sexta-feira, 11 de julho de 2014

O direito penal na sociedade de risco: uma análise da criminalidade econômica



Daniela Villani Bonaccorsi  
 

Advogada criminalista do escritório Leonardo Isaac Yarochewsky Advogados Associados e Associada ao escritório Homero Costa Advogados. Mestre e Doutorando em Direito Processual. Professora de Direito Penal PUC-Minas

*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 33 em 25/03/2011





        A “Sociedade de Risco”, foi identificada, em 1986, por Ulrich Beck, “com o momento de crise e de revisão, que manifesta seus efeitos deletérios e coloca em cheque seus fundamentos”. (JUNGES, 2001. p.19). “(...) Uma sociedade de enorme complexidade, na qual a interação individual pelas necessidades de cooperação e de divisão funcional- alcançou níveis até agora desconhecidos (...)”.(SILVA SANCHES, 2002, p.31).

Hoje a sociedade vive em uma “expansão”¹ penal do direito penal. Desde os anos 60, as condutas e as atividades que poderiam oferecer perigo, alastraram-se no sistema penal, a violência tomou proporções cada vez maiores, onde se reclama por maior intervenção penal e por uma excessiva intervenção estatal, uma “legislação de emergência” sem o estabelecimento de princípios ou um modelo garantista, mas o desenvolvimento hipertrófico”² do direito penal (Luisi, 2003, p. 42), com tendências intervencionistas e preventivas.

A sensação de insegurança na sociedade chamada de risco, ou pós-industrial é traço significativo, fala-se de uma sociedade da “insegurança sentida (ou como a sociedade do medo)”³, pois “é inegável que a população experimenta uma crescente dificuldade de adaptação” com os avanços tecnológicos, novas realidades econômicas e até, ético-sociais:

“a insegurança e a angústia podem também guardar relação com a intensa experiência do mal como elemento de nossa existência, que de modo significativo tem sido possível experimentar ao largo da interminável sucessão de guerras e destruição que caracterizou o recém concluído século XX” (SILVA SANCHES, 2002, p. 36).

Ademais, o avanço dos meios de comunicação e tecnológicos, como internet, têm aumentado o sentimento de insegurança subjetiva4 com notícias que atuam como multiplicador de notícias de crimes, catástrofes e conseqüente ânsia de repressão penal e  de tal modo que “a segurança se converte em uma pretensão social à qual se supõe que o estado e, em particular, o Direito Penal, devem oferecer uma resposta” (SILVA SANCHES, 2002, p. 40).” Parte-se do axioma de que há de existir um terceiro responsável a quem imputar o fato e suas conseqüências, verdadeira expansão da imputação.

A sociedade de risco, traçada como o modo social pós-industrial aparece caracterizada por um âmbito econômico variante e avanços tecnológicos na indústria, sistema financeiro, informática, genética e outros com repercussões diretas a cada indivíduo (SILVA SANCHES, 2002, p.28). A denominada sociedade de risco pode ser vista como riscos a danos não delimitáveis “riscos globais e com freqüência, irreparáveis; que afetam todos os cidadãos; e que surgem de decisões humanas (BECK, 1993, p. 19).

A idéia de uma sociedade de risco é diretamente ligada à globalização e sociedade pós-industrial, ligada às mudanças históricas como ocorrência de guerras, crise econômica, abertura de mercado de capitais, aumento de atividades industriais, riscos ao meio ambiente e, formação de atividades criminosas organizadas. “A sociedade pós-industrial é, além da ‘sociedade de riscos’ tecnológicos, uma sociedade com outras características individualizadoras que contribuem à sua caracterização como uma sociedade de ‘objetiva’ insegurança. (SILVA SANCHES, 2002, p.30)”.

Os modelos sociais pós-industriais têm ligação direta com a globalização econômica, com fenômenos econômicos5 que se definem pela eliminação de restrições às transações comerciais e ampliação dos mercados.

Os fenômenos econômicos e integração econômica deram lugar à aparição de novas formas de delito, gerando uma delinqüência relacionada a interesses financeiros, criminalidade organizada e “criminalidade dos poderosos”, a macrocriminalidade. (SILVA SANCHES, 2002, p. 80):

(...) Infatti l´epoca della globalizzazione è anche l´epoca della insicurezza quotidiana e della sicurezza individuale e collettiva perseguita com ogni mezzo, poichè calamità e catastrofi non mancano e le irrisolte situazioni di tensione política, etnica e religiosa diffondo in tutti i paese pericoli e rischi per La sicurezza, ma anche per La tutela dei diritti fondamentali e del costituzionalismo democrático6.(MOCCIA, p. 34)

Com as inúmeras variações sócio-econômicas na atualidade, a “sociedade de riscos”, trouxe uma verdadeira inflação legislativa na qual o processo penal tem caráter intimidador, simbólico e que dá origem à respostas autoritárias.

O tema da emergência no processo penal tem relevo atual, em virtude dos contornos de violência da macrocriminalidade. “O fenômeno da ‘criminalidade de massas’, no sentido de crimes que possam ofender todos os cidadãos determina que o outro se mostre muitas vezes como um risco, dimensão da própria sociedade de risco”. (SILVA SANCHES, 2002, p.32):

a globalização dirige ao Direito Penal demandas fundamentalmente práticas, no sentido de uma abordagem mais eficaz da criminalidade (...). Trata-se mais que nada, de responder a exigência do poder político ou das instâncias de aplicação judicial do Direito, impotentes na luta dos ordenamentos nacionais contra a criminalidade transnacional. (SILVA SANCHES, 2002, p. 76)

A exigência de responder à macrocriminalidade tem se concebido em questões punitivistas. Afirmação esta fundada nas características da sociedade de risco, diante no novo modelo de criminalidade que cria “forte sensação de insegurança” e, em argumentos de déficit de aplicação da legislação penal, uma vez que são condutas não abrangidas ou esperadas no direito penal clássico. “La paura e l´incertezza per la stessa sopravvivenza delle persone e dei loro beni sono sentimenti che si diffondono dagli elettori agli eletti secondo uma lógica fisiologica típica do ogni Stato Democratico (...).”7 (BONETTI, 2006, p. 24)

a delinqüência da globalização é econômica, em sentido amplo (ou em todo caso, lucrativa, ainda que se ponham em perigo outros bens jurídicos). Isso significa que a reflexão jurídico-penal tem pela primeira vez como objeto essencial de estudo de delitos claramente diversos do paradigma clássico ( o homicídio ou a delinqüência patrimonial tradicional). Trata-se de delitos qualificados criminologicamente como crimes of the powerful; de delitos que têm uma regulação legal insuficientemente assentada; e de delitos cuja dogmática se acha parcialmente pendente de elaboração. E tudo isso há de redundar em uma configuração dos mesmos sobre as bases significativamente diversas daquelas do Direito Penal clássico (...) (SILVA SANCHES, 2002, p. 77)

