segunda-feira, 29 de novembro de 2021

COTAS RACIAIS NAS ELEIÇÕES DA OAB: O DIREITO BRASILEIRO E A REPARAÇÃO HISTÓRICA ANTIRRACISTA

 

 

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

Nathália Caixeta Pereira de Castro

Acadêmica de Direito e ex-estagiária de Homero Costa Advogados

 

 

O dia 20 de novembro é uma data que simboliza a celebração e a conscientização sobre a história do povo negro no Brasil. Essa data surgiu a partir da morte de Zumbi, líder do Quilombo de Palmares que lutou bravamente contra a escravidão no século XVII.

O Dia da Consciência Negra foi incluído no calendário escolar brasileiro pelo artigo 79-B, da Lei 10.639/03, e oficialmente instituído no país pela Lei 12.519/11. O dispositivo legal é novo no Brasil, mas a discussão se iniciou há 50 anos, em 1971, quando um grupo de quilombolas passou a questionar ainda com mais veemência o assunto, ao reivindicar a conscientização de que o assassinato de Zumbi de Palmares e de tantos outros negros se deu pelo tão presente legado da escravidão em nosso país.

Apesar de o simbolismo do dia 20 de novembro trazer consigo um relevante reconhecimento para a história da luta negra no Brasil, ainda há um longo percurso a ser feito rumo a uma sociedade livre de racismo.

Já se vê uma tentativa de reparação história a partir das cotas raciais que são aplicadas em diversos âmbitos sociais, como por exemplo, no ingresso em universidades ou investiduras em concursos públicos, instituídas, respectivamente, pelas Leis nº 12.711, de 29 de agosto de 2012, e nº 12.990, de 9 de junho de 2014.

As cotas raciais podem abranger pessoas que se autodeclaram como minoria étnico-racial, sejam elas pretas, pardas ou indígenas. A Lei Magna, em seu artigo 4º, VIII, reforça o Princípio Constitucional de Igualdade, pelo qual é garantido tratamento isonômico racial:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

(...)

VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;

Seguindo essa linha, o Conselho Federal da OAB, Ordem dos Advogados do Brasil, aprovou em 14 de dezembro de 2020 a aplicação imediata, além da paridade de gênero de 50%, de cotas raciais de 30% em suas eleições. Na reunião realizada na época da aprovação, o conselheiro federal Jedson Marchesi Maioli, da bancada da Seccional do Espírito Santo, argumentou: “A OAB necessita não se limitar a realizar alterações do sistema de eleições institucional, mas sim se aprofundar no tema, adotando medidas, mecanismos e projetos eficazes para a inserção de todas as representatividades inscritas no quórum da OAB como forma de ser mais atual, justa e digna.”

A princípio, a proposta do relator era de que as cotas raciais abrangessem 15%. Após votos divergentes de outras bancadas, foi adotado o percentual de 30%. A reserva valerá pelo período mínimo de dez eleições e já vale nas eleições de 2021.

Após essa aprovação, as chapas registradas obrigatoriamente deveriam alcançar essa porcentagem de pessoas negras, tanto em cargos titulares quanto em suplentes. Como a cota se aplica a casos de autodeclaração racial, foi necessária a observação de critérios para evitar deturpações fraudulentas. Em novembro de 2021, o Conselho Eleitoral da OAB determinou que haverá fiscalização e, eventualmente, impugnações a casos em que a autodeclaração pudesse configurar tentativa de fraude para atingir o percentual necessário. O relator Conselheiro Airton Martins Molina pontuou: “Sempre que houver uma impugnação à autodeclaração, a Comissão Eleitoral deve resolvê-la com a transparência nos registros e a existência de uma banca de heteroidentificação que atue no controle de possíveis fraudes e irregularidades, tal qual já fez a Comissão Eleitoral da Seccional do Distrito Federal, será o caminho”.

É indiscutível o papel e dever do Direito e de suas instituições de reparar as consequências causadas pelo racismo no Brasil. Foi nessa conjuntura que a Ordem corretamente aprovou tal medida, de busca por isonomia e equilíbrio racial em sua composição. A representatividade e a inclusão são direitos resguardados pela Lei e que devem ser aplicados em todas as esferas sociais, de forma a coibir o racismo de progredir, mesmo que de forma estrutural e aparentemente singela. 

