sexta-feira, 27 de março de 2015

O Alcance da Lei 12.740/12 – O Novo Adicional de Periculosidade

Orlando José de Almeida
Sócio do Escritório Homero Costa Advogados, Pós Graduado em Direito Processual - IEC
Fernanda Duarte Riegert
Estagiária do Homero Costa Advogados
*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 48 em 21/04/2013

A Lei nº 12740/12 deu nova redação ao artigo 193, da CLT, que passou a ser a seguinte:

"Art. 193 - São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:
I - inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;
II - roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.
§ 1º O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.
§ 2º O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido
§ 3º Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo."


O art. 2º da referida Lei estabeleceu que a mesma entrasse em vigor na data de sua publicação, o que ocorreu em 10.12.12.

Logo de plano, realçamos que a leitura do caput e dos incisos I e II, do artigo 193, da CLT, leva à conclusão no sentido de que a norma dispõe de forma taxativa que o alcance do adicional está limitado aos trabalhadores exercentes de atividades ou operações perigosas, que “por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:” I - inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; e, II - roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.

Com efeito, seguindo-se essa linha de pensamento, foram revogadas as normas que tratavam do pagamento do adicional de periculosidade ao trabalhador exposto às radiações ionizantes ou substâncias radioativas.

Realmente, de forma taxativa e não exemplificativa, o legislador passou a considerar em único dispositivo, ou seja, no art. 193, da CLT, quais são as situações que autorizam o pagamento do adicional de periculosidade, sendo, inclusive, revogada pelo artigo 3º, a Lei nº 7.369/85, que versava sobre o adicional de periculosidade em decorrência de trabalho no setor de energia elétrica.

Assim, se a lei posterior cuidou inteiramente da “matéria de que tratava a lei anterior” (§ 1º, do art. 2º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro), consoante dispositivo transcrito, é de se ver que as normas que dispunham sobre o pagamento do adicional de periculosidade aos trabalhadores expostos às radiações ionizantes ou substâncias radioativas foram revogadas.

Aliás, se outro for o entendimento, isso em razão do disposto no art. 200, caput, e inciso VI, da CLT, nas Portarias do Ministério do Trabalho 3.393/87 e 518/03, e na Orientação Jurisprudencial nº 345 do TST, pode-se constatar a existência de conflito de normas (art. 193, caput, incisos I e II em relação ao art. 200 da CLT), devido, inclusive, às abordagens em locais distintos sobre o mesmo assunto.

Essa questão, provavelmente, será debatida e enfrentada em nossos Tribunais.

De outro lado, a respeito do inciso II, do art. 193, da CLT, a redação final, conferida à norma, é vaga e genérica, não identificando precisamente os seus destinatários. De fato, várias funções executadas por “profissionais de segurança pessoal ou patrimonial” podem sujeitar trabalhadores a “roubos ou outras espécies de violência física”.

Por isso, é necessário verificar qual era a intenção do legislador, sendo relevante averiguar a redação do Projeto de Lei n.º 1.033/03, que deu ensejo à lei.

O Projeto de Lei original visou instituir o “adicional de periculosidade para os vigilantes e empregados em transporte de valores”.

Ademais, em sua redação inicial, o projeto reconhecia o direito ao adicional de periculosidade aos mencionados trabalhadores desde que ficassem expostos permanentemente a risco de “roubos ou outras espécies de violência física”.

A Câmara dos Deputados ampliou a proposta e condicionou a percepção do adicional a duas novas categorias: do trabalhador submetido a riscos de “acidentes de trânsito” ou de “acidentes de trabalho”, que adiante foram excluídas em razão da sua abrangência.

Mas posteriormente, foi decidido que não é todo e qualquer empregado exposto a roubos e outras espécies de violência que terá direito ao adicional. A exposição deve ser permanente e desempenhada nas atividades de segurança pessoal e patrimonial.

O que se percebe é que a Lei, desde o seu nascedouro, tinha como destinatários os vigilantes e empregados de transportes de valores. Este fato também pode ser deduzido pelo disposto no § 3º do art. 193, ao estabelecer a possibilidade de compensação de adicionais da mesma natureza já pagos ao vigilante.

Deve-se considerar que a função de vigilante não se confunde com a de vigia ou outras similares.

Aquela atividade é regida pela Lei 7.102/83 e, dentre os requisitos para o seu exercício, consta a realização de curso específico (art. 16, IV) e o prévio registro no Departamento de Polícia Federal (art. 17).

Ao diferenciar o vigilante do vigia, Valentim Carrion[1] identifica:

“Segundo a lei, vigilante é o empregado contratado para proceder à vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, bem como a segurança de pessoas físicas; realizar o transporte de valores ou garantir o transporte de qualquer outro tipo de carga. As empresas especializadas em prestação de serviços de segurança, vigilância e transporte de valores poderão prestar serviços de segurança privada a pessoas; estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residências; a entidades sem fins lucrativos e órgãos e empresas públicas, com os requisitos previstos em lei (L. 7.102/83, alt. L. 8.863/94, 9.017/95, 2.184/01, 11.718/08 e D. 89.056/83, red. D. 1.592/95, v. Índ. Leg.). Os serviços de vigilante podem ser contratados tanto por pessoa física quanto jurídica. É duvidoso que os vigias residenciais, sendo considerados empregados domésticos, integrem a categoria diferenciada.
Vigia é o que exerce tarefas de observação e fiscalização do local, sem os requisitos formais, estritos dos vigilantes. Seus direitos são os comuns dos trabalhadores urbanos, conforme sejam domésticos ou não. Os vigias de rua que atendem diversos moradores, geralmente do mesmo quarteirão, não tem relação trabalhista, não podendo ser comparados com os vigias dos condomínios; neste último caso, há uma administração responsável, unificada, com personalidade jurídica ou não. Os proprietários de residência de quarteirão não se constituem em grupo organizado, não unificam suas vontades, ao contratar nem no decorrer da prestação de trabalho, pois não se reúnem para deliberar e com freqüência nem se conhecem, tratando cada um diretamente com o vigia; por esse motivo a relação é exclusivamente civil”.

Portanto, ao que nos parece, apenas os empregados em transportes de valores e os vigilantes, se enquadrados na situação prevista no art. 193, da CLT, possuem direito ao adicional de periculosidade, desde a data da publicação da lei (10.12.12).

Todavia, o caput do art. 193 da CLT estabelece que as atividades perigosas devam ser regulamentadas pelo MTE, o que já aconteceu em relação ao Inciso I.

Entretanto, o mesmo não se deu quanto ao Inciso II, mas o referido órgão já informou que tal regulamentação deve ocorrer em breve.

Com isso, é possível que venha a ser dilatado o campo de abrangência da norma, não se vinculando apenas aos vigilantes e empregados em transportes de valores.

Até que isso ocorra, o que se recomenda é o pagamento do adicional de periculosidade (inclusive de forma retroativa a 10.12.12) aos empregados que exercem as atividades indicadas no parágrafo anterior.


[1]CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 35ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 143-144, anotações ao art. 62, CLT

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