Stefano Naves
Boglione
Bacharel em direito
pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e advogado associado de
Homero Costa Advogados
*publicado
originalmente no Boletim Jurídico N.º 22 em 19/03/2010
A Ação Rescisória possui
como um dos requisitos indispensáveis à sua propositura o prévio recolhimento
da quantia de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, a título de multa. É
o que prescreve o inciso II, do art. 488, do Código de Processo Civil:
Art. 488. A petição inicial será elaborada com observância dos requisitos essenciais do art. 282, devendo o autor:I – cumular ao pedido de rescisão, se for o caso, o de novo julgamento;II – depositar a importância de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, a título de multa, caso a ação seja, por unanimidade de votos, declarada inadmissível, ou improcedente.
O referido pressuposto –
há quem discorde - faz as vezes de verdadeiro inibidor do abuso ao direito de
ação. Nas palavras de Cássio Scarpinella Bueno¹, “A ratio do dispositivo é
evitar a proliferação de pretensões rescisórias infundadas”.
No mesmo sentido, ensina
Humberto Theodoro Júnior² que, “Tendo ampliado os casos de admissibilidade e
facilitado a sua utilização pelas partes, entendeu o código de coibir abusos na
propositura da ação rescisória através de duas medidas práticas: a) instituição
de uma multa; e b) redução do prazo decadencial do direito de postular a
rescisória, que ficou limitado a dois anos”.
É pacífico, tanto na
doutrina, quanto na jurisprudência – até por ser verbo legal – que a quantia
consignada previamente pelo autor da actio rescindens reverterá em favor do
réu, caso haja unanimidade na inadmissão
ou na improcedência do pedido rescisório.
Lado outro, na hipótese de
procedência ou de julgamento não unânime, a quantia será levantada pelo autor.
Entretanto, a dúvida
permanece no caso de ser a pretensão autoral, uma vez contestada, rechaçada monocraticamente pelo Relator da
causa, sem a questão nem sequer ter sido submetida a julgamento colegiado.
Os Regimentos Internos da
maioria dos nossos Tribunais (e.g., art. 34, inc. XVIII, do RISTJ) permitem, ao
Magistrado que preside o processo, indeferir, de plano, ou após a contestação,
a petição inicial do autor, diante da flagrante impertinência de suas
alegações, ou, ainda, caso não tenha satisfeito algum pressuposto indispensável
à propositura da ação.
Em outras palavras, nesses
casos, tamanha é a certeza de que a pretensão rescisória é absolutamente
infundada, que, por prudência e economia processual, o Relator da causa poderá
encerrar prematuramente o processo, julgando sua extinção, sem resolução do
mérito.
Nessa hipótese, em que se
prescindiu, fundamentadamente, de um julgamento colegiado, a qual das partes
nasceria o direito de levantar para si o depósito da multa prévia?
Há quem defenda, com
significativo convencimento, que, a despeito do resultado negativo da demanda,
por não ter havido a perquirida unanimidade, ao autor incumbiria o levantamento
do valor depositado³.
No entanto, esse nos
parece o entendimento equivocado, em desacordo com a mens legis processual.
Inobstante não haver
unanimidade na hipótese de o Relator indeferir, monocraticamente, a pretensão
rescisória autoral, é patente que, nesse caso, a argumentação exposta na
petição inicial padece de inegável impropriedade.
Mormente, ainda, se o réu
tiver apresentado contestação nos autos, demonstrando a fragilidade da
argumentação exordial.
Isto é, a nosso ver, o
encerramento prematuro da Ação Rescisória, por inadmissão da petição inicial, é
algo maior que uma provável improcedência unânime da pretensão autoral, caso o
processo fosse levado a julgamento colegiado.
Nesse sentido, há inúmeros
precedentes de decisões monocráticas, proferidas por Ministros do Colendo
Superior Tribunal de Justiça, em que, após o indeferimento da petição inicial
em Ação Rescisória, determinou-se o levantamento da multa prévia pelo réu4.
Seria um contrassenso
permitir que o autor da actio rescindens fosse agraciado pelo resgate da caução
prestada, sempre que ajuizar ações rescisórias absolutamente infundadas, cujas
petições iniciais fossem, de plano, indeferidas.
Afinal, como dito alhures,
a teleologia da lei processual é justamente a de prevenir que isso ocorra, ao
impor ao autor a obrigação de depositar a multa prévia do art. 488, inc. II, do
CPC.
Conclui-se, portanto, que,
conjugando-se o objetivo do legislador de refrear o ajuizamento de pretensões
rescisórias levianas, juntamente com a ausência de dispositivo processual
expresso a respeito do tema tratado neste artigo, o destino do depósito prévio
do art. 488, inc. II, do CPC, nos casos de indeferimento monocrático da petição
inicial, em Ação Rescisória, deverá ser, sem dúvidas, o seu levantamento pelo
réu.
__________
¹ BUENO, Cássio
Scarpinella. Curso sistematizado de Direito Processual Civil. Vol. 5. Editora
Saraiva : 2008. p. 330.
² THEODORO JÚNIOR,
Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do direito
processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p.
710.
³ Precedentes: Resp
754.254/RS, Rel. Min. Castro Meira, SEGUNDA TURMA, DJe 1.6.2009; AgRg na AR
839/SP, PRIMEIRA SEÇÃO, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 1.8.2000; AR 1.579/PB,
Rel. Min. Laurita Vaz, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 13.2.2008.
4 Precedentes: AR nº
3448/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, DJ 28.5.2008; AR nº 3168/AL, Rel. Min. Vasco
Della Giustina, DJe 2.4.2009; AR nº 003346, Rel. Min. Castro Meira, DJe
19.11.2009.
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