Daniela Villani Bonaccorsi
Advogada criminalista do escritório Leonardo Isaac Yarochewsky Advogados Associados e Associada ao escritório Homero Costa Advogados. Mestre e Doutorando em Direito Processual. Professora de Direito Penal PUC-Minas
*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 33 em 25/03/2011
A “Sociedade de
Risco”, foi identificada, em 1986, por Ulrich Beck, “com o momento
de crise e de revisão, que manifesta seus efeitos deletérios e coloca em cheque
seus fundamentos”. (JUNGES, 2001. p.19). “(...) Uma sociedade de enorme complexidade,
na qual a interação individual pelas necessidades de cooperação e de divisão
funcional- alcançou níveis até agora desconhecidos (...)”.(SILVA SANCHES, 2002,
p.31).
Hoje a sociedade vive em
uma “expansão”¹ penal do direito penal. Desde os anos 60, as condutas e as
atividades que poderiam oferecer perigo, alastraram-se no sistema penal, a
violência tomou proporções cada vez maiores, onde se reclama por maior
intervenção penal e por uma excessiva intervenção estatal, uma “legislação de
emergência” sem o estabelecimento de princípios ou um modelo garantista, mas o
desenvolvimento “hipertrófico”²
do direito penal (Luisi, 2003, p. 42), com tendências intervencionistas e
preventivas.
A sensação de
insegurança na sociedade chamada de risco, ou pós-industrial é traço significativo,
fala-se de uma sociedade da “insegurança sentida (ou como a sociedade do
medo)”³, pois “é inegável que
a população experimenta uma crescente dificuldade de adaptação” com os avanços
tecnológicos, novas realidades econômicas e até, ético-sociais:
“a insegurança e a angústia podem também guardar relação
com a intensa experiência do mal como elemento de nossa existência, que de modo
significativo tem sido possível experimentar ao largo da interminável sucessão
de guerras e destruição que caracterizou o recém concluído século XX” (SILVA
SANCHES, 2002, p. 36).
Ademais, o avanço dos
meios de comunicação e tecnológicos, como internet, têm aumentado o sentimento
de insegurança subjetiva4 com notícias que atuam como multiplicador de notícias de
crimes, catástrofes e conseqüente ânsia de repressão penal e de tal modo que “a segurança se
converte em uma pretensão social à qual se supõe que o estado e, em particular,
o Direito Penal, devem oferecer uma resposta” (SILVA SANCHES, 2002, p. 40).” Parte-se do
axioma de que há de existir um terceiro responsável a quem imputar o fato e
suas conseqüências, verdadeira expansão da imputação.
A sociedade de risco,
traçada como o modo social pós-industrial aparece caracterizada por um âmbito
econômico variante e avanços tecnológicos na indústria, sistema financeiro,
informática, genética e outros com repercussões diretas a cada indivíduo (SILVA
SANCHES, 2002, p.28). A denominada sociedade de risco pode ser vista como
riscos a danos não delimitáveis “riscos globais e com freqüência, irreparáveis;
que afetam todos os cidadãos; e que surgem de decisões humanas (BECK, 1993, p.
19).
A idéia de uma sociedade
de risco é diretamente ligada à globalização e sociedade pós-industrial, ligada
às mudanças históricas como ocorrência de guerras, crise econômica, abertura de
mercado de capitais, aumento de atividades industriais, riscos ao meio ambiente
e, formação de atividades criminosas organizadas. “A sociedade
pós-industrial é, além da ‘sociedade de riscos’ tecnológicos, uma sociedade com
outras características individualizadoras que contribuem à sua caracterização
como uma sociedade de ‘objetiva’ insegurança. (SILVA SANCHES,
2002, p.30)”.
Os modelos sociais
pós-industriais têm ligação direta com a globalização econômica, com fenômenos
econômicos5 que se definem pela
eliminação de restrições às transações comerciais e ampliação dos mercados.
Os fenômenos econômicos
e integração econômica deram lugar à aparição de novas formas de delito,
gerando uma delinqüência relacionada a interesses financeiros, criminalidade
organizada e “criminalidade dos poderosos”, a macrocriminalidade. (SILVA
SANCHES, 2002, p. 80):
(...) Infatti l´epoca della globalizzazione è anche l´epoca
della insicurezza quotidiana e della sicurezza individuale e collettiva
perseguita com ogni mezzo, poichè calamità e catastrofi non mancano e le
irrisolte situazioni di tensione política, etnica e religiosa diffondo in tutti
i paese pericoli e rischi per La sicurezza, ma anche per La tutela dei diritti
fondamentali e del costituzionalismo democrático6.(MOCCIA, p. 34)
Com as inúmeras
variações sócio-econômicas na atualidade, a “sociedade de riscos”, trouxe uma
verdadeira inflação legislativa na qual o processo penal tem caráter
intimidador, simbólico e que dá origem à respostas autoritárias.
O tema da emergência no
processo penal tem relevo atual, em virtude dos contornos de violência da
macrocriminalidade. “O fenômeno da ‘criminalidade de massas’, no sentido de crimes que
possam ofender todos os cidadãos determina que o outro se mostre muitas vezes
como um risco, dimensão da própria sociedade de risco”. (SILVA SANCHES,
2002, p.32):
a globalização dirige ao Direito Penal demandas fundamentalmente
práticas, no sentido de uma abordagem mais eficaz da criminalidade (...).
