dos sistemas jurídicos mais complexos do mundo, com uma vasta quantidade de leis, decretos, portarias e regulamentos. A constante mudança legislativa exige que os advogados estejam em permanente atualização, o que pode ser um desafio, especialmente para escritórios menores e advogados autônomos.

Estamos vivendo um momento desta natureza, a alteração do Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/2002), diante do Projeto de alteração do Código Civil, que está sendo elaborado por uma Comissão de Juristas, constituída pelo senador Rodrigo Pacheco, em 4 de setembro de 2023. Uma nova preocupação para a comunidade jurídica.

E mais duas outras: (i) a intervenção do CADE na Tabela de Honorários da OAB (https://homerocosta.blogspot.com/2022/11/intervencao-do-cade-na-tabela-de.html ) e (ii) a OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que veiculou o relatório "Regulatory Reform in Brazil", que na parte de serviços da economia brasileira, afeta a Advocacia Brasileira ( https://homerocosta.blogspot.com/2022/07/ocde-e-advocacia-brasileira.html).

O número de advogados e sociedades de advogados no Brasil tem crescido exponencialmente, resultando em um mercado altamente competitivo. A saturação do mercado jurídico é visível, gerando problemas, profissionais sem colocação ou mal remunerados, torna a diferenciação um desafio, levando muitos advogados a buscar especializações ou nichos de mercado para se destacarem.

A tecnologia está transformando a prática jurídica de várias maneiras:

- Inteligência Artificial (IA): Ferramentas de IA estão sendo utilizadas para análise de jurisprudência, elaboração de documentos e até mesmo para prever resultados de litígios.

- Automação de Processos: Softwares de automação estão simplificando tarefas repetitivas, como a gestão de contratos e a análise de documentos, permitindo que os advogados se concentrem em atividades de maior valor agregado.

- Blockchain: A tecnologia blockchain tem o potencial de revolucionar áreas como a autenticação de documentos, contratos inteligentes e a cadeia de custódia de provas.

- Tribunal de Justiça de Minas Gerais compartilhou experiência sobre contratação de startups: “O presidente do TJMG, desembargador José Arthur de Carvalho Pereira Filho, destacou o interesse do Judiciário mineiro em manter um canal aberto com as instituições brasileiras que atuam na área da inovação. “Acreditamos que essas parcerias são muito produtivas para que possamos colher frutos expressivos desse diálogo” (https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/noticias/tjmg-compartilha-experiencia-sobre-contratacao-de-startups.htm#:~:text=Em%20fevereiro%20de%202023%2C%20o,outros%20tribunais%20e%20institui%C3%A7%C3%B5es%20brasileiras. ).

A emergência de lawtechs e legaltechs está criando novos modelos de negócio no setor jurídico. Essas startups estão desenvolvendo soluções inovadoras para problemas antigos, como a gestão de processos, a análise de dados jurídicos e a comunicação com clientes. As plataformas de resolução de disputas online e marketplaces jurídicos são exemplos.

A crescente demanda por serviços de consultoria e prevenção de litígios está abrindo novas frentes de atuação para os advogados. Empresas estão cada vez mais buscando aconselhamento jurídico preventivo para evitar problemas legais futuros, o que cria oportunidades para advogados especializados em compliance, governança corporativa e gestão de riscos.

O Judiciário brasileiro está em um processo contínuo de modernização e digitalização. As principais iniciativas incluem:

- Processo Judicial Eletrônico (PJe): A expansão do PJe visa tornar os processos mais ágeis e acessíveis, reduzindo a dependência de documentos físicos e facilitando o acesso remoto.

- Inteligência Artificial: Ferramentas de IA estão sendo desenvolvidas para auxiliar na análise de jurisprudência, elaboração de peças processuais e até mesmo na colaboração na tomada de decisões judiciais. O “Victor”, do Supremo Tribunal Federal, que utiliza IA para triagem de recursos é um exemplo.

