segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

EXPLORAÇÃO DE JOGOS DE FORTUNA? FAÇAM SUAS APOSTAS!

  

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

Nathália Caixeta Pereira de Castro

Colaboradora de Homero Costa Advogados

 

O Decreto-lei 9.215/46, em 30 de Abril de 1946, do governo do presidente Eurico Gaspar Dutra, contendo cinco considerandos que (i) a repressão aos jogos de azar é um imperativo da consciência universal; (ii) a legislação penal de todos os povos cultos contém preceitos tendentes a esse fim; (iii) a tradição moral jurídica e religiosa do povo brasileiro e contrária à prática e à exploração e jogos de azar; (iv) das exceções abertas à lei geral, decorreram abusos nocivos à moral e aos bons costumes; (v) as licenças e concessões para a prática e exploração de jogos de azar na Capital Federal e nas estâncias hidroterápicas, balneárias ou climáticas foram dadas a título precário, podendo ser cassadas a qualquer momento, restaurou em todo o território nacional a vigência do artigo 50 e seus parágrafos da Lei das Contravenções Penais (Decreto-lei nº 3.688, de 2 de Outubro de 1941)  e declarou nulas e sem efeito todas as licenças, concessões ou autorizações dadas pelas autoridades federais, estaduais ou municipais, com fundamento nas leis ora, revogadas (Decretos-leis nº 241, de 4 de Fevereiro de 1938n.º 5.089, de 15 de Dezembro de 1942 e nº 5.192, de 14 de Janeiro de 1943 ), ou que, de qualquer forma, contenham autorização em contrário ao disposto no artigo 50 e seus Parágrafos da Lei das Contravenções penais.

Aludido Decreto sofreu influência direta de questões morais e religiosas praticadas principalmente pela Primeira-Dama da época, Carmela Dutra, que considerava os jogos de azar ofensivos aos bons costumes.

Cassinos legalizados no Brasil, que movimentavam fortemente a economia, atraindo diversos turistas e até mesmo celebridades foram fechados da noite para o dia.

Não é a primeira vez que escrevemos sobre este assunto (https://www.migalhas.com.br/depeso/338040/cassinos-no-brasil--uma-proibicao-ultrapassada), mas diante dos últimos movimentos na Câmara dos Deputados, vale uma nova versão, na esperança de que o aniversário de 76 anos do Decreto-lei 9.215/46 se transforme em apenas uma data. A maturidade nestes quase 76 anos foi alcançada e muito recursos financeiros foram pedidos, tanto na arrecadação de impostos quanto na iniciativa privada.

Apesar de sua ilegalidade, os jogos de azar no Brasil continuaram sendo praticados de forma indireta, seja por meios online ou casas clandestinas.

A partir dessa realidade, em que a norma se mostrou meramente teórica e que os próprios considerandos citados acima não se sustentam, a prática de tais jogos eventualmente volta a ser discutida no cenário político legislativo brasileiro.

Em novembro de 2021, o PL 442/91 tornou a ser revisado pela Câmara dos Deputados, cuja minuta inicial foi apresentada pelo relator do Grupo de Trabalho, Deputado Felipe Carreras (PSB-PE), para debater a organização, a estruturação e as diretrizes da norma que regulamenta os jogos e as apostas no país. Esse Grupo de Trabalho foi criado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, e tem como objetivo o debate sobre o assunto.

O deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP) disse que há articulação de evangélicos e católicos contra a proposta. “Nós, da Frente Parlamentar Evangélica, da Frente Cristã e da Frente Católica, somos terrivelmente contra este PL. E vamos obstruí-lo aqui até o momento em que nós o derrubarmos”, declarou (Fonte: Agência Câmara de Notícias).

Nas palavras do deputado Newton Cardoso Jr (MDB-MG): “O jogo do Brasil não é proibido, em qualquer esquina, em qualquer canto se faz uma aposta. ”  e que “O emprego gerado por essa atividade vai pagar contribuição para a previdência pública” (Fonte: Agência Câmara de Notícias).

Para a deputada Renata Abreu (PTN-SP): “Já é hora do Congresso Nacional superar a hipocrisia, discutir a matéria e regulamentar o jogo da forma mais adequada a cumprir suas finalidades diversionistas e lúdicas e, em adendo, contribuir com recursos para financiar ações sociais” (Fonte: Agência Câmara de Notícias).

As alterações sugeridas no texto trataram sobre diversas vertentes, desde a associação dos jogos de azar a organizações criminosas, até questões de saúde pública relacionadas ao vício causado por tais jogos.

Foi alterado também pelo relator o ponto que versava sobre a competência para autorização dos jogos, que, segundo ele, só poderia ser dada pela União, mas no texto anterior poderia ser decidida por outros entes federativos. É pauta ainda indefinida a dosimetria da pena para aqueles que praticarem condutas delituosas relacionadas aos jogos de azar e também a tributação que incidirá sobre esse setor.