Trata-se mais que nada, de responder a exigência do poder político ou das
instâncias de aplicação judicial do Direito, impotentes na luta dos
ordenamentos nacionais contra a criminalidade transnacional. (SILVA SANCHES,
2002, p. 76)
A exigência de responder
à macrocriminalidade tem se concebido em questões punitivistas. Afirmação esta
fundada nas características da sociedade de risco, diante no novo modelo de
criminalidade que cria “forte sensação de insegurança” e, em argumentos de
déficit de aplicação da legislação penal, uma vez que são condutas não
abrangidas ou esperadas no direito penal clássico. “La paura e l´incertezza per
la stessa sopravvivenza delle persone e dei loro beni sono sentimenti che si
diffondono dagli elettori agli eletti secondo uma lógica fisiologica típica do
ogni Stato Democratico (...).”7 (BONETTI, 2006, p. 24)
a delinqüência da globalização é econômica, em sentido
amplo (ou em todo caso, lucrativa, ainda que se ponham em perigo outros bens
jurídicos). Isso significa que a reflexão jurídico-penal tem pela primeira vez
como objeto essencial de estudo de delitos claramente diversos do paradigma
clássico ( o homicídio ou a delinqüência patrimonial tradicional). Trata-se de
delitos qualificados criminologicamente como crimes of the powerful; de delitos
que têm uma regulação legal insuficientemente assentada; e de delitos cuja
dogmática se acha parcialmente pendente de elaboração. E tudo isso há de redundar
em uma configuração dos mesmos sobre as bases significativamente diversas
daquelas do Direito Penal clássico (...) (SILVA SANCHES, 2002, p. 77)
A doutrina caracteriza a
criminalidade da globalização com duas características mais marcantes:
Por um lado, trata-se de uma criminalidade organizada. Vale
dizer, nela intervêm coletivos de pessoas estruturadas hierarquicamente, seja
nas empresas, seja na forma estrita da organização criminal. A dissociação que
isso produz entre execução material direta e responsabilidade determina, ainda,
que o resultado lesivo possa aparecer significativamente separado, tanto no
espaço como no tempo, da ação dos sujeitos mais relevantes no plano delitivo”
Em segundo lugar “Do ponto de vista material, a criminalidade da globalização é
criminalidade de sujeitos poderosos, caracterizada pela magnitude de seus
efeitos, normalmente de desestabilização geral dos mercados, assim como de
corrupção de funcionários e governantes, são traços da mesma forma notáveis
(SILVA SANCHES, 2002, p. 80)
“O progresso
técnico dá lugar, no âmbito da delinqüência dolosa tradicional, a adoção de
novas técnicas como instrumento que lhe permite produzir resultados
especialmente lesivos (...)”.(SILVA SANCHES, 2002, p.
29). A criminalidade, associada aos meios informáticos e à internet é
seguramente, grande exemplo de tal evolução.
Desta forma, com o
argumento de amparar os perigos da macrocriminalidade, cada vez mais ganhou
espaço a legislação penal de emergência8, legislação que é produto da sociedade de risco, daqueles
que clamam por um maior número de condutas incriminadas, pelo aumento das
penas, pelo endurecimento das regras de execução penal, pela implementação do
direito penal do inimigo, têm cada vez mais ressonância na sociedade, com a
afirmação de que o processo penal não busca a garantia da norma, mas a
eliminação de um possível perigo futuro, um inimigo da sociedade9 (JACKOBS, 2008).
Essa concepção da emergência outra coisa não é que a idéia
do primado da razão de estado sobre a razão jurídica (...). Ela equivale a um
princípio normativo de legitimação da intervenção punitiva: não mais jurídica,
mas imediatamente política; não mais subordinada à lei enquanto sistema de
vínculos e garantias, mas a essa supraordenada. (FERRAJOLI, 1992, p.650).
A noção do que hoje vem
sendo tratado como legislação de emergência não possui uma única definição
objetiva, já que a globalização possui diferentes conseqüências nos vários
países, o “reclamo pela intervenção penal’ acaba por ter fundamentos diversos:
Incerta è la nozione giuridica di emergenza e sembra in
parte differenziarsi da paese a paese. Nei diversi ordinamenti giuridici spesso
non se dà una definizione giuridica o comunque Il termine è accostato ad altri
che consentono di qualificarne meglio Il contenuto nella concreta situazione.10 (BENETTI, 2006, p.
61)
Não obstante a
dificuldade de definição objetiva da emergência, esta é diretamente ligada às
situações de riscos iminentes e de perigos à sociedade, não solucionáveis pelas
normas até então existentes:
Si può cosi tentare di definire ‘emergenza’ ogni situazione
nella quale le norme giuridiche vigenti si rivelano inadeguate a rimediare alle
lesioni o ai pericoli di lesiose grave ai principi fondamentali
dell´ordenamento, che provengono da accadimenti naturali o da comportamenti
umani imprevisti o imprevedibili: tra tali eventi vi sono le guerre, le guerre
civili, le crisi economiche, le catastrofi naturali e i disastri ambientali, le
varie forme di criminalità organizzata, tra le quali spicca quella terroristica.
IL fatto emergenciale non necessariamente è um fatto nuovo, ma comunque mette
in crisi ogni ordinamento giuridico, quale sistema di norme destinate a
regolare pro futuro um numero indeterminato di fattispecie concrete, che
pertanto si rivela indeguato a provvedere per prevenire o rimediare agli
effetti da Esso prodotti che appaiono lesivi di Beni costituzionalmente
gatantiti.11 (BENETTI, 2006,
p. 61)
O reclamo pela
intervenção penal em condutas até então não amparadas penalmente, a fim de
responder aos anseios da massa e sentimento de insegurança, são intervenções
pontuais, urgentes e, por isso, acabou por partir de legislações especiais e
emergenciais.
Diante dessa auto
compreensão da sociedade como vítima em potencial, há uma verdadeira “ojeriza”
às figuras do direito penal clássico, reclamando não um procedimento garantista
e processo constitucional, mas uma questões que lhe levam a uma sensação de
segurança, formas de aplicação penal preventiva, flexibilização de regras de
imputação e relativização de garantias (SILVA-SANCHES, 2002, p. 75), reclamo
por prisões e rigidez na legislação penal. Surgem assim:
“modelos de justiça negociada, nos quais a verdade e a
justiça comum ocupam, quando muito, um segundo plano. A penetração na idéia de
justiça negociada é muito profunda e tem manifestações muito diversas, nem
sempre coincidindo com seus partidários. Assim, compreende desde os pactos de
imunidade das promotorias com certos imputados, até as diversas formas de
mediação (...) o direito penal aparece como mecanismo de gestão eficiente”
(SILVA SANCHES, 2002, P. 69)
Essa maior intervenção
penal acabou por gerar uma expansão do direito penal, imediatamente diversa
daquela idéia de direito penal garantista, minimalista e de “ultima ratio”.
A expansão do
direito penal diante do emergencialismo, para responder aos anseios sociais,
traz uma verdadeira “hipertrofia legislativa”. Uma vez que o direito penal
clássico não tratava das condutas de uma macrocriminalidade organizada o fez na
tentativa de incriminar novas condutas que podem trazer riscos, perigos
futuros.