- Justiça Digital: A pandemia de COVID-19 (https://homerocosta.blogspot.com/2022/02/o-mercado-da-advocacia-e-sua.html) acelerou a adoção de audiências e julgamentos virtuais, tendência que deve se consolidar no futuro. A justiça digital oferece maior flexibilidade e acessibilidade, mas também apresenta desafios em termos de segurança, privacidade e a necessidade de flexibilização para atendimento pessoal dos advogados, um direito do jurisdicionado.

O Poder Legislativo desempenha um papel crucial na definição do futuro da advocacia, por meio da criação e reforma de leis. As tendências incluem:

- A tal sonhada, esperada e necessária Reforma Administrativa.

- Reformas Tributárias e Trabalhistas: A contínua atualização do arcabouço jurídico para acompanhar as mudanças sociais e econômicas. Reformas tributárias e trabalhistas são frequentemente discutidas e têm implicações diretas para a prática jurídica.

- Regulamentação de Novas Tecnologias: A criação de leis específicas para regular o uso de tecnologias emergentes, como inteligência artificial e blockchain, no âmbito jurídico. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) é um exemplo de legislação que impacta diretamente a prática jurídica.

- Transparência e Participação: O aumento da transparência e da participação popular no processo legislativo, impulsionado por plataformas digitais. A participação cidadã na elaboração de leis pode influenciar diretamente a prática da advocacia.

O Poder Executivo, por meio de suas políticas públicas e regulamentações, também influencia diretamente a prática da advocacia. As tendências incluem:

- Políticas de Acesso à Justiça: Programas e iniciativas para ampliar o acesso à justiça, especialmente para populações vulneráveis. Exemplos incluem a Defensoria Pública e programas de assistência jurídica gratuita, e neste particular a Advocacia Pro Bono praticada por advogados e sociedades de advogados é sempre bem-vinda (Provimento 166/2015 do CFOAB - https://www.oab.org.br/leisnormas/legislacao/provimentos/166-2015?search=166&provimentos=True).

- Incentivo à Mediação e Arbitragem: Promoção destes métodos de resolução de conflitos para auxiliar o Judiciário na prestação jurisdicional. A criação de câmaras de mediação e arbitragem e a capacitação de mediadores são exemplos de iniciativas nesse sentido.                                                                 (https://homerocosta.blogspot.com/2024/09/mediacao-um-voto-cidadania.html ).

- Digitalização dos Serviços Públicos: A digitalização de serviços públicos e a integração de sistemas para facilitar o acesso a informações e documentos. Iniciativas como o Gov.br e o e-Social são exemplos de esforços para modernizar a administração pública.

Os advogados do futuro precisarão desenvolver uma combinação de habilidades jurídicas e tecnológicas. (https://homerocosta.blogspot.com/2023/06/desafios-das-carreiras-juridicas-no.html ).  As competências essenciais incluem:

- Conhecimento Jurídico Avançado: Aprofundamento em áreas específicas do direito, como compliance, direito digital e proteção de dados.

- Habilidades Tecnológicas: Familiaridade com ferramentas de IA, automação e análise de dados. A capacidade de utilizar essas tecnologias para melhorar a eficiência e a qualidade dos serviços jurídicos será crucial.

- Gestão e Liderança: Habilidades de gestão de projetos e liderança serão importantes para advogados que desejam assumir posições de destaque em escritórios de advocacia ou departamentos jurídicos de empresas. ( https://homerocosta.blogspot.com/2024/04/transformando-visoes-em-realidade.html ).

- Ética e Responsabilidade Social: A postura ética e o compromisso com a justiça social serão diferenciais importantes em um mercado cada vez mais competitivo e exigente.                                                 ( https://homerocosta.blogspot.com/2023/07/o-conflito-etico-da-sociedade-moderna.html ).

Os advogados precisarão adaptar seus modelos de negócio e estratégias de mercado para se manterem competitivos. As tendências incluem:

- Especialização e Nichos de Mercado: A busca por especialização em áreas específicas do direito, como direito digital, proteção de dados e compliance, pode ser uma estratégia eficaz para se destacar no mercado.

- Parcerias e Colaborações: A formação de parcerias entre as espécies de Sociedades de Advogados, com lawtechs e outras empresas de tecnologia pode oferecer vantagens competitivas, permitindo a oferta de serviços inovadores e eficientes.

