Gustavo Pires Maia da Silva
Advogado Sócio de Homero Costa Advogados
Atualmente, nosso país encontra-se em um contexto político e econômico inclinado a ideias reformistas. Dentre as reformas discutidas hoje no Brasil está a denominada reforma tributária. As principais propostas apresentadas são a PEC nº 45/19 da Câmara dos Deputados, a PEC nº 110/2019 do Senado Federal e o PL nº 3.887/2020 do Governo Federal.
Resumidamente, as propostas objetivam: (i) PEC nº 45/19 – a extinção do IPI, do PIS, da COFINS, do ICMS e do ISS. A criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) com alíquota estimada para não alterar a arrecadação entre 20% e 25%, mais um tributo federal seletivo sobre bebidas e cigarros; (ii) PEC nº 110/2019 – a extinção do IPI, do PIS, da COFINS, do ISS, da CIDE Combustíveis, da CSLL, do IOF, do ICMS e do Salário Educação. A instituição do IBS e do Imposto Seletivo (IS), este último incidente sobre operações com bens e serviços específicos; (iii) PL nº 3.887/2020 – o fim do PIS e da COFINS, contribuições que serão substituídas pela Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços com alíquota de 12%, dentre outras mudanças.
Os três projetos acima citados dependem ainda de ampla discussão, análise e votação pelo Congresso Nacional, com posterior sanção presidencial a depender da espécie legislativa.
Frente aos projetos de reforma tributária apresentados, questão de extrema relevância está diretamente relacionada aos impactos e interferências que poderão acarretar ao federalismo nacional. Assim, devemos pensar cuidadosamente: necessitamos, neste momento, primeiro de uma reforma tributária ou de uma adaptação do nosso Pacto Federativo?
Apresentadas, ainda que sinteticamente, as principais novidades das propostas de reforma tributária e lançado o questionamento ventilado no parágrafo anterior, vale esclarecer que o Federalismo é uma forma de estado, um sistema de composição de forças, interesses e objetivos que podem variar, no tempo e no espaço, de acordo com as características, as necessidades e os sentimentos do povo. É a união institucional de Estados, que dá lugar a um novo Estado (o Estado Federal), diferente dos que dele participam (os Estados-membros). Nela, os Estados Federados, sem perderem suas personalidades jurídicas, desnudam-se de algumas tantas prerrogativas, em benefício da União. A mais relevante é a soberania.
A Constituição Federal de 1988, no seu Artigo 1º e Artigo 60, §4º, Incisos I e II, afirma veementemente a indissolubilidade do Pacto Federativo, a soberania nacional e a autonomia dos Estados-membros.
Há bastante tempo que se discute a interferência e os impactos das questões relacionadas às reformas tributárias no federalismo nacional.
É sabido que um dos maiores problemas concernentes a qualquer Federação, diz respeito à distribuição das bases tributárias entre as esferas de governo e a posterior repartição da receita arrecadada. Em face desta premissa, para que possa prevalecer a negociação e vontade política dos governantes, a descentralização política e principalmente a participação efetiva dos interesses regionais, antes de uma reforma tributária, pelo menos nos moldes das que foram propostas, é primordial a adaptação do Pacto Federativo, com o objetivo de mantê-lo apoiado e baseado na Constituição da República de 1988.
A Federação é cláusula pétrea e, num país com dimensões gigantescas como o Brasil, é uma consequência da Democracia. O Federalismo não significa indubitavelmente a possibilidade de os Estados criarem os tributos que bem entendam da maneira que acharem mais conveniente. Também não nos parece que o Federalismo exija que a arrecadação dos Estados seja própria, pois se assim fosse, os Estados da região Norte, Nordeste, Centro-Oeste e a maioria absoluta dos municípios brasileiros não integrariam a Federação, porque as transferências de recurso suplantam a arrecadação própria. Todavia, o Federalismo não é coadunável com um regime de concentração desmedida de recursos nas mãos da União, onde os governantes locais necessitam portar-se como pedintes a clamar os recursos indispensáveis ao custeio mínimo de suas máquinas administrativas. A solução do problema parece ser a criação de uma partilha rígida do produto da arrecadação dos tributos, com repasses automáticos e independentes dos humores da União. Só assim teremos os pré-requisitos da eficiência econômica e o respeito ao Federalismo, o que talvez signifique repensar o modelo atual do Pacto Federativo brasileiro.
A mudança na criação, cobrança e pagamento de tributos e também da exigência do cumprimento de obrigações acessórias, talvez não passe, pelo menos em tempos atuais, inicialmente, pela reforma tributária, principalmente diante das propostas apresentadas, mas primeiramente na alteração e no melhoramento do Pacto Federativo vigente, com a possibilidade de modificações para a existência de um modelo tributário brasileiro que considere tanto os condicionantes externos como as próprias restrições econômicas e políticas internas. O tributo tem que fazer valer sua função constitucional e legal em favor da coletividade. As deformações existentes entre os entes federados restringem-se sempre na tentativa de reformar o sistema, mantendo a receita global e as receitas próprias, mas nunca almejando uma reforma direcionada ao combate à sonegação, à fraude e a uma melhor distribuição social da carga tributária de maneira mais justa, fazendo valer os princípios da isonomia e legalidade, o que passa pelo desenvolvimento do Pacto Federativo.
Infere-se, frente ao conteúdo apresentado, que devemos pensar cuidadosamente se antes de passarmos no Congresso Nacional umas das reformas tributárias propostas, senão devemos, a princípio, trabalharmos o aperfeiçoamento do Pacto Federativo brasileiro, que fatalmente contribuiria para superar diversos obstáculos tributários impostos às esferas governamentais e aos contribuintes.