Como já dito anteriormente no artigo “DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA: O PAPEL DO DIREITO NA LUTA ANTIRRACISTA”, também de autoria de Stanley Martins Frasão e Nathália Caixeta Pereira de Castro: “É imperioso o entendimento de que a luta antirracista também é uma luta contra a omissão e contra o desleixo diante da carga histórica carregada pelos negros. É uma luta a favor de quem ocupa mais da metade da população brasileira, que assim se declara, e, ainda assim, não goza do mesmo lugar que a branquitude ocupa. Faz-se sempre importante o papel do Direito e dos juristas em buscar não apenas a criação de um corpo legislativo que abomine a discriminação racial, mas que, principalmente, o aplique e o faça respeitado por todos.”

Fica a nossa homenagem ao advogado abolicionista Luiz Gama, ex-escravo, responsável por libertar cerca de 500 pessoas escravizadas, no século XIX, que gerou um filme, 'Doutor Gama', dirigido por Jeferson De.

 

O FUTURO, JUNTOS E DESARMADOS

 

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

Cristina Simões Vieira

                                                                Estagiária de Homero Costa Advogados

 

O que é a Agenda 2030? é um plano para governos, sociedades, empresas, academias e para todas as pessoas, e no Brasil, ela se alinha aos princípios da Constituição Federal de 1988, que esclarece:

I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e, V - o pluralismo político (Art. 1º). Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - constituir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e, IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas de discriminação (Art. 3º).

Em tempos de polarização, reeducação comportamental, vejamos por um momento o país com mãos desarmadas e olhares esperançosos. Falemos de um futuro breve, a proposta da ONU em união dos países para que, até 2030, juntos e desarmados, possamos lutar pelo bem maior, o Planeta Terra que nos fornece a vida.

É um Plano de Ação entre 193 nações, membros da ONU, criado para colocar o mundo em um caminho mais sustentável e resiliente até 2030. O Plano entrou em vigor em 1º de janeiro de 2016 e o prazo para que os 17 ODS (Objetivos Desenvolvimento Sustentável) sejam cumpridos é até 31 de dezembro de 2030.

Apoiar e monitorar a implementação dos ODS é um dever de todos.  O plano indica 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Acompanhe a evolução dos ODS em nosso Brasil.

A Responsabilidade Social deve estar baseada na Ética, interna e externa, envolvendo questões sociais sem que com isso deixe a empresa de perseguir o lucro de seus objetivos sociais, com observância da transparência nos negócios.

A responsabilidade social é fruto de estratégias de melhoria das condições de vida das pessoas que trabalham nas empresas e, também, de soluções para problemas da comunidade em que elas estão inseridas. Isso implica dizer que não basta a divulgação de balanços financeiros, determinados por lei, e que às vezes são manipulados, gerando prejuízos de toda ordem. Hoje também é necessário ter transparência nos negócios, que emerge das relações com os respectivos empregados, consumidores, meio-ambiente, na integração dos deficientes físicos no mercado de trabalho (Lei 7.853/09, regulamentada pelo Decreto 3.298/99), atendendo, no mínimo, o percentual fixado em lei, na erradicação do trabalho infantil. Enfim, espera-se ética e responsabilidade social de todos.

Não se trata de obrigação, porque cada país aderiu para melhorar o ambiente da comunidade, mas é uma responsabilidade assumida para que sejam implementadas de fato, seja através de políticas públicas, leis e caminhos alternativos legais.

Não se trata de sonho, trata-se de ideias simples com suas nuances revolucionárias, a reconstrução do nosso Planeta.

Apesar dos desafios, nos propusemos a continuar trabalhando no sentido de oferecer a mudança necessária para a saúde mundial.

A mudança climática continua a ser uma emergência global e, pelo tempo, estamos em delay para com nosso ecossistema. Não podemos parar, temos que acelerar.  A abordagem nos permitirá oferecer aos jovens as habilidades e os conhecimentos para que no futuro priorizem a biodiversidade.

O princípio para engrenar a mudança é saber que, a velocidade da implantação e execução dos planos não estão sendo desenvolvidas ao tempo que é destruído o ecossistema, contudo, essa fatídica realidade não pode ser fator para desanimarmos.

