Por Stanley Martins Frasão e
Nathália Caixeta Pereira de Castro
O agronegócio brasileiro é um dos pilares da
economia nacional, sendo responsável por grande parte do PIB, das exportações e
da geração de empregos. No entanto, para além da produção em larga escala e da
alta tecnologia no campo, o setor enfrenta desafios cada vez mais complexos que
exigem um equilíbrio delicado entre crescimento econômico e preservação
ambiental. Nesse contexto, o Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651/2012)
surge como um marco regulatório crucial, influenciando diretamente as práticas
agrícolas, o uso da terra e a imagem do Brasil no cenário internacional.
O Código Florestal e seus impactos no
agro
A legislação ambiental estabelece diretrizes
para a preservação de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reservas Legais
(RLs), o que impacta diretamente a gestão das propriedades rurais. Para muitos
produtores, isso significa uma redução da área disponível para cultivo,
exigindo maior eficiência produtiva e investimentos em tecnologias que
possibilitem o uso sustentável do solo.
O Código também impôs a obrigatoriedade do
Cadastro Ambiental Rural (CAR), um instrumento de controle, monitoramento e
planejamento ambiental das propriedades. A adesão ao CAR é pré-requisito para
que os produtores tenham acesso a linhas de crédito e programas de
regularização. Apesar de representar um desafio inicial, essa exigência promove
maior segurança jurídica e incentiva a adoção de práticas sustentáveis no
campo.
Sustentabilidade como vetor de inovação
Ao limitar a expansão indiscriminada da
fronteira agrícola, o Código Florestal estimula o aumento da produtividade
dentro das áreas já consolidadas. Isso tem impulsionado a adoção de novas
tecnologias, como agricultura de precisão, uso racional de insumos e práticas
regenerativas, que não só aumentam a eficiência como também reduzem impactos
ambientais.
As novas tecnologias e práticas sustentáveis
têm promovido ganhos expressivos de produtividade e ampliado a competitividade
internacional do setor. A agricultura de precisão permite o uso eficiente de
insumos como água, fertilizantes e defensivos, enquanto drones, sensores e
softwares ajudam no monitoramento das lavouras e na tomada de decisões em tempo
real.
Práticas como integração
lavoura-pecuária-floresta (ILPF), plantio direto, rotação de culturas e
recuperação de áreas degradadas fortalecem a conservação dos recursos naturais
e reduzem a emissão de gases de efeito estufa. Com isso, o Brasil ganha destaque
como produtor agrícola sustentável, atendendo às exigências de mercados
internacionais cada vez mais atentos à responsabilidade socioambiental.
Conexão com compromissos internacionais e
mercados
O cumprimento do Código Florestal também
reforça a posição do Brasil frente a acordos internacionais, como o Acordo de
Paris, em que o nosso país se comprometeu a reduzir emissões e ampliar a
recuperação de vegetação nativa. A efetividade da legislação torna-se,
portanto, não apenas uma obrigação interna, mas também um elemento essencial
para a diplomacia ambiental e para a manutenção de mercados estratégicos que
exigem cadeias de produção livres de desmatamento.
A crescente implementação de barreiras
comerciais ambientais, como o regulamento da União Europeia sobre produtos
livres de desmatamento, faz com que a conformidade com o Código Florestal se
torne um diferencial competitivo. A rastreabilidade das cadeias produtivas e a
comprovação da regularidade ambiental das propriedades serão cada vez mais
decisivas para garantir acesso a mercados internacionais e mostrar o
compromisso do Brasil com a sustentabilidade em nível extraterritorial.
Dimensão social e políticas públicas
Além da responsabilidade do produtor, é
fundamental o papel do Estado na criação de políticas públicas efetivas para
apoiar a implementação do Código Florestal. A ampliação de linhas de crédito
verde, a redução da burocracia no processo de regularização e a aceleração da
análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR) são medidas indispensáveis para
reduzir a insegurança jurídica e ampliar a adesão.
