quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Contrato de Trespasse

Stanley Martins Frasão¹

Maria Eduarda Guimarães de Carvalho Pereira Vorcaro²

¹Advogado, sócio de Homero Costa Advogados, Mestre em Direito Empresarial.

²Estagiária de Homero Costa Advogados

*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 11, em 19/01/2009


O Código Civil, nos artigos 1.142 a 1.149, prescreve sobre o Contrato de Trespasse. Trata-se de contrato de compra e venda de estabelecimento empresarial, através do qual transfere-se todo o seu corpo, os conjuntos de bens e seus anexos organizativos, além da transferência de sua titularidade. Segundo Carvalho de Mendonça, “é a venda do estabelecimento como entidade unitária, compreende todos os elementos que o integram principal ou acessoriamente”.(MENDONÇA, Carvalho de J. X. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. Vol. V. 1ª Parte. 7ª edição, Rio de Janeiro: Editora Livraria Freitas Bastos S.A., 1963.)
O Trespasse ocorre quando o estabelecimento deixa de integrar o patrimônio de um empresário e passa a ser objeto de direito de propriedade de outrem.

O referido contrato é consensual na medida em que se perfaz pela anuência dos contratantes, onde o ônus e o proveito deverão estar em nível de equivalência.

O alienante deverá obrigar-se a fazer boa a coisa vendida, além de não se restabelecer no mesmo ramo em uma localidade que possa vir a prejudicar o adquirente.

O art. 1.147 do CC prevê: “Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente nos cinco anos subseqüentes à transferência.” 

O Diário do Judiciário de Minas Gerais, em 24 de junho de 2006, veiculou a seguinte ementa:

“Direito Comercial. Trespasse. Cláusula de não-restabelecimento. Obrigação de não fazer. Fechamento do estabelecimento.

- Mesmo antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002, já havia o entendimento de que, sendo omisso o contrato de traspasse, deve ser entendida implícita a cláusula de não-restabelecimento.

- Comprovado o restabelecimento do alienante, impõe-se o fechamento do novo estabelecimento e a indenização pelo prejuízo causado.

-Apelação Cível n˚ 1.0713.04.039318-1/001 – Comarca de Viçosa – Relator: Desembargador Maurício Barros. “

Da análise do inteiro teor do acórdão, percebe-se a inexistência de autorização para o alienante explorar o mesmo ramo de comércio no interregno de cinco anos contados da data da venda.

Na citada decisão, que transitou em julgado em 24/01/2006, ou seja, contra a mesma não cabe mais recurso, o alienante agiu de má-fé ao violar direito, aplicando-se o artigo 927 do Código Civil (“Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”),  cometeu ato ilícito, cabendo indenizar, porque presente o dano e o nexo causal, representado pelo fato de o réu ter iniciado atividade empresarial idêntica à que desenvolve o adquirente, que teve prejudicada a sua expectativa de lucro, além de impingir perda de clientela.

Sendo o contrato omisso, deve-se entender como implícita a cláusula de não-restabelecimento,  culminando-se, portanto, a concorrência desleal por parte do alienante.

Vale ressaltar que a cláusula de não concorrer, vem sendo reconhecida pelo CADE, limitando o tempo e o espaço na prática comercial. Ela é uma garantia que o adquirente possui para a proteção da integridade de seu estabelecimento.

O campo de atividades comerciais no Brasil possibilita uma livre concorrência, direito constitucional (art.170 CF/88), que é bem-vinda, porque haverá aprimoramento de métodos, qualidade e produtos na busca por clientela, impulsionando a competitividade. O “livre mercado” é protegido pelos princípios da livre iniciativa e da concorrência, sendo limitado pela ética e pela licitude da legislação brasileira que veda a concorrência de forma desleal, que rompe com os princípios da honestidade e da correção comercial.

A Lei da Propriedade Industrial (9.279/96), cujo papel é regular o instituto da concorrência, prevê como crime os procedimentos antiéticos e desonestos, sujeitando o infrator desleal às penalidades de natureza civil e penal.

O empresário que aliena seu negócio a outrem e posteriormente se instala com o mesmo objetivo de negócio, visando atingir o mesmo público alvo, estará agindo de má-fé.

“Em regra, quem vende estabelecimento comercial não está proibido de instalar ou adquirir outro. Mas, se trata de pequena indústria, há concorrência desleal se depois de alienar o estabelecimento, instale outro a pequena distância” (in RT 157/237).

A concorrência desleal pelo seu caráter ilícito, deve ser reprimida.

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