- Marketing Digital e Presença Online: A utilização de estratégias de marketing, inclusive o digital e a construção de uma presença online forte serão essenciais para atrair e reter clientes em um mercado cada vez mais digitalizado.

Concluindo, o futuro da advocacia brasileira será moldado por uma combinação de fatores tecnológicos, legislativos e sociais.

A capacidade de adaptação e inovação será crucial para os advogados que desejam se destacar em um mercado cada vez mais competitivo e dinâmico.

A modernização do Judiciário, as reformas legislativas e as políticas públicas voltadas para a eficiência e transparência serão determinantes para o desenvolvimento de uma Advocacia mais acessível, eficiente e justa.

Os advogados do futuro precisarão não apenas de conhecimento jurídico, mas também de habilidades tecnológicas e de gestão, além de uma postura ética e comprometida com a Justiça Social.

A Análise SWOT da Advocacia Brasileira poderá ser útil:

Forças (Strengths)

  1. Tradição e respeito: A advocacia mantém sua posição respeitada, com raízes históricas profundas no Brasil.
  2. Formação acadêmica sólida: Presença de faculdades de Direito renomadas e um sistema educacional em evolução.
  3. Regulamentação profissional: Atuação da OAB na regulamentação e fiscalização da profissão.
  4. Demanda constante: Complexidade do sistema jurídico brasileiro gera demanda contínua por serviços jurídicos.
  5. Adaptabilidade: Capacidade de adaptação a mudanças legislativas e tecnológicas, como demonstrado durante a pandemia.

Fraquezas (Weaknesses)

  1. Saturação do mercado: Crescimento exponencial no número de advogados, levando à alta competitividade.
  2. Complexidade legislativa: Sistema jurídico brasileiro extremamente complexo, exigindo constante atualização.
  3. Morosidade judicial: Sobrecarga crônica do Judiciário, afetando a eficiência e a confiança no sistema.
  4. Desigualdade de oportunidades: Concentração de oportunidades em grandes centros e escritórios estabelecidos.
  5. Resistência à mudança: Alguns profissionais ainda resistem à adoção de novas tecnologias e modelos de negócio.

Oportunidades (Opportunities)

  1. Inovação tecnológica: Adoção de legal techs, IA, blockchain e automação para otimizar processos.
  2. Especialização em novas áreas: Surgimento de campos como direito digital, proteção de dados e compliance.
  3. Advocacia preventiva: Aumento da demanda por consultoria jurídica preventiva e gestão de riscos.
  4. Métodos alternativos de resolução de conflitos: Crescimento da Mediação e Arbitragem.
  5. Parcerias estratégicas: Colaborações entre advogados, sociedades de advogados e startups jurídicas.

Ameaças (Threats)

  1. Automação de tarefas: Risco de substituição de algumas funções jurídicas por IA e automação.
  2. Mudanças legislativas frequentes: Necessidade de atualização constante, podendo gerar insegurança jurídica.
  3. Pressão por redução de custos: Desvalorização dos honorários devido à alta competitividade.
  4. Desafios éticos: Novas tecnologias e modelos de negócio trazem questões éticas complexas.
  5. Regulamentações externas: Interferências como a do CADE na tabela de honorários da OAB e recomendações da OCDE.

Considerações Adicionais

  1. Impacto da pandemia: Aceleração da digitalização e adoção de práticas remotas no Judiciário e na advocacia.
  2. Reformas estruturais: Impactos de reformas administrativas, tributárias e trabalhistas na prática jurídica.
  3. Habilidades multidisciplinares: Necessidade de desenvolver competências em tecnologia, gestão e liderança.
  4. Acesso à justiça: Oportunidades e desafios relacionados à ampliação do acesso à justiça, incluindo a advocacia pro bono.
  5. Marketing jurídico: Importância crescente do marketing digital e presença online para advogados e escritórios.

A Advocacia Brasileira está em um ponto de inflexão, e aqueles que souberem aproveitar as oportunidades, inclusive as disfarçadas, e enfrentar os desafios, estarão bem posicionados para liderar essa transformação.

