Débora Nunes de Lima Soares de Sá
Sócia do Escritório Homero Costa Advogados
Bárbara Ximenes Queiroga
Estagiária do Homero Costa Advogados
*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 48 em 21/04/2013
Conforme artigo 820 do código Civil, a fiança é um contrato unilateral, pois independe da vontade do devedor. Contudo, de acordo com outro dispositivo também do Código Civil, o credor tem a prerrogativa de aceitar ou não o fiador apresentado para aquele contrato (CC/02, art. 825), sendo forçoso concluir pela bilateralidade do contrato de fiança, em que as partes são fiador e credor.
Por versar sobre direitos patrimoniais, tal contrato acessório deve ser interpretado de forma restritiva. Nesse sentido, transcreve-se a súmula 214 do STJ: “o fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu”.
Além disso, tem o fiador uma série de prerrogativas, que visam proteger seu patrimônio, como, por exemplo, a possibilidade de dar andamento à execução quando protelada pelo credor, ou se valer do benefício de ordem, que é o direito de ver executados primeiramente os bens do devedor, antes de ter seus bens onerados por constrição judicial.
Ser fiador é uma grande responsabilidade, tendo em vista todos os riscos aos quais fica exposto. Por esse motivo, inclusive, muitas vezes o contrato de fiança é oneroso, ou seja, o afiançado obriga-se a pagar uma determinada quantia para ter seu contrato garantido.
A Lei n 8.009/90, em seu art. 3º, traz um rol de exceções ao instituto do bem de Família, permitindo, dentre outras situações, a constrição judicial por meio de penhora de imóvel de família do fiador. Por esse motivo, é imprescindível que haja outorga conjugal para fins de se validar o contrato.
Nos casos em que houver recusa injustificada por parte do cônjuge em anuir a fiança, é possível ajuizar ação para suprir a outorga. Na falta do suprimento, se ainda assim houve a fiança, o cônjuge que não anuiu poderá pleitear anulação do ato, conforme determina o art. 1.649, do Código Civil e súmula no 332, do STJ, que enuncia: "a fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia".
Com tais considerações sobre o instituto da fiança, passa-se a analisar a mudança do entendimento do STJ no que se refere ao efeito no contrato de fiança da prorrogação do contrato de locação por prazo indeterminado.
Segundo o art. 46 da Lei de Locações, findo o prazo estipulado no contrato, se o locatário permanecer no imóvel pelo período mínimo de 30 dias sem a oposição do locador considerar-se-á como renovado o contrato por prazo indeterminado. Surge, então, a discussão sobre a automática renovação do contrato de fiança, seguindo a sorte do contrato principal.
Até o ano de 2009, entendia-se que o contrato de fiança – assessório ao contrato de locação - se extinguiria com o exaurimento de seu prazo ou, até mesmo, com a efetiva entrega das chaves quando da renovação do contrato principal por prazo indeterminado. Neste último caso, no entanto, seria necessária expressa anuência do fiador no próprio contrato, admitindo a prorrogação.
Contudo, com a alteração da redação do art. 39 da Lei do Inquilinato, pela lei 12.112/09, fez-se necessária a reforma de tal entendimento. Até 2009, lia-se:
"Salvo disposição em contrário qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel."
Após a vigência da Lei nº 12.112, passou a ser assim a redação;
"Salvo disposição em contrário qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta lei" (sem grifos no original).
Insta ressaltar que pode ainda o fiador se exonerar da obrigação nos termos do art. 835 do Código Civil, independentemente do término do contrato de locação, notificando o locador.
Em síntese, pode-se dizer que a alteração legislativa teve como finalidade dar fim à divergência de entendimentos acerca do art. 39 da Lei de Locações, fazendo com que o contrato acessório seguisse a sorte do principal, o que já deveria ser de praxe.
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