Do criminoso comum, que
praticava crimes com o uso de violência, como homicídio, de forma individual e
atingindo bens jurídicos individuais, passou-se a tratar de crimes que atingem
bens jurídicos supra-individuais, crimes relacionados ao poderio econômico,
crimes de colarinho branco, crimes praticados por organização criminosa em que
passou a haver verdadeira “atividade laboral” com divisão de tarefas e
remuneração, características que se passou a chamar de macrocriminalidade, com
atos cada vez mais complexos:
O paradigma do Direito Penal clássico é o homicídio de um
autor individual(...) O paradigma do Direito Penal da globalização é o delito
econômico organizado tanto em sua modalidade empresarial convencional como nas
modalidades da chamada macrocriminalidade: terrorismo, narcotráfico ou
criminalidade organizada. (SILVA SANCHES, 2002, p. 93)
No caso dos crimes
comuns, uma vez que o criminoso, seja provisoriamente ou em virtude de sentença
condenatória, tenha sua liberdade privada, retirado do convívio social, parece
gerar maior segurança e, verdadeira “satisfação” com a conseqüência penal. Mas,
numa “sociedade de risco” as condutas são diferenciadas. Fala-se de bens
supra-individuais e que, diante da própria natureza, geram uma insegurança e
visão de risco iminente ante a sociedade:
A delinqüência da globalização é a delinqüência econômica,
à qual se tende a assinalar menos garantias pela menor gravidade das infrações,
ou é criminalidade que pertence ao âmbito da legislação denominada legislação
“excepcional. À qual se tende assinalar menos garantias pelo enorme potencial
de perigo que contém” (SILVA SANCHES, 2002, p. 94)
Tal afirmação é ratificada
pelo aparato criminal na globalização, criminosos que detém, diante do poder
econômico, verdadeiro aparato tecnológico, praticam crimes cujos vestígios
desaparecem pela complexidade dos atos e, acabam por aumentar a noção de
insegurança:
Em primeiro lugar, merece ser destacada a introdução dos
delitos contra a ordem sócia econômica, formas de criminalidade organizada ou a
nova regulação dos delitos relativos à ordenação do território e dos recursos
naturais; em segundo, o desaparecimento das figuras complexas do roubo com
violência e intimidação das pessoas que, surgidas no marco da luta contra
o’bandoleirismo’, devem desaparecer deixando passo à aplicação das regras
gerais. A vinculação do primeiro aspecto com as novas ‘necessidades’ de tutela
penal de uma sociedade complexa resulta bastante clara, segundo o discurso
doutrinário e ideológico que está consagrado como dominante (SILVA SANCHES,
2002, p. 22).
A visão da sociedade na
aplicação do direito penal nesses casos, não é como a do criminoso comum, pois,
tanto diante da natureza dos bens jurídicos, diante da complexidade de atos
praticados por uma organização criminosa, há maior dificuldade na persecução
penal.
Fala-se de bens que
podem atingir a coletividade, fala-se de crimes de difícil persecução e, por
isso, fala-se de um sentimento de insegurança social com um anseio pela
intervenção penal, forma simbólica de satisfazer esse sentimento de medo e
incerteza. Se com o homicida preso, fora do convívio social a sociedade se
sente segura, no caso da sociedade de risco, esta é a mesma exigência, de maior
intervenção penal, que lhes forneçam a sensação de segurança:
Diante da característica econômica dos fenômenos da
globalização, o Direito Penal no século XIX concentra-se na delinqüência
econômica ou organizada e em modalidades delitivas conexas. Um Direito Penal
como eminentemente prático, “Direito Penal de duas velocidades” no sentido de
que “trata-se de proporcionar uma resposta uniforme ou, ao menos harmônica à
delinqüência transnacional, que evite a conformação de ‘paraísos jurídico
penais’. A existência de tais ‘paraísos’ resulta problemática, especialmente
quando se trata de combater uma modalidade de delinqüência na qual a
intervenção dos principais responsáveis das organizações pode estar significativamente
distanciada do lugar e momento dos atos de execução. (SILVA SANCHES, 2002, p.
81)
Seguindo tal raciocínio,
com a globalização surge uma nova figura de criminoso, uma “nova criminalidade”
que passa a praticar condutas até então não amparadas pelo direito penal.
Sociedade de risco, insegurança social, falta de tipificação de condutas,
pontos de partida para a compreensão do emergencialismo penal. A sociedade que
passou a ter a sensação de perigo iminente reclama intervenções emergenciais,
intervenções que diminuam o sentimento de risco e insegurança, intervenção
penal.
“Infatti le norme penali previste in um ordenamento
giuridico democratico per sanzionare atti di terrorismo o di minaccia all´a
democrazia hanno almeno de aspeti peculiari: da um lato sono funzionali non
soltanto a prevenire e a reprimere eventuali lesionni ai diritti fondamentali e
ai principi supremi dell´ordinamento costituzionalmente provisti, ma anche a
risocializzare il reo ad uma convivenza sociale tipica di ogni sistema costituzionale
democratico che ammete ogni azione politica purchè sai svolta com metodi
pacifici, e dall´altro lato cosistono comunque in misure che limitano a loro
volta i diritti fondamentali costituzionalmente garantiti di alcune persone, Il
che può produrre però rilevanti effetti sul funzionamento effettivo dell´intero
sistema democrático12” (BONETTI, 2006, p. 45)
Porém, juntamente com
essas idéias garantistas, o mundo ocidental vive em uma sociedade de risco.
Denominação esta diretamente ligada à globalização e à sociedade pós
industrial, mudanças históricas nas quais se pode citar a ocorrência de
guerras, crise econômica, abertura de
mercados de capitais, proliferação de atividades industriais, riscos ao
meio ambiente e atividades praticadas por organizações criminosas.
All´origine si pone um legittimo, progressivo aumento
dell´attenzione nei confronti di beni colettivi che, sovente, tra di loro si
intersecano e risultano legati all´evoluzione tecnológica, Del sistema
econômico e della struttura sócio-statuale. È emersa uma valutazione più attenta da parte dei
consociati dei ‘nuovi’ fenomeni criminali, (...) uma consapevolezza più matura,
Che è própria Del corretto esercizio delle liberta economiche, nonchè di un´equilibrata
discipina dei fattori di produzione e dei meccanismi idonei a garantire uma
razionale ed equa distribuizione dei redditi, um corretto ed equilibrato
sistema fiscale Ed uma produttiva utilizzazione Del gettito dei tributi13.(MOCCIA, p. 31)
Quando se fala do
criminoso comum, pensando-se na possível conseqüência de prisão cautelar ou de
uma sentença penal condenatória com conseqüente privação da liberdade, acaba-se
por gerar o sentimento de “segurança”, na sociedade, uma vez que o “criminoso”
foi “retirado” do convívio social. Na chamada sociedade de risco, as condutas são diversas, em que se fala de bens
jurídicos supra-individuais, como a ordem econômica, o meio ambiente, o sistema
financeiro.