Outro ponto que merece destaque é a
necessidade de políticas diferenciadas para pequenos e médios produtores. A
democratização do acesso à tecnologia, a expansão da assistência técnica e o
fortalecimento de cooperativas rurais são instrumentos fundamentais para evitar
que a adequação ao Código Florestal aumente desigualdades no campo. O futuro do
agro sustentável passa não apenas pela preservação ambiental, mas também pela
inclusão social e pela redução da concentração produtiva.
Também é importante considerar a criação de
mecanismos de pagamento por serviços ambientais (PSA), que remunerem
agricultores pela conservação de florestas e recuperação de áreas degradadas,
valorizando economicamente práticas sustentáveis. Além disso, políticas
públicas podem estimular parcerias público-privadas (PPPs) voltadas à inovação
em biotecnologia, monitoramento e certificação ambiental, facilitando a
transição para um agro competitivo e mais verde.
Outro eixo fundamental é o fortalecimento da
educação rural, tanto na formação técnica de jovens agricultores quanto na
capacitação continuada de profissionais do campo, assegurando que as novas
gerações estejam preparadas para conciliar produtividade com responsabilidade
ambiental. Ainda, é essencial que os cursos superiores de Agronomia estejam
estruturados para oferecer uma formação acadêmica que valorize a adequação do
setor agropecuário ao Código Florestal e a outras legislações ambientais, de
modo a despertar, desde o início da jornada profissional dos futuros
agricultores, a consciência sobre a relevância de uma agronomia sustentável.
Desafios e estratégias de adaptação
Mesmo com os avanços, os desafios
permanecem. Muitos produtores ainda enfrentam dificuldades técnicas e
financeiras para se adequarem às exigências legais. Falta de assistência
técnica, morosidade na análise dos cadastros e a insegurança jurídica em algumas
regiões também dificultam a plena efetividade da lei.
Além disso, o setor precisa lidar com
fatores como:
- Volatilidade dos preços das
commodities, influenciada por aspectos geopolíticos, climáticos e
cambiais;
- Aumento dos custos de produção,
especialmente com insumos importados;
- Insegurança jurídica e entraves na
regularização fundiária e ambiental;
- Dificuldade ou até mesmo
impossibilidade na obtenção ao crédito rural, eis que os pequenos e médios
enfrentaram grandes obstáculos, notadamente em 2024, submetendo-os aos
juros comerciais, inclusive das indústrias de insumos;
- Desigualdade no acesso à tecnologia,
sobretudo entre pequenos e médios produtores.
Para enfrentar esses desafios, algumas
estratégias têm se mostrado fundamentais:
- Diversificação da produção e das fontes
de renda na propriedade rural;
- Uso de ferramentas de gestão de risco,
como o seguro rural e contratos futuros;
- Capacitação técnica contínua, por meio
da extensão rural e do acesso à informação;
- Fortalecimento de cooperativas, que
promovem ganho de escala e poder de negociação;
- Investimento em rastreabilidade e
certificações ambientais, agregando valor à produção.
Desse modo, percebe-se que o Código
Florestal, longe de ser um obstáculo, representa uma oportunidade de
transformação no agronegócio. Ele aponta para um futuro em que produção e
preservação caminham juntas, em que a inovação é sinônimo de sustentabilidade e
em que o Brasil se consolida como uma potência agroambiental. O desafio está em
garantir que todos os produtores tenham condições de participar dessa mudança,
com apoio técnico, segurança jurídica e incentivos adequados para fazer do
campo um espaço de equilíbrio e prosperidade.
Mais do que uma exigência legal, trata-se de
uma política estratégica de Estado, capaz de posicionar o Brasil em um patamar
único: produzir em escala global sem abrir mão da preservação natural. O
verdadeiro desafio não é escolher entre o agronegócio ou a floresta, mas
construir pontes para que ambos coexistam de maneira integrada e colaborativa.
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