Silvia Ferreira
Persechini
Advogada,
especialista em Direito de Empresas pela PUC/MG e mestranda em Direito de
Empresa pela Faculdade de Direito Milton Campos
*publicado
originalmente no Boletim Jurídico N.º 25 em 20/07/2010
As diferenças existentes
entre o aval e a fiança são bastante consideráveis.
A fiança trata-se de um
instituto regulado pelo direito comum – Código Civil, arts. 818 a 839 – e pode
ter natureza civil ou comercial – um título de crédito pode ter a fiança como
garantia. Ou seja, a fiança pode garantir qualquer obrigação, sendo que pode
ser prestada no próprio contrato que será garantido ou em um documento
separado.
Já o aval é instituto
próprio do direito cambiário, sendo que sempre terá natureza comercial e
somente pode ser dado no próprio título de crédito ou, em seu prolongamento. O
fato de o Código Civil de 2002 também dispor sobre esse instituto não lhe
retira a característica de garantia, eminentemente, cambiária.
Nos termos do art. 818 do
CC/021, a fiança tem forma de contrato. Lado outro, o aval não tem natureza jurídica
de contrato, trata-se de uma declaração cambiária unilateral.
Ainda, consoante o art.
821 do CC/02, “As dívidas futuras podem ser objeto de fiança; mas o fiador,
neste caso, não será demandado senão depois que se fizer certa e líquida a
obrigação do principal devedor”. Ou seja, a fiança pode garantir obrigações
ilíquidas, enquanto o aval apenas garante obrigações líquidas, haja vista que a
liquidez é característica imprescindível da obrigação cambiária.
A fiança é uma obrigação
acessória, porque nula a obrigação principal do devedor, nula também será a
fiança. Do contrário, como já mencionado quando da conceituação do aval, esta
garantia é autônoma e independente, sendo que, ainda que a assinatura do
avalizado seja falsa, a obrigação do avalista subsistirá. Em razão dessa
autonomia, ao contrário da fiança2, o avalista não pode opor as suas exceções
pessoais ao credor, trata-se do princípio da inoponibilidade das exceções
pessoais decorrente da autonomia das obrigações cambiárias, dentre elas, o
aval.
Portanto, diferentemente
da fiança – garantia subjetiva – a garantia do aval é objetiva, salvo se a
nulidade da assinatura do avalizado decorrer de vício de forma, hipótese esta
em que a garantia cambiária não poderá manter-se3.
Ainda, a fiança, consoante
os artigos 827, 828 e 839, do CC/02, comporta benefício de ordem, ou seja, uma
vez demandado o fiador, este pode requerer que o credor execute primeiramente o
afiançado. Tal possibilidade não existe para o instituto do aval, porque as
obrigações cambiárias são solidárias, podendo o credor do título de crédito
propor ação cambial contra qualquer um dos obrigados, independentemente da
ordem pela qual se obrigaram no título (art. 47, da LUG4).
Rosa Jr. (2007), ao
discriminar as diferenças entre aval e fiança, acrescenta que:
O fiador que paga
sub-roga-se em todos os direitos do credor, mas só poderá demandar a cada um
dos outros fiadores pela respectiva quota (CCB, art. 831), adquirindo direito derivado,
enquanto o avalista que paga adquire direito originário, autônomo, novo,
decorrente do título em relação à pessoa avalizada e aos devedores que
garantem, dos quais poderá haver o total pago (LUG, art. 32, al. 3°, LC, art.
31, § único) 5
Sobre isso, deve-se
apontar que há duas solidariedades, a solidariedade comum – registrada pelo
Código Civil de 2002 – e a solidariedade cambiária – regulada pelo art. 47, da
LUG. Assim, como explicado pelo referido autor, em razão da solidariedade
cambiária, o avalista que paga o débito escrito no título de crédito poderá
cobrar dos devedores anteriores e do avalizado, o valor total pago.
Todavia, caso haja vários
avalistas de um mesmo avalizado, ou seja, co-avalistas, na hipótese de um
destes pagar o valor total do título, aquele que pagou poderá cobrar dos demais
co-avalistas apenas a quota parte respectiva de cada. Nesse caso, trata-se da
solidariedade comum existente entre os avalistas de mesmo grau.
Por fim, a assinatura dada
no anverso do título de crédito, que não seja do sacador ou do aceitante da
letra nem do emitente da nota promissória e do cheque, presume-se que ela seja
o aval dado a favor do emitente da nota promissória ou do cheque e a favor do
sacador da letra de câmbio. Lado outro, a fiança não se presume.
Diante de todas as
diferenças assinaladas, percebe-se que, apesar de fiança e aval serem garantias
fidejussórias (pessoais) esses dois institutos apresentam características
específicas, não podendo ser confundidos.
__________________________
1 Art. 818. Pelo contrato
de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo
devedor, caso este não a cumpra
2 Art. 837. O fiador pode
opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais, e as extintivas da obrigação
que competem ao devedor principal, se não provierem simplesmente de
incapacidade pessoal, salvo o caso do mútuo feito a pessoa menor
3 Art. 32. O dador de aval
é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada.
4 Art. 47. Os sacadores,
aceitantes, endossantes ou avalistas de uma letra são todos solidariamente
responsáveis para com o portador.
O portador tem o direito
de acionar todas estas pessoas individualmente, sem estar adstrito a observar a
ordem por que elas se obrigaram.
O mesmo direito possui
qualquer dos signatários de uma letra quando a tenha pago.
A ação intentada contra um
dos coobrigados não impede acionar os outros, mesmo os posteriores àquele que
foi acionado em primeiro lugar.
5 ROSA JÚNIOR, Luiz
Emygdio Franco da. Títulos de Crédito. 5 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007 p.
286.
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