segunda-feira, 3 de novembro de 2025

O CÓDIGO FLORESTAL E OS DESAFIOS DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO: SUSTENTABILIDADE, INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE

  

Por Stanley Martins Frasão e Nathália Caixeta Pereira de Castro

 

 

O agronegócio brasileiro é um dos pilares da economia nacional, sendo responsável por grande parte do PIB, das exportações e da geração de empregos. No entanto, para além da produção em larga escala e da alta tecnologia no campo, o setor enfrenta desafios cada vez mais complexos que exigem um equilíbrio delicado entre crescimento econômico e preservação ambiental. Nesse contexto, o Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651/2012) surge como um marco regulatório crucial, influenciando diretamente as práticas agrícolas, o uso da terra e a imagem do Brasil no cenário internacional.

O Código Florestal e seus impactos no agro

A legislação ambiental estabelece diretrizes para a preservação de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reservas Legais (RLs), o que impacta diretamente a gestão das propriedades rurais. Para muitos produtores, isso significa uma redução da área disponível para cultivo, exigindo maior eficiência produtiva e investimentos em tecnologias que possibilitem o uso sustentável do solo.

O Código também impôs a obrigatoriedade do Cadastro Ambiental Rural (CAR), um instrumento de controle, monitoramento e planejamento ambiental das propriedades. A adesão ao CAR é pré-requisito para que os produtores tenham acesso a linhas de crédito e programas de regularização. Apesar de representar um desafio inicial, essa exigência promove maior segurança jurídica e incentiva a adoção de práticas sustentáveis no campo.

Sustentabilidade como vetor de inovação

Ao limitar a expansão indiscriminada da fronteira agrícola, o Código Florestal estimula o aumento da produtividade dentro das áreas já consolidadas. Isso tem impulsionado a adoção de novas tecnologias, como agricultura de precisão, uso racional de insumos e práticas regenerativas, que não só aumentam a eficiência como também reduzem impactos ambientais.

As novas tecnologias e práticas sustentáveis têm promovido ganhos expressivos de produtividade e ampliado a competitividade internacional do setor. A agricultura de precisão permite o uso eficiente de insumos como água, fertilizantes e defensivos, enquanto drones, sensores e softwares ajudam no monitoramento das lavouras e na tomada de decisões em tempo real.

Práticas como integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), plantio direto, rotação de culturas e recuperação de áreas degradadas fortalecem a conservação dos recursos naturais e reduzem a emissão de gases de efeito estufa. Com isso, o Brasil ganha destaque como produtor agrícola sustentável, atendendo às exigências de mercados internacionais cada vez mais atentos à responsabilidade socioambiental.

Conexão com compromissos internacionais e mercados

O cumprimento do Código Florestal também reforça a posição do Brasil frente a acordos internacionais, como o Acordo de Paris, em que o nosso país se comprometeu a reduzir emissões e ampliar a recuperação de vegetação nativa. A efetividade da legislação torna-se, portanto, não apenas uma obrigação interna, mas também um elemento essencial para a diplomacia ambiental e para a manutenção de mercados estratégicos que exigem cadeias de produção livres de desmatamento.

A crescente implementação de barreiras comerciais ambientais, como o regulamento da União Europeia sobre produtos livres de desmatamento, faz com que a conformidade com o Código Florestal se torne um diferencial competitivo. A rastreabilidade das cadeias produtivas e a comprovação da regularidade ambiental das propriedades serão cada vez mais decisivas para garantir acesso a mercados internacionais e mostrar o compromisso do Brasil com a sustentabilidade em nível extraterritorial.

Dimensão social e políticas públicas

Além da responsabilidade do produtor, é fundamental o papel do Estado na criação de políticas públicas efetivas para apoiar a implementação do Código Florestal. A ampliação de linhas de crédito verde, a redução da burocracia no processo de regularização e a aceleração da análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR) são medidas indispensáveis para reduzir a insegurança jurídica e ampliar a adesão.

