quarta-feira, 31 de julho de 2013

A Reforma do Código de Processo Civil – A Questão da Suspensão da Execução pela Interposição de Embargos na Execução Fiscal.

Isabela Mello da Mata

Advogada, pós-graduanda em Direito Tributário pela Faculdade Milton Campos.

*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 04, em 16/07/2008


Com o advento das Leis nos 11.232/05 e 11.382/06 muitas mudanças foram implementadas no Código de Processo Civil brasileiro.
Primeiramente, a Lei nº 11.232/05 alterou a tramitação da execução de títulos judiciais, introduzindo o cumprimento de sentença, trazendo maior celeridade e eficiência à satisfação de credores dessa espécie de títulos.

A Lei nº 11.382/06, por sua vez, objetivava estender as mesmas mudanças à execução dos títulos extrajudiciais e implicou em mudanças substanciais no processo de execução civil.

Uma das principais mudanças foi aquela relativa aos Embargos à Execução que não mais, via de regra, suspendem a Execução.

O artigo 739-A, incluído pela mencionada Lei nº 11.382/06, dispõe que: “Os embargos do executado não terão efeito suspensivo”, salvo determinados casos em que o juiz poderá, por requerimento do embargante, atribuir a eles o efeito suspensivo, desde que haja possibilidade de dano de difícil ou incerta reparação e sejam relevantes os fundamentos.

Diante disso, a execução permanece com seu curso normal, autônomo, paralelamente aos embargos, dando-se continuidade a todos os atos executivos até que se satisfaça a obrigação, sem levar em conta a decisão final dos embargos.

Em suma, a partir destas modificações, os embargos não suspendem a execução e independem da garantia do juízo (art. 736 do CPC), a não ser no caso em que o embargante requerer a atribuição de efeito suspensivo, requisito imposto para a concessão do referido efeito.

O questionamento que tem se tornado freqüente no meio tributário diz respeito à aplicação das modificações na execução civil às execuções fiscais.

Como se sabe, o processo de execução fiscal é regido pela Lei nº 6.830/80, também conhecida como Lei de Execução Fiscal, que possui peculiaridades distintas da lei de execução civil.

Ocorre que, a referida lei de execução fiscal prevê que a execução judicial de dívida ativa das Fazendas Públicas será regida, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil. Ressalta-se que, por ser subsidiária, não serão todas as modificações mencionadas alhures que serão aplicadas ao processo de execução fiscal. É este o caso de atribuição de efeito suspensivo aos embargos à execução.

Na Lei de Execução Fiscal não há previsão expressa no que tange aos efeitos dos embargos à execução, tendo sido o efeito suspensivo deste instituto retirado das disposições do Código de Processo Civil.

Diante do exposto, alguns doutrinadores entendem que no processo de execução fiscal, a partir da Lei nº 11.382/06, assim como no processo civil, os embargos não suspendem o curso do processo executivo.

Acontece que, ainda que a LEF não faça referência expressa ao efeito suspensivo dos embargos, não se pode negar que o efeito já faz parte implicitamente do processo executivo fiscal.

A execução fiscal era tratada de forma autônoma até o advento do Código de Processo Civil atual, quando passou, então, a ser regulada pelas disposições contidas no CPC para as execuções de maneira geral. Promulgada anteriormente, com relação aos embargos do executado, a LEF, em geral, manteve o procedimento previsto no CPC, porém criou outras espécies de garantias, não previstas na execução civil até então, como a possibilidade de apresentação da fiança bancária e a fixação de prazo diverso para a oposição de embargos, de trinta dias contados da apresentação da garantia.