A doutrina caracteriza a criminalidade da globalização com duas características mais marcantes:

Por um lado, trata-se de uma criminalidade organizada. Vale dizer, nela intervêm coletivos de pessoas estruturadas hierarquicamente, seja nas empresas, seja na forma estrita da organização criminal. A dissociação que isso produz entre execução material direta e responsabilidade determina, ainda, que o resultado lesivo possa aparecer significativamente separado, tanto no espaço como no tempo, da ação dos sujeitos mais relevantes no plano delitivo” Em segundo lugar “Do ponto de vista material, a criminalidade da globalização é criminalidade de sujeitos poderosos, caracterizada pela magnitude de seus efeitos, normalmente de desestabilização geral dos mercados, assim como de corrupção de funcionários e governantes, são traços da mesma forma notáveis (SILVA SANCHES, 2002, p. 80)

“O progresso técnico dá lugar, no âmbito da delinqüência dolosa tradicional, a adoção de novas técnicas como instrumento que lhe permite produzir resultados especialmente lesivos (...)”.(SILVA SANCHES, 2002, p. 29). A criminalidade, associada aos meios informáticos e à internet é seguramente, grande exemplo de tal evolução.

Desta forma, com o argumento de amparar os perigos da macrocriminalidade, cada vez mais ganhou espaço a legislação penal de emergência8, legislação que é produto da sociedade de risco, daqueles que clamam por um maior número de condutas incriminadas, pelo aumento das penas, pelo endurecimento das regras de execução penal, pela implementação do direito penal do inimigo, têm cada vez mais ressonância na sociedade, com a afirmação de que o processo penal não busca a garantia da norma, mas a eliminação de um possível perigo futuro, um inimigo da sociedade9 (JACKOBS, 2008).

Essa concepção da emergência outra coisa não é que a idéia do primado da razão de estado sobre a razão jurídica (...). Ela equivale a um princípio normativo de legitimação da intervenção punitiva: não mais jurídica, mas imediatamente política; não mais subordinada à lei enquanto sistema de vínculos e garantias, mas a essa supraordenada. (FERRAJOLI, 1992, p.650).

A noção do que hoje vem sendo tratado como legislação de emergência não possui uma única definição objetiva, já que a globalização possui diferentes conseqüências nos vários países, o “reclamo pela intervenção penal’ acaba por ter fundamentos diversos:

Incerta è la nozione giuridica di emergenza e sembra in parte differenziarsi da paese a paese. Nei diversi ordinamenti giuridici spesso non se dà una definizione giuridica o comunque Il termine è accostato ad altri che consentono di qualificarne meglio Il contenuto nella concreta situazione.10 (BENETTI, 2006, p. 61)

Não obstante a dificuldade de definição objetiva da emergência, esta é diretamente ligada às situações de riscos iminentes e de perigos à sociedade, não solucionáveis pelas normas até então existentes:

Si può cosi tentare di definire ‘emergenza’ ogni situazione nella quale le norme giuridiche vigenti si rivelano inadeguate a rimediare alle lesioni o ai pericoli di lesiose grave ai principi fondamentali dell´ordenamento, che provengono da accadimenti naturali o da comportamenti umani imprevisti o imprevedibili: tra tali eventi vi sono le guerre, le guerre civili, le crisi economiche, le catastrofi naturali e i disastri ambientali, le varie forme di criminalità organizzata, tra le quali spicca quella terroristica. IL fatto emergenciale non necessariamente è um fatto nuovo, ma comunque mette in crisi ogni ordinamento giuridico, quale sistema di norme destinate a regolare pro futuro um numero indeterminato di fattispecie concrete, che pertanto si rivela indeguato a provvedere per prevenire o rimediare agli effetti da Esso prodotti che appaiono lesivi di Beni costituzionalmente gatantiti.11 (BENETTI, 2006, p. 61)

O reclamo pela intervenção penal em condutas até então não amparadas penalmente, a fim de responder aos anseios da massa e sentimento de insegurança, são intervenções pontuais, urgentes e, por isso, acabou por partir de legislações especiais e emergenciais.

Diante dessa auto compreensão da sociedade como vítima em potencial, há uma verdadeira “ojeriza” às figuras do direito penal clássico, reclamando não um procedimento garantista e processo constitucional, mas uma questões que lhe levam a uma sensação de segurança, formas de aplicação penal preventiva, flexibilização de regras de imputação e relativização de garantias (SILVA-SANCHES, 2002, p. 75), reclamo por prisões e rigidez na legislação penal. Surgem assim:

“modelos de justiça negociada, nos quais a verdade e a justiça comum ocupam, quando muito, um segundo plano. A penetração na idéia de justiça negociada é muito profunda e tem manifestações muito diversas, nem sempre coincidindo com seus partidários. Assim, compreende desde os pactos de imunidade das promotorias com certos imputados, até as diversas formas de mediação (...) o direito penal aparece como mecanismo de gestão eficiente” (SILVA SANCHES, 2002, P. 69)

Essa maior intervenção penal acabou por gerar uma expansão do direito penal, imediatamente diversa daquela idéia de direito penal garantista, minimalista e de “ultima ratio”.

A expansão do direito penal diante do emergencialismo, para responder aos anseios sociais, traz uma verdadeira “hipertrofia legislativa”. Uma vez que o direito penal clássico não tratava das condutas de uma macrocriminalidade organizada o fez na tentativa de incriminar novas condutas que podem trazer riscos, perigos futuros.

