Tatiana Alves Nunes
Advogada Associada
do Escritório Homero Costa Advogados
*publicado
originalmente no Boletim Jurídico N.º 29 em 25/11/2010
Decisões acerca de temas
relacionados ao contrato de seguro tem tido muita relevância no Superior
Tribunal de Justiça, principalmente, sob a extensão do risco contratual.
Segundo dispõe o art. 757
do Código Civil Brasileiro, o contrato de seguro é aquele pelo qual um das
partes se obriga para com outra, mediante o pagamento de um prêmio, a garantir-lhe
interesse legítimo relativo a pessoa ou a coisa e a indenizá-la de prejuízo
decorre de riscos futuros previsto do contrato.
Maria Helena Diniz, em sua
obra Tratado Téorico e Prático dos Contratos, Vol. 04, aduz que “a noção de
seguro supõe a de risco, isto é, o fato de estar o sujeito exposto à
eventualidade de um dano à sua pessoa, ou ao seu patrimônio, motivado pela
ação. Com a verificação do evento a que está condicionada a execução do dever
do segurador, ele pagará a indenização, se o dano atingir a pessoa ou os bens
do segurado”.
A d. civilista apresenta
as principais características do contrato em questão: bilateralidade,
onerosidade, aleatoriedade, formal, de execução sucessiva ou continuada, de
adesão e um contrato regido pela boa fé.
Trata-se de um contrato de
boa fé por exigir uma conclusão rápida, devendo o segurado apresentar uma
sincera e leal em suas declarações, a respeito do seu conteúdo e do riscos, sob
pena de ocorrer em sanções quando agir com má fé. A boa fé também é exigida do
segurador. Ressalta-se que a má fé de qualquer um deverá ser comprovada.
Embora a boa fé é
considerado um requisito essencial ao contrato de seguro, é um atributo que
também deve estar presente em todos os negócios jurídicos, conforme dispõe o
art. 113 do novel Código Civil.
A boa fé objetiva está
relacionada com deveres anexos, inerentes a qualquer negócio, onde as partes
devem agir com lealdade, probidade e confiança recíprocas (art. 422 do CC), com
o dever de cuidado, cooperação, informando o conteúdo do negócio e agindo com
equidade e razoabilidade.
Ademais, é importante
observar a função social do contrato, prevista no art. 421 do CC, que se revela
norma de ordem pública, onde o contrato deve se ater mais à intenção do que o
sentido literal das disposições escritas.
De acordo com o i.
doutrinador Flávio Tartuce, “a real função do contrato não é atender aos
interesses do mercado, mas sim da pessoa humana. (...) Por isso, o contrato
deve ser analisado sob o prisma da personalização do Direito Privado e do Direito
Civil Constitucional, a fim de atender o mínimo para que a pessoa viva com
dignidade. O foco principal do contrato não é o patrimônio, mas sim o indivíduo
que contrata.”
Nessa concepção, o
Superior Tribunal de Justiça tem proferido diversas decisões visando satisfazer
os interesses daqueles em que lhe foram negadas indenizações.
Recentemente, a segunda
seção aprovou a redação da Súmula 465 sobre a validade do seguro de veículo
transferido sem comunicação prévia, ainda que conste do contrato tal exigência.
Senão vejamos:
“Ressalvada a hipótese de
efetivo agravamento do risco, a seguradora não se exime do dever de indenizar
em razão da transferência do veículo sem a sua prévia comunicação”.
Os ministros entenderam
que deve ser realizado um exame das situações para autorizar a exclusão da
responsabilidade da seguradora, podendo a obrigação ser excluída em caso de
má-fé ou aumento do risco segurado, pois apenas a transferência da propriedade do
automóvel segurado não significa, por si só, um agravamento do risco.
No Resp. 1.192.609-SP, o
STJ se posicionou favorável à indenização securitária de policial que vem a
falecer no trajeto trabalho/residência. No referido caso, a seguradora
sustentou que a referida indenização somente seria devida em eventual sinistro
quando o policial estivesse exclusivamente em serviço. Entretanto, o Ministro
Relator Massmi Yeda considerou que o seguro em grupo possuem algumas
limitações, devendo constá-las de forma expressa, clara e objetiva, a fim de
evitar qualquer dúvida em sua aplicação, sob pena de inversão em sua
interpretação a favor do aderente, decorrentes da boa fé objetiva e da função
social do contrato.
A intervenção do
Judiciário torna-se ainda mais evidente quando o assunto refere-se a saúde,
tendo sido inclusive editada a Súmula 302, em que considera abusiva a cláusula
contratual que limita o tempo de internação hospitalar do segurado.
Ademais, o Tribunal da
Cidadania proferiu decisões no sentido de que as seguradoras também não
poderiam limitar os tratamentos necessários à cura da patologia, conforme os
REsp. 1.053.810-SP e REsp 1.136.475-RS.
Diante dos referidos
princípios contratuais, atrelado ao da dignidade da pessoa humana, há uma
grande interferência do Estado nas relações de Direito Privado, visando
proteger a parte mais frágil da relação. Portanto, as seguradoras precisam
estar preparadas para que o risco constante no contrato seja realmente apurado,
a fim de se evitar prejuízos para qualquer uma das partes contratantes, sob
pena de frustrar a finalidade precípua do contrato.
________________
Bibliografias utilizadas:
- DINIZ, Maria Helena.
Tratado Teórico e Prático dos Contratos. 4º Volume. 5ª Edição, Editora Saraiva,
São Paulo, 2003.
- TARTUCE, Flávio. DIREITO
CIVIL, V.3: Teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 3ª. Edição,
Editora Método, São Paulo, 2008.
- Site do Superior
Tribunal de Justiça (www.stj.jus.br)
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