A ARTE DO QUESTIONAMENTO E DA REFLEXÃO

 

 

Stanley Martins Frasão

                                        Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

  

A famosa citação "O ignorante afirma, o sábio duvida, o sensato reflete", de Aristóteles (falecimento em 322 a.C), o grande filósofo grego, continua a ressoar, há séculos, como um lembrete poderoso sobre a importância da dúvida e da reflexão em nossa busca pelo conhecimento e pela compreensão.

 

No cerne dessa citação está a ideia de que a verdadeira sabedoria não reside na afirmação cega, mas sim na disposição de questionar, duvidar e refletir sobre as informações apresentadas a nós.

 

O ignorante, incapaz de enxergar além de suas próprias convicções, contenta-se em afirmar sua visão limitada do mundo.

Em contraste, o sábio reconhece a complexidade da realidade e abraça a incerteza como uma oportunidade para aprender e crescer.

 

Dúvida não é sinal de fraqueza, mas sim de inteligência e humildade.

A dúvida nos impulsiona a investigar mais profundamente, a considerar diferentes perspectivas e a estar abertos a novas ideias.

Ao duvidar, reconhecemos nossas próprias limitações e abrimos espaço para o crescimento pessoal e intelectual.

 

A mera dúvida não é suficiente, porque é necessário também o exercício da reflexão.

Enquanto a dúvida nos encoraja a questionar, a reflexão nos convida a ponderar e analisar criticamente as informações disponíveis.

É através da reflexão que transformamos a dúvida em ideias, a incerteza em compreensão.

 

O sensato é aquele que não apenas duvida, mas também reflete sobre suas dúvidas. Ele não se contenta com respostas superficiais, mas busca uma compreensão mais profunda e fundamentada do mundo ao seu redor.

Sua busca pela verdade é guiada não apenas pela curiosidade, mas também pela prudência e discernimento.

 

Em um mundo onde a informação está prontamente disponível e as opiniões proliferam, a habilidade de duvidar e refletir torna-se ainda mais crucial. Diante do ruído constante das vozes discordantes, é fácil sucumbir à tentação de aceitar cegamente o que nos é apresentado.

 

É precisamente nestes momentos que devemos lembrar das palavras de Aristóteles e abraçar a dúvida e a reflexão como nossos guias.

 

Ao fazê-lo, não apenas cultivamos nossa própria sabedoria, mas também contribuímos para um mundo onde o pensamento crítico e a busca pela verdade são valorizados.

 

É através da dúvida e da reflexão que avançamos como indivíduos e como sociedade, rumo a um entendimento mais profundo e significativo do mundo em que vivemos.

 

Vale a pena calçar as sandálias da humildade, afinal somos meros mortais.

 

 

DA ATUALIZAÇÃO DOS DEPÓSITOS JUDICIAIS E ADMINISTRATIVOS FEDERAIS


 

Gustavo Pires Maia da Silva

                                        Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

No último dia 16 de setembro de 2024, foi publicada a Lei nº 14.973/2024, que estabelece renovadas diretrizes para a atualização dos depósitos efetivados nos processos administrativos ou judiciais abrangendo a União Federal, seus órgãos, fundos, autarquias, fundações ou empresas estatais federais, inclusive aqueles estendidos à garantia de tributos federais.

 

Amparado na nova legislação, os depósitos judiciais e administrativos passaram a ser corrigidos especificamente por um índice que reflita a inflação, qual seja, hodiernamente, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Esta modificação caracteriza uma expressiva transformação no que concerne à legislação anterior, a Lei nº 9.703/1998, que definia a taxa SELIC como índice de correção aplicável e que foi cancelada.

 

A taxa SELIC é um índice heterogêneo, constituído por correção monetária e juros. Com a recente determinação, os depósitos deixam de ter caráter remuneratório e passam a ter caráter compensatório. Por consequência, o contribuinte não será mais recompensado pelo tempo em que renunciou à disponibilidade do valor depositado, o que provavelmente originará em uma diminuição relevante do valor a ser levantado por ele em caso de êxito em sua defesa.

