Simone Oliveira Rocha
Sócia do Escritório Homero Costa Advogados, MBA em Gestão Estratégica de Empresas pela FUMEC
Uma das grandes preocupações das empresas nos tempos atuais é saber de quem é a responsabilidade pelo pagamento da remuneração dos empregados que foram considerados aptos pelo INSS para retornar ao trabalho, mas apresentaram recursos administrativos interpostos com o objetivo de prorrogar o período de concessão do auxílio-doença.
A Lei 8.213/91, que prevê a concessão de auxílio-doença,determina:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz.
(...)
§ 3º Durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral.
§ 4º A empresa que dispuser de serviço médico, próprio ou em convênio, terá a seu cargo o exame médico e o abono das faltas correspondentes ao período referido no § 3º, somente devendo encaminhar o segurado à perícia médica da Previdência Social quando a incapacidade ultrapassar 15 (quinze) dias.
Portanto, a princípio, a empresa é responsável apenas pelo pagamento dos 15 primeiros dias do afastamento, comprovado mediante atestado, devendo o INSS responder pelo restante.
É pratica do INSS, ao conceder o benefício de auxílio-doença, estabelecer a data em que este será automaticamente revogado, sem que seja necessária a realização de perícia para averiguar o estado do segurado.
Com o término do auxílio-doença, o empregado deve retornar ao trabalho, sob pena de lançamento dos dias não trabalhados como faltas e até mesmo uma eventual justa causa por abandono de emprego.
Na hipótese de o empregado se julgar incapacitado, ainda que considerado apto pelo INSS e pelo setor médico da empresa, deve o mesmo buscar novo afastamento, seja através da prorrogação do benefício ou mesmo apresentando novos atestados médicos que comprovem o seu estado de saúde. Durante este período, não terá direito ao recebimento de salários por parte da empresa se não laborar.
Por outro lado, os efetivos problemas ocorrem quando o empregado é considerado apto pelo INSS e inapto pelo setor médico da empresa.
Isso porque o empregado se vê impedido, pelo empregador, de prestar serviços e não recebe qualquer remuneração. Ainda que apresente recurso administrativo e/ou interponha ação judicial, até o julgamento definitivo estará privado de sua fonte de renda usual (salários ou benefícios previdenciários).
Neste caso, a jurisprudência tem entendido que o empregador responde pelos salários do período.
Uma das justificativas é que o contrato de trabalho, que estava suspenso durante o afastamento previdenciário, foi restabelecido com a alta previdenciária. Desse modo, os salários se tornam devidos, ainda que não tenha havido a prestação de serviços, eis que isso se deu por impedimento do próprio empregador.
Além disso, fundamenta-se que o empregado não poderia ser submetido ao impasse de a empregadora recusar-lhe trabalho em decorrência de uma incapacidade que não foi reconhecida pela Autarquia ou em Juízo.
Vejamos algumas decisões:
ALTA PREVIDENCIÁRIA. RETORNO DO EMPREGADO. RECUSA DO EMPREGADOR. EFEITOS DO CONTRATO DE TRABALHO. Se o empregador mantém em vigor o contrato de trabalho da empregada, mesmo após o INSS e a Justiça Federal terem indeferido o restabelecimento do benefício previdenciário, ao fundamento de existência de capacidade laborativa, ele deve arcar com todos os efeitos pecuniários da ausência de suspensão do contrato de trabalho, mesmo não tendo havido prestação de serviço (TRT 3ª Região – RO 0000475-44.2011.5.03.0136, Quinta Turma, Rel.Dra. Lucilde D'Ajuda L. de Almeida, DO 30.01.12)
Salárioe benefício previdenciário. Não percepção. Culpa da empresa. Indenização. Osartigos 186e927 do Código Civilestabelecem que aquele que causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Assim, por ter o médico da empresa considerado o trabalhadorinaptopara o trabalho mesmo tendo oINSSo considerado apto, impõe-se a ré opagamentodos salários do período pleiteado por ter causado prejuízo ao autor. Nega-se provimento..(TRT 23ª R.; RO 0005800-21.2009.5.23.0; Segunda Turma; Relª Desª Maria Berenice; DEJTMT 15/04/2011; Pág. 65)
EMPREGADOR QUE NÃO PERMITE O RETORNO ÀS FUNÇÕES DE EMPREGADO QUE TEVE SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO INTERROMPIDO PELOINSSPORALTA.RESPONSABILIDADEPELO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS.O fato de o empregador declarar que o obreiro permaneceinapto, contrariando a conclusão da Previdência Social, não tem o condão de obstruir o direito de o empregado começar a receber a contraprestação salarial devida, pois, nessa hipótese, não foi ele quem deu azo à inação. Tal discussão deve ser travada entre oINSSe o empregador, devendo este, na hipótese de o médico da empresa estar correto e o empregado efetivamente não estava apto ao trabalho, procurar ressarcir eventuais prejuízos junto à autarquia previdenciária. O que não pode acontecer em nenhuma conjectura é o empregado, agente inocente no episódio, ter de suportar o prejuízo e a solução do problema, principalmente frente à natureza alimentar os valores que deixará de receber. 17672/2008(TRT 12ª R.; RO 00870-2007-009-12-00-5; Primeira Turma; Rel. Juiz José Ernesto Manzi; Julg. 21/05/2009; DOESC 12/06/2009)
Noutro norte, pode acontecer de os peritos do INSS não examinarem com atenção as condições físicas e psicológicas do beneficiário, concedendo altas médicas precipitadas. E os médicos do empregador, ao examinarem mais atentamente o empregado, se opõem à alta, inclusive com o receio de agravamento do quadro durante a prestação dos serviços ou até mesmo a possibilidade de um acidente.
Por estes motivos, caso o médico da empresa considere que o empregado está inapto para retornar ao trabalho, deve embasar o seu entendimento através de exames específicos e detalhados, bem como apresentar um relatório/laudo médico discriminando os motivos pelos quais o empregado encontra-se inapto, para que se tenha robustez e fundamento jurídico e médico para sustentar eventual parecer contrário do INSS.
Além disso, se o próprio empregado se diz incapaz ao retorno, isso também deve ser registrado por escrito. O rumo a ser seguido é o da máxima cautela e demonstração de que tudo foi feito para deixar a situação mais clara possível.
Diante do exposto, com o intuito de evitar a geração de um passivo, é interessante que a empresa realize o pagamento os salários neste período (do exame médico constatando a incapacidade até o efetivo afastamento), ressalvando, em documento específico que o empregado deverá procurar o INSS ou ajuizar ação buscando o seu afastamento e que os valores quitados sem a contraprestação devida serão devolvidos na hipótese de novo afastamento previdenciário.
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