Juliana Mello
Vieira
Advogada, Mestre em
Ciências Juridico-Civilisticas pela Universidade de Coimbra
*publicado
originalmente no Boletim Jurídico N.º 20 em 23/12/2009
O PROCON Municipal ou
Programa de Proteção ao Consumidor em âmbito municipal, em alguns municípios
estruturado como Órgão oficial de proteção ao consumidor, insere-se no Sistema
Nacional de Defesa do Consumidor - SNDC, preconizado pela lei consumerista (lei
8.078/90 – CDC), e exerce um papel protagonista na efetivação dos princípios e
direitos consumeristas, seja operando como agente político na divulgação de
dados e informações de interesse do consumidor, seja como agente fiscalizador
atuando junto às empresas, com poder, inclusive, de aplicação de sanções
administrativas, ou ainda no atendimento direto ao cidadão, orientando ou
tratando reclamações individualizadas.
Percebemos que, a despeito
da grande efetividade do PROCON em suas demais atividades, a reclamação ainda
carece de uma maior estruturação. Fato é que o excesso de informalismo na
atuação do referido Órgão/Programa para atender às demandas individualizadas
pode ensejar certo grau de insegurança jurídica e quiçá impedir a efetivação de
suas resoluções. Senão vejamos:
O PROCON, no âmbito da
reclamação individualizada, exerce um papel meramente moderador, buscando
insuflar a transação entre reclamante e reclamado, ou seja, uma solução
conciliada para o conflito.
Uma vez celebrado o acordo
perante o PROCON, órgão oficial integrante do executivo municipal, tem o
consumidor uma justa expectativa de definitiva solução para seu conflito.
Contudo, o que se verifica
na prática judiciária é a incerteza de um acordo celebrado sem as devidas
cautelas que possam amparar o consumidor na hipótese de descumprimento por
parte da empresa reclamada das obrigações pactuadas.
Isto porque, em homenagem
à segurança jurídica e ao due process of law,
a normativa processual pátria é taxativa quanto aos documentos que
possuem caráter executivo, os assim chamados “títulos executivos
extrajudiciais”, que, por constituírem prova plena dos fatos que encerram,
tornam descabida qualquer discussão sobre os mesmos, permitindo que os direitos
neles constantes possam ser de imediato exigidos do devedor.
Assim, nos termos
preconizados pelo artigo 585 do Código de Processo Civil, são títulos
executivos extrajudiciais: escritura pública ou outro documento público
assinado pelo devedor, documentos particulares assinados pelo devedor e duas
testemunhas, instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela
Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores (inciso II) ou todos os
títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva (inciso
VIII).
Considerando que não há
lei que preveja a força executiva do termo de acordo celebrado perante o
PROCON, e, por outro lado, confrontando os incisos do artigo 585 e a
configuração do termo de acordo celebrado, vislumbramos duas possibilidades de
adequação: caso pudéssemos entender o termo como documento público ou caso o
termo de acordo tenha apostas as assinaturas de duas testemunhas, na qualidade
de documento particular.
Observando o tratamento
dado pela lei civil e processual civil aos documentos públicos, percebemos que
para tal o documento deve emanar de um órgão oficial, e registrar fatos
realizados perante funcionário público ou a quem se atribua fé pública ( ex vi artigos
364 e 367 do CPC).
Os coordenadores das
unidades PROCON são, por norma, funcionários públicos municipais e, em regra,
apõem sua assinatura em todos os termos firmados perante o mesmo. Contudo, na
esteira do informalismo que permeia a atuação do Órgão, não se pode aferir
com absoluta certeza o atendimento de
tais formalidades, o que finda por limitar os termos firmados à natureza
jurídica de documento particular.
Assim que, recentemente,
após algumas recusas do Poder Judiciário em conferir executividade aos termos
de acordo firmados perante o PROCON Municipal, algumas unidades do Programa
passaram a adotar por procedimento a cautela de apor a assinatura de duas
testemunhas em seus termos, possibilitando, assim, a executividade dos termos
pactuados.
Lado outro, encontra-se em
tramitação perante a Câmara dos Deputados projeto de lei nº 5327/2009, proposto
pelo deputado federal Paulo Roberto, atualmente aguardando parecer da Comissão
de Constituição e Justiça da Câmara, sendo objeto do mesmo conferir força
executiva ao termo de acordo celebrado perante os órgãos de defesa do
consumidor. Propõe-se a alteração da lei 8.078/90 para inclusão do artigo 82-A,
com o seguinte texto: “As decisões dos órgãos de defesa do consumidor, e os
acordos por eles intermediados, valerão como título executivo extrajudicial”.
Trata-se de excelente
iniciativa para o fortalecimento dos órgãos de controle e defesa dos
consumidores e, portanto, de efetivação dos interesses e direitos destes
últimos.
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