Stanley Martins Frasão
Advogado
Sócio de Homero Costa Advogados
Nathália Caixeta Pereira de Castro
Estagiária
de Homero Costa Advogados
O Dia da Consciência Negra é celebrado no
Brasil na data de 20 de novembro, em referência a Zumbi, líder do Quilombo de
Palmares, que lutou contra a escravidão no Nordeste, até seu falecimento, em
1695.
Tal data foi incluída no calendário escolar
pelo artigo 79-B, da Lei 10.639/03, e oficialmente instituída no país pela Lei
12.519/11. Apesar de legalmente novo, o Dia da Consciência Negra é pauta de
discussão no Brasil desde a década de 1970, quando um grupo de quilombolas
gaúchos trouxe à tona o assunto, questionando o legado da escravidão no país,
que culminou no trágico assassinato de Zumbi.
A despeito de todo reconhecimento trazido
junto à celebração do Dia da Consciência Negra, a luta antirracista ainda
enfrenta grandes batalhas. É evidente a necessidade da evolução de uma
sociedade que, ainda, se mostra segregacional e que carrega o pesado fardo da
escravidão no Brasil.
Nessa conjuntura, a mídia mostra, com
frequência, casos em que o racismo violenta e, até mesmo, mata os negros no
Brasil e no mundo. Recentemente, ganhou grande destaque o caso de assassinato
de George Floyd, após um policial branco se ajoelhar em seu pescoço até
sufocá-lo, mesmo enquanto George pedia por sua vida dizendo “não consigo
respirar”. O caso aconteceu em Minnesota, nos Estados Unidos, mas ganhou
repercussão mundial.
Foi então que ascendeu o movimento “Black
Lives Matter” ou, em português, “Vidas
Negras Importam”, criado em 2013 por ativistas negros norte-americanos. O Black
Lives Matter teve início com o objetivo principal de combater a violência
racista, mas abrangeu sua luta como um movimento pelos direitos da população
negra como um todo.
É preciso compreender que o racismo não se
trata apenas de atitudes visíveis e óbvias, como foi o assassinato de Georde
Floyd, mas também da ausência de direitos necessários enquanto reparação
histórica pela escravidão. O racismo, antes de tudo, é uma questão estrutural,
que acontece de forma sistemática e singela, e que deve ser combatido desde a
sua raiz.
A plataforma Change.org lançou um
abaixo-assinado ‘Justiça para George Floyd’, iniciado em maio deste ano, registrando
um fenômeno que se tornou recordista em assinaturas, chegando a 19,6 milhões de
apoiadores em todo o mundo, conforme informação obtida em 01/10/2020. O Brasil
é o quarto país mais engajado nessa causa, que levou a discussão sobre o
antirracismo para um novo patamar de visibilidade.
Diante disso, não somente a legislação do
país, mas também as outras esferas abarcadas pelo Direito trazem consigo a
necessidade de reparar o infeliz legado deixado pela desigualdade racial e,
majoritariamente, pelo período da escravatura.
A luta antirracista é constante e atual e,
por isso, faz-se necessária a devida criação e aplicação de um sistema legislativo
e jurídico que abrace essa causa, compreendendo que a Constituição de 1988 é um
marco contra a discriminação. O Princípio Constitucional de Igualdade, pelo
qual é garantido tratamento isonômico pela Lei, é reiterado no que se refere ao
racismo no artigo 4º, VIII:
Art. 4º A República Federativa do
Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
(...)
VIII - repúdio ao terrorismo e ao
racismo;
Dentro do dever de repúdio ao racismo e de
reparação histórica, fala-se sobre o sistema de cotas universitárias, por
exemplo, que vem com o objetivo de mudar as estatísticas, que sempre mostraram
uma menor frequência de negros nos ambientes acadêmicos e que, agora, têm o seu
lugar garantido nas universidades.
O CESA - Centro de Estudos das Sociedades
de Advogados realizou um levantamento informal em 2016, junto a alguns dos
escritórios associados, que indicou que menos de 1% de todo o quadro
profissional é composto por pessoas negras. Segundo o mesmo estudo, nas
seleções promovidas para a contratação de estagiários – principal meio de
ingresso aos escritórios de advocacia – o número de candidatos negros é ínfimo
ou, em alguns casos, inexistente. O CESA lançou o Projeto Incluir Direito, cujo
objetivo é a maior participação de negros no universo jurídico e desenvolver
uma atuação coerente e afirmativa, que contribua para a redução das
desigualdades e da discriminação.
Para maiores informações: http://www.cesa.org.br/projeto_incluir_direito.html
Não apenas no âmbito da educação, como
também no mercado de trabalho, em campanhas publicitárias, na arte, na moda e
em tantas outras esferas sociais, o que se busca é a representatividade e a
inclusão devida da população negra em todos os setores e segmentos, que, por
tanto tempo, foi marginalizada.
É imperioso o entendimento de que a luta
antirracista também é uma luta contra a omissão e contra o desleixo diante da
carga histórica carregada pelos negros. É uma luta a favor de quem ocupa mais
da metade da população brasileira, que assim se declara, e, ainda assim, não
goza do mesmo lugar que a branquitude ocupa. Faz-se sempre importante o papel
do Direito e dos juristas em buscar não apenas a criação de um corpo
legislativo que abomine a discriminação racial, mas que, principalmente, o
aplique e o faça respeitado por todos.