quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Da possibilidade de Celebração de Acordo Coletivo de Trabalho diretamente entre empregados e empregadores

Orlando José de Almeida

Advogado Pós-Graduado em Direito Processual pelo IEC - Instituto de Educação Continuada da PUC/MG, Diretor Jurídico da Fundamar - Fundação 18 de Março, Membro do Comitê Trabalhista e Previdenciário do CESA - Centro de Estudos das Sociedades de Advogados, Membro da Comissão de Estágio da OAB/MG

*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 12, em 16/02/2009

Introdução:

A crise financeira mundial tem provocado em determinados segmentos da economia, como é o caso do setor das montadoras de automóveis, problemas graves devido a drástica redução da produção, que em algumas empresas já supera a casa dos 50% (cinquenta por cento).
A diminuição da produção e do consequente faturamento não permite a manutenção dos postos de trabalho por longo espaço de tempo sem o risco de quebra, e, em razão disso, os empresários estão promovendo a adequação aos tempos atuais buscando a preservação das empresas.

Assim, várias medidas, que vão da concessão de férias coletivas até a realização de  dispensas, têm sido adotadas pelos os empregadores.

Constata-se, também, que existe uma preocupação por parte dos integrantes de todos os setores da sociedade com a preservação dos empregados que, sem dúvida alguma, é de grande interesse social.

Na busca para manter os postos de trabalho, muitos empregadores estão caminhando com os Sindicatos que representam as categorias profissionais e realizando Acordos Coletivos de Trabalho, como é o caso daqueles amplamente noticiados na mídia e que versam sobre a suspensão de contratos e redução de jornada com proporcional diminuição dos salários.

Nesta integração, os Sindicatos estão cumprindo o papel reservado pela Constituição Federal ou contido na Consolidação das Leis do Trabalho, que é o de representar os interesses das respectivas categorias que aos mesmos estão vinculadas.

Entretanto, o que se vê é que alguns Sindicatos, por motivações diversas, como exemplo, a situação de surgir precedentes dentre sua base de atuação ou de orientação das entidades superiores (Federações, Confederações e das Centrais) a que estão filiados, ou políticas, ou ideológicas, deixam de negociar com as empresas, muito embora seja este o desejo dos empregados que representam.

Após estes esclarecimentos, adiante será indicada a alternativa legal para buscar a solução do impasse.

Vigência e da Aplicação do art. 617 da CLT:

Na hipótese do sindicato não desejar iniciar as negociações, mas sendo este o interesse dos empregados e de determinada empresa, as partes estão autorizadas pelo art. 617¹ da CLT a iniciar os acertos para a celebração de um Acordo Coletivo de Trabalho.

Devem, na sequência, dar ciência da resolução, por escrito, ao Sindicato representativo da categoria, que poderá assumir as negociações dentro do prazo de oito dias, após a entrega do comunicado.

Em caso de recusa ou ausência de resposta, podem, ainda, buscar o acompanhamento da respectiva Federação ou Confederação.

Não havendo pronunciamento das referidas entidades “poderão os interessados prosseguir diretamente na negociação coletiva até final”.