No dia 16 de dezembro de 2021, o Projeto foi novamente discutido na sessão do Plenário da Câmara e, conforme matéria na Agência Câmara de Notícias, será votado em fevereiro deste ano. Lira defende que o Projeto seja votado “com o tempo necessário para que seja maturado, discutido, para notarmos a quem interessa regularizar jogos, a quem não interessa regularizar jogos; quais são os seus efeitos, quais são as suas causas; o que é bom e o que é ruim”.

Aqueles que defendem a aprovação do Projeto acreditam que a legalização dos jogos será um importante estímulo ao turismo e à economia do Brasil. Além da atração que atrairia diversos visitantes aos cassinos integrados a resorts, seriam também uma grande fonte para criação de novos empregos no país. Defendem, ainda, que os jogos de azar fazem parte da cultura brasileira, e que somente foram proibidos à época por questões morais e religiosas há muito superadas.

Já aqueles que são contra a aprovação do Projeto, o argumento é de que esses jogos “levam ao vício e destroem famílias”, como foi dito pelo Deputado Eli Borges (Solidariedade-TO). É também pontuado que os cassinos atraem a criminalidade, como o tráfico de drogas.

Os parlamentares à frente do Grupo fazem parte dos defensores da legalização dos jogos, e acreditam que as alterações propostas ao texto podem viabilizar a sua aprovação na Câmara.

Para o autor do pedido de criação da comissão especial, deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP): "De 193 países, o jogo é regularizado em 177. Mensalmente, 200 mil brasileiros saem para jogar em outros países, principalmente Uruguai, Argentina, Chile e Paraguai. Nós não precisamos continuar deixando as divisas irem embora daqui. Nós temos 2,5 bilhões de pessoas no planeta que jogam e precisamos fazer com que essas pessoas venham jogar no Brasil" (Fonte: Agência Câmara de Notícias).

Em 16/12/2021 foi aprovado requerimento n. 5358/2016 do Líderes que requer urgência para apreciação do Substitutivo ao PL 442, de 1991.

Agora resta à população aguardar a votação da PL, programada para fevereiro, para que sejam vistos os próximos passos dados pelos denominados jogos de fortuna no Brasil. Devendo ser lembrado que dos 108 países que formam a Organização Mundial de Turismo, somente dois proíbem o jogo: Cuba e Brasil (https://www.migalhas.com.br/depeso/177218/brasil-sem-cassinos)

E fica o questionamento: seria um bem à economia brasileira ou uma regressão moral, a volta dos jogos de fortuna no Brasil?

 

O ICMS E O PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE NOS SETORES DE ENERGIA ELÉTRICA E DE TELECOMUNICAÇÕES


 

Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

No dia 22 de novembro de 2021, o Supremo Tribunal Federal (“STF”) finalizou o julgamento do Recurso Extraordinário (“RE”) n° 714.139 (Tema 745 das Repercussões Gerais), que trata da abrangência do Artigo 155, §2º, Inciso III, da Constituição da República de 1988, que prevê a aplicação do Princípio da Seletividade ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (“ICMS”).

O princípio da seletividade é instituto que versa sobre a possibilidade de que se vale o legislador para atuar elevando ou diminuindo a carga tributária, por meio de alíquota, tendo em vista a essencialidade dos bens e serviços.

Por maioria de votos, os Ministros da Corte Suprema declararam ser inconstitucional a instituição de uma alíquota de ICMS majorada para energia elétrica e telecomunicações.

O caso concreto, levado à apreciação do STF, envolve o Estado de Santa Catarina, que aplica uma alíquota de ICMS de 25% (vinte e cinco por cento) para ambos os setores, diante de uma alíquota geral de 17% (dezessete por cento).

A tese vitoriosa foi a do Relator, Ministro Marco Aurélio, no sentido de que as empresas que não se creditam de ICMS poderão reaver o que foi pago a mais (diferença entre a alíquota geral de ICMS e a alíquota majorada). O magistrado propôs a seguinte tese: “adotada, pelo legislador estadual, a técnica da seletividade em relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, discrepam do figurino constitucional alíquotas sobre as operações de energia elétrica e serviços de telecomunicação em patamar superior ao das operações em geral, considerada a essencialidade dos bens e serviços”.

O Ministro Marco Aurélio não estabeleceu a partir de que momento a decisão terá efeitos (modulação dos efeitos da decisão). Referido tema será discutido posteriormente pelo Supremo Tribunal Federal. Por ora, o julgamento foi suspenso para coleta dos votos dos demais Ministros. A perspectiva é de que o Recurso Extraordinário seja novamente pautado em Plenário Virtual para que haja uma decisão sobre a modulação dos efeitos. Até o momento, não houve o agendamento de pauta para o novo julgamento.

