sexta-feira, 27 de março de 2015

A Manutenção do Contrato de Fiança à Luz da Lei Nº 8.245/91

Débora Nunes de Lima Soares de Sá
Sócia do Escritório Homero Costa Advogados
Bárbara Ximenes Queiroga
Estagiária do Homero Costa Advogados
*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 48 em 21/04/2013

A fiança é uma garantia fidejussória, em que um sujeito (fiador) se responsabiliza pelo adimplemento de uma obrigação alheia frente ao credor, em caso de descumprimento. Essa garantia se dá por meio de um contrato acessório escrito, que pode estar inserido em cláusulas do contrato principal, ou vir em documento apartado, por meio de instrumento particular ou público.


Conforme artigo 820 do código Civil, a fiança é um contrato unilateral, pois independe da vontade do devedor. Contudo, de acordo com outro dispositivo também do Código Civil, o credor tem a prerrogativa de aceitar ou não o fiador apresentado para aquele contrato (CC/02, art. 825), sendo forçoso concluir pela bilateralidade do contrato de fiança, em que as partes são fiador e credor.

Por versar sobre direitos patrimoniais, tal contrato acessório deve ser interpretado de forma restritiva. Nesse sentido, transcreve-se a súmula 214 do STJ: “o fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu”.

Além disso, tem o fiador uma série de prerrogativas, que visam proteger seu patrimônio, como, por exemplo, a possibilidade de dar andamento à execução quando protelada pelo credor, ou se valer do benefício de ordem, que é o direito de ver executados primeiramente os bens do devedor, antes de ter seus bens onerados por constrição judicial.

Ser fiador é uma grande responsabilidade, tendo em vista todos os riscos aos quais fica exposto. Por esse motivo, inclusive, muitas vezes o contrato de fiança é oneroso, ou seja, o afiançado obriga-se a pagar uma determinada quantia para ter seu contrato garantido.

A Lei n 8.009/90, em seu art. 3º, traz um rol de exceções ao instituto do bem de Família, permitindo, dentre outras situações, a constrição judicial por meio de penhora de imóvel de família do fiador. Por esse motivo, é imprescindível que haja outorga conjugal para fins de se validar o contrato.

Nos casos em que houver recusa injustificada por parte do cônjuge em anuir a fiança, é possível ajuizar ação para suprir a outorga. Na falta do suprimento, se ainda assim houve a fiança, o cônjuge que não anuiu poderá pleitear anulação do ato, conforme determina o art. 1.649, do Código Civil e súmula no 332, do STJ, que enuncia: "a fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia".

Com tais considerações sobre o instituto da fiança, passa-se a analisar a mudança do entendimento do STJ no que se refere ao efeito no contrato de fiança da prorrogação do contrato de locação por prazo indeterminado.
Segundo o art. 46 da Lei de Locações, findo o prazo estipulado no contrato, se o locatário permanecer no imóvel pelo período mínimo de 30 dias sem a oposição do locador considerar-se-á como renovado o contrato por prazo indeterminado. Surge, então, a discussão sobre a automática renovação do contrato de fiança, seguindo a sorte do contrato principal.

Até o ano de 2009, entendia-se que o contrato de fiança – assessório ao contrato de locação - se extinguiria com o exaurimento de seu prazo ou, até mesmo, com a efetiva entrega das chaves quando da renovação do contrato principal por prazo indeterminado. Neste último caso, no entanto, seria necessária expressa anuência do fiador no próprio contrato, admitindo a prorrogação.

Contudo, com a alteração da redação do art. 39 da Lei do Inquilinato, pela lei 12.112/09, fez-se necessária a reforma de tal entendimento. Até 2009, lia-se:

"Salvo disposição em contrário qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel."

Após a vigência da Lei nº 12.112, passou a ser assim a redação;

"Salvo disposição em contrário qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta lei" (sem grifos no original).

Dessa forma, pelos contratos firmados a partir de 2009, os fiadores continuarão garantindo o contrato de locação até a efetiva devolução das chaves, a não ser que se exonerem em contrato.

Insta ressaltar que pode ainda o fiador se exonerar da obrigação nos termos do art. 835 do Código Civil, independentemente do término do contrato de locação, notificando o locador.

Em síntese, pode-se dizer que a alteração legislativa teve como finalidade dar fim à divergência de entendimentos acerca do art. 39 da Lei de Locações, fazendo com que o contrato acessório seguisse a sorte do principal, o que já deveria ser de praxe.

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