Stanley Martins Frasão
Advogado
Sócio de Homero Costa Advogados
Nathália Caixeta Pereira de Castro
Colaboradora
de Homero Costa Advogados
O Decreto-lei 9.215/46, em
30 de Abril de 1946, do governo do presidente Eurico Gaspar Dutra, contendo
cinco considerandos que (i) a repressão aos jogos de azar é um imperativo da
consciência universal; (ii) a legislação penal de todos os povos cultos contém
preceitos tendentes a esse fim; (iii) a tradição moral jurídica e religiosa do
povo brasileiro e contrária à prática e à exploração e jogos de azar; (iv) das
exceções abertas à lei geral, decorreram abusos nocivos à moral e aos bons
costumes; (v) as licenças e concessões para a prática e exploração de jogos de
azar na Capital Federal e nas estâncias hidroterápicas, balneárias ou
climáticas foram dadas a título precário, podendo ser cassadas a qualquer
momento, restaurou em todo o território nacional a vigência do artigo 50 e seus
parágrafos da Lei das Contravenções Penais (Decreto-lei nº 3.688, de 2 de Outubro de 1941) e declarou nulas e sem efeito todas as licenças, concessões ou
autorizações dadas pelas autoridades federais, estaduais ou municipais, com
fundamento nas leis ora, revogadas (Decretos-leis nº 241, de 4 de Fevereiro de 1938, n.º 5.089, de 15 de Dezembro de 1942 e nº 5.192, de 14 de Janeiro de 1943 ), ou que, de qualquer forma, contenham
autorização em contrário ao disposto no artigo 50 e seus Parágrafos da Lei das
Contravenções penais.
Aludido Decreto sofreu influência direta de questões morais e
religiosas praticadas principalmente pela Primeira-Dama da época, Carmela
Dutra, que considerava os jogos de azar ofensivos aos bons costumes.
Cassinos legalizados no Brasil, que movimentavam fortemente a
economia, atraindo diversos turistas e até mesmo celebridades foram fechados da
noite para o dia.
Não é a primeira vez que escrevemos sobre este assunto (https://www.migalhas.com.br/depeso/338040/cassinos-no-brasil--uma-proibicao-ultrapassada), mas diante dos últimos movimentos na
Câmara dos Deputados, vale uma nova versão, na esperança de que o aniversário
de 76 anos do Decreto-lei 9.215/46 se transforme em apenas uma data. A
maturidade nestes quase 76 anos foi alcançada e muito recursos financeiros
foram pedidos, tanto na arrecadação de impostos quanto na iniciativa privada.
Apesar de sua ilegalidade, os jogos de azar no Brasil
continuaram sendo praticados de forma indireta, seja por meios online ou casas
clandestinas.
A partir dessa realidade, em que a norma se mostrou meramente
teórica e que os próprios considerandos citados acima não se sustentam, a
prática de tais jogos eventualmente volta a ser discutida no cenário político
legislativo brasileiro.
Em novembro de 2021, o PL 442/91 tornou a ser revisado
pela Câmara dos Deputados, cuja minuta inicial foi apresentada pelo relator do
Grupo de Trabalho, Deputado Felipe Carreras (PSB-PE), para debater a
organização, a estruturação e as diretrizes da norma que regulamenta os jogos e
as apostas no país. Esse Grupo de Trabalho foi criado pelo presidente da
Câmara, Arthur Lira, e tem como objetivo o debate sobre o assunto.
O deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP) disse que há
articulação de evangélicos e católicos contra a proposta. “Nós, da Frente
Parlamentar Evangélica, da Frente Cristã e da Frente Católica, somos
terrivelmente contra este PL. E vamos obstruí-lo aqui até o momento em que nós
o derrubarmos”, declarou (Fonte: Agência Câmara de Notícias).
Nas palavras do deputado Newton Cardoso Jr (MDB-MG): “O jogo
do Brasil não é proibido, em qualquer esquina, em qualquer canto se faz uma
aposta. ” e que “O emprego gerado por
essa atividade vai pagar contribuição para a previdência pública” (Fonte:
Agência Câmara de Notícias).
Para a deputada Renata Abreu (PTN-SP): “Já é hora do
Congresso Nacional superar a hipocrisia, discutir a matéria e regulamentar o
jogo da forma mais adequada a cumprir suas finalidades diversionistas e lúdicas
e, em adendo, contribuir com recursos para financiar ações sociais” (Fonte:
Agência Câmara de Notícias).
As alterações sugeridas no texto trataram sobre diversas
vertentes, desde a associação dos jogos de azar a organizações criminosas, até
questões de saúde pública relacionadas ao vício causado por tais jogos.
Foi alterado também pelo relator o ponto que versava sobre a
competência para autorização dos jogos, que, segundo ele, só poderia ser dada
pela União, mas no texto anterior poderia ser decidida por outros entes
federativos. É pauta ainda indefinida a dosimetria da pena para aqueles que
praticarem condutas delituosas relacionadas aos jogos de azar e também a
tributação que incidirá sobre esse setor.
No dia 16 de dezembro de 2021, o Projeto foi novamente
discutido na sessão do Plenário da Câmara e, conforme matéria na Agência Câmara de
Notícias, será votado em fevereiro deste ano. Lira defende que o Projeto seja
votado “com o tempo necessário para que seja maturado, discutido, para notarmos
a quem interessa regularizar jogos, a quem não interessa regularizar jogos;
quais são os seus efeitos, quais são as suas causas; o que é bom e o que é
ruim”.
Aqueles que defendem a aprovação do Projeto acreditam que a
legalização dos jogos será um importante estímulo ao turismo e à economia do
Brasil. Além da atração que atrairia diversos visitantes aos cassinos
integrados a resorts, seriam também uma grande fonte para criação de novos empregos
no país. Defendem, ainda, que os jogos de azar fazem parte da cultura
brasileira, e que somente foram proibidos à época por questões morais e
religiosas há muito superadas.
Já aqueles que são contra a aprovação do Projeto, o argumento
é de que esses jogos “levam ao vício e destroem famílias”, como foi dito pelo
Deputado Eli Borges (Solidariedade-TO). É também pontuado que os cassinos
atraem a criminalidade, como o tráfico de drogas.
Os parlamentares à frente do Grupo fazem parte dos defensores
da legalização dos jogos, e acreditam que as alterações propostas ao texto
podem viabilizar a sua aprovação na Câmara.
Para o autor do pedido de criação da comissão especial,
deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP): "De 193 países, o jogo é
regularizado em 177. Mensalmente, 200 mil brasileiros saem para jogar em outros
países, principalmente Uruguai, Argentina, Chile e Paraguai. Nós não precisamos
continuar deixando as divisas irem embora daqui. Nós temos 2,5 bilhões de
pessoas no planeta que jogam e precisamos fazer com que essas pessoas venham
jogar no Brasil" (Fonte: Agência Câmara de Notícias).
Em 16/12/2021 foi aprovado requerimento n. 5358/2016 do
Líderes que requer urgência para apreciação do Substitutivo ao PL 442, de 1991.
Agora resta à população aguardar a votação da PL, programada
para fevereiro, para que sejam vistos os próximos passos dados pelos
denominados jogos de fortuna no Brasil. Devendo ser lembrado que dos 108 países
que formam a Organização Mundial de Turismo, somente dois proíbem o jogo: Cuba
e Brasil (https://www.migalhas.com.br/depeso/177218/brasil-sem-cassinos)
E fica o questionamento: seria um bem à economia brasileira
ou uma regressão moral, a volta dos jogos de fortuna no Brasil?