quarta-feira, 24 de julho de 2013

Alterações à Lei de Estágio e suas consequências

Simone Oliveira Rocha


Advogada, pós-graduanda em Gestão Estratégica de Empresas pela Faculdade Newton Paiva

*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 01, em 08/05/2008


O projeto de Lei 473/2003, apresentado pelo Senador Osmar Dias do PDT/PR, que sugere relevantes mudanças nos contratos de estágio, foi aprovado pelo Senado em 06.11.07 e encaminhando à Câmara dos Deputados em 13.11.07, onde foi apensado ao PL n.º 4065/1993 e recebeu o n.º 2419/2007.


Ainda que o projeto seja bem intencionado, objetivando, principalmente, combater a postura abusiva de algumas empresas na utilização dos estagiários como “mão-de-obra barata”, alguns de seus artigos podem, na verdade, prejudicar o contrato de estágio, dificultando a criação e a manutenção de vagas.

As mudanças mais significativas e controversas são:

a) a limitação da jornada do estágio para 6 horas diárias e 30 semanais, no caso de estudantes de curso superior ou profissionalizantes de ensino médio e ensino médio regular, e 4 horas diárias e 20 semanais no caso de estudantes de educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional de educação de jovens e adultos (art. 10, I e II);

b) a duração máxima de dois anos do contrato de estágio, exceto quando se tratar de estagiário portador de  deficiência física (art. 11);

c) na hipótese de estágio não compulsório, a obrigatoriedade de pagamento de bolsa ou vale-transporte (art. 12);

d) a concessão, quando o estagiário receber bolsa, de recesso de remunerado 30 dias em casos de contratos com duração igual ou superior a 1 (um) ano (art. 13) ou proporcional, se a duração for inferior a 1 (um) ano (art. 13, § 2º);

e) caso a empresa seja reincidente na manutenção de estagiários, o impedimento de firmar contratos desta natureza durante 2 (dois) anos (art. 15, § 2º);

f) a limitação do número de estagiários do ensino médio de acordo com o número de empregados da empresa (art. 17 c/c 4§); e,

g) a reserva de 10% das vagas de estagiários para portadores de deficiências (art. 17, § 6º).

O Projeto de Lei, com o intuito de coibir contratos fraudulentos e irregulares, que são adotados por uma minoria das empresas, acaba por prejudicar os empreendimentos que cumprem corretamente a legislação, aumentando o ônus e restringindo o número de vagas que podem ser oferecidas e, conseqüentemente, os próprios estudantes.

Deve-se, primeiramente, considerar que o estágio objetiva possibilitar que o estudante desenvolva a prática de seu estudo teórico, preparando-o para a vida profissional. Além disso, concede à empresa a oportunidade de treinar seus profissionais futuros de acordo com as suas necessidades e com um custo menor.

Isto é mais facilmente visualizado na hipótese de cursos superiores e profissionais. Ainda que a instituição de ensino ofereça os conceitos e até mesmo alguma prática ligada à matéria, somente o contato diário com a realidade da profissão oferecerá ao estudante a oportunidade de, efetivamente, conhecer e praticar as atividades a ela ligadas e, inclusive, comprovar a sua vocação.

Lado outro, possibilitando-se à empresa ensinar e treinar o estudante na prática concomitantemente com a sua formação acadêmica, aquela poderá moldá-lo de acordo com os seus padrões, tendo, assim, um excelente profissional de capacidade comprovada pronto para ocupar o quadro de empregados no momento da conclusão do seu curso.

Assim, limitar o contrato de estágio é limitar o conhecimento que pode ser adquirido pelo estagiário e atrasar o seu desenvolvimento profissional, bem como a sua possibilidade de futura contratação, desestimulando, também, as empresas a oferecer uma vaga de estágio.

Ao impor uma carga horária da jornada de 6 diárias, o Projeto de Lei impede que o estudante de ensino superior ou profissionalizante acompanhe integralmente as atividades para a qual está se preparando para desenvolver após a sua formatura, que poderá requerer uma jornada de pelo menos 8 horas, por exemplo. A bolsa também sofrerá redução proporcional, o que pode prejudicar os estudantes que dela dependem para pagar a sua educação.

Já a limitação da duração do contrato de estágio a dois anos pode causar diversos prejuízos. Isso porque muitos cursos têm duração superior a este período, chegando a até 6 anos. Conseqüentemente, muitas empresas optariam por não contratar estudantes que estejam no início ou meio do curso, o que significaria treinar estagiários para outro empregador.

Ou seja, os estudantes, no início do curso, terão maiores dificuldades de conseguir estágio.

Além disso, limitar as vagas de estágio de acordo com o número de empregados da empresa com toda a certeza irá diminuir, e muito, as oportunidades sem, entretanto, garantir a criação de novos empregos.

Por fim, reservar 10% das vagas para deficientes apenas tráz novas preocupações para as empresas, sendo de notório conhecimento que hoje as empresas enfrentam grandes dificuldades em atender o artigo 93 da Lei n.º 8213/91, por ausência de pessoal qualificado que preencha os requisitos legais e, conseqüentemente, as vagas.

Deve-se ressaltar que apenas as empresas com mais de 100 empregados são obrigadas a preencher seus cargos, no mínimo 2% e no máximo 5%, com portadores de deficiência.. O projeto de lei, além de não estabelecer nenhum número mínimo a partir do qual a contratação de deficientes se torna obrigatória, quintuplica esta cota para estagiários (10%), o que com certeza inviabilizará o cumprimento da lei.

Conclui-se que o projeto de lei, ao contrário de proteger e incentivar o estágio, que possibilita, muitas vezes, que o jovem consiga o seu primeiro emprego, cria novas restrições, desestimulando as empresas de oferecerem este tipo de vaga.

Na verdade, para atingir os objetivos apontados pelo projeto, bastaria que houvesse um aumento da fiscalização para coibir as fraudes e as irregularidades, sem prejuízo aos contratos de estágio firmados nos termos da lei. 

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