Bernardo José
Drumond Gonçalves
Advogado,
especializando em direito processual pelo IEC – Instituto de Educação
Continuada - da PUC/MG
*publicado
originalmente no Boletim Jurídico N.º 05, em 11/08/2008
O instituto dos alimentos no Direito de Família envolve tanto
o dever de prestar, quanto o direito de pedir auxílio, em princípio pecuniário,
aos parentes, cônjuges ou companheiros, com o escopo de suprir as necessidades
básicas à subsistência e à mantença da condição social (art. 1.694 do Código
Civil/02), com fundamento nos Princípios da Solidariedade ou da Mútua
Assistência.
Em conteúdo mais detalhado, o atual Código Civil Brasileiro estabelece que “Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação e penhora.” (art. 1.707).
Sob a análise do Supremo Tribunal Federal, a questão chegou a
ser sumulada, corroborando o texto legal: “No acordo de desquite não se admite
renúncia aos alimentos, que poderão ser pleiteados ulteriormente, verificados
os pressupostos legais.” (Súmula nº 379).
Na hipótese isolada de uma separação, as sociedades conjugais
constituídas deparam-se com uma gama de dificuldades oriundas do impacto da
ruptura da vida em comum. Normalmente, os efeitos e, em especial, os problemas,
não surgem de imediato. Sabe-se que, no calor do momento dos litígios, as
partes dispensam a pensão alimentícia de forma recíproca, por motivos diversos,
como a simples pretensão de encerrar o vínculo de dependência mútua, visando
extinguir pacificamente a anterior assistência.
Segundo o doutrinador Sílvio Rodrigues, a despeito do
expresso impedimento legal do disposto no artigo 1.707 do Código Civil de
2.002, bem como na súmula nº 379 do STF, não há possibilidade jurídica de um
cônjuge pleitear alimentos, considerando a renúncia no ato da separação
judicial.
Os ministros do Superior Tribunal de Justiça não têm
entendimento diverso, ao argumento de que a renúncia se apresenta condizente
com cláusulas que tratam os alimentos com disponibilidade no ato da separação,
considerando-as como válidas e eficazes. Com efeito, a 3ª¹ e a 4ª²
Turma concluíram recentemente: “Tendo sido homologado acordo em separação
judicial no qual a parte renunciou aos alimentos, por dispor de meios próprios
para o seu sustento, não pode posteriormente pretender recebê-los”.
Em destaque, a Ministra Nancy Andrighi, ainda alerta: “Esse
julgamento permite que seja aberta uma grave reflexão no sentido de alertar as
mulheres deste País a respeito do que são levadas a assinar, muitas vezes
desconhecendo o teor ou as implicações futuras daquilo que está redigido no
acordo de separação”. Nesse particular, questiona-se se são realmente
irrenunciáveis os alimentos, conforme disposto em lei, ou se podem os
ex-cônjuges postularem-nos a qualquer tempo, mesmo depois da acordarem sua
renúncia.
A justificativa para tal posicionamento encontra-se no
seguinte ponto: a irrenunciabilidade dos alimentos prescrita em lei versa
somente sobre os alimentos fundados no parentesco, caso em que marido e a
mulher não se incluem, uma vez que não são parentes. Em sua obra Direito de
Família, Washington de Barros Monteiro afirma que “[...] cônjuge não é parente
e sim um companheiro, um sócio, enquanto perdure a sociedade conjugal”.
Estaria, assim, superada a Súmula nº 379 do Supremo Tribunal
Federal? De toda forma, cumpre mencionar o projeto de lei (nº 6.960/2002) em
trâmite na Câmara dos Deputados, cujo escopo é alterar o atual Código Civil
Brasileiro, propondo ao artigo 1.707 a mudança na sua redação para acrescentar:
“O crédito de pensão alimentícia, oriundo de relação de parentesco, de
casamento ou de união estável, é insuscetível de cessão, penhora ou compensação”.
Por fim, conclui-se que, havendo o intuito entre os cônjuges
em não exercer o direito aos alimentos no ato da separação judicial, o ideal é
a dispensa dos mesmos e não sua renúncia expressa.
Portanto, em que pese ser hipoteticamente irrenunciável o
direito aos alimentos, quando os cônjuges firmarem pacto em fase de litígio
judicial, deverão apenas dispensá-los momentaneamente, sem implicar extinção do direito, assegurando, assim,
eventual e futura necessidade.
______________________
¹ - RESP 701.902/SP (DJ 15/09/05),
596.049/SC (DJ 10/05/04), RHC 11.690/DF (DJ 19/11/01), RESP 221.216/MG (DJ
05/06/00), RESP 85.863/SP (DJ 16/09/00) e RESP 37.151/SP (DJ 27/06/94).
²RESP 199.427/SP (DJ 29/03/04), RESP
226.330/GO (DJ 12/05/03), RESP 254.392/MT (DJ 28/05/01), RESP 70.630/SP (DJ
20/11/00) e RESP 33.815/SP (DJ 08/09/97).
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