Na sociedade de risco,
ao se falar da possível ofensa a bens jurídicos supra-individuais, existe o
sentimento de um perigo iminente, uma sensação de insegurança social em que a
coletividade se identifica cada vez mais, com a vítima.
Tal argumento é
ratificado pelo aparato criminal existente na sociedade pós-industrial,
criminosos que possuem poder econômico, que detém aparato tecnológico e, a
sensação de segurança que a sociedade detinha,com a punição do criminoso comum,
deixa de existir.
Pode-se falar que a
sensação de segurança deixa de existir por inúmeros motivos, que podem ser
delimitados tanto com a natureza dos bens jurídicos, diante da complexidade de
atos praticados por organizações perigosas, características que tornam a persecução
penal cada vez mais difícil.
Da cio che si qui approfondito appare evidente la tendenza
recentemente sviluppatasi nell´ambito degli stato democratici ad asasperare
l´esigenza dei cittadini di chiedere ed ottenere daí pubblici poteri
provvedimenti di tutela della sicurezza, quase si tratti di um modo nuovo e più
efficace per assicurare tutela ai diritti fondamentali di ogni persona messi in
pericolo dalle incertezze della vita sociale Ed Internazionale, daí potenziali
conflitti bellici, e sopprattutto, per cio che in questa sede interessa, daí
pericoli derivanti da situazioni emergenzilai o da minacce terroristiche14. (BONETTI, 2006,
p. 47)
Na sociedade
globalizada, fala-se de bens jurídicos que atingem toda a sociedade, bens supra
individual, de difícil individualização das condutas e de difícil punição,
fazendo com que a sensação de insegurança tome conta da sociedade. Tal
sentimento leva a sociedade de risco à visão de que só o direito penal poderia
trazer respostas efetivas e, de devolver a sensação de segurança que a
sociedade tanto reclama.
A partir daí,
percebendo-se que a sociedade pós-industrial mudou, a globalização trouxe um
novo criminoso, em que as condutas não
caracterizam crimes violentos ou que atingem bens jurídicos individuais, mas
que praticam condutas que são reflexo de seu poderio econômico, e, em grande
maioria, ainda não previstas no âmbito penal.
Infatti, ai profili di carattere emergenziale che Il
diritto penale esprime in rapporto ai fenomeni di criminalità a cui si è già
accennato, che sembrano rappresentare momenti conguinturali di crisi, si
aggiungono carenze e disfunzionalità di carattere stratturale, relative, in
particolar modo, al diritto sostanziale, riassumibili nel panpenalismo e nel
suo recíproco della mancata razionale depenalizzazione15. (MOCCIA, 2000, p.
9)
Sociedade de risco,
insegurança, falta de tipificação de condutas, ponto de partida para o que veio
a ser chamado de emergencialismo penal. A sociedade de risco, com o sentimento
de perigo iminente, com a sensação de necessidade de medidas urgentes reclama
por uma aplicação penal de emergência. Reclama-se a intervenção penal pois são
fatos que podem atingir toda a coletividade, fatos não controláveis, fatos até
então não puníveis e, por tudo isso, que reclamam urgência no “controle”.
El debate original sobre el derecho penal de la sociedad
del riesco parte de la constataciòn de um conjunto de realiades sociales que se
prodrìan, quizàs, sintetizar em três grandes bloques: por um lado, la
generalizaciòn em la sociedad moderna de nuevos riesgos, afectantes a amplios
colctivos, y que podrìan ser calificados com artificiales em cuanto producto de
nuevas actividades humanas, em conreto, serìan consecuencias colaterales de la
puesta praáctica de nuevas tecnologias em muy diversos âmbitos sociales; tales
riesgos resultan de difícil anticipaciòn y suelen basarse em fallos em el
conocimiento o manejo de las nuevas capacidades técnicas. (...) a la ya citada
probelmática prevision de su aparición. Se añade la realidad de unas actividades
generadoras de riesgos que se entrecruzan unas com otras, de manera que el
control del riesgo no solo escapa al domínio de uno mismo, sino que tampoco
está claro em manos de quién está; se hacen ineludibles critérios de
distribuición de riesgos que no satisfacen plenamente las exigências de
imputación de responsabilidad. Finalmente, em la sociedad se há difundido um
exagerado sentimento de inseguridad, que no parece guardar exclusiva
correspondência com tales riesgos, sino que se vê potenciado por la intensa
cobertura mediática de los sucesos peligrosos o lesivos, por las dificuldades
com que tropieza el ciudadano médio para comprender el acelerado cambio
tecnológico y acompasar su vida cotidiana a el, , y por la extendida percepción
social de que la moderna sociedad colectiva. Em suma, todo esse conjunto de
factores activa demandas de intervenciones socioestatales que permitan
controlar tales riesgos y aplacar tales temores, y a eso se aplica, entre otros
mecanismos sociales, la política criminal.16 (BENETTI, 2006, p.
556)
A fim de responder aos
“anseios sociais” e diminuir o sentimento de insegurança, a aplicação penal
partiu de leis esparças, já que se fala de situações até então não previstas,
leis penais para abrangência de situações pontuais, leis que “acalmariam” a
sociedade de risco.
A su vez, la política criminal que pretenderia dar
respuesta a esa sociedad del riesgo podría evocarse a partir de cuatro grandes
rasgos: Em primer lugar, uma notable ampliación de los âmbitos sociales objeto
de intervención penal, la cual pretenderia incidir sobre nuevas realidades
sociales problemáticas, o sobre realidades sociales preexistentes cuya vulnerabilidad se habría
potenciado; entre los sectores de intervención preferente, habría que citar la
fabricación y distribuición de productos, el médio ambiente, los nuevos âmbitos
tecnológicos, como el nuclear, informático, genético..., el orden
sócio-económico y las actividades encuadradas em estructuras delictivas
organizadas, com especial mención de los tráficos ilícitos de drogas. Em
segundo lugar, uma significativa transformación del Blanco de la nueva política
criminal, que concentraria sus esfuerzos em perseguir la criminalidad de los
poderosos, únicos sectores sociales capaces de desarrollar tales conductas
delictivas y que hasta entonces dificilmente entraban em contacto com la
justicia penal (BENETTI, 2006, p. 557)17.
Essa maior intervenção
trouxe o que veio a se chamar de expansão do direito penal, idéia imediatamente
inversa à concepção do direito penal como “ultima ratio” e, um distanciamento
cada vez maior de um direito penal garantista. (...)“hemos
entrado em uma dinâmica que tiende a superar el hasta hace poco indiscutido
modelo garantista y a substituirlo por outro al que he denominado el modelo penal
de la seguridad ciudadana” 18 (MELIÀ, 2006, p. 553).
