Ana Carolina Silva Barbosa
Sócia do Escritório Homero Costa Advogados, especialista em Direito Tributário pelo CAD
*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 47 em 07/03/2013
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem decidido de maneira reiterada sobre a possibilidade do redirecionamento da Execução Fiscal ajuizada pelo Fisco para cobrança de débitos oriundos de obrigação tributária para os sócios da pessoa jurídica, sem processo autônomo.
De acordo com o artigo 135 do Código Tributário Nacional os sócios das pessoas jurídicas poderão ser responsabilizados pelos débitos das empresas desde que:
- não seja possível a cobrança da pessoa jurídica,
- o débito tenha surgido em decorrência de uma ação ou omissão do sócio; necessidade de relação pessoal do sócio com o débito (art. 128 do CTN).
A necessidade de comprovação de dolo, culpa, fraude ou excesso de poder do sócio é obrigação do Fisco para que fosse possível o redirecionamento da Execução Fiscal, a não ser que o nome do sócio já esteja incluído na Certidão de Dívida Ativa, quando se pressupõe que tal análise já foi objeto de procedimento anterior à constituição do crédito.
Entretanto, o ônus da prova ficaria invertido passando para o sócio, nos casos em que ficasse configurada a dissolução irregular da sociedade. Destaca-se:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL.
REDIRECIONAMENTO. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. SÚMULA 435/STJ. VIABILIDADE.
1. Aorientação da Primeira Seção/STJ firmou-se no sentido de que é viável o redirecionamento da execução fiscal na hipótese de dissolução irregular da sociedade, pois tal circunstância acarreta, em tese, a responsabilidade subsidiária dos sócios, que poderá eventualmente ser afastada em sede de embargos à execução. Cumpre registrar que, nos termos da Súmula 435/STJ, "presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente".
2. Impende ressaltar que "não prospera o argumento de que o Fisco não fez prova do excesso de mandato ou atos praticados com violação do contrato ou da lei a ensejar o redirecionamento, porque, nos casos em que houver indício de dissolução irregular, como certidões oficiais que comprovem que a empresa não mais funciona no endereço indicado, inverte-se o ônus da prova para que o sócio-gerente alvo do redirecionamento da execução comprove que não agiu com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder"(AgRg no AREsp 8.509/SC, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJe de 4.10.2011).
3. Recurso especial provido.
(REsp 1282234/BA, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/11/2011, DJe 28/11/2011)
Tal entendimento atrelado à força da Súmula nº 435 do STJ fortaleceu e facilitou o trabalho do Fisco, permitindo o redirecionamento das Execuções aos sócios das empresas, com a simples informação de que a empresa não mais funcionaria no local da citação, em presunção de que teria ocorrido a dissolução irregular.
Em meados de 2012 a 1º Turma do Superior Tribunal de Justiça, impulsionada pelo Ministro Napoleão Nunes Maia, teve entendimento diferente, afirmando que a súmula deveria ser aplicada com temperamentos.
O assunto foi analisado a partir de um recurso da Fazenda Nacional que contestava decisão do ministro Napoleão Maia Filho, que negou o seguimento de Recurso Especial, mantendo a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que determinou a retirada do nome dos sócios da Execução Fiscal de empresa baiana.
De acordo com o Ministro, o “redirecionamento depende de prévia apuração das razões pelas quais tal fato ocorreu, bem como da comprovação do elemento subjetivo na conduta ilícita do sócio", vale a leitura da ementa do acórdão:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO CONTRA O SÓCIO, SOB A ALEGAÇÃO DE INFRINGÊNCIA AO ART. 135 DO CTN OU DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA: RESP. 1.101.728/SP, REL. MIN. TEORI ALBINO ZAVASCKI (DJe 23.03.2009). AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO BASTANTE DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. CERTIFICAÇÃO DO OFICIAL DE JUSTIÇA DE QUE A EMPRESA NÃO FUNCIONA NO LOCAL INDICADO NOS REGISTROS FISCAIS, QUE, À MINGUA DE OUTROS ELEMENTOS INDICIÁRIOS, É INSUFICIENTE PARA O PRONTO REDIRECIONAMENTO. INADMISSIBILIDADE DA INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO.
SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL DA FAZENDA NACIONAL DESPROVIDO.