Ressalte-se que o posicionamento tranquilo e atual do Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que o art. 617, da CLT, foi recepcionado pela Constituição Federal. Confira-se os seguintes e recentes julgados:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRELIMINAR DE NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. As supostas omissões foram efetivamente respondidas pela Corte Regional. De fato, foi consignado pela egrégia Corte o entendimento de que o art. 617 da CLT foi recepcionado pelo art. 11 da Carta Magna, que prevê a negociação dos empregados diretamente com o empregador. Também já havia sido pontuado, no acórdão prolatado em Recurso Ordinário, que a Recorrente não havia logrado demonstrar que os empregados substituídos, ao assinarem os acordos coletivos, fizeram-no sob coação. Nesse diapasão, constata-se que a decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada e livre de omissões. Ressalte-se que o mero inconformismo da Recorrente com o desfecho da controvérsia não implica sonegação da tutela jurisdicional. VALIDADE DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA - PARTICIPAÇÃO SINDICAL - VIOLAÇÃO DO ART. 8º, VI, DA Constituição Federal NÃO CONFIGURADA. O art. 8º, VI, da CF impõe a participação obrigatória dos sindicatos nas negociações coletivas. Por outro lado, o art. 617, § 1º, da CLT, que foi recepcionado pela Constituição Federal, estabelece que, não se desincumbindo a entidade sindical de seu encargo de assumir a direção dos entendimentos entre os interessados no acordo coletivo, poderão os interessados prosseguir diretamente na negociação coletiva. Nesse contexto, correto o entendimento do Regional no sentido de que válidos os acordos coletivos. Não configurada violação do art. 8º, VI, da Constituição Federal. Agravo de Instrumento não provido. (TST; AIRR 292/2004-007-05-40.4; Segunda Turma; Rel. Min. José Simpliciano Fontes de Faria Fernandes; DJU 24/08/2007; Pág. 1117) (Publicado no DVD Magister nº 18 - Repositório Autorizado do STJ nº 60/2006 e do TST nº 31/2007)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRELIMINAR DE NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. O Tribunal Regional negou seguimento ao Recurso de Revista do Reclamante por entender que o Recurso não preenche os pressupostos intrínsecos que viabilizariam seu seguimento. Não vislumbro, portanto, cerceamento de defesa e violação do artigo 5º, inciso LV, da CF. VALIDADE DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA. PARTICIPAÇÃO SINDICAL. Pela análise dos autos observa-se que, ante a recusa do Sindicato profissional em assumir a negociação coletiva, os empregados da Reclamada cumpriram as formalidades previstas no art. 617 da CLT. Por conseguinte, os acordos coletivos devem ser reputados válidos, uma vez que cumprem os requisitos legais. Agravo de Instrumento não provido. (TST; AIRR 288/2004-007-05-40.6; Segunda Turma; Rel. Min. José Simpliciano Fontes de Faria Fernandes; DJU 27/04/2007; Pág. 1106) (Publicado no DVD Magister nº 18 - Repositório Autorizado do STJ nº 60/2006 e do TST nº 31/2007)
 
ACORDO CELEBRADO DIRETAMENTE COM OS EMPREGADOS. RECUSA DO SINDICATO PROFISSIONAL À NEGOCIAÇÃO. Comprovada a recusa do sindicato profissional à negociação proposta pelas empregadoras, e observadas as prescrições do art. 617 da CLT, válido o acordo celebrado pelas empresas diretamente com seus empregados. Recurso Ordinário a que se nega provimento. (TST; ROAD 45784/2002-900-09-00; Seção de Dissídios Coletivos; Rel. Min. Rider Nogueira de Brito; Julg. 12/08/2004; DJU 10/09/2004) (Publicado no DVD Magister nº 16 - Repositório Autorizado do STJ nº 60/2006 e do TST nº 31/2007)
 
“Se o sindicato não teve interesse na negociação, os interessados não poderão ficar esperando indefinidamente. Assim, não há que falar em violação do art. 8º, VI, da Constituição Federal, uma vez que o art. 617, caput, e § 1º, da CLT permite a negociação diretamente entre a empresa e seus empregados.” (Ementa referente ao PROC. Nº TST-AIRR-309/2004-007-05-40.3 – Julgamento realizado 19 de novembro de 2008)

Ao interpretar o artigo 617, parágrafo 1°, consolidado, Sérgio Pinto Martins relata²:

"Apesar de a participação do sindicato dos empregados ser obrigatória nas negociações coletivas de trabalho (art.8°, VI, da CF), entendo que os dispositivos anteriormente elencados não foram revogados pe1a Constituição, pois se o sindicato não tem interesse na negociação, os interessados não poderão ficar esperando indefinidamente, daí por que podem promover diretamente as negociações. O interesse do sindicato não pode ficar divorciado do interesse da categoria em fazer negociação."

