TESTAMENTO VITAL – NOVA MODALIDADE?
Manoella
Queiroz Duarte Freitas
Advogada Sócia de Homero Costa Advogados
Bernardo José
Drumond Gonçalves
Advogado Sócio de Homero Costa Advogados
No ordenamento
jurídico brasileiro, há várias formas de testamento. A modalidade denominada
“vital” é um instrumento por meio do qual o testador expressa as suas escolhas,
caso venha perder a sua capacidade civil, seja por motivo de doença ou por
acidente – o que lhe impossibilitaria de expressar livremente a sua vontade e
deliberação sobre questões patrimoniais e também acerca de tratamentos médicos
a ser seguidos, capazes de prolongar artificialmente sua vida, além da
possibilidade de doação de órgãos – o que já é previsto na Lei nº 9.434/1997,
alterada pela nº 10.211/2001. Assim, o testador irá indicar os detalhes ou
limites a serem observados na eventual hipótese de não poder ser
conscientemente consultado.
Nos testamentos
tradicionais, a vontade do testador irá ter eficácia após a sua morte. Ou seja,
antes desse evento (óbito), não possuem qualquer aplicabilidade. Diferentemente
dessas outras espécies de testamento, o “vital” é o documento apropriado para
surtir efeitos antes da morte, em situações específicas, tais como aquelas que
impliquem estado de incapacidade civil, mesmo que provisória, a fim de que,
neste período, seus interesses sejam preservados.
Em relação a
disposições que tratem sobre a recusa ou aceitação de tratamentos específicos,
para serem consideradas válidas, sabe-se que o testador não poderá recusar cuidados
paliativos, porque estes são garantidores do princípio constitucional da
Dignidade da Pessoa Humana e, igualmente, do direito à morte digna, bem como
por afrontarem a própria filosofia dos cuidados paliativos, que orienta a
prática médica no tratamento de pacientes terminais no Brasil. Seriam, por sua
vez, válidas deliberações acerca de traqueostomia, hemodiálise e ordem
“reanimação”.
No que diz
respeito à escolha do curador – pessoa que assumiria a representação jurídica
dos interesses civis do testador –, essa medida não pode ser confundida com a
outorga de mandato (procuração), cujos poderes se encerram exatamente pela
interdição, na forma do artigo 682, inciso II do Código Civil. Evidente, por
sua vez, que a indicação dessa pessoa pelo testador deverá ser levada em
consideração pelo Juiz à época da escolha do representante, prevalecendo-se
sobre a ordem legal disposta no artigo 1.775 do Código Civil, a fim de
preservar os interesses do testador, em obediência à expressa deliberação
testamentária.
Essa modalidade de
testamento (vital) pode ser realizada por meio de escritura pública ou, até
mesmo, instrumento particular, desde que as formalidades mínimas sejam
observadas.
Apesar de parecer
novidade, inexiste qualquer ineditismo no Testamento Vital, que é aplicado
desde 1960, sobretudo nos Estados Unidos da América. Decerto que, no Brasil,
referida espécie de testamento não tem vasta utilização, sobretudo pelo seu
desconhecimento e, possivelmente, pela ausência de legislação específica que o
regulamente.
No entanto, é
importante ressaltar que há uma Resolução do Conselho Federal de Medicina (nº
1995, de 31 de agosto de 2012), que dispõe sobre a receptividade das diretivas
antecipadas de vontade do paciente no momento de sua incapacidade, a serem consideradas
pelo médico responsável, mediante registro na ficha médica ou prontuário.
Dita Resolução já
foi até motivo de discussão intentada pelo Ministério Público (Estadual e
Federal), sendo que, nas decisões judiciais proferidas, reconheceu-se a
constitucionalidade da aludida Resolução e a harmonia com o ordenamento
jurídico pátrio brasileiro.
Nesse
particular, muito embora a edição de uma lei específica sobre o assunto venha
certamente agregar maior segurança jurídica ao instrumento, é inequívoco que,
frente aos precedentes jurisprudenciais e preenchidos os requisitos mínimos
necessários como ato unilateral com repercussão jurídica, o testamento vital
detém validade e eficácia suficiente para ser aplicado.
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