 

Apesar de transparente a nova normatização no que se refere à aplicação da SELIC para os depósitos já realizados e que estão à disposição do Tesouro Nacional até o presente momento, e quanto à aplicação do IPCA para os novos depósitos feitos a partir de agora, ainda não há compreensão acerca do índice que deverá ser aplicado aos depósitos judiciais antigos com o início de vigência da Lei nova.

A norma moderna, que delimita a atualização dos depósitos judiciais e administrativos à inflação, poderá ser contestada judicialmente, principalmente em razão da disparidade entre a correção aplicável aos débitos tributários (taxa SELIC) e os depósitos administrativos ou judiciais realizados para garanti-los (IPCA).

 

De mais a mais, a transmutação poderá provocar novos debates no que diz respeito à incidência do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) sobre a variação dos depósitos que serão corrigidos apenas pela inflação, porque tal oscilação deixará de ter caráter remuneratório e passará a ter específica natureza compensatória.

 

Percebe-se, nitidamente, que a modificação é de extrema importância para o confronto e fixação de um plano de gestão de processos administrativos e judiciais.

EXECUÇÃO - DEVEDORES - SUSPENSÃO DE CARTEIRA DE HABILITAÇÃO E HABEAS CORPUS

 


Orlando José de Almeida

                                        Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

                                 

  

O pedido de suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) dos devedores vem sendo formulado com certa frequência por parte dos credores, com o objetivo de recebimento dos seus créditos.

No dia 03/10/2024, foi publicada notícia no site do Tribunal Superior do Trabalho -TST, referente ao julgamento proferido nos autos do processo nº ROT-1032624-06.2023.5.02.0000, cujo acórdão foi publicado no dia 11/09/2024. A matéria recebeu o seguinte título: “Empresários não conseguem reverter suspensão de carteira de habilitação por habeas corpus”.

No mencionado processo a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2), do TST, em decisão unânime, não admitiu recurso em habeas corpus impetrado por empresários que tiveram as suas CNHs suspensas.

Os fatos que originaram o julgamento, em síntese, foram assim descritos: “Os empresários, donos de postos de gasolina e conveniência, foram condenados a pagar diversas parcelas a um ex-empregado. Como os valores não foram pagos, na fase de execução, o juízo da 51ª Vara do Trabalho de São Paulo ordenou a suspensão das carteiras de motorista (CNH) e dos passaportes dos três. No habeas corpus, eles alegaram que a CNH é indispensável e que sua suspensão os impediria de trabalhar - um deles é motorista de excursões de veículos 4x4 para esportistas, o outro é corretor autônomo de imóveis, e o terceiro é advogado. O Tribunal Regional do Trabalho deferiu a liminar em relação ao bloqueio dos passaportes, mas manteve a suspensão das CNH, porque a medida não cerceia o direito de locomoção, porque “a direção de veículo não é um único meio para tal fim”. Eles então recorreram ao TST, alegando que o habeas corpus serve, também, para sanar violência contra outros direitos constitucionalmente garantidos.”

 

Vale lembrar que o habeas corpus é uma ação constitucional prevista no artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, que estabelece:

 

Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.

 

E o artigo 647, do Código de Processo Penal, determina:

 

Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.

 

A finalidade do instituto, portanto, é a “proteção da liberdade de locomoção sofrida por pessoa física, ou que se ache na iminência de sofrer coação ilegal na liberdade de ir e vir em decorrência de abuso de poder ou ilegalidade praticada.”

 

Por ocasião mencionado julgamento, diante de recurso interposto em habeas corpus, o Colegiado entendeu que “esse tipo de processo é inadequado, porque a decisão questionada só os impede de dirigir, mas não de se locomover”, cuja ementa foi a seguinte:

 

AGRAVO. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. MEDIDAS ATÍPICAS DE EXECUÇÃO. SUSPENSÃO DA CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO – CNH. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. 1. Esta Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, no julgamento do processo nº TST-HCCiv-1000678- 46.2018.5.00.0000, firmou o entendimento de que o habeas corpus tem cabimento restrito à defesa da liberdade de locomoção primária, assim entendida como a proteção do direito de ir, vir e permanecer consubstanciado na liberdade física como condição necessária para o seu exercício. 2. Na presente hipótese, os impetrantes pretendem a cassação da decisão que determinou a suspensão de suas CNH para assegurar o cumprimento da ordem judicial, o que denota a inadequação da via eleita, porquanto tal determinação tão somente restringe a condução de veículos pelos próprios impetrantes e não a sua liberdade de locomoção em si. Agravo a que se nega provimento.