A expansão do direito
penal, diante do emergencialismo, cria a “hipertrofia” dos sistema penal. Uma
vez que o direito penal clássico não abrangia tais condutas, condutas
relacionadas à macrocriminalidade organizada, o fez na tentativa de incriminar
condutas que podem trazer riscos à sociedade. O direito penal na sociedade de
risco tenta coibir condutas em que possa haver um perigo futuro, diante da
dificuldade de individualizar condutas em crimes complexos e relacionados à
organizações criminosas, passa-se a prestigiar formas de responsabilidade
objetiva:
Abbiamo assistito ad uma significativa estenzione
dell´intervento penale Che, da um lato, si è diffuso in ambiti considerati
tradizionalmente quase ex lege- criminalità Del ceto político-amministrativo e
imprenditoriale, anche di altíssimo livello- e, dall´altro, há dovuto
fronteggiare Il dilagare della criminalità organizzata purê AL di fuori delle
zone di origine, Che há finito com l´assumere dimensioni inquietanti.19” (MOCCIA, P.2-)
Na criminalidade
organizada e, conseqüência de uma sociedade de risco, como característica da
relativização das regras de imputabilidade “tende a prevalecer formulas de não
distinção entre autoria e participação” uma verdadeira responsabilidade
objetiva no âmbito penal “que já se verifica no plano da pura tipificação se se
examinam os tipos delitivos em matéria de tráfico de estupefaciente, de lavagem
de dinheiro. (SILVA SANCHES, 2002, p. 93
A idéia do objeto do
direito penal como forma de proteção aos bens jurídicos fundamentais e o
surgimento de novas realidades têm consubstanciado o surgimento de leis penais
continuadamente havendo um clamor geral
de que os riscos da sociedade sejam abrangidos ou agravados com novas leis
penais (SILVA SANCHES, 2002, p.19). A sociedade parece tender, a marchas
forçadas, a aplicar também aqui o
critério de “tolerância zero. (SILVA SANCHES, 2002, p. 101).
No emergencialismo,
conforme depreende a doutrina, garantia e eficiência têm sentidos, pois, a
legislação no seu próprio conteúdo relativiza tais garantias, tudo, em nome da
“eficiência”, do desenvolvimento de uma sensação de segurança:
Garanzie individuali ed efficienza del controllo sembrano
oggi costituire i termini, constrastanti, di uma proprosizione dialettica. Ma
um tale assunto, in rapporto al nostro constesto ordinamentale, di democrazia
fondata sui principi dello stato sociale di diritto, è senz’altro falso e la
dimostrazione è agevole (...) Garanzia ed efficienza, infatti, nello stato
sociale di diritto, lugi dal porsi antiteticamente, rappresentano, congiunte,
degli elementi essenziali di riferimento a cui dev’essere informato il
perseguimento delle legittime istanze di controllo sociale. In realtà, lo stato
sociale di diritto- felice sintesi di componenti liberali e solidaristiche-,
sul piano dell’impegno a favore dei diritti dell’individuo, tende ad
assicurare, rendevole effetive, garanzie di tipo formale e sostanziale; cosi
come, sul piano della tutela di beni fondamentali, si preocuupa della difesa
sai di tradizionali interessi individuali che di emergenti interessi
superindividuali. Cio significa, in termini di política criminale, l’adozione
di strategie di controllo di fatti socialmente dannosi che, nell’assoluto
rispetto di prerogative di liberta e dignità della persona, risulti ispirata,
contestualmente, a criteri di razionalità ed efficienza. (MOCCIA, 2000, p.1) 20
Justificando
ocorrência de fatos novos e mudanças na proteção aos bens jurídicos:
Ebbene, a noi pare Che anche in rapporto a fenomeni
socialmente dannosi di emersione ‘postmoderna’- si pensi solo a sofiticate
aggressioni all´ambiente, purê nelle sue implicazioni relative a vita Ed
integrità personale, o ad azioni lesive dello stesso ordine
econômico-finanziario- cosi come avveniva per i loro ‘antenati premoderni’, se
‘astrarre’ uma condotta, um evento, um titolo d´imputazione oggetiva, um
disvalore personale e, quindi, affidare l´accertamento processuale della
vicenda concreta a parametri probatori di sperimentata efficacia nella loro
estrema semplicità21.(MOCCIA, p. 21)
Hoje há uma tendência
claramente dominante no sentido de introdução de novos tipos penais,
agravamento dos existentes, ampliação de novos espaços vistos como
jurídico-penalmente relevantes, flexibilização das regras de imputação e
verdadeira “expansão” da aplicação de sanções penais (SILVA SANCHES, 2002, p.
21).
Como salientado, de
forma a satisfazer o medo e o risco, o direito penal passa a ter caráter
simbólico, sofrendo mudanças também em relação aos tipos penais. Uma vez que,
diante da preocupação de proteção aos riscos, as condutas tipificadas passaram
a amparar, em sua grande maioria, crime de perigo abstrato e formais. “Os delitos de
resultado se mostram crescentemente insatisfatórios havendo o uso cada vez maior de tipos de perigo e
tipos com configuração cada vez mais abstrata ou formalista”. (SILVA SANCHES,
2002, p.31):
Tutto cio há determinato non solo um ampliamento
quantitativo, ma anche uma modificazione qualitativa; non soltanto è cresciuto
Il numero delle fattispecie, ma ne è mutata anche La struttura, cambiando, di
consequenza, anche i moduli di intervento; La caratteristica più evidente di
queste è data dalla lontananza dall´offesa al bene; esse assumono il carattere
della mera violazione formale. Sotto Il profilo della técnica di normazione, si
assiste all´assunzione di uma técnica casistica e/o di rinvio, Che testimonia
um inquietante declino dei moduli normativi della tipizzazione/astrazione.
(MOCCIA, 31)22.
Assim, A visão do
direito penal como único instrumento eficaz de pedagogia político-social, como
mecanismo de socialização, de civilização, supõe uma expansão ad absurdum da
outrora “ultima
ratio”.