Do criminoso comum, que praticava crimes com o uso de violência, como homicídio, de forma individual e atingindo bens jurídicos individuais, passou-se a tratar de crimes que atingem bens jurídicos supra-individuais, crimes relacionados ao poderio econômico, crimes de colarinho branco, crimes praticados por organização criminosa em que passou a haver verdadeira “atividade laboral” com divisão de tarefas e remuneração, características que se passou a chamar de macrocriminalidade, com atos cada vez mais complexos:

O paradigma do Direito Penal clássico é o homicídio de um autor individual(...) O paradigma do Direito Penal da globalização é o delito econômico organizado tanto em sua modalidade empresarial convencional como nas modalidades da chamada macrocriminalidade: terrorismo, narcotráfico ou criminalidade organizada. (SILVA SANCHES, 2002, p. 93)

No caso dos crimes comuns, uma vez que o criminoso, seja provisoriamente ou em virtude de sentença condenatória, tenha sua liberdade privada, retirado do convívio social, parece gerar maior segurança e, verdadeira “satisfação” com a conseqüência penal. Mas, numa “sociedade de risco” as condutas são diferenciadas. Fala-se de bens supra-individuais e que, diante da própria natureza, geram uma insegurança e visão de risco iminente ante a sociedade:

A delinqüência da globalização é a delinqüência econômica, à qual se tende a assinalar menos garantias pela menor gravidade das infrações, ou é criminalidade que pertence ao âmbito da legislação denominada legislação “excepcional. À qual se tende assinalar menos garantias pelo enorme potencial de perigo que contém” (SILVA SANCHES, 2002, p. 94)

Tal afirmação é ratificada pelo aparato criminal na globalização, criminosos que detém, diante do poder econômico, verdadeiro aparato tecnológico, praticam crimes cujos vestígios desaparecem pela complexidade dos atos e, acabam por aumentar a noção de insegurança:

Em primeiro lugar, merece ser destacada a introdução dos delitos contra a ordem sócia econômica, formas de criminalidade organizada ou a nova regulação dos delitos relativos à ordenação do território e dos recursos naturais; em segundo, o desaparecimento das figuras complexas do roubo com violência e intimidação das pessoas que, surgidas no marco da luta contra o’bandoleirismo’, devem desaparecer deixando passo à aplicação das regras gerais. A vinculação do primeiro aspecto com as novas ‘necessidades’ de tutela penal de uma sociedade complexa resulta bastante clara, segundo o discurso doutrinário e ideológico que está consagrado como dominante (SILVA SANCHES, 2002, p. 22).

A visão da sociedade na aplicação do direito penal nesses casos, não é como a do criminoso comum, pois, tanto diante da natureza dos bens jurídicos, diante da complexidade de atos praticados por uma organização criminosa, há maior dificuldade na persecução penal.

Fala-se de bens que podem atingir a coletividade, fala-se de crimes de difícil persecução e, por isso, fala-se de um sentimento de insegurança social com um anseio pela intervenção penal, forma simbólica de satisfazer esse sentimento de medo e incerteza. Se com o homicida preso, fora do convívio social a sociedade se sente segura, no caso da sociedade de risco, esta é a mesma exigência, de maior intervenção penal, que lhes forneçam a sensação de segurança:

Diante da característica econômica dos fenômenos da globalização, o Direito Penal no século XIX concentra-se na delinqüência econômica ou organizada e em modalidades delitivas conexas. Um Direito Penal como eminentemente prático, “Direito Penal de duas velocidades” no sentido de que “trata-se de proporcionar uma resposta uniforme ou, ao menos harmônica à delinqüência transnacional, que evite a conformação de ‘paraísos jurídico penais’. A existência de tais ‘paraísos’ resulta problemática, especialmente quando se trata de combater uma modalidade de delinqüência na qual a intervenção dos principais responsáveis das organizações pode estar significativamente distanciada do lugar e momento dos atos de execução. (SILVA SANCHES, 2002, p. 81)

Seguindo tal raciocínio, com a globalização surge uma nova figura de criminoso, uma “nova criminalidade” que passa a praticar condutas até então não amparadas pelo direito penal. Sociedade de risco, insegurança social, falta de tipificação de condutas, pontos de partida para a compreensão do emergencialismo penal. A sociedade que passou a ter a sensação de perigo iminente reclama intervenções emergenciais, intervenções que diminuam o sentimento de risco e insegurança, intervenção penal.

“Infatti le norme penali previste in um ordenamento giuridico democratico per sanzionare atti di terrorismo o di minaccia all´a democrazia hanno almeno de aspeti peculiari: da um lato sono funzionali non soltanto a prevenire e a reprimere eventuali lesionni ai diritti fondamentali e ai principi supremi dell´ordinamento costituzionalmente provisti, ma anche a risocializzare il reo ad uma convivenza sociale tipica di ogni sistema costituzionale democratico che ammete ogni azione politica purchè sai svolta com metodi pacifici, e dall´altro lato cosistono comunque in misure che limitano a loro volta i diritti fondamentali costituzionalmente garantiti di alcune persone, Il che può produrre però rilevanti effetti sul funzionamento effettivo dell´intero sistema democrático12” (BONETTI, 2006, p. 45)

Porém, juntamente com essas idéias garantistas, o mundo ocidental vive em uma sociedade de risco. Denominação esta diretamente ligada à globalização e à sociedade pós industrial, mudanças históricas nas quais se pode citar a ocorrência de guerras, crise econômica, abertura de  mercados de capitais, proliferação de atividades industriais, riscos ao meio ambiente e atividades praticadas por organizações criminosas.

All´origine si pone um legittimo, progressivo aumento dell´attenzione nei confronti di beni colettivi che, sovente, tra di loro si intersecano e risultano legati all´evoluzione tecnológica, Del sistema econômico e della struttura sócio-statuale. È emersa  uma valutazione più attenta da parte dei consociati dei ‘nuovi’ fenomeni criminali, (...) uma consapevolezza più matura, Che è própria Del corretto esercizio delle liberta economiche, nonchè di un´equilibrata discipina dei fattori di produzione e dei meccanismi idonei a garantire uma razionale ed equa distribuizione dei redditi, um corretto ed equilibrato sistema fiscale Ed uma produttiva utilizzazione Del gettito dei tributi13.(MOCCIA, p. 31)

Quando se fala do criminoso comum, pensando-se na possível conseqüência de prisão cautelar ou de uma sentença penal condenatória com conseqüente privação da liberdade, acaba-se por gerar o sentimento de “segurança”, na sociedade, uma vez que o “criminoso” foi “retirado” do convívio social. Na chamada sociedade de risco, as  condutas são diversas, em que se fala de bens jurídicos supra-individuais, como a ordem econômica, o meio ambiente, o sistema financeiro.

Na sociedade de risco, ao se falar da possível ofensa a bens jurídicos supra-individuais, existe o sentimento de um perigo iminente, uma sensação de insegurança social em que a coletividade se identifica cada vez mais, com a vítima.

Tal argumento é ratificado pelo aparato criminal existente na sociedade pós-industrial, criminosos que possuem poder econômico, que detém aparato tecnológico e, a sensação de segurança que a sociedade detinha,com a punição do criminoso comum, deixa de existir.