O mundo sofre com mazelas milenares, ao tempo, melhorando. Tempo ao tempo. A transformação do Gran Canyon remonta a 6 milhões de anos. Partimos do mesmo pressuposto, não devemos ter a ambição de querer estarmos presentes quando o resultado da mudança acontecer, nos cabe inicia-la e fomenta–lá. Destacando nosso país, rico por natureza, é de conhecimento global a inestimável biodiversidade que possuímos, é o país que detém a maior fonte de espécies do planeta.

Nós abarcamos mais de 20% do total de espécies do mundo, encontradas em terra e água. O Valor que possuímos engloba a rica biodiversidade, não somente pelo serviço ecossistêmico, mas pelas oportunidades que representam sua conservação, uso e patrimônio genético.

É notório que estamos atrasados na evolução das propostas, mas temos que nos apegar nas lições aprendidas. Não podemos parar, desanimar. Críticas sempre devem existir, mas não podem se tornar uma âncora para nos frear em meio ao nada.

Em Minas Gerais, citemos outro projeto engajado e promissor, o Coalizão Under 2- o primeiro estado brasileiro a aderir a aliança climática, que reúne mais de 260 Estados, regiões e províncias em todo o mundo que representam cerca de 1,75 bilhão de pessoas e 50% da economia global.

“A agenda ambiental em Minas Gerais é estratégica para todo país e por isso a nossa responsabilidade, que pôde ser vista na adesão pioneira à Race To Zero. E um destaque foi que, em Minas, a adesão ocorreu de forma compartilhada, pela assinatura conjunta com os setores industrial e agropecuário, de forma inédita no Brasil, tornando o compromisso ainda mais importante”, ressaltou a secretária”. Marília Melo - secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais .

Palavras como liberdade, opções e escolha, evocam possibilidades muito além dos seus reais benefícios. Ultrapassemos o que possa vir a nos limitar, juntos, podemos mais. Estamos em momento de enormes desafios. Milhares de cidadãos continuam a viver na pobreza e a eles é negada uma vida digna. Crescentes desigualdades dentre e entre os países, disparidades de oportunidades, riqueza e poder.

A desigualdade de gênero continua a ser um desafio chave. O desemprego, particularmente entre os jovens, é uma grande preocupação. Ameaças globais à saúde, desastres naturais mais frequentes e intensos, conflitos em ascensão, o extremismo violento, o terrorismo e as crises humanitárias relacionadas e o deslocamento forçado de pessoas ameaçam reverter grande parte do progresso alcançado na área de desenvolvimento nas últimas décadas.

Ser visionário, é também, um momento de grandes oportunidades. Na geração passada, centenas de milhões de pessoas deixaram a pobreza extrema. O acesso à educação aumentou. A disseminação da informação e das tecnologias de comunicação e interconectividade global aceleraram o progresso humano, para eliminar o hiato digital e desenvolver sociedades do conhecimento, tal como a inovação científica e tecnológica em áreas tão diversas como medicina e energia. A realidade global é essa, não se iluda, há muitos desafios, presentes e futuros, cabendo a cada um decidir se sucumbe ou luta por uma sociedade melhor.

Não nos esqueçamos que há quase quinze anos, os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio foram acordados. Um marco importante para o desenvolvimento, e progresso significativo tem sido obtido em diversas áreas.

 “Não podemos mudar a direção do vento, mas podemos ajustar nossas velas para sempre chegarmos ao nosso destino”. Confúcio, adaptado. 

 

A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 170/2021 E A TRIBUTAÇÃO DO MARKETPLACE

 

 

Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

De acordo com a Wikipédia[1], o marketplace é um e-commerce, mediado por uma empresa, em que vários lojistas se inscrevem e vendem seus produtos. Essa loja virtual funciona de forma que o cliente possa acessar um site e comprar itens de diferentes varejistas, pagando tudo junto, em um só carrinho. Essa plataforma pode ser vista como várias vitrines de um shopping center, vendendo as mais diversas categorias de itens.

Como o marketplace ganha cada vez mais força, mormente pelo entusiasmo de ter um “negócio digital ambulante”, em que se pode comercializar produtos e/ou serviços para todo o Brasil, e diante da dificuldade dos contribuintes entenderem como devem ser tributados os produtos e/ou serviços, a Receita Federal publicou, no dia 04/10/2021, a Solução de Consulta COSIT nº 170/2021.