Mas, desde já, no
âmbito material, “tal expansão é em boa parte inútil, na medida em que transfere ao
Direito Penal um fardo que ele não pode carregar. Isso, mesmo se mantido um
modelo mais ou menos análogo ao clássico de garantias e regras de imputação”. E, com maior
razão, se tal modelo sofrer fraturas que o desnaturalizem por completo. Pois
ocorrem fenômenos (os chamados ‘macroproblemas: grandes questões
sociopolíticas) cujo caráter macroscópico, estrutural ou sistêmico faz com que-
e ainda que se possa identificar neles uma natureza globalmente ‘criminal’- o
direito penal não se constitua então conceitualmente- no mecanismo adequado
para uma abordagem razoalmente satisfatória dos mesmos. O debate acerca do “Zukunftssicherung”, isto é, da “atribuição ao
Direito Penal da responsabilidade de proteger os interesses fundamentais das
gerações futuras sobre a terra, é um exemplo suficientemente ilustrativo a esse
respeito”. (...)
(SILVA SANCHES, 2002. P. 62):
Somente os cínicos podem aceitar que a legislação penal
contra macrocriminalidade já ultrapassou o ‘Rubicon’ da vinculação pelos
princípios tradicionais e pode em seguida dar azo a ‘ luta’ contra as
percebidas mega ameaças, e sem atenção ao lastro dos formalismos do estado de
Direito: mediante intervenção profilática que não espera a produção de lesões
de direitos; mediante responsabilidade coletiva que renuncia a imputação
individual; mediante inversão do ônus da prova e delitos de mera suspeita que
desprezam a presunção de inocência e o princípio in dúbio pro reo; mediante a
dotação das instituições de persecução penal de competências análogas a dos
serviços secretos, que somente podem ser controladas judicialmente de modo
limitado. (SILVA SANCHES, 2002, p. 68)
As peculiares exigências
da reação jurídico-penal à delinqüência própria de um e outro campo parecem
capazes de acentuar substancialmente as tendências que, “como já foi
dito, se acham patentes nos ordenamentos jurídicos nacionais, no sentido de uma
demolição do edifício conceitual da teoria do delito, assim como o do
constituído pelas garantias formais e materiais do Direito Penal e do Direito
Processual Penal”. (SILVA-SANCHES, 2002, p. 75).
Ratificando tal
afirmação:
In questo momento storico si è invece, consolidato a
livello legislatico, ma anche nella prassi, um habitus di tipo emergenziale
dalle origini risalenti, collegato, attualmente, all´a lotta contro gravi e
difuse forme di criminalità, dei colletti Bianchi ed organizzatta, Che non pio
non destare preoccupazione in rapporto All´a difesa dei diritti dell´individuo.
Quali limiti a difesa dell´uomo contro le sopraffazioni statuali, Le garanzie
rappresentano, infatti, l´espressione più significativa di que lingo e
tormentato processo evolutivo che há caratterizzato lo svolgersi della civiltà
giuridica contemporânea. Non è possibile, pertanto, in uma struttura
ordinamentale di democrazia avanzata, al fine di porre rimedio a turbative,
anche gravissime, della compagine sócio statuale, espressive di una profonda
crisi di legalità, endo- ed extraistituzionale, adottare rimedi normativi e
prassi giurisprudenziali, che finiscono com Il far scivolare La struttura
ordinamentale verso preoccupanti forme di arbítrio, Che hanno sempre
caratterizzato i momenti più difficili per Le ragioni dell´individuo23.(MOCCIA, 2000, p.2
)
Apesar da sociedade de
risco busca uma resposta no direito penal, “a eficácia preventiva do Direito Penal se
assenta no desconhecimento por parte da sociedade dos concretos mecanismos por
meio dos quais o Estado reage contra o delito”(SILVA SANCHES
p. 72):
Il diritto penale è, empate, uno stramento notevole di
coesione e di credibilità dell´ordinamento giuridico nel suo complesso,
rilevante sai dal punto di vista individuale che collettivo, ma a condizione
che i suoi interventi risultino caratterizzati dall´integrale rispetto delle
regole del gioco. La riflessione giuridica sull´emergenza e sul terrorismo, e
sul loro rapporto com i principi fondamentali del constituzionalismo
democrático non è mai finita in quei paesi la cui forma di Stato si ispira a
tali principi24. (MOCCIA, p. 34)
Por isso, o “Direito
penal de riscos”, além de acabar por ter uma caráter meramente simbólico, acaba
por relativizar uma seria de direitos e garantias fundamentais, incompatíveis
com o momento de evolução da sociedade em direção a formas cada vez mais
complexas, que rompeu o equilíbrio dualista entre o Estado e cidadãos,
favorecendo o surgimento de múltiplos direitos e garantias (BARACHO, 1984,
p.125), repudiando sistemas penais autoritários ou totalitários, do tipo opressivo fundados em
apriorismos ideológicos e radicais.
A expansão do direito
penal, dentre outros abusos, diante da dificuldade de responsabilização e
individualização de condutas acaba por trazer graves conseqüências também no
âmbito processual penal, como objeto desse trabalho, na imputação alternativa
nos crimes praticados por organização criminosa.
A visão do direito penal
“máximo” como único instrumento capaz de solucionar os problemas
político-sociais supõe essa expansão, transferindo ao direito penal “um fardo
que ele não pode carregar”.
___________________________
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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________________.
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SUTHERLAND, Edwin H. Is “White-Collar Crime” Crime?, in American. Sociological
Review, n. 10 (1945), p. 132-139. 14.
____________________
1 O termo “expansão” do direito penal foi tratado pelo autor Jesús-María
Silva Sánchez em fevereiro de 1999, em obra que possui o título “A expansão do
Direito Penal: Aspectos da política criminal nas sociedade pós industriais,
para o autor: “Com a Sociedade de Risco, com o conjunto de fenômenos sociais,
jurídicos e políticos vem experimentando o direito penal e processual penal um
acúmulo de efeitos, que configuram o que convencionamos chamar “expansão”, com
características, dentre outras, da flexibilização de garantias constitucionais
e de regras de imputação(...) “a modificação da própria estrutura e do conteúdo
material dos tipos penais é a sua primeira expressão”(...)”uma transição rápida
do modelo de “delito de lesão a bens jurídicos individuais ao modelo ‘delito de
perigo presumidos para bens supra-individuais”(..)(SILVA SANCHES, 2002, p. 113)
2 O termo “hipertrofia” penal foi utilizado em artigo
publicado em 1898, por Reinhart Franck, salientando que o uso da pena e das
tipificações das condutas tem sido abusivo, e por isso perdeu parte do seu
crédito e, portanto, de sua forma intimidadora, já que o corpo social deixa de
reagir do mesmo modo que o organismo humano não reage a um remédio administrado
abusivamente. (FRANCK, Reinhart apud LUISI, 2003. p 42. ) Ratificando tal
afirmação: Na “hipertrofia penal”, podemos citar expressamente a criação de
inúmeras leis no âmbito econômico como no caso dos crimes contra a ordem
econômica; dos crimes contra o sistema financeiro; dos crimes de lavagem de
dinheiro e, todas, com uma característica em comum, a macrocriminalidade. Na
legislação penal para “amparar” condutas até então atípicas, deu-se lugar à
excessiva extensão da legislação penal, como se fosse o único meio para
combater “qualquer força hostil que se pusesse em contradição com a ordem
jurídica”. (LUISI, 2003, p. 41).
