Bernardo José
Drumond Gonçalves¹
Yuri Neiva²
¹Advogado ,
professor de Direito Civil da Faculdade de Direito Unifenas e especialista em
Direito Processual
² Estagiário,
Bacharelando pela Universidade Federal de Minas Gerais
*publicado
originalmente no Boletim Jurídico N.º 18 em 30/09/2009
Em regra, quando não são
verbais, os contratos são celebrados por meio físico, através de um instrumento
documentado. Vem surgindo, contudo, os contratos eletrônicos, que requerem
atenção especial, considerando sua crescente utilização e aplicação prática.
Diferem quanto aos demais
contratos somente no que tange à forma (são realizados via internet), e são
definidos como “vínculo jurídico criado através de declaração de vontade
emanada por meio eletrônico, com a finalidade de estabelecer relações entre
pessoas”. 332 CPC).
Os contratos eletrônicos
são beneficiados por outros recursos que, apesar de não serem totalmente
abrangidos pela legislação específica, servem também como instrumento de prova
nas demandas judiciais.
Nesse sentido, por não
servirem como forma independente de prova, o ideal é que sejam opostas ao Juízo
juntamente com outras formas mais tradicionais.
São modalidades de prova
inerentes ao contrato eletrônico o documento eletrônico, a assinatura digital, URL
e certificação digital.
O melhor conceito de
documento eletrônico é aquele apresentado pelo projeto de Lei nº 2.644/96:
“Considera-se documento eletrônico, para efeito dessa lei, todo documento,
público ou particular, originado por processamento eletrônico de dados e
armazenamento em meio magnético, optomagnético, eletrônico ou similar”.
É, portanto, similar ao
documento regular, com a única diferença que não é registrado em papel, mas em
banco de dados eletrônico, tal como disco rígido, CD, ou Pendrive, de modo que
seu acesso seja feito via computador.
Para que tenha força
probatória, a doutrina exige que nesse documento haja três características:
- autenticidade: o documento deve permitir a identificação, com bom grau de segurança, de que a manifestação de vontade nela contida venha daquele que a enviou, bem como deve ter, em si, a garantia de sua procedência;- integridade: o documento eletrônico deve ser seguro o suficiente para que não sofra alteração no meio eletrônico por nenhum elemento externo, ou que, ao sofrer tal alteração, seja capaz de identificar o responsável;- perenidade: para servir como elemento de prova, o documento eletrônico deve ter predeterminação de validade temporal.
O correio eletrônico (e-mail),
normalmente, já é aceito como documento capaz de contribuir como busca da
veracidade dos fatos em juízo, e, não obstante, está em vias de ser positivado
como meio de prova no Código de Processo Civil, através do Projeto de Lei nº
170/2008, de iniciativa da Deputada Federal Sandra Rosado.
Tal projeto pretende
incluir ao CPC o art. 375-A, com a seguinte redação:
O e-mail transmitido pela
rede mundial de computadores - internet goza de presunção de veracidade quanto
ao emitente e às suas declarações unilaterais de vontade, desde que certificado
digitalmente nos moldes da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP
–Brasil.”
A jurisprudência do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais vem demonstrando aceitação aos documentos
digitais:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - SEGURO - DPVAT - VALOR DEVIDO - DIFERENÇA - CNSP - SALÁRIO MÍNIMO DA ÉPOCA DO PAGAMENTO A MENOR. Resultando que quantum indenizatório referente ao DPVAT é estipulado na Lei, resta óbvio que o mesmo não pode ser reduzido por resoluções do Conselho Nacional de Seguros Privados, devendo ser pago em sua integralidade. O documento eletrônico de f. 50, oriundo do sistema MEGADATA, encerra presunção relativa sobre a veracidade do pagamento da indenização do seguro DPVAT ao pai da vítima, sendo, portanto, devida tão-somente a complementação da importância devida. Presentes os requisitos autorizadores do pleito de cobrança de diferença de seguro por morte, de rigor se revela a parcial procedência da ação. TJMG, Proc. nº 1.0105.06.174198-6/001, Des. Rel. Nilo Lacerda, publicado em 20/072009) (Grifou-se)
Sobre a assinatura
digital, diante da possibilidade de serem utilizados em uma contratação na internet
dados falsos, de modo a dificultar a identificação das partes contratantes,
essa modalidade age no sentido de viabilizar, àqueles interessados, essa
identificação.