Pode-se falar que a sensação de segurança deixa de existir por inúmeros motivos, que podem ser delimitados tanto com a natureza dos bens jurídicos, diante da complexidade de atos praticados por organizações perigosas, características que tornam a persecução penal cada vez mais difícil.

Da cio che si qui approfondito appare evidente la tendenza recentemente sviluppatasi nell´ambito degli stato democratici ad asasperare l´esigenza dei cittadini di chiedere ed ottenere daí pubblici poteri provvedimenti di tutela della sicurezza, quase si tratti di um modo nuovo e più efficace per assicurare tutela ai diritti fondamentali di ogni persona messi in pericolo dalle incertezze della vita sociale Ed Internazionale, daí potenziali conflitti bellici, e sopprattutto, per cio che in questa sede interessa, daí pericoli derivanti da situazioni emergenzilai o da minacce terroristiche14. (BONETTI, 2006, p. 47)

Na sociedade globalizada, fala-se de bens jurídicos que atingem toda a sociedade, bens supra individual, de difícil individualização das condutas e de difícil punição, fazendo com que a sensação de insegurança tome conta da sociedade. Tal sentimento leva a sociedade de risco à visão de que só o direito penal poderia trazer respostas efetivas e, de devolver a sensação de segurança que a sociedade tanto reclama.

A partir daí, percebendo-se que a sociedade pós-industrial mudou, a globalização trouxe um novo criminoso, em que as condutas  não caracterizam crimes violentos ou que atingem bens jurídicos individuais, mas que praticam condutas que são reflexo de seu poderio econômico, e, em grande maioria, ainda não previstas no âmbito penal.

Infatti, ai profili di carattere emergenziale che Il diritto penale esprime in rapporto ai fenomeni di criminalità a cui si è già accennato, che sembrano rappresentare momenti conguinturali di crisi, si aggiungono carenze e disfunzionalità di carattere stratturale, relative, in particolar modo, al diritto sostanziale, riassumibili nel panpenalismo e nel suo recíproco della mancata razionale depenalizzazione15. (MOCCIA, 2000, p. 9)

Sociedade de risco, insegurança, falta de tipificação de condutas, ponto de partida para o que veio a ser chamado de emergencialismo penal. A sociedade de risco, com o sentimento de perigo iminente, com a sensação de necessidade de medidas urgentes reclama por uma aplicação penal de emergência. Reclama-se a intervenção penal pois são fatos que podem atingir toda a coletividade, fatos não controláveis, fatos até então não puníveis e, por tudo isso, que reclamam urgência no “controle”.

El debate original sobre el derecho penal de la sociedad del riesco parte de la constataciòn de um conjunto de realiades sociales que se prodrìan, quizàs, sintetizar em três grandes bloques: por um lado, la generalizaciòn em la sociedad moderna de nuevos riesgos, afectantes a amplios colctivos, y que podrìan ser calificados com artificiales em cuanto producto de nuevas actividades humanas, em conreto, serìan consecuencias colaterales de la puesta praáctica de nuevas tecnologias em muy diversos âmbitos sociales; tales riesgos resultan de difícil anticipaciòn y suelen basarse em fallos em el conocimiento o manejo de las nuevas capacidades técnicas. (...) a la ya citada probelmática prevision de su aparición. Se añade la realidad de unas actividades generadoras de riesgos que se entrecruzan unas com otras, de manera que el control del riesgo no solo escapa al domínio de uno mismo, sino que tampoco está claro em manos de quién está; se hacen ineludibles critérios de distribuición de riesgos que no satisfacen plenamente las exigências de imputación de responsabilidad. Finalmente, em la sociedad se há difundido um exagerado sentimento de inseguridad, que no parece guardar exclusiva correspondência com tales riesgos, sino que se vê potenciado por la intensa cobertura mediática de los sucesos peligrosos o lesivos, por las dificuldades com que tropieza el ciudadano médio para comprender el acelerado cambio tecnológico y acompasar su vida cotidiana a el, , y por la extendida percepción social de que la moderna sociedad colectiva. Em suma, todo esse conjunto de factores activa demandas de intervenciones socioestatales que permitan controlar tales riesgos y aplacar tales temores, y a eso se aplica, entre otros mecanismos sociales, la política criminal.16 (BENETTI, 2006, p. 556)

A fim de responder aos “anseios sociais” e diminuir o sentimento de insegurança, a aplicação penal partiu de leis esparças, já que se fala de situações até então não previstas, leis penais para abrangência de situações pontuais, leis que “acalmariam” a sociedade de risco.

A su vez, la política criminal que pretenderia dar respuesta a esa sociedad del riesgo podría evocarse a partir de cuatro grandes rasgos: Em primer lugar, uma notable ampliación de los âmbitos sociales objeto de intervención penal, la cual pretenderia incidir sobre nuevas realidades sociales problemáticas, o sobre realidades sociales  preexistentes cuya vulnerabilidad se habría potenciado; entre los sectores de intervención preferente, habría que citar la fabricación y distribuición de productos, el médio ambiente, los nuevos âmbitos tecnológicos, como el nuclear, informático, genético..., el orden sócio-económico y las actividades encuadradas em estructuras delictivas organizadas, com especial mención de los tráficos ilícitos de drogas. Em segundo lugar, uma significativa transformación del Blanco de la nueva política criminal, que concentraria sus esfuerzos em perseguir la criminalidad de los poderosos, únicos sectores sociales capaces de desarrollar tales conductas delictivas y que hasta entonces dificilmente entraban em contacto com la justicia penal (BENETTI, 2006, p. 557)17.

Essa maior intervenção trouxe o que veio a se chamar de expansão do direito penal, idéia imediatamente inversa à concepção do direito penal como “ultima ratio” e, um distanciamento cada vez maior de um direito penal garantista. (...)“hemos entrado em uma dinâmica que tiende a superar el hasta hace poco indiscutido modelo garantista y a substituirlo por outro al que he denominado el modelo penal de la seguridad ciudadana” 18 (MELIÀ, 2006, p. 553).