Entendemos que os acordos podem abranger e versar, de forma ampla e genérica, sobre todas as matérias que estão legitimados a negociar os Sindicatos, Federações e Confederações.

Afinal, se estes não desejarem, por quaisquer motivos, iniciar ou prosseguir nas negociações e de exercer a representação da categoria ou parte dela, tendo em vista a convocação para tanto, os interessados não podem ser prejudicados.

Esta, certamente, foi a razão pela qual o legislador fez incluir no ordenamento jurídico nacional o art. 617 da CLT.

Merece ser destacado que as partes devem ter o cuidado e a cautela de observar os comandos legais, a fim de que o Acordo Coletivo de Trabalho não padeça de eventual vício, especialmente quando for ajustada uma redução de jornada com proporcional redução de salário (art. 7º, VI, da CF).

Veja que a legislação permite que haja a alteração contratual, ainda que prejudicial, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados (art. 503 da CLT).

Da mesma forma, o art. 2º da Lei 4.913/65 possibilita que o empregador, em face da conjuntura econômica, reduza a jornada e o salário, por prazo certo e no máximo durante 3 meses (prorrogáveis, se a condição originária da ação se mantiver), observado o limite de 25% e o salário mínimo nacional.

Tais normas, a nosso ver, não foram revogadas pela Constituição Federal, mas com ela se harmoniza, desde que os ajustes sejam feitos mediante negociação coletiva.

E o que se busca proteger, essencialmente, são os postos de trabalho, o que tem amparo em princípio de grande relevância no direito que é o da continuidade da relação de emprego. Resguarda-se, outrossim, o interesse coletivo e social.

Destacamos, por fim, que as negociações devem ser encaminhadas com a maior transparência possível e a efetiva participação dos empregados, por intermédio de uma de uma Comissão por eles livremente constituída, evitando-se futura alegação de que houve coação por parte da Empresa para que fosse firmado o instrumento.

Conclusão:

Diante do exposto, concluímos que:

a) Em caso de recusa ou ausência de interesse dos Sindicatos, por força do art. 617, da CLT, podem os empregados e empregadores celebrar, diretamente, um Acordo Coletivo de Trabalho;

b) O posicionamento firme e tranquilo do Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que o art. 617, da CLT, foi recepcionado pela Constitucional Federal, encontrando-se, portanto, em vigor; e,

c) O Acordo Coletivo de Trabalho deverá ser realizado com a maior transparência possível, observando-se os comandos da legislação em vigor, como meio de evitar eventual alegação de sua nulidade.

____________________

¹ Art. 617. Os empregados de uma ou mais empresas que decidirem celebrar Acordo Coletivo de Trabalho com as respectivas empresas darão ciência de sua resolução, por escrito, ao Sindicato representativo da categoria profissional, que terá o prazo de 8 (oito) dias para assumir a direção dos entendimentos entre os interessados, devendo igual procedimento ser observado pelas empresas interessadas com relação ao Sindicato da respectiva categoria econômica.

§ 1º Expirado o prazo de 8 (oito) dias sem que o Sindicato tenha se desincumbido do encargo recebido, poderão os interessados dar conhecimento do fato à Federação a que estiver vinculado o Sindicato e, em falta dessa, à correspondente Confederação, para que, no mesmo prazo, assuma a direção dos entendimentos. Esgotado esse prazo, poderão os interessados prosseguir diretamente na negociação coletiva até final.

§ 2º Para o fim de deliberar sobre o Acordo, a entidade sindical convocará Assembléia Geral dos diretamente interessados, sindicalizados ou não, nos termos do art. 612. (Artigo com redação determinada no Decreto-Lei nº 229, de 28.2.1967, DOU 28.2.1967)

² MARTINS, Sérgio Pinto. Comentário à CLT

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