Com a edição e publicação da Solução de Consulta COSIT nº 170/2021, as autoridades fiscais analisaram o conceito de receita bruta para fins de incidência do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS nesse tipo de atividade.

Na Solução de Consulta a Secretaria da Receita Federal do Brasil apurou um caso que tratava sobre o conceito de receita bruta de empresa que atua como intermediária no comércio de diversos produtos através de um sítio eletrônico na internet.

A finalidade da atividade de um marketplace é englobar em plataforma única a comercialização de produtos de diversos fornecedores, permitindo que o consumidor pague de uma única vez os produtos adquiridos. Como remuneração, o marketplace retém uma comissão do fornecedor, também chamada de take rate.

Diante desse contexto, a tributação dos marketplaces estabelecia um conflito: a pessoa jurídica deveria tributar o valor integral da comercialização do produto em sua plataforma? ou tão somente sua comissão? A receita bruta levada à tributação seria o valor integral pago pelo consumidor final (incluída a parcela repassada ao fornecedor), ou somente o valor cobrado pelo serviço de intermediação realizado (apenas a parcela que lhe cabe a título de comissão)?

Ao analisar o caso que lhe foi apresentado, a Receita Federal do Brasil, por intermédio da Solução de Consulta COSIT nº 170/2021, concluiu que não se incluem no conceito de receita bruta os valores que circulam na contabilidade de pessoa jurídica que não lhe pertencem, sendo propriedade e receita bruta de terceiros, titulares da relação jurídica que deu causa à entrada desse recurso.

O entendimento do Fisco Federal é válido para IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. Para nenhum desses tributos, a legislação aplicável permitiu considerar como receita bruta os valores que apenas transitam em sua contabilidade.

Nesse sentido, consoante entendimento da própria Receita Federal, apenas o valor recebido pela empresa a título de prestação de serviço de marketplace (a comissão) compõe a sua receita bruta, na medida em que este é o preço do serviço prestado que passa a incorporar seu patrimônio.

Assim, a receita bruta “não compreenderá a entrada de recursos que não lhe pertencem e que serão repassados aos terceiros”.

Cumpre ressaltar que a Solução de Consulta COSIT nº 170/2021 exige a existência de contrato de prestação de serviços firmado entre o fornecedor do produto e o operador do marketplace, além de documentos fiscais lastreando cada operação.

Conclui-se que, com esse posicionamento, a tributação dos marketplaces ganha mais segurança jurídica e fascínio para investimentos, porque pode diminuir espantosamente a carga tributária para as empresas que estavam, por conservantismo, tributando a integralidade das importâncias circuladas em sua contabilidade.                                                 



[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%ADtio_de_com%C3%A9rcio

A LEI DO SUPERENDIVIDAMENTO

 


 

 

Pedro Augusto Soares Vilas Boas

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

Caroline Kellen Silveira

Advogada Associada de Homero Costa Advogados

 

 

A Lei Federal nº14.181/2021, conhecida como “Lei do Superendividamento”, entrou em vigor em 02/07/2021, com a finalidade de apresentar soluções aos consumidores que enfrentam dificuldades para pagar as parcelas de seus empréstimos e crediários em geral.  

 

O objetivo da lei, que inseriu novos e relevantes dispositivos no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), é a prevenção e tratamento especial ao superendividamento de pessoas físicas, buscando prevenir sua insolvência por meio de uma nova reorganização financeira com intermédio da conciliação e do poder judiciário.

 

As disposições relacionadas ao superendividamento se aplicam às dívidas contraídas de boa-fé, levando em consideração se sua atual situação financeira acarreta na impossibilidade de manter seu mínimo existencial.

 

Ponto relevante da Lei do Superendividamento é a nova possibilidade de renegociar as dívidas através dos tribunais estaduais de justiça por meio de procedimento semelhante às recuperações judiciais empresariais. Em situações de débito com diversos credores, é possível a conciliação em conjunto, ou seja, é possível a existência de um plano de pagamento que “caiba no bolso” do devedor, o que se assemelha ao conhecido plano de recuperação judicial.

 

Conforme dispõe a Lei, a conciliação entre as partes poderá ser realizada perante os tribunais, órgãos como o Ministério Público, Procon ou Defensoria Pública. Os credores são chamados para comparecer em audiência com finalidade de conhecer a realidade do devedor, que oferecerá uma proposta para pagamento dento de suas possibilidades, seguindo critérios definidos.