A expansão do direito penal, diante do emergencialismo, cria a “hipertrofia” dos sistema penal. Uma vez que o direito penal clássico não abrangia tais condutas, condutas relacionadas à macrocriminalidade organizada, o fez na tentativa de incriminar condutas que podem trazer riscos à sociedade. O direito penal na sociedade de risco tenta coibir condutas em que possa haver um perigo futuro, diante da dificuldade de individualizar condutas em crimes complexos e relacionados à organizações criminosas, passa-se a prestigiar formas de responsabilidade objetiva:

Abbiamo assistito ad uma significativa estenzione dell´intervento penale Che, da um lato, si è diffuso in ambiti considerati tradizionalmente quase ex lege- criminalità Del ceto político-amministrativo e imprenditoriale, anche di altíssimo livello- e, dall´altro, há dovuto fronteggiare Il dilagare della criminalità organizzata purê AL di fuori delle zone di origine, Che há finito com l´assumere dimensioni inquietanti.19” (MOCCIA, P.2-)

Na criminalidade organizada e, conseqüência de uma sociedade de risco, como característica da relativização das regras de imputabilidade “tende a prevalecer formulas de não distinção entre autoria e participação” uma verdadeira responsabilidade objetiva no âmbito penal “que já se verifica no plano da pura tipificação se se examinam os tipos delitivos em matéria de tráfico de estupefaciente, de lavagem de dinheiro. (SILVA SANCHES, 2002, p. 93

A idéia do objeto do direito penal como forma de proteção aos bens jurídicos fundamentais e o surgimento de novas realidades têm consubstanciado o surgimento de leis penais continuadamente havendo um  clamor geral de que os riscos da sociedade sejam abrangidos ou agravados com novas leis penais (SILVA SANCHES, 2002, p.19). A sociedade parece tender, a marchas forçadas, a aplicar  também aqui o critério de “tolerância zero. (SILVA SANCHES, 2002, p. 101).

No emergencialismo, conforme depreende a doutrina, garantia e eficiência têm sentidos, pois, a legislação no seu próprio conteúdo relativiza tais garantias, tudo, em nome da “eficiência”, do desenvolvimento de uma sensação de segurança:

Garanzie individuali ed efficienza del controllo sembrano oggi costituire i termini, constrastanti, di uma proprosizione dialettica. Ma um tale assunto, in rapporto al nostro constesto ordinamentale, di democrazia fondata sui principi dello stato sociale di diritto, è senz’altro falso e la dimostrazione è agevole (...) Garanzia ed efficienza, infatti, nello stato sociale di diritto, lugi dal porsi antiteticamente, rappresentano, congiunte, degli elementi essenziali di riferimento a cui dev’essere informato il perseguimento delle legittime istanze di controllo sociale. In realtà, lo stato sociale di diritto- felice sintesi di componenti liberali e solidaristiche-, sul piano dell’impegno a favore dei diritti dell’individuo, tende ad assicurare, rendevole effetive, garanzie di tipo formale e sostanziale; cosi come, sul piano della tutela di beni fondamentali, si preocuupa della difesa sai di tradizionali interessi individuali che di emergenti interessi superindividuali. Cio significa, in termini di política criminale, l’adozione di strategie di controllo di fatti socialmente dannosi che, nell’assoluto rispetto di prerogative di liberta e dignità della persona, risulti ispirata, contestualmente, a criteri di razionalità ed efficienza. (MOCCIA, 2000, p.1) 20

Justificando ocorrência de fatos novos e mudanças na proteção aos bens jurídicos:

Ebbene, a noi pare Che anche in rapporto a fenomeni socialmente dannosi di emersione ‘postmoderna’- si pensi solo a sofiticate aggressioni all´ambiente, purê nelle sue implicazioni relative a vita Ed integrità personale, o ad azioni lesive dello stesso ordine econômico-finanziario- cosi come avveniva per i loro ‘antenati premoderni’, se ‘astrarre’ uma condotta, um evento, um titolo d´imputazione oggetiva, um disvalore personale e, quindi, affidare l´accertamento processuale della vicenda concreta a parametri probatori di sperimentata efficacia nella loro estrema semplicità21.(MOCCIA, p. 21)

Hoje há uma tendência claramente dominante no sentido de introdução de novos tipos penais, agravamento dos existentes, ampliação de novos espaços vistos como jurídico-penalmente relevantes, flexibilização das regras de imputação e verdadeira “expansão” da aplicação de sanções penais (SILVA SANCHES, 2002, p. 21).

Como salientado, de forma a satisfazer o medo e o risco, o direito penal passa a ter caráter simbólico, sofrendo mudanças também em relação aos tipos penais. Uma vez que, diante da preocupação de proteção aos riscos, as condutas tipificadas passaram a amparar, em sua grande maioria, crime de perigo abstrato e formais. “Os delitos de resultado se mostram crescentemente insatisfatórios havendo  o uso cada vez maior de tipos de perigo e tipos com configuração cada vez mais abstrata ou formalista”. (SILVA SANCHES, 2002, p.31):

Tutto cio há determinato non solo um ampliamento quantitativo, ma anche uma modificazione qualitativa; non soltanto è cresciuto Il numero delle fattispecie, ma ne è mutata anche La struttura, cambiando, di consequenza, anche i moduli di intervento; La caratteristica più evidente di queste è data dalla lontananza dall´offesa al bene; esse assumono il carattere della mera violazione formale. Sotto Il profilo della técnica di normazione, si assiste all´assunzione di uma técnica casistica e/o di rinvio, Che testimonia um inquietante declino dei moduli normativi della tipizzazione/astrazione. (MOCCIA, 31)22.

Assim, A visão do direito penal como único instrumento eficaz de pedagogia político-social, como mecanismo de socialização, de civilização, supõe uma expansão ad absurdum da outrora “ultima ratio”.

Mas, desde já, no âmbito material, “tal expansão é em boa parte inútil, na medida em que transfere ao Direito Penal um fardo que ele não pode carregar. Isso, mesmo se mantido um modelo mais ou menos análogo ao clássico de garantias e regras de imputação”. E, com maior razão, se tal modelo sofrer fraturas que o desnaturalizem por completo. Pois ocorrem fenômenos (os chamados ‘macroproblemas: grandes questões sociopolíticas) cujo caráter macroscópico, estrutural ou sistêmico faz com que- e ainda que se possa identificar neles uma natureza globalmente ‘criminal’- o direito penal não se constitua então conceitualmente- no mecanismo adequado para uma abordagem razoalmente satisfatória dos mesmos. O debate acerca do “Zukunftssicherung”, isto é, da “atribuição ao Direito Penal da responsabilidade de proteger os interesses fundamentais das gerações futuras sobre a terra, é um exemplo suficientemente ilustrativo a esse respeito”. (...) (SILVA SANCHES, 2002. P. 62):

Somente os cínicos podem aceitar que a legislação penal contra macrocriminalidade já ultrapassou o ‘Rubicon’ da vinculação pelos princípios tradicionais e pode em seguida dar azo a ‘ luta’ contra as percebidas mega ameaças, e sem atenção ao lastro dos formalismos do estado de Direito: mediante intervenção profilática que não espera a produção de lesões de direitos; mediante responsabilidade coletiva que renuncia a imputação individual; mediante inversão do ônus da prova e delitos de mera suspeita que desprezam a presunção de inocência e o princípio in dúbio pro reo; mediante a dotação das instituições de persecução penal de competências análogas a dos serviços secretos, que somente podem ser controladas judicialmente de modo limitado. (SILVA SANCHES, 2002, p. 68)

As peculiares exigências da reação jurídico-penal à delinqüência própria de um e outro campo parecem capazes de acentuar substancialmente as tendências que, “como já foi dito, se acham patentes nos ordenamentos jurídicos nacionais, no sentido de uma demolição do edifício conceitual da teoria do delito, assim como o do constituído pelas garantias formais e materiais do Direito Penal e do Direito Processual Penal”. (SILVA-SANCHES, 2002, p. 75).