3 Tal expressão é
utilizada por Silva Saches ao caracterizar a expansão do direito penal
relacionando a sociedade de risco à fenômeno psicológico social e multiplicação
emocional do risco
4 Vale ilustrar que
tal sentimento de insegurança também acaba gerando um fenômeno de identificação
social com a vítima, o que também fundamenta o reclamo pela intervenção penal.
A criminalidade organizada, a criminalidade das empresas, do meio ambiente, a
criminalidade dos poderosos, que hoje preside as discussões acadêmicas acaba
por trazer uma representação
social do delito e a mencionada contemplação do cidadão como vítima em
potencial (SILVA SANCHES, 2002, p.50, 54)
5 “Tratando-se da
sociedade chamada de risco, além dos fenômenos econômicos, vale justificar a
mencionada sensação de insegurança com o incremento dos bolsões de
marginalidade nas sociedades ocidentais, os movimentos migratórios, a
globalização das comunicações”. (Tradução Livre)
6 “Assim, a época da globalização é também a época da
insegurança cotidiana e da segurança individual e coletiva, perseguida por
vários meios, uma vez que fatalidades e catástrofes não faltam e a situação não
solucionadas de tensão política, étnica e religiosa difundem em todos os países
perigos e riscos, mas também pela tutela de direitos e garantias fundamentais”.
(Tradução Livre)
7 “O medo e a incerteza pela sobrevivência das pessoas e de
seus bens são sentimentos que se difundem dos eleitores aos eleitos segundo uma
lógica típica de cada estado democrático. (Tradução Livre)
8 Nesse sentido, “dal punto di vista giuridico l´emergenza o
Il fatto emergenziale non è altro che um presupposto funzionale all´attivazione
di particolare strumenti giuridici predisposti per tali evenienze.” (BENETTI,
2006, p. 62)
9 O direito penal do inimigo será tratado em capítulo
próprio, mas, desde já, para maior
compreensão, no mesmo sentido, FERRAJOLI define o direito penal do inimigo,
termo utilizado por Günther Jackobs em obra com o mesmo título: “Dobbiamo allora domandarci: di che cosa stiamo discutendo quando
parliammo di ‘diritto penale del nemico’? del ‘paradigma del nemico nel diritto
penale? Io credo che dobbiamo riconoscere com assoluta fermezza che stiamo
parlando di um ossimoro, di uma contradizione in termini, che rappresenta, di
fatto, la negazione del diritto penale, la dissoluzione del suo ruolo e della sua intima essenza, dato che la
figura del nemico appartiene all' alógica della guerra, che del dirritto é la
negazione, cosi come il diritto è la negazione della guerra.”(FERRAJOLI, 2006, p. 799).
10 “Incerta é a noção
jurídica de emergência e parece ter características diferentes em cada país.
Nos vários ordenamentos jurídicos com freqüência não se dá uma definição
jurídica ou normalmente o termo é ligado a conceitos que a qualificam de acordo
com cada caso concreto”(Tradução Livre).
11 “Assim, pode-se
tentar definir emergência como cada situação nas quais as normas jurídicas
vigentes revelam-se inadequadas a evitar lesões ou perigo de lesões graves aos
princípios fundamentais do ordenamento, que têm origem em acontecimentos naturais ou de comportamentos humanos não
previstos: dentre tais eventos fala-se das guerras, das guerras civis, as crises
econômicas, as catástrofes naturais e desastres ambientais, as várias formas de
criminalidade organizada, dentre as quais se destaca o terrorismo. O fato
emergencial não é necessariamente um fato novo, mas normalmente coloca em crise
cada ordenamento jurídico, sistemas de normas destinadas a regulamentar de
forma preventiva um numero indeterminado de tipos penais concretos, que,
portanto, revelam-se inadequadas a fornecer formas para prevenir ou remediar os
efeitos dos fatos lesivos aos bens constitucionalmente garantidos.” (Tradução
Livre).
12 “Assim, as normas penais previstas em um ordenamento
jurídico democrático para sancionar atos de terrorismo ou de ameaça à
democracia têm alguns aspectos particulares: de um lado são funcionais não
apenas a prevenir e reprimir eventuais lesões a direitos fundamentais e à
princípios previstos no ordenamento constitucional, mas também a ressocializar
o réu à uma convivência social típica de cada ordenamento constitucional
democrático que admite cada ação política contanto que seja desenvolvida com
métodos pacíficos e, por outro lado consistem, de qualquer modo, em medidas que
limitam seus direitos fundamentais constitucionalmente garantidos, e que podem
produzir relevantes efeitos no funcionamento efetivo e integral do sistema
democrático. (Tradução Livre)
13 “Originariamente coloca-se um legítimo, progressivo aumento
da atenção aos confrontos de bens coletivos que, freqüentemente se cruzam à
evolução tecnológica, do sistema econômico e da estrutura sócio-estatal. Surge
uma valoração mais atenta em relação aos ligados aos novos fenômenos
criminais,(...) uma consciência mais madura,que é própria ao correto exercício
de liberdade econômica, sem falar de uma equilibrada disciplina de fatores de
produção de receitas, um correto e equilibrado sistema fiscal e uma utilização
produtiva dos tributos. (Tradução Livre)
14 “Posto isto, tem se aprofundado parece evidente a tendência
atual desenvolvimento no âmbito de cada estado democrático de exasperar a
exigência dos cidadãos de pedirem e obterem do poder público provimentos para
segurança, meios novos e mais eficazes para assegurar a tutela dos direitos
fundamentais de cada pessoas, diante da
incerteza da vida social e internacional, daí conflitos bélicos em potencial,
e, sobretudo, dessa forma nesta função interessa, um perigo derivado da
situação emergencial iminência terrorista”. (Tradução Livre)
15 “Assim, as características emergenciais que o direito penal
exprime em relação aos fenômenos da criminalidade, como já mencionado, parecem
representar momentos conjunturais de crise, se unindo à disfunção estrutural
relativas ao direito substancial, reassumidas no pan penalismo e na falta de
razões despenalizadoras.”(Tradução Livre)
16 ”O debate original sobre o direito penal da sociedade de
risco parte da constatação de um conjunto de realidades sociais podem, talvez,
ser sintetizada em três grandes blocos: de um lado, a generalização na
sociedade moderna de novos riscos, que podem afetar a coletividade,e que podem