 

E na mesma direção o Tribunal Superior do Trabalho, por intermédio da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, já se manifestou:

 

HABEAS CORPUS. ATLETA PROFISSIONAL. LIBERAÇÃO PARA EXERCÍCIO EM OUTRA AGREMIAÇÃO ESPORTIVA.  AUSÊNCIA DE  RESTRIÇÃO  DO  DIREITO  PRIMÁRIO  DE  LIBERDADE  DE  LOCOMOÇÃO (DIREITO DE IR, VIR E PERMANECER). SUPERAÇÃO DA DOUTRINA BRASILEIRA DO HABEAS CORPUS.NÃO CABIMENTO. A Justiça do Trabalho tem competência constitucional para apreciação de habeas corpus, quando o ato questionado  envolver  matéria  sujeita  à  sua  jurisdição.  Contudo, tal competência deve observar os limites de cabimento da referida ação constitucional garantidora de liberdades fundamentais, em respeito à  instrumentalidade  das  ações  constitucionais. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que o habeas corpus tem cabimento restrito à defesa da liberdade de locomoção primária, assim entendida como o direito de ir, vir e permanecer. Admissível, portanto, como meio de proteção de direitos que tenham na liberdade física condição necessária para o seu exercício.  Precedentes do  STF  e  do  STJ.  Contraria  o  entendimento  majoritário  dessas  Cortes,  portanto,  a admissão de habeas corpus para discutir cláusula contratual de atleta profissional, com pedido de transferência  imediata  para  outra  agremiação  desportiva  e  de  rescisão  indireta  do  contrato  de trabalho,  por  não  afetar  restrição  ou  privação  da  liberdade  de  locomoção.  Se a discussão afeta somente  secundariamente  a  liberdade  de  locomoção,  decorrente  de  liberdade  de  exercício  de profissão ou trabalho, não cabe habeas corpus, caso em que o direito deve ser tutelado por outro meio admitido em Direito. Eventuais restrições do exercício de atividade por atleta profissional não autorizam a impetração de habeas corpus, porquanto não põem em risco a liberdade primária de ir, vir ou permanecer. Ademais, na hipótese dos autos, o habeas corpus foi utilizado como substitutivo de decisão a ser proferida na reclamatória trabalhista, âmbito apropriado para a análise probatória da alegação de  descumprimento  do  contrato,  uma  vez  que  o  paciente  apresentou  reclamatória trabalhista, cujo pedido de tutela de urgência de natureza antecipada foi indeferido e contra o qual impetrou mandado de segurança. O presente habeas corpus foi impetrado contra decisão em agravo regimental da Seção Especializada do Tribunal Regional, que cassou a liminar concedida no mandado de segurança. Habeas corpus extinto sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, IV, do CPC/2015. (TST-HCCiv-1000678-46.2018.5.00.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 01/02/2019, destaques acrescidos)

 