Ratificando tal afirmação:

In questo momento storico si è invece, consolidato a livello legislatico, ma anche nella prassi, um habitus di tipo emergenziale dalle origini risalenti, collegato, attualmente, all´a lotta contro gravi e difuse forme di criminalità, dei colletti Bianchi ed organizzatta, Che non pio non destare preoccupazione in rapporto All´a difesa dei diritti dell´individuo. Quali limiti a difesa dell´uomo contro le sopraffazioni statuali, Le garanzie rappresentano, infatti, l´espressione più significativa di que lingo e tormentato processo evolutivo che há caratterizzato lo svolgersi della civiltà giuridica contemporânea. Non è possibile, pertanto, in uma struttura ordinamentale di democrazia avanzata, al fine di porre rimedio a turbative, anche gravissime, della compagine sócio statuale, espressive di una profonda crisi di legalità, endo- ed extraistituzionale, adottare rimedi normativi e prassi giurisprudenziali, che finiscono com Il far scivolare La struttura ordinamentale verso preoccupanti forme di arbítrio, Che hanno sempre caratterizzato i momenti più difficili per Le ragioni dell´individuo23.(MOCCIA, 2000, p.2 )

Apesar da sociedade de risco busca uma resposta no direito penal, “a eficácia preventiva do Direito Penal se assenta no desconhecimento por parte da sociedade dos concretos mecanismos por meio dos quais o Estado reage contra o delito”(SILVA SANCHES p. 72):

Il diritto penale è, empate, uno stramento notevole di coesione e di credibilità dell´ordinamento giuridico nel suo complesso, rilevante sai dal punto di vista individuale che collettivo, ma a condizione che i suoi interventi risultino caratterizzati dall´integrale rispetto delle regole del gioco. La riflessione giuridica sull´emergenza e sul terrorismo, e sul loro rapporto com i principi fondamentali del constituzionalismo democrático non è mai finita in quei paesi la cui forma di Stato si ispira a tali principi24. (MOCCIA, p. 34)

Por isso, o “Direito penal de riscos”, além de acabar por ter uma caráter meramente simbólico, acaba por relativizar uma seria de direitos e garantias fundamentais, incompatíveis com o momento de evolução da sociedade em direção a formas cada vez mais complexas, que rompeu o equilíbrio dualista entre o Estado e cidadãos, favorecendo o surgimento de múltiplos direitos e garantias (BARACHO, 1984, p.125), repudiando sistemas penais autoritários ou  totalitários, do tipo opressivo fundados em apriorismos ideológicos e radicais.

A expansão do direito penal, dentre outros abusos, diante da dificuldade de responsabilização e individualização de condutas acaba por trazer graves conseqüências também no âmbito processual penal, como objeto desse trabalho, na imputação alternativa nos crimes praticados por organização criminosa.

A visão do direito penal “máximo” como único instrumento capaz de solucionar os problemas político-sociais supõe essa expansão, transferindo ao direito penal “um fardo que ele não pode carregar”.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BECK, Ulrich.De La sociedad industrial a La sociedad de risco (trad.del rio Herrmann, Revista de Occidente150, novembro 1993.
BONETTI, Paolo. Terrorismo, emergenza e costituzioni democratiche. Bologna: Il Mulino, 2006.
BRODT, Luiz Augusto. Do estrito cumprimento de dever legal.  Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris. Ed., 2005.
JACKOBS, Gunther. Criminalización en el estado prévio a la lesión de um bien jurídico.Trad. de Enrique Peñaranda Ramos, em estúdios de derecho penal, Civitas, Madrid, 1997.
________________. Direito Penal do Inimigo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.
JUNGES, José Roque. Evento Cristo e Ação Humana. Temas em fundamentais de ética teleológica. Coleção Theologia Publica 1. São Leopoldo:Unisinos. 2001.
MOCCIA, Sergio. La Perenne Emergenza. Tendenze autoritarie nel sistema penale. Seconda Edizione riveduta ed ampliata. Napoli, 2006.
LUISI, Luiz. Os Princípios Constitucionais Penais. Porto Alegre, Sergio Antônio Fabris Editor, 2003.
SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María. Los Indeseados como Enemigos: La Exclusión de Seres Humanos del Status Personae,  2-12, In DÍEZ, Gómez-Jara; MELIÁ, Cancio. Derecho penal del enemigo. El discurso penal de la exclusión. Vol. 2. Editorial BDEF, Montevideo, 2006;
SILVEIRA, Renato de Mello Jorge. Direito Penal supra-individual: interesses difusos. São Paulo: RT, 2003;
SILVEIRA, Renato de Mello Jorge. Direito Penal econômico como Direito Penal de Perigo. São Paulo, RT, 2006
SUTHERLAND, Edwin H. Is “White-Collar Crime” Crime?, in American. Sociological Review, n. 10 (1945), p. 132-139. 14.

