Simone
Oliveira Rocha
Advogada,
pós-graduanda em Gestão Estratégica de Empresas pela Faculdade Newton Paiva
*publicado
originalmente no Boletim Jurídico N.º 01, em 08/05/2008
O projeto de Lei 473/2003, apresentado
pelo Senador Osmar Dias do PDT/PR, que sugere relevantes mudanças nos contratos
de estágio, foi aprovado pelo Senado em 06.11.07 e encaminhando à Câmara dos
Deputados em 13.11.07, onde foi apensado ao PL n.º 4065/1993 e recebeu o n.º
2419/2007.
Ainda que o projeto seja bem
intencionado, objetivando, principalmente, combater a postura abusiva de
algumas empresas na utilização dos estagiários como “mão-de-obra barata”,
alguns de seus artigos podem, na verdade, prejudicar o contrato de estágio,
dificultando a criação e a manutenção de vagas.
As mudanças mais significativas e
controversas são:
a) a limitação da jornada do estágio
para 6 horas diárias e 30 semanais, no caso de estudantes de curso superior ou
profissionalizantes de ensino médio e ensino médio regular, e 4 horas diárias e
20 semanais no caso de estudantes de educação especial e dos anos finais do
ensino fundamental, na modalidade profissional de educação de jovens e adultos
(art. 10, I e II);
b) a duração máxima de dois anos do
contrato de estágio, exceto quando se tratar de estagiário portador de
deficiência física (art. 11);
c) na hipótese de estágio não
compulsório, a obrigatoriedade de pagamento de bolsa ou vale-transporte (art.
12);
d) a concessão, quando o estagiário
receber bolsa, de recesso de remunerado 30 dias em casos de contratos com
duração igual ou superior a 1 (um) ano (art. 13) ou proporcional, se a duração
for inferior a 1 (um) ano (art. 13, § 2º);
e) caso a empresa seja reincidente na
manutenção de estagiários, o impedimento de firmar contratos desta natureza
durante 2 (dois) anos (art. 15, § 2º);
f) a limitação do número de estagiários
do ensino médio de acordo com o número de empregados da empresa (art. 17 c/c
4§); e,
g) a reserva de 10% das vagas de
estagiários para portadores de deficiências (art. 17, § 6º).
O Projeto de Lei, com o intuito de
coibir contratos fraudulentos e irregulares, que são adotados por uma minoria
das empresas, acaba por prejudicar os empreendimentos que cumprem corretamente
a legislação, aumentando o ônus e restringindo o número de vagas que podem ser
oferecidas e, conseqüentemente, os próprios estudantes.
Deve-se, primeiramente, considerar que
o estágio objetiva possibilitar que o estudante desenvolva a prática de seu
estudo teórico, preparando-o para a vida profissional. Além disso, concede à
empresa a oportunidade de treinar seus profissionais futuros de acordo com as
suas necessidades e com um custo menor.
Isto é mais facilmente visualizado na
hipótese de cursos superiores e profissionais. Ainda que a instituição de
ensino ofereça os conceitos e até mesmo alguma prática ligada à matéria,
somente o contato diário com a realidade da profissão oferecerá ao estudante a
oportunidade de, efetivamente, conhecer e praticar as atividades a ela ligadas
e, inclusive, comprovar a sua vocação.
Lado outro, possibilitando-se à empresa
ensinar e treinar o estudante na prática concomitantemente com a sua formação
acadêmica, aquela poderá moldá-lo de acordo com os seus padrões, tendo, assim,
um excelente profissional de capacidade comprovada pronto para ocupar o quadro
de empregados no momento da conclusão do seu curso.
Assim, limitar o contrato de estágio é
limitar o conhecimento que pode ser adquirido pelo estagiário e atrasar o seu
desenvolvimento profissional, bem como a sua possibilidade de futura
contratação, desestimulando, também, as empresas a oferecer uma vaga de
estágio.
Ao impor uma carga horária da jornada
de 6 diárias, o Projeto de Lei impede que o estudante de ensino superior ou
profissionalizante acompanhe integralmente as atividades para a qual está se
preparando para desenvolver após a sua formatura, que poderá requerer uma
jornada de pelo menos 8 horas, por exemplo. A bolsa também sofrerá redução
proporcional, o que pode prejudicar os estudantes que dela dependem para pagar
a sua educação.
Já a limitação da duração do contrato
de estágio a dois anos pode causar diversos prejuízos. Isso porque muitos
cursos têm duração superior a este período, chegando a até 6 anos.
Conseqüentemente, muitas empresas optariam por não contratar estudantes que
estejam no início ou meio do curso, o que significaria treinar estagiários para
outro empregador.
Ou seja, os estudantes, no início do
curso, terão maiores dificuldades de conseguir estágio.
Além disso, limitar as vagas de estágio
de acordo com o número de empregados da empresa com toda a certeza irá
diminuir, e muito, as oportunidades sem, entretanto, garantir a criação de
novos empregos.
Por fim, reservar 10% das vagas para
deficientes apenas tráz novas preocupações para as empresas, sendo de notório
conhecimento que hoje as empresas enfrentam grandes dificuldades em atender o
artigo 93 da Lei n.º 8213/91, por ausência de pessoal qualificado que preencha
os requisitos legais e, conseqüentemente, as vagas.
Deve-se ressaltar que apenas as
empresas com mais de 100 empregados são obrigadas a preencher seus cargos, no
mínimo 2% e no máximo 5%, com portadores de deficiência.. O projeto de lei, além
de não estabelecer nenhum número mínimo a partir do qual a contratação de
deficientes se torna obrigatória, quintuplica esta cota para estagiários (10%),
o que com certeza inviabilizará o cumprimento da lei.
Conclui-se que o projeto de lei, ao
contrário de proteger e incentivar o estágio, que possibilita, muitas vezes,
que o jovem consiga o seu primeiro emprego, cria novas restrições,
desestimulando as empresas de oferecerem este tipo de vaga.
Na verdade, para atingir os objetivos
apontados pelo projeto, bastaria que houvesse um aumento da fiscalização para
coibir as fraudes e as irregularidades, sem prejuízo aos contratos de estágio
firmados nos termos da lei.
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