Relevante ressaltar que a decisão não extingue a lei do Estado de Santa Catarina. Ela tem efeito apenas entre as partes envolvidas no processo. De outra forma, por ter repercussão geral, a decisão vincula todo o Poder Judiciário. Desse modo, além de eventuais ações individuais, o entendimento também prevalecerá e deverá ser aplicado no julgamento de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (“ADIs”).

Em outras palavras, apesar de as leis estaduais permanecerem vigentes, eventuais ações judiciais individuais sobre o tema deverão ser julgadas em sentido favorável aos contribuintes.

Diante do exposto, espera-se que a decisão proferida pela Corte Suprema, haja vista sua força vinculante em relação ao Judiciário, venha ratificar a aplicação da seletividade em função da essencialidade nos serviços de energia elétrica e telecomunicação, frente à obrigatoriedade da graduação da carga tributária.

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL – PEC 18/2011 - TRABALHO DO MENOR


 

 

    Orlando José de Almeida

                                                     Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

                                                                                     

 

A Proposta de Emenda à Constituição nº 18/2011, de autoria do Deputado Dilceu Sperafico (PP-PR), encontra-se em tramitação.

 

O seu objetivo é o de modificar o artigo 7º, XXXIII, da Constituição Federal, para permitir o trabalho do menor em jornada “sob o regime de tempo parcial, a partir de quatorze anos”.

 

Assim, se aprovada a PEC, na redação do referido dispositivo constitucional, passará a estabelecer que constitui “direitos dos trabalhadores urbanos e rurais”:

 

XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz ou sob o regime de tempo parcial, a partir de quatorze anos.

 

Segundo o autor no contrato de aprendizagem o aprendiz a partir dos 14 anos de idade pode se inserir no mercado de trabalho e cumprir jornada de até seis horas diárias, com possibilidade de estender esse limite até oito horas diárias, desde que já tenha completado o ensino fundamental, nos termos do artigo 432 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

 

De outro lado, o trabalho em regime de tempo parcial é regulado pela CLT. O artigo 58-A dispõe:

 

Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a trinta horas semanais, sem a possibilidade de horas suplementares semanais, ou, ainda, aquele cuja duração não exceda a vinte e seis horas semanais, com a possibilidade de acréscimo de até seis horas suplementares semanais.  

 

O Deputado concluiu que a jornada de trabalho a tempo parcial pode ser inferior a da aprendizagem e que, a bem da verdade, a Proposta visa à ampliação dos direitos do menor, “na medida em que formaliza o trabalho daqueles que precisam trabalhar, garantindo-lhes todos os direitos trabalhistas e previdenciários”.

 

Na realidade, estes são os principais fundamentos defendidos por aqueles que vem manifestando adesão à Proposta.

 

Em outra direção, recentemente, a PEC vem encontrando sérias resistências por alguns seguimentos da sociedade.

 

As Centrais Sindicais apresentaram manifesto[1] realçando que a Proposta viola tratados internacionais que versam sobre o trabalho infantil, dos quais o Brasil é signatário, como é o caso da Convenção 138 e a Recomendação 146 da OIT — Organização Internacional do Trabalho.

 

Realçaram que “o trabalho infantil é uma grave violação dos direitos humanos que impede ou dificulta o desenvolvimento pleno, sadio e integral de crianças e jovens dos setores mais vulneráveis da classe trabalhadora, comprometendo o acesso à educação, à saúde, ao lazer e a formação profissional segura e qualificada. De acordo com o IBGE, em 2020, quase dois milhões de criança e adolescentes foram submetidos ao trabalho infantil, sendo a imensa maioria de crianças negras, vítimas do racismo estrutural. A PEC 18 legaliza esta situação de violação do direito à infância e perpetua a desigualdade social, agravando ainda mais a situação das crianças e dos jovens, já cruelmente atingidas pelo desemprego, pela carestia e pela insegurança alimentar presente em milhões de lares no Brasil”.

 

Seguindo a mesma linha o Ministério Público do Trabalho, em pronunciamento contrário à iniciativa legislativa[2], asseverou que, “por fim, esperamos que, no Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil, declarado pela Assembleia Geral da ONU em 2019, o parlamento brasileiro não promova alterações que impliquem evidente retrocesso social e frustração aos direitos fundamentais de adolescente e jovens (art.227 da CF), num cenário de agravamento da vulnerabilidade socioeconômica em nosso País”.

 

Efetivamente, as teses defendidas pelos dois lados são de grande importância e relevância.

 

Com efeito, a reflexão que trazemos é no sentido de que, existe considerável contingente de jovens trabalhando de forma irregular a partir de 14 anos, em jornada até mesmo superior à fixada no artigo 58-A, da CLT, sem qualquer amparo, notadamente no que tange aos direitos trabalhistas e previdenciários.

 

Ademais, não deve passar despercebido é que os jovens, quando alcançam a idade de 14 anos, atualmente, já possuem desenvolvimento físico e mental de modo a permitir o ingresso no mercado de trabalho. A limitação da jornada, tal como proposto, propícia um tempo razoável para os estudos e contribui para a formação profissional.