Na maioria dos casos, a
assinatura digital substitui com razoável grau de certeza a assinatura de
próprio punho.
São três as principais
modalidades de assinatura digital:
- password/PIN/Código: por meio de um cadastro no site contratante ou por meio da utilização da chave identificadora em um contrato, a pessoa que a fornece para o respectivo acesso se identifica com aquela que efetuou o registro;- assinatura digitalizada – digitalização da assinatura de próprio punho do signatário, de modo que ela seja inserida no documento virtual;- assinatura virtual: serve da utilização de métodos criptográficos para que os dados enviados ao contratante destinatário cheguem com integridade, sem possibilidade de alteração durante o caminho eletrônico percorrido, sendo garantida sempre que o conteúdo enviado venha daquele que o enviou, sem nenhuma alteração.
Essa assinatura digital
funciona através de um método simples, denominado criptografia, que consiste em
literalmente assegurar àquele interessado a integridade (procedência) e
imutabilidade da declaração proferida.
Ao ser emitida a
declaração, o software responsável por encaminhá-la eletronicamente emite duas
chaves diferenciadas (criptográfica assimétrica) – uma pública e outra privada,
que servem como meio de acesso ao conteúdo.
Em seguida, utiliza-se a
chave privada para “embaralhar” o respectivo conteúdo da mensagem, para que ela
se torne indecifrável e é enviada juntamente com a chave pública ao destinatário.
Somente o detentor da
chave privada (remetente da declaração) e o da chave pública (destinatário)
podem ter acesso ao conteúdo da mensagem.
O uso de criptografia
simétrica, por outro lado, funciona da mesma maneira, porém emitindo duas
chaves privadas, ao invés de duas modalidades de chaves (pública e privada).
Nesse sentido, todo aquele
que a interceptar não poderá decifrar o conteúdo, pois não estará em posse da
chave que dá acesso ao conteúdo da mesma. Portanto, a segurança conferida pelo
método da criptografia faz com que ao seu uso se atribua essa “assinatura
digital”, que não é feita de letras, mas de códigos numéricos que bloqueiam o
conteúdo manifestado.
O entendimento do de
Justiça de Minas Gerais é no sentido de aceitar a assinatura eletrônica sem
maiores restrições:
[...] Registre-se, primeiramente, que o documento que instruiu a inicial não é uma mera cópia reprográfica, mas sim a própria notificação extrajudicial enviada ao devedor em 22.11.2007, acompanhada da certidão firmada pelo Oficial do Cartório de Títulos e Documentos atestando a entrega da carta de cobrança em 23.11.2007, conforme assinatura de Salvador Silva no aviso de recebimento (fls. 41/42-TJ). A autenticidade da notificação e certidão é aferida pela assinatura eletrônica do Oficial do Cartório, que lhes confere "o mesmo valor dos respectivos originais, para todos os fins de direito" (fls. 43-TJ). Assim, até argüição de falsidade pela parte interessada, não há motivo fundado para questionar a validade da notificação extrajudicial para fins de comprovação da mora do devedor, sendo, aliás, o que dispõe o artigo 161, da Lei n.º 6.015/73, segundo o qual as "certidões do registro integral de títulos terão o mesmo valor probante dos originais, ressalvado o incidente de falsidade destes, oportunamente levantado em juízo" (grifou-se). No que tange a assinatura digital, tem ela expressa previsão na Medida Provisória 2.200-2, de 24.8.2001, que, em seu artigo 1º, institui "a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras [...]. (TJMG, AI. n° 1.0024.08.079318-5/001, Des. Rel. Sebastião Pereira de Souza, publicado em 19/06/2009) (Grifou-se)
Contudo, tal aceitação
ampla se restringe aos órgãos públicos e similares, que é o objeto da Medida
Provisória nº 2.200/01. Não há lei específica que exija a aceitação da
assinatura digital entre privados, mas a tendência é de mudança desse cenário.