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 1 O termo “expansão” do direito penal foi tratado pelo autor Jesús-María Silva Sánchez em fevereiro de 1999, em obra que possui o título “A expansão do Direito Penal: Aspectos da política criminal nas sociedade pós industriais, para o autor:  “Com a Sociedade de Risco, com o conjunto de fenômenos sociais, jurídicos e políticos vem experimentando o direito penal e processual penal um acúmulo de efeitos, que configuram o que convencionamos chamar “expansão”, com características, dentre outras, da flexibilização de garantias constitucionais e de regras de imputação(...) “a modificação da própria estrutura e do conteúdo material dos tipos penais é a sua primeira expressão”(...)”uma transição rápida do modelo de “delito de lesão a bens jurídicos individuais ao modelo ‘delito de perigo presumidos para bens supra-individuais”(..)(SILVA SANCHES, 2002, p. 113)
2 O termo “hipertrofia” penal foi utilizado em artigo publicado em 1898, por Reinhart Franck, salientando que o uso da pena e das tipificações das condutas tem sido abusivo, e por isso perdeu parte do seu crédito e, portanto, de sua forma intimidadora, já que o corpo social deixa de reagir do mesmo modo que o organismo humano não reage a um remédio administrado abusivamente. (FRANCK, Reinhart apud LUISI, 2003. p 42. ) Ratificando tal afirmação: Na “hipertrofia penal”, podemos citar expressamente a criação de inúmeras leis no âmbito econômico como no caso dos crimes contra a ordem econômica; dos crimes contra o sistema financeiro; dos crimes de lavagem de dinheiro e, todas, com uma característica em comum, a macrocriminalidade. Na legislação penal para “amparar” condutas até então atípicas, deu-se lugar à excessiva extensão da legislação penal, como se fosse o único meio para combater “qualquer força hostil que se pusesse em contradição com a ordem jurídica”. (LUISI, 2003, p. 41).
3 Tal expressão é utilizada por Silva Saches ao caracterizar a expansão do direito penal relacionando a sociedade de risco à fenômeno psicológico social e multiplicação emocional do risco
4 Vale ilustrar que tal sentimento de insegurança também acaba gerando um fenômeno de identificação social com a vítima, o que também fundamenta o reclamo pela intervenção penal. A criminalidade organizada, a criminalidade das empresas, do meio ambiente, a criminalidade dos poderosos, que hoje preside as discussões acadêmicas  acaba  por  trazer uma representação social do delito e a mencionada contemplação do cidadão como vítima em potencial (SILVA SANCHES, 2002, p.50, 54)
5 “Tratando-se da sociedade chamada de risco, além dos fenômenos econômicos, vale justificar a mencionada sensação de insegurança com o incremento dos bolsões de marginalidade nas sociedades ocidentais, os movimentos migratórios, a globalização das comunicações”. (Tradução Livre)
6 “Assim, a época da globalização é também a época da insegurança cotidiana e da segurança individual e coletiva, perseguida por vários meios, uma vez que fatalidades e catástrofes não faltam e a situação não solucionadas de tensão política, étnica e religiosa difundem em todos os países perigos e riscos, mas também pela tutela de direitos e garantias fundamentais”. (Tradução Livre)
7 “O medo e a incerteza pela sobrevivência das pessoas e de seus bens são sentimentos que se difundem dos eleitores aos eleitos segundo uma lógica típica de cada estado democrático. (Tradução Livre)
8 Nesse sentido, “dal punto di vista giuridico l´emergenza o Il fatto emergenziale non è altro che um presupposto funzionale all´attivazione di particolare strumenti giuridici predisposti per tali evenienze.” (BENETTI, 2006, p. 62)
9 O direito penal do inimigo será tratado em capítulo próprio, mas, desde já,  para maior compreensão, no mesmo sentido, FERRAJOLI define o direito penal do inimigo, termo utilizado por Günther Jackobs em obra com o mesmo título: “Dobbiamo allora domandarci: di che cosa stiamo discutendo quando parliammo di ‘diritto penale del nemico’? del ‘paradigma del nemico nel diritto penale? Io credo che dobbiamo riconoscere com assoluta fermezza che stiamo parlando di um ossimoro, di uma contradizione in termini, che rappresenta, di fatto, la negazione del diritto penale, la dissoluzione del suo ruolo  e della sua intima essenza, dato che la figura del nemico appartiene all' alógica della guerra, che del dirritto é la negazione, cosi come il diritto è la negazione della guerra.”(FERRAJOLI, 2006, p. 799).
10 “Incerta é a noção jurídica de emergência e parece ter características diferentes em cada país. Nos vários ordenamentos jurídicos com freqüência não se dá uma definição jurídica ou normalmente o termo é ligado a conceitos que a qualificam de acordo com cada caso concreto”(Tradução Livre).
11 “Assim, pode-se tentar definir emergência como cada situação nas quais as normas jurídicas vigentes revelam-se inadequadas a evitar lesões ou perigo de lesões graves aos princípios fundamentais do ordenamento, que têm origem em acontecimentos  naturais ou de comportamentos humanos não previstos: dentre tais eventos fala-se das guerras, das guerras civis, as crises econômicas, as catástrofes naturais e desastres ambientais, as várias formas de criminalidade organizada, dentre as quais se destaca o terrorismo. O fato emergencial não é necessariamente um fato novo, mas normalmente coloca em crise cada ordenamento jurídico, sistemas de normas destinadas a regulamentar de forma preventiva um numero indeterminado de tipos penais concretos, que, portanto, revelam-se inadequadas a fornecer formas para prevenir ou remediar os efeitos dos fatos lesivos aos bens constitucionalmente garantidos.” (Tradução Livre).
12 “Assim, as normas penais previstas em um ordenamento jurídico democrático para sancionar atos de terrorismo ou de ameaça à democracia têm alguns aspectos particulares: de um lado são funcionais não apenas a prevenir e reprimir eventuais lesões a direitos fundamentais e à princípios previstos no ordenamento constitucional, mas também a ressocializar o réu à uma convivência social típica de cada ordenamento constitucional democrático que admite cada ação política contanto que seja desenvolvida com métodos pacíficos e, por outro lado consistem, de qualquer modo, em medidas que limitam seus direitos fundamentais constitucionalmente garantidos, e que podem produzir relevantes efeitos no funcionamento efetivo e integral do sistema democrático. (Tradução Livre)
13 “Originariamente coloca-se um legítimo, progressivo aumento da atenção aos confrontos de bens coletivos que, freqüentemente se cruzam à evolução tecnológica, do sistema econômico e da estrutura sócio-estatal. Surge uma valoração mais atenta em relação aos ligados aos novos fenômenos criminais,(...) uma consciência mais madura,que é própria ao correto exercício de liberdade econômica, sem falar de uma equilibrada disciplina de fatores de produção de receitas, um correto e equilibrado sistema fiscal e uma utilização produtiva dos tributos. (Tradução Livre)