 

O devedor interessado em negociar suas dívidas deverá relacionar os valores das dívidas, minunciosamente, descrevendo quem são os credores e quais valores devidos para cada um deles. Em seguida, os credores serão convidados a participarem da audiência de conciliação, momento que o indivíduo inadimplente irá propor os valores para quitação da dívida.

 

Em caso de acordo entre as partes, o documento deverá apresentar todas as condições de pagamento, como o valor total da dívida, quantidade de parcelas e descontos nos encargos moratórios. O Juiz é responsável por definir em qual momento o nome do devedor será retirado dos cadastros de inadimplentes.

 

Caso eventual credor não compareça à audiência, este ficará vinculado ao plano de pagamento da dívida acordado na audiência.

 

Relevante benefício do pagamento das dívidas em bloco é o fato de o indivíduo inadimplente conseguir quitar todas as suas dívidas de uma única vez, sem a necessidade de escolher qual dívida irá pagar e qual dívida irá esperar. Com o programa, todos os débitos são incluídos em um único plano.

 

A Lei do Superendividamento tem como finalidade proteger os consumidores vulneráveis, busca efetivar a composição e facilitar a conciliação entre as partes, sempre em busca de soluções assertivas, que sejam traçadas em conjuntos entre as partes. Tudo visando um ambiente mais saudável e seguro no mundo do comércio consumerista.

OBRIGATORIEDADE DE APRESENTAÇÃO DE CARTÃO DE VACINAÇÃO - DISPENSA POR JUSTA CAUSA

 

Orlando José de Almeida

                                                      Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

                                                                                         Cristina Simões Vieira

                                                                Estagiária de Homero Costa Advogados

 

 

No dia 1º de novembro o Ministério do Trabalho e Previdência – MTP editou a Portaria nº 620. Após a sua publicação vários e incessantes debates surgiram, notadamente a respeito de sua legalidade e constitucionalidade.

O ponto central da discussão reside no fato de “que a não apresentação de cartão de vacinação contra qualquer enfermidade não está inscrita como motivo de justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador, nos termos do art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho”.

Outra justificativa para a implementação da norma foi a que consta em seus “considerandos”, onde é feita referência a postulados Constitucionais, destacando-se as hipóteses da proteção ao trabalho e à saúde e a proibição de quaisquer formas de discriminação.

Nesse contexto, restou indicado no parágrafo 2º, do art. 1º, que “considera-se prática discriminatória a obrigatoriedade de certificado de vacinação em processos seletivos de admissão de trabalhadores, assim como a demissão por justa causa de empregado em razão da não apresentação de certificado de vacinação.”

 

Ao final, em seu art. 4º, traz as consequências do descumprimento de suas determinações e estabelece que, “além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre:

 

I – a reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais;

II - a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais.”

De outro lado, de igual forma, são consistentes os fundamentos para justificar a ilegalidade ou inconstitucionalidade de dispositivos da Portaria.

 

Os defensores dessa corrente buscam suporte em vários comandos previstos na Constituição Federal, especialmente no que concerne aos preceitos fundamentais do direito social à saúde (art. 6º e art. 196), bem como na legislação ordinária em vigor e em decisões de nossos Tribunais.

O advogado Sérgio Schwartsman, em artigo intitulado O “Trabalho” do Governo Federal Contra a Vacinação – Portaria Inconstitucional, Ilegal e Inoportuna”, [1] após justificar que a inconstitucionalidade reside no fato de que as “Portarias não podem criar normas relativas aos direito do trabalho, apenas regulamentar aquelas já existentes, de acordo com o art. 22, inciso I da Constituição Federal (CF)”, diz que “além disso, não permitir que o empregador aplique punições pela falta de vacinação, vai de encontro à legislação em vigor, pois tanto a CF/88, quanto a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e algumas outras leis, definem direitos à segurança e saúde do empregado, restando ao empregador o dever de garanti-las a todos os empregados no ambiente de trabalho. E se, um não se vacinar, põe em risco toda a coletividade de trabalhadores (e demais pessoas que frequentem o local). Destacamos que os arts. 157 e 158 da CLT, o art. 19 da Lei nº 8213/91, o art. 3º-J da Lei nº 13979/2020 são exemplos das Normas que levam à essa obrigação do empregador zelar pela saúde do empregado”.