MARCELO NETTO DE MOURA
LOPES, bem adverte:
A completa implementação e regulamentação da tecnologia de assinatura digital no Brasil irá permitir a plena incidência do art. 219 do Código Civil de 2002 e do art. 368 do Código de Processo Civil, dentre outros (ex: arts. 389, II e 585, II do CPC), aos documentos eletrônicos, tornando a assinatura digital válida de um documento eletrônico equivalente à assinatura manuscrita em papel, com presunção iuris tantum de veracidade: "As declarações constantes de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários." (Art. 219, CC). As declarações constantes do documento particular, escrito e assinado, ou somente assinado, presumem-se verdadeiras em relação ao signatário. Parágrafo único. Quando, todavia, contiver declaração de ciência, relativa a determinado fato, o documento particular prova a declaração, mas não o fato declarado, competindo ao interessado em sua veracidade o ônus de provar o fato." (Art. 368, CPC).
Também conhecida como
endereço eletrônico, a URL é meio indicativo de prova do processo ajuizado.
Serve principalmente para identificar as partes contratantes e, sobretudo, a
proposta realizada por um deles.
É um recurso muito
utilizado nos processos que tratam sobre direito do consumidor, pelo fato de
que vários estabelecimentos possuem endereço fixo na internet, através do qual
mantêm propostas de negócio de maneira permanente. A título de exemplo,
companhias aéreas, lojas de eletrodomésticos, sites de leilão, etc.
Quanto à certidão digital,
como meio de prova apto a individualizar as partes e garantir a regular
procedência das declarações de vontade, cumpre fazer algumas ponderações específicas.
Quando se deseja, em uma
contratação, atribuir plena certeza à autoria de uma assinatura digital,
demanda-se uma entidade, denominada de Autoridade Certificadora – AC, que
identifique presencialmente as partes, coletando seus dados pessoais como nome,
identidade, CPF e endereço (no caso de pessoa física), ou seus dados
comerciais, como denominação, CNPJ e sede (no caso de pessoa jurídica),
distribuindo a cada uma delas o certificado eletrônico.
Nesse contexto, o
certificado eletrônico foi desenvolvido. Ele contém o registro dos dados
pessoais, da chave pública e da autoridade certificadora do usuário, servindo
como uma espécie de documento de identidade de ambas as partes.
Os certificados
eletrônicos geralmente são enviados juntamente com o documento eletrônico
digitalmente assinado para verificação pelo destinatário, funcionando como se
fosse a cópia da identidade do remetente.
Independentemente do
certificado eletrônico (que permite a rápida conferência da identidade), a
verificação da assinatura digital também pode ser feita diretamente junto à
Autoridade Certificadora, como se esta fosse um "cartório
eletrônico", reconhecendo "firmas digitais" em documentos
eletrônicos assinados por seus usuários, bem como autenticando as cópias
físicas de tais documentos.
Por todo o exposto,
verifica-se que há muitos elementos em que a informática pode contribuir para a
comprovação do alegado em um processo.
Apesar da falta de
segurança que é inerente à internet, devido a presença de vários softwares (programas)
e sujeitos dispostos a interceptar, adulterar e até mesmo a cometer crimes,
tanto a assinatura digital, quanto o documento eletrônico e a certificação
digital têm muito o que oferecer para a solução da insegurança e o
prosseguimento desse método de contratação.
Necessário se faz, nesse
sentido, maior tratamento legislativo sobre o assunto, expressamente
consubstanciado-o de força probante.
Contudo, é forçoso
concluir que cada um desses elementos, se reunidos, e adotados os critérios
necessários, formam um meio de prova eletrônica muito mais confiável e seguro.
______________
GREGORE, Valeria Elias de
Melo -Compra e Venda Eletrônica e suas Implicações –Ed. Método, 2006
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