RECURSO ORDINÁRIO. HABEAS CORPUS. SUSPENSÃO DA CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO-  CNH.  AUSÊNCIA  DE  AMEAÇA  À  LIBERDADE  DE  LOCOMOÇÃO.  JURISPRUDÊNCIA  DO  TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DESCABIMENTO DO WRIT. 1. Trata-se  de  habeas  corpus  impetrado  contra  ato  judicial  que,  na  fase  de  execução,  determinou  a suspensão  da  carteira  de  habilitação  da  paciente.  2.  O  habeas  corpus, remédio  constitucional previsto no art. 5º, LXVIII, da Carta Magna, destina-se a garantir o direito de quem " sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder ". A doutrina e os tribunais vêm ampliando a interpretação acerca da "liberdade de locomoção" tutelada pelo writ, não limitando seu escopo às circunstâncias de estrita privação de liberdade  corporal,  mas  autorizando  seu  manejo  para  hipóteses  de  imposição  de  medidas  que efetivamente limitam o livre ir e vir do paciente - desde que eivadas de ilegalidade. Nessa esteira, o Superior  Tribunal  de  Justiça  e  este  Tribunal  Superior  do  Trabalho  passaram  a  admitir  o  habeas corpus  contra  atos  que  impõem  -  injustamente  e  abusivamente  -  a  retenção  do  passaporte, documento necessário para a locomoção internacional. 3. Contudo, a jurisprudência de ambos os Tribunais  Superiores  é  firme  no  sentido  de  que,  diversamente  da  retenção  do  passaporte,  a suspensão  da  carteira  nacional  de  habilitação  de  trânsito  -  CNH  -  não  configura  ameaça tutelável pela via do habeas corpus, pois não se trata de documento indispensável ao ir e vir, mas tão somente exigência para a condução própria de veículos automotores. Precedentes daSDI-2 do TST e do STJ. 4. Assim, embora certo que eventual abuso na retenção da CNH autoriza o manejo dos meios processuais adequados para sua impugnação e cessação, o remédio não perpassa a via especial do habeas corpus, que se revela incabível, tal como decidido na origem. Recurso ordinário a que se nega provimento. (TST-ROT-1002140-47.2019.5.02.0000, Subseção II Especializada em  Dissídios  Individuais,  Relator  Ministro  Alberto  Bastos  Balazeiro,  DEJT  01/04/2022,  destaques acrescidos)

 

RECURSO  ORDINÁRIO  EM  HABEAS  CORPUS. SUSPENSÃO  DE  CNH  E  DO  PASSAPORTE  DO RECORRENTE. MEDIDA EXECUTIVA ATÍPICA. INADEQUAÇÃO DO HABEAS CORPUS PARA LIBERAÇÃO DA CNH. NÃO CONFIGURAÇÃO DE RESTRIÇÃO DO DIREITO PRIMÁRIO DE LOCOMOÇÃO. CABIMENTO DO REMÉDIO  HEROICO  CONTRA  ATO  DE  SUSPENSÃO  DO  PASSAPORTE.  CARACTERIZAÇÃO  DA ABUSIVIDADE DO ATO COATOR. 1. O habeas corpus, ação integrante da jurisdição constitucional das liberdades, tem por escopo tutelar a liberdade de locomoção física diante de ameaça de violência ou coação mediante ilegalidade ou abuso de poder, conforme expressamente previsto no art. 5.º, LXVIII, da Constituição Federal, não se prestando a tutelar direitos que não encontram sua condição de exercício na liberdade física de locomoção, conforme entendimento pacificado pelo STF e por esta Corte Superior.  2.  A partir  dessa  premissa,  esta  SBDI-2,  no  julgamento  do  RO  n.º  8790-04.2018.5.15.0000, ocorrido em 18/8/2020, firmou o entendimento de ser incabível o habeas corpus para obstar a suspensão da CNH determinada como medida atípica em processo de execução, com fundamento no art. 139, IV, do CPC de 2015, uma vez que esse ato não afeta, de forma objetiva e concreta,  a  liberdade  de  locomoção  primária  do  indivíduo.  3. Assim,  considerando  que  o delineamento fático do caso em exame se amolda integralmente às balizas que sustentaram a ratio decidendi extraída do referido Precedente - a impetração de habeas corpus para obstar a suspensão da CNH determinada como medida atípica na execução - , e à luz da diretriz oferecida pelo art. 926 do CPC de 2015, exsurge manifesta a inadequação do meio escolhido, impondo-se, nesse tema específico, a extinção da ação, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI e § 3.º,do  CPC  de  2015.  [...]  (TST-RO-1247-26.2018.5.05.0000,  Subseção  II  Especializada  em  Dissídios Individuais, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 17/12/2021, destaques acrescidos).

 

O que pode ser constatado é que o posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho, acerca da matéria, vem sendo na direção de que é possível a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) dos devedores, como meio de forçar a satisfação da execução, considerando que tal ato não restringe a liberdade de locomoção, inexistindo violação ao direito e ir e vir. Logo, o habeas corpus não é medida adequada para afastar decisão que determinou a aludida suspensão.