14 “Posto isto, tem se aprofundado parece evidente a tendência atual desenvolvimento no âmbito de cada estado democrático de exasperar a exigência dos cidadãos de pedirem e obterem do poder público provimentos para segurança, meios novos e mais eficazes para assegurar a tutela dos direitos fundamentais de cada  pessoas, diante da incerteza da vida social e internacional, daí conflitos bélicos em potencial, e, sobretudo, dessa forma nesta função interessa, um perigo derivado da situação emergencial iminência terrorista”. (Tradução Livre)
15 “Assim, as características emergenciais que o direito penal exprime em relação aos fenômenos da criminalidade, como já mencionado, parecem representar momentos conjunturais de crise, se unindo à disfunção estrutural relativas ao direito substancial, reassumidas no pan penalismo e na falta de razões despenalizadoras.”(Tradução Livre)
16 ”O debate original sobre o direito penal da sociedade de risco parte da constatação de um conjunto de realidades sociais podem, talvez, ser sintetizada em três grandes blocos: de um lado, a generalização na sociedade moderna de novos riscos, que podem afetar a coletividade,e que podem ser classificados como artificiais, já que são produtos de novas atividades humanas, seriam conseqüências paralelas da inserção de novas tecnologias em diversos âmbitos sociais; tais riscos são difíceis de serem previstos e são colocados como falhas do conhecimento ou utilização de novas capacidades técnicas. (...) a mencionada problemática da previsão do surgimento desses riscos.Liga-se a realidade de atividades que podem gerar riscos e que se ligam a outras, de forma que o controle do risco não só se escapa do domínio como não se pode prever nas mãos de quem está o domínio do risco; tornam-se inúteis critérios de distribuição de riscos que não se resolvem com as exigências de imputação. Finalmente, na sociedade tem-se difundido um sentimento exagerado de insegurança,que não parece ter relação exclusiva com tais riscos, mas que são potencializados por acontecimentos perigosos ou lesivos, pelas dificuldades deparadas pelos cidadão para compreender as rápidas mudanças tecnológicas e acompanhar sua vida cotidiana, e pela ampla percepção social da sociedade moderna. Assim, esse conjunto de fatores incentivam demandas e intervenções sócio estatais que permitam controlar tais riscos e diminuir tais temores com mecanismos sociais, como a política criminal.” (Tradução Livre)
17 Por sua vez, a política criminal que pretendia responder a essa sociedade de risco pode ser explicada a partir de quatro características: Em primeiro lugar, uma notável ampliação do objeto da intervenção penal, o qual pretende incidir sobre novas problemáticas realidades sociais, ou sobre realidades sociais preexistentes cuja vulnerabilidade se potencializaria; dentre os setores de maior intervenção penal pode-se citar a fabricação e distribuição de produtos, no meio ambiente, no âmbito tecnológico, como o nuclear, informático, genético...A  ordem sócio-econômica e as atividades enquadradas em estruturas delitivas organizadas, em especial o tráfico ilícito de entorpecentes. Em segundo lugar, uma significativa transformação da nova política criminal, que concentra seus esforços em perseguir a criminalidade dos poderosos, únicos setores sociais capazes de desenvolver tais condutas delituosas e, que até então, dificilmente entravam em contato com a justiça criminal” (Tradução Livre)
18 Entramos numa dinâmica que tende a superar o até então indiscutível modelo garantista e a substituí-lo por outro que se denomina o modelo penal de segurança dos cidadãos.”(Tradução Livre)
19 “Temos assistido a uma significativa extensão da intervenção penal que, por um lado, é difundida num âmbito considerados tradicionalmente quase ex lege- criminalidade de condição político-administrativo e empresarial, também de altos níveis – e por outro teve de encarar a criminalidade organizada, que acabou por assumir dimensões inquietantes”(Tradução Livre)
20 ”Garantias individuais e eficiência do controle parecem constituir termos contrastantes. Mas tal afirmação, em relação ao nosso ordenamento, de democracia fundamentada em princípios do estado social de direito, é de fácil demonstração (...)Garantia e eficiência, assim, no estado social de direito, são antíteses, representam, conjuntamente  elementos essenciais que refletem a procura de meios legítimos de controle social. Na realidade, o estado social de direito- síntese de componentes liberais e solidários- além de lentamente se empenhar do empenho em favor dos direitos do indivíduo, tende a assegurar garantias formais e substanciais; assim como, SAI tutela dos bens fundamentais, preocupam-se da defesa de interesses supra individuais de emergência. Isto significa, em termos de política criminal, a adoção de estratégias de controle dos fatos socialmente danosos que, no respeito absoluto das prerrogativas de liberdade e dignidade da pessoa inspiram critérios de racionalidade e eficiência. (Tradução Livre)
21 “Bom, nos parece que em relação a fenômenos socialmente danosos de emersão “pós moderna”- pensa-se somente em agressão ao ambiente nas suas implicações à vida e integridade pessoal, ou em ações lesivas da ordem econômico-financeira- assim como haveria para os ancestrais pré modernos, se abstrai uma conduta, um evento, a responsabilidade objetiva, um desvalor pessoal e, assim, transmite confiança na averiguação processual de acontecimentos em parâmetros probatórios de eficácia comprovada.” (Tradução Livre)
22 “Tudo isto tem determinado não só uma ampliação quantitativa, mas também uma modificação qualitativa; Não somente tem aumentado o número de tipos penais, nem é alterada a estrutura, mudando, em conseqüência, os meios de intervenção; a característica mais evidente é a distância entre da ofensa ao bem; esses assumem a característica de mera violação formal. Em relação à técnica da norma, assiste-se à suposição de uma técnica de deliberação e ou de transferência, que testemunha um inquietante declínio dos meios normativos de tipificação-abstração.”(Tradução Livre)
23 “Neste momento histórico é, ao contrário, consolidado no nível legislativo, mas também na prática ,um costume do tipo emergencial  ligado, atualmente à luta contra graves e difusas formas de criminalidade, de colarinho branco e organizada, que desperta preocupações em relação a defesa dos direitos do indivíduo. Quais limites a defesa do homem contra o abuso da força estatal, as garantias representam, assim, a expressão mais significativa tradução do processo evolutivo tem caracterizado o desenvolvimento da civilização jurídica contemporânea. Não é possível, portanto, em uma estrutura do ordenamento democrático avançado, a fim de remediar a tormentosa,  e gravíssimas expressões de uma profunda crise de legalidade,  endo e extra institucional, adotar remédios normativos e práticas jurisprudenciais, que terminam com distância da estrutura do ordenamento e, por outro lado, tradizem formas de arbítrio.Que têm sempre caracterizado os momentos mais difíceis para a razão do indivíduo.”(Tradução Livre)
24 A reflexão jurídica em relação à emergência e ao terrorismo, e sobre a relação desses com os direitos fundamentais no constitucionalismo democrático não termina mais nesses países nos quais as formas de estado inspiram tais princípios. (Tradução Livre)
 


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