O Supremo Tribunal Federal indiretamente já se manifestou sobre o cerne da questão, por ocasião dos julgamentos da ADI 6586 e da ADI 6587, nas quais se questionava a “determinação de realização compulsória de vacinação” inserta na Lei nº 13.979, de 2020 (art. 3º, III, d), sendo que prevaleceu o posicionamento no sentido de que o direito coletivo – no que tange à compulsoriedade - se sobressai ao direito individual.

É bom lembrar também que em direção oposta às disposições da Portaria, o Tribunal Superior do Trabalho editou o Ato Conjunto TST.GP.GVP.CGJT Nº 279, estabelecendo que, “para fins de ingresso e circulação nas suas dependências”,  “será exigida, a partir do dia 3 de novembro de 2021, a apresentação de comprovante de vacinação contra a covid”, ou “de testes RT-PCR ou de antígeno não reagentes para covid realizados nas últimas 72h.”

 

Consta ainda do Ato que “os servidores que, convocados para o trabalho presencial, não cumprirem as exigências acima estabelecidas serão impedidos de ingressar nas dependências do Tribunal e a ausência será considerada como falta injustificada”, o que tem amparo no art. 13, § 2º, da Resolução nº 748, de 26 de outubro de 2021, do Supremo Tribunal Federal.

 

Anteriormente, no início do ano em curso, o Ministério Público do Trabalho havia divulgado um guia técnico,[2] onde chegou à conclusão de que em relação à vacinação, em caso de “recusa injustificada, o trabalhador deverá ser afastado do ambiente de trabalho, sob pena de colocar em risco a imunização coletiva” e “o empregador poderá aplicar sanções disciplinares, inclusive a despedida por justa causa”.

 

Por fim, deve ser destacado que tramitam perante o Supremo Tribunal Federal quatro Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental, ADPFs 898, 900, 901 e 905, com pedido de cautelar, propostas contra a Portaria 620, respectivamente, pelos partidos Rede Sustentabilidade, Partido Socialista Brasileiro – PSB, Partido dos Trabalhadores – PT e pelo Partido Novo – Novo.

Em 12.11.2021 o Ministro Roberto Barroso deferiu, com abrangência ao tema da justa causa, “a cautelar para suspender os dispositivos impugnados, com ressalva quanto às pessoas que têm expressa contraindicação médica, fundada no Plano Nacional de Vacinação contra COVID-19 ou em consenso científico, para as quais deve-se admitir a testagem periódica.”

Aliás, a Portaria em questão determinou em seu art. 2º que “o empregador deve estabelecer e divulgar orientações ou protocolos com a indicação das medidas necessárias para prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão da COVID-19 nos ambientes de trabalho, incluindo a respeito da política nacional de vacinação e promoção dos efeitos da vacinação para redução do contágio da COVID-19.”

 

Assim, ao que nos parece, trata-se de contradição ao direcionar tais deveres aos empregadores, mas não permitir a adoção da justa causa em caso de descumprimento injustificado das normas que o mesmo fixar.

A Portaria viola as disposições contidas no art. 2º, da CLT, uma vez que cabe ao empregador dirigir a prestação dos serviços, e, ainda, no art. 482, letra “h”, que autoriza a dispensa por justa causa quando o empregado praticar “ato de indisciplina ou de insubordinação”.

Em conclusão, o empregador poderá estabelecer regras claras acerca da prevenção contra a COVID-19, incluindo a obrigatoriedade por parte dos empregados de apresentar cartão de vacinação para ingressar nas suas dependências, sob pena de justa causa, salvo nos casos de recusa justificada, mediante relatório médico para não se submeter à vacinação, ou quando não for possível ou de seu interesse direcionar o colaborador para atividade laboral em sistema de teletrabalho ou home office.

O risco de reversão da justa causa e de aplicação das sanções previstas no art. 4º não pode ser desprezado, ao entendimento de que a Portaria 620 do MTP não padece dos vícios de ilegalidade ou inconstitucionalidade, mas sem dúvida alguma existem fortíssimos fundamentos jurídicos para amparar ou manter a penalidade (justa causa).