Mariana Cardoso Magalhães
Advogada Sócia de Homero Costa Advogados
Gustavo Pires Maia da Silva
Advogado Sócio de Homero Costa Advogados
A ousadia e voracidade arrecadatórias do
Fisco estão, a cada dia, mais imprevisíveis e absurdas! Irá, a Receita Federal,
divulgar em seu site os nomes de representados fiscais para fins penais.
Em 14 de novembro de 2018 foi publicada a Portaria
RFB nº 1750[1]
que dispõe sobre representação fiscal para fins penais referente (i) a crimes
contra a ordem tributária; (ii) contra a Previdência Social; (iii) e de
contrabando ou descaminho; (iv) crimes contra a Administração Pública Federal,
em detrimento da Fazenda Nacional ou contra administração pública estrangeira; (v)
crimes de falsidade de títulos, papéis e documentos públicos (vi) crime de
“lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; e (vii) referente a atos de
improbidade administrativa.
Os primeiros artigos da Portaria se referem a
procedimentos que já estavam previstos em outras legislações federais, como o
prazo para o encaminhamento da representação fiscal para fins penais ao órgão
do Ministério Público Federal (MPF), após encerrada a esfera administrativa
fiscal com a conclusão da existência do crédito tributário relacionado a alguns
dos ilícitos penais citados no parágrafo anterior.
O surpreendente de tal Portaria é a previsão
de seu artigo 16, no qual a Receita Federal (RFB) se auto permite a realizar a
divulgação, em seu site (www.receita.fazenda.gov.br),
de informações constantes nas representações fiscais para fins penais enviadas
ao MPF, como (i) o nome e o CPF/CNPJ dos responsáveis pelos fatos que
configuram o ilícito objeto da representação fiscal para fins penais; (ii) a
tipificação legal desta representação; (iii) o número do processo referente à
representação; (iv) bem como a data do envio desta ao MPF.
Importante apontar que a Constituição da
República de 1988 prevê como cláusulas pétreas – direitos que não podem ser
diminuídos – (i) a dignidade da
pessoa humana (artigo 1º); (ii) o princípio da presunção de inocência,
onde ninguém poderá ser considerado culpado antes de trânsito em julgado de
sentença penal condenatória (artigo 5º, inciso LVII); (iii) direito de imagem, onde fica assegurado
o direito a indenização pelo dano material e moral em decorrência da violação (artigo
5º, inciso X); (iv) e o direito ao contraditório
e a ampla defesa (artigo 5º, inciso LV), no qual qualquer litigante, em
processo administrativo ou judicial, deverá ter os seus direitos de defesa
assegurados.
O que se verifica com esta Portaria da RFB é
que não haverá respeito a estes princípios constitucionais quando se tratar de
representações fiscais para fins penais dos tipos ilícitos apontados acima.
Vale lembrar que uma pessoa cujo nome for
divulgado publicamente, não necessariamente sofrerá condenação penal por aquele
ato divulgado. Se houver, de fato, instauração de processo criminal, apenas no
curso da Ação Penal é que será verificado se de fato ocorreu um ato criminoso.
Podendo, inclusive, ocorrer a conclusão de necessidade absolvição do indivíduo,
todavia, seu nome já terá sido maculado pela divulgação irresponsável da RFB.
A divulgação
pela internet de informações relativas às representações fiscais para fins penais não pode
ser regulada por intermédio de Portaria de Órgão do Poder Executivo, porque a
matéria está relacionada ao direito penal e/ou processual penal, conforme
estabelece o Artigo 22, Inciso I, da CF/88, é competência da União, e,
portanto, tal tema deve ser atribuição do Congresso Nacional.
Além do mais, o controle de
constitucionalidade é claro ao determinar que as previsões normativas
infralegais, como é o caso de uma Portaria, são hierarquicamente inferiores às
normas constitucionais, por isso, ao serem criadas, não podem violar ou possuir
determinações contrárias àquelas de cunho originário, sob pena de invalidade.
O que é claramente o caso da Portaria RFB nº
1750 que viola uma as cláusulas pétreas acima demonstradas.
Esta é, sem dúvida, mais uma forma que a RFB
encontrou para tentar coagir o contribuinte a realizar a quitação de possíveis
créditos tributários, sem utilizar de suas possibilidades processuais e
administrativas para discutir se há, de fato, crédito tributário que deve ser
recolhido.
Contudo, a vontade de arrecadar tributos não
pode ser maior do que as garantias constantes na Constituição Federal de 1988. Os
Órgãos Fazendários, Receita Federal do Brasil e Procuradoria da Fazenda
Nacional, possuem meios legais para a cobrança dos créditos tributários, como
por exemplo, Procedimento Administrativo, Medida Cautelar Fiscal e a Execução
Fiscal.
A questão aqui tratada não se refere à
existência e instauração de representação fiscal para fins penais quando
cabível, mas sim e unicamente no que diz respeito à banalização indiscriminada
do mecanismo e ao desrespeito à imagem do contribuinte com o intuito de coação
para pagamento.
Nem mesmo o Ministério Público Federal, como
fiscal da lei, pode aceitar a edição desta Portaria, porque estaria concordando
com o desrespeito aos Artigos 1º, 5º e 22, Inciso I, da Constituição Federal de
1988.
Dúvidas não restam de que o Artigo 16 da
Portaria RFB nº 1.750/2018 é completamente inconstitucional, ferindo
mortalmente os Artigos 1º, 5º e 22, Inciso I, da Constituição da República de
1988.
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