A execução fiscal, portanto, previa a necessidade de garantia para a oposição de embargos, o que culminava na suspensão do processo executivo. E, ainda que a previsão da suspensão não tenha menção expressa na LEF, esse efeito foi incorporado à norma, diante do sistema existente no ordenamento para o processo de execução fiscal. Isto porque, diferentemente do que ocorre com os títulos extrajudiciais, os títulos cobrados por meio da execução fiscal são constituídos no âmbito da chamada autotutela vinculada, da qual a Administração Pública é dotada, ou seja, a própria administração, em um procedimento unilateral, constitui seus próprios títulos, o que dificulta, inclusive a oportunidade do contraditório ao contribuinte, que se realiza plenamente no âmbito judicial, em regra, por via dos embargos.

Ademais, eventual excesso na cobrança de crédito tributário, quando constatado, somente poderá ocorrer por Execução de Sentença após o trânsito em julgado do processo de conhecimento, o que não significa aguardar apenas  a solução de primeira instância, mas de toda a via recursal admitida. Por fim, como não bastasse, o contribuinte para ter seu crédito, já reconhecido, satisfeito deverá aguardar na fila dos precatórios, eventualmente submetido inclusive a emendas constitucionais que parcelam o crédito em até dez anos ou outras restrições requeridas para o pagamento.

A este respeito, extrai-se de artigo publicado por Hugo de Brito Machado Segundo¹:

“Está claro, neste contexto, que eventual excesso na cobrança de um crédito tributário não é reparado da mesma forma que o excesso na cobrança de um crédito executado, por um particular conta outro, nos moldes do CPC. Isso recomenda, no primeiro caso, cautela ainda maior que no segundo, aspecto que se soma à já mencionada forma, também diferenciada, por meio da qual se dá a unilateral constituição do crédito tributário.
Assim, ainda que o regramento da questão pela lei de execuções fiscais permitisse o avanço da Fazenda exequente no patrimônio do executado, para que esta obtivesse a satisfação da quantia por ela própria apurada e tida como devida, isso não poderia ocorrer, sob pena de violação ao 'substantive due process of law' (CF/88, art. 5º, LIV), e aos princípios da ampla defesa e do amplo acesso ao judiciário (CF/88, art. 5º, XXXV e LV). De fato, permitir-se-ia, com tal sistemática, que um credor obtivesse a quantia considerada como devida, diretamente de quem apontasse como seu devedor, sem qualquer possibilidade de um controle jurisdicional prévio, o que implicaria o retorno, na prática, da odiosa regra do 'solve et repete'.”

Desta forma, resta claro que ainda que o regramento da Execução Fiscal permitisse a intervenção da Fazenda Pública no patrimônio do Executado para satisfação da quantia por ela apurada e, portanto, tida como devida, isso configuraria ofensa ao devido processo legal e aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, o que não pode ocorrer.

Lado outro, têm-se também que, interpretando a reforma do Código de Processo Civil como um todo, a ausência de atribuição de efeito suspensivo aos embargos pode ter advindo como consequência da desnecessidade de garantia do juízo para interposição destes, pois, anteriormente, havia a necessidade da referida garantia e os embargos suspendiam a execução.       

Trazendo tal sistemática à Execução Fiscal, encontramos nova razão para a inaplicabilidade desta modificação. Isto porque, se a intenção para a suspensão da execução é a garantia do juízo, a condição encontra-se satisfeita neste caso, vez que a garantia do juízo na Execução Fiscal é imposição para oposição de Embargos, assim como na antiga sistemática do Código de Processo Civil, razão pela qual o seu regramento deve ser mantido. 

Diante do exposto, não nos parece correta a aplicação do dispositivo inovador do Código de Processo Civil, aos embargos apresentados na Execução Fiscal. Despeito disso, a matéria ainda não está pacificada nem na doutrina e nem na jurisprudência. Prudente, portanto, o Executado efetuar o requerimento de atribuição de efeito suspensivo aos seus Embargos, nos moldes da Lei 11.382/06, quando da interposição dos mesmos. 

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¹ - Machado Segundo, Hugo de Brito e Machado, Raquel Cavalcanti Ramos. “A Reforma no CPC e a Supensão da Execução Fiscal pela Oposição de Embargos”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 151, São Paulo, abril/2008, p. 61. 

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