A PARIDADE DE GÊNERO

 


 

Stanley Martins Frasão

                                        Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

Segundo o IBGE (VEJA, edição 2911, p.19), foi identificado que as mulheres ganham menos que os homens em 82% das áreas e o salário delas é, em média, 17% menor.

A afirmação sobre a disparidade salarial entre homens e mulheres no Brasil, conforme identificado pelo IBGE, é um reflexo de um problema persistente e complexo que afeta não apenas o Brasil, mas muitos países ao redor do mundo.

Esta situação demanda atenção urgente e ações concretas para promover a igualdade de gênero no mercado de trabalho.

Algumas sugestões e ideias para melhorar esses índices, com foco em políticas públicas e iniciativas que podem ser implementadas:

Licença parental igualitária

Estabelecer uma política de licença parental que incentive tanto homens quanto mulheres a compartilharem as responsabilidades familiares.

Oferecer benefícios fiscais para empresas que adotem políticas de licença parental mais equitativas.

Cotas em cargos de liderança

Implementar cotas temporárias para garantir uma representação mínima de mulheres em cargos de liderança em empresas públicas.

Criar programas de mentoria e desenvolvimento de liderança focados em mulheres.

Educação e conscientização

Desenvolver campanhas nacionais de conscientização sobre a igualdade de gênero no trabalho.

Integrar a educação sobre igualdade de gênero nos currículos escolares desde o ensino fundamental.

Incentivos fiscais para a igualdade salarial

Oferecer benefícios fiscais para empresas que demonstrem progresso na redução da disparidade salarial entre gêneros.

Criar um selo de "Igualdade Salarial" para empresas que atingirem determinados padrões de equidade.

Apoio ao empreendedorismo feminino

Criar linhas de crédito específicas e condições favoráveis para mulheres empreendedoras.

Estabelecer programas de capacitação e mentoria para mulheres que desejam abrir seus próprios negócios.

Políticas de conciliação trabalho-família

Incentivar a adoção de horários flexíveis e trabalho remoto nas empresas.

Criar mais creches públicas e subsidiar serviços de cuidados infantis para facilitar o retorno das mulheres ao mercado de trabalho.

Combate ao assédio no ambiente de trabalho

Fortalecer as leis e mecanismos de denúncia contra o assédio sexual e moral no trabalho.

Exigir que as empresas implementem programas de treinamento obrigatórios sobre prevenção de assédio.

Valorização de setores predominantemente femininos

Reavaliar e ajustar os salários em setores tradicionalmente femininos, como educação e cuidados, para refletir a importância desses trabalhos para a sociedade.

Implementar políticas de valorização salarial para profissões predominantemente femininas no setor público.

Incentivo à participação feminina em áreas STEM

Criar programas de bolsas de estudo e incentivos para mulheres em áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM).

Promover campanhas para aumentar a visibilidade de mulheres em carreiras STEM.

Monitoramento e avaliação contínuos

Estabelecer um observatório nacional da igualdade de gênero no trabalho para monitorar o progresso e propor ajustes nas políticas públicas.

Realizar pesquisas periódicas para identificar barreiras específicas que impedem o avanço das mulheres no mercado de trabalho.

A implementação dessas sugestões requer um esforço conjunto do governo, setor privado e sociedade civil.

É importante ressaltar que a mudança cultural é um processo gradual, mas com políticas públicas bem direcionadas e o engajamento de todos os setores da sociedade, é possível acelerar o progresso em direção à igualdade salarial e de oportunidades entre homens e mulheres no Brasil.

A Resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 2023, a fim de promover a paridade de gênero nos tribunais é exemplo, que aliás foi adotado pelo Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao dar provimento de uma vaga de desembargadora, pela primeira vez, a partir de uma lista exclusivamente feminina de candidatas, sendo escolhida a juíza Ivone Campos Guilarducci Cerqueira, com assento na 15ª Câmara Cível (https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/noticias/primeira-desembargadora-escolhida-em-lista-exclusivamente-feminina-toma-posse-do-tjmg.htm# ).