ser classificados como artificiais, já que são produtos de novas atividades
humanas, seriam conseqüências paralelas da inserção de novas tecnologias em
diversos âmbitos sociais; tais riscos são difíceis de serem previstos e são colocados como falhas do
conhecimento ou utilização de novas capacidades técnicas. (...) a mencionada
problemática da previsão do surgimento
desses riscos.Liga-se a realidade de atividades que podem gerar riscos e que se
ligam a outras, de forma que o controle
do risco não só se escapa do
domínio como não se pode prever nas mãos de quem está o domínio do risco;
tornam-se inúteis critérios de distribuição de riscos que não se resolvem com
as exigências de imputação. Finalmente, na sociedade tem-se difundido um
sentimento exagerado de insegurança,que não parece ter relação exclusiva com tais
riscos, mas que são potencializados por acontecimentos perigosos ou lesivos,
pelas dificuldades deparadas pelos cidadão para compreender as rápidas mudanças
tecnológicas e acompanhar sua vida cotidiana, e pela ampla percepção social da
sociedade moderna. Assim, esse conjunto de fatores incentivam demandas e
intervenções sócio estatais que permitam controlar tais riscos e diminuir tais
temores com mecanismos sociais, como a política criminal.” (Tradução Livre)
17 Por sua vez, a política criminal que pretendia responder a
essa sociedade de risco pode ser explicada a partir de quatro características:
Em primeiro lugar, uma notável ampliação do objeto da intervenção penal, o qual
pretende incidir sobre novas problemáticas realidades sociais, ou sobre
realidades sociais preexistentes cuja vulnerabilidade se potencializaria;
dentre os setores de maior intervenção penal pode-se citar a fabricação e
distribuição de produtos, no meio ambiente, no âmbito tecnológico, como o nuclear,
informático, genético...A ordem
sócio-econômica e as atividades enquadradas em estruturas delitivas
organizadas, em especial o tráfico ilícito de entorpecentes. Em segundo lugar,
uma significativa transformação da nova política criminal, que concentra seus
esforços em perseguir a criminalidade dos poderosos, únicos setores sociais
capazes de desenvolver tais condutas delituosas e, que até então, dificilmente
entravam em contato com a justiça criminal” (Tradução Livre)
18 Entramos numa dinâmica que tende a superar o até então
indiscutível modelo garantista e a substituí-lo por outro que se denomina o
modelo penal de segurança dos cidadãos.”(Tradução Livre)
19 “Temos assistido a uma significativa extensão da
intervenção penal que, por um lado, é difundida num âmbito considerados
tradicionalmente quase ex lege- criminalidade de condição
político-administrativo e empresarial, também de altos níveis – e por outro
teve de encarar a criminalidade organizada, que acabou por assumir dimensões
inquietantes”(Tradução Livre)
20 ”Garantias
individuais e eficiência do controle parecem constituir termos contrastantes.
Mas tal afirmação, em relação ao nosso ordenamento, de democracia fundamentada
em princípios do estado social de direito, é de fácil demonstração
(...)Garantia e eficiência, assim, no estado social de direito, são antíteses,
representam, conjuntamente elementos
essenciais que refletem a procura de meios legítimos de controle social. Na
realidade, o estado social de direito- síntese de componentes liberais e
solidários- além de lentamente se empenhar do empenho em favor dos direitos do
indivíduo, tende a assegurar garantias formais e substanciais; assim como, SAI
tutela dos bens fundamentais, preocupam-se da defesa de interesses supra
individuais de emergência. Isto significa, em termos de política criminal, a
adoção de estratégias de controle dos fatos socialmente danosos que, no
respeito absoluto das prerrogativas de liberdade e dignidade da pessoa inspiram
critérios de racionalidade e eficiência. (Tradução Livre)
21 “Bom, nos parece que em relação a fenômenos socialmente
danosos de emersão “pós moderna”- pensa-se somente em agressão ao ambiente nas
suas implicações à vida e integridade pessoal, ou em ações lesivas da ordem
econômico-financeira- assim como haveria para os ancestrais pré modernos, se
abstrai uma conduta, um evento, a responsabilidade objetiva, um desvalor
pessoal e, assim, transmite confiança na averiguação processual de
acontecimentos em parâmetros probatórios de eficácia comprovada.” (Tradução
Livre)
22 “Tudo isto tem determinado não só uma ampliação
quantitativa, mas também uma modificação qualitativa; Não somente tem aumentado
o número de tipos penais, nem é alterada a estrutura, mudando, em conseqüência,
os meios de intervenção; a característica mais evidente é a distância entre da
ofensa ao bem; esses assumem a característica de mera violação formal. Em
relação à técnica da norma, assiste-se à suposição de uma técnica de
deliberação e ou de transferência, que testemunha um inquietante declínio dos
meios normativos de tipificação-abstração.”(Tradução Livre)
23 “Neste momento histórico é, ao contrário, consolidado no
nível legislativo, mas também na prática ,um costume do tipo emergencial ligado, atualmente à luta contra graves e
difusas formas de criminalidade, de colarinho branco e organizada, que desperta
preocupações em relação a defesa dos direitos do indivíduo. Quais limites a
defesa do homem contra o abuso da força estatal, as garantias representam,
assim, a expressão mais significativa tradução do processo evolutivo tem
caracterizado o desenvolvimento da civilização jurídica contemporânea. Não é
possível, portanto, em uma estrutura do ordenamento democrático avançado, a fim
de remediar a tormentosa, e gravíssimas
expressões de uma profunda crise de legalidade,
endo e extra institucional, adotar remédios normativos e práticas
jurisprudenciais, que terminam com distância da estrutura do ordenamento e, por
outro lado, tradizem formas de arbítrio.Que têm sempre caracterizado os
momentos mais difíceis para a razão do indivíduo.”(Tradução Livre)
24 A reflexão jurídica em relação à emergência e ao
terrorismo, e sobre a relação desses com os direitos fundamentais no
constitucionalismo democrático não termina mais nesses países nos quais as
formas de estado inspiram tais princípios. (Tradução Livre)
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