Outro ponto que merece destaque é a necessidade de políticas diferenciadas para pequenos e médios produtores. A democratização do acesso à tecnologia, a expansão da assistência técnica e o fortalecimento de cooperativas rurais são instrumentos fundamentais para evitar que a adequação ao Código Florestal aumente desigualdades no campo. O futuro do agro sustentável passa não apenas pela preservação ambiental, mas também pela inclusão social e pela redução da concentração produtiva.

Também é importante considerar a criação de mecanismos de pagamento por serviços ambientais (PSA), que remunerem agricultores pela conservação de florestas e recuperação de áreas degradadas, valorizando economicamente práticas sustentáveis. Além disso, políticas públicas podem estimular parcerias público-privadas (PPPs) voltadas à inovação em biotecnologia, monitoramento e certificação ambiental, facilitando a transição para um agro competitivo e mais verde.

Outro eixo fundamental é o fortalecimento da educação rural, tanto na formação técnica de jovens agricultores quanto na capacitação continuada de profissionais do campo, assegurando que as novas gerações estejam preparadas para conciliar produtividade com responsabilidade ambiental. Ainda, é essencial que os cursos superiores de Agronomia estejam estruturados para oferecer uma formação acadêmica que valorize a adequação do setor agropecuário ao Código Florestal e a outras legislações ambientais, de modo a despertar, desde o início da jornada profissional dos futuros agricultores, a consciência sobre a relevância de uma agronomia sustentável.

Desafios e estratégias de adaptação

Mesmo com os avanços, os desafios permanecem. Muitos produtores ainda enfrentam dificuldades técnicas e financeiras para se adequarem às exigências legais. Falta de assistência técnica, morosidade na análise dos cadastros e a insegurança jurídica em algumas regiões também dificultam a plena efetividade da lei.

Além disso, o setor precisa lidar com fatores como:

  1. Volatilidade dos preços das commodities, influenciada por aspectos geopolíticos, climáticos e cambiais;
  2. Aumento dos custos de produção, especialmente com insumos importados;
  3. Insegurança jurídica e entraves na regularização fundiária e ambiental;
  4. Dificuldade ou até mesmo impossibilidade na obtenção ao crédito rural, eis que os pequenos e médios enfrentaram grandes obstáculos, notadamente em 2024, submetendo-os aos juros comerciais, inclusive das indústrias de insumos;
  5. Desigualdade no acesso à tecnologia, sobretudo entre pequenos e médios produtores.

Para enfrentar esses desafios, algumas estratégias têm se mostrado fundamentais:

  1. Diversificação da produção e das fontes de renda na propriedade rural;
  2. Uso de ferramentas de gestão de risco, como o seguro rural e contratos futuros;
  3. Capacitação técnica contínua, por meio da extensão rural e do acesso à informação;
  4. Fortalecimento de cooperativas, que promovem ganho de escala e poder de negociação;
  5. Investimento em rastreabilidade e certificações ambientais, agregando valor à produção.

Desse modo, percebe-se que o Código Florestal, longe de ser um obstáculo, representa uma oportunidade de transformação no agronegócio. Ele aponta para um futuro em que produção e preservação caminham juntas, em que a inovação é sinônimo de sustentabilidade e em que o Brasil se consolida como uma potência agroambiental. O desafio está em garantir que todos os produtores tenham condições de participar dessa mudança, com apoio técnico, segurança jurídica e incentivos adequados para fazer do campo um espaço de equilíbrio e prosperidade.

Mais do que uma exigência legal, trata-se de uma política estratégica de Estado, capaz de posicionar o Brasil em um patamar único: produzir em escala global sem abrir mão da preservação natural. O verdadeiro desafio não é escolher entre o agronegócio ou a floresta, mas construir pontes para que ambos coexistam de maneira integrada e colaborativa.

 

 

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