1. A Súmula 435 do STJ diz que presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente; todavia, a inteligência que se deve ter desse enunciado é de que a não localização da empresa no endereço fiscal é indício de sua dissolução irregular, mas, por si só e independente de qualquer outro elemento, é insuficiente para o pronto redirecionamento, que depende de prévia apuração das razões pelas quais tal fato ocorreu, bem como da comprovação do elemento subjetivo na conduta ilícita do sócio.
2.. Ao meu sentir, como a declaração de dissolução irregular importa no reconhecimento de uma infração, é inadmissível essa conclusão sem prévio procedimento. A prova do ato infracional compete a quem alega a sua ocorrência, no caso, ao credor (Fazenda Pública) que requer o redirecionamento. A inversão do ônus probandi a favor da parte menos favorecida só deve ser feita nos casos em que a lei a admite expressamente e, ainda assim, excepcionalmente.
3. Registre-se, ainda, que existem julgados da Primeira Seção afirmando que a mera devolução do Aviso de Recebimento (AR-Postal) sem cumprimento não basta à caracterização de dissolução irregular.
Esse entendimento pode ser estendido para outros tipos de certificação, inclusive aquela feita pelo Meirinho. Precedentes.
4. Agravo regimental FAZENDA NACIONAL desprovido.
(AgRg no REsp 1268993/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/05/2012, DJe 11/05/2012)
A flexibilização da aplicação da Súmula nº 435 parecia uma realidade, mas verifica-se que o Ministro Napoleão Nunes Maia ficou isolado em seu entendimento, como se pode verificar no julgado abaixo:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO.
REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL CONTRA O SÓCIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA: RESP. 1.101.728/SP, REL. MIN. TEORI ALBINO ZAVASCKI (DJe 23.03.2009). AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO BASTANTE DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. CERTIFICAÇÃO DO OFICIAL DE JUSTIÇA DE QUE A EMPRESA NÃO FUNCIONA NO LOCAL INDICADO NOS REGISTROS FISCAIS QUE, À MINGUA DE OUTROS ELEMENTOS INDICIÁRIOS, É INSUFICIENTE PARA O PRONTO REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL CONTRA OS GESTORES. INADMISSIBILIDADE DA INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO. RESSALVO DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. APLICAÇÃO DA SÚMULA 435/STJ. AGRAVO REGIMENTAL DA FAZENDA NACIONAL PROVIDO, COM A RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR.
1. A Súmula 435 do STJ diz que presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente; todavia, a inteligência que se deve ter desse enunciado é de que a não localização da empresa no endereço fiscal é indício de sua dissolução irregular, mas, por si só e independente de qualquer outro elemento, é insuficiente para o pronto redirecionamento da execução fiscal, que depende de prévia apuração das razões pelas quais tal fato ocorreu, bem como da comprovação do elemento subjetivo na conduta ilícita do sócio, a teor dos arts. 134 e 135 do CTN.
2. Como a declaração de dissolução irregular importa no reconhecimento de uma infração, é inadmissível essa conclusão sem prévio procedimento de sua apuração. A prova do ato infracional compete a quem alega a sua ocorrência, no caso, ao credor (Fazenda Pública) que requer o redirecionamento; deve o fisco instaurar regular processo administrativo para respaldar a conclusão de dissolução anômala da pessoa jurídica. A inversão do ônus probandi só deve ser feita nos casos em que a lei a admite expressamente e, ainda assim, em hipóteses excepcionais.
3. Todavia, a maioria dos integrantes da 1a. Turma entendeu pela aplicação da Súmula 435/STJ em casos tais, razão pela qual, considerando a missão constitucional desta Corte de uniformização da jurisprudência pátria, ressalvo o meu ponto do vista, para acompanhar o entendimento sufragado por esta Turma.
4. Agravo Regimental da Fazenda Nacional provido, com a ressalva do ponto de vista do Relator.
(AgRg no AREsp 199.509/RN, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/09/2012, DJe 12/12/2012)
Diante do exposto, o entendimento da Corte é o de que é possível o redirecionamento da Execução Fiscal para o sócio, com poder de gestão, com simples indícios de que ocorreu a dissolução irregular da sociedade.
Nestes casos, o sócio poderá garantir a execução e via Embargos à Execução Fiscal procurar comprovar que não agiu dolo, culpa, fraude ou excesso de poder.
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