quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

DISPENSA DISCRIMINATÓRIA – IGUALDADE DE GÊNERO



Orlando José de Almeida

                                        Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

                                

 

A discussão envolvendo atos de natureza discriminatória, de modo geral, vêm ganhando cada vez mais espaço em nossa sociedade.

 

O debate a respeito de práticas discriminatórias contra as mulheres no ambiente de trabalho, de igual forma, tem sido bastante acentuado.

 

No dia 09/01/2025, foi publicada notícia no site do Tribunal Superior do Trabalho -TST, referente ao julgamento proferido nos autos do processo nº TST-RR-1282-19.2016.5.08.0114, cujo acórdão foi publicado no dia 19/12/2024. A matéria recebeu o seguinte título: “Empresa é condenada por dispensar mulheres e contratar homens em seu lugar”.

 

Os fatos que originaram o julgamento, em síntese, foram assim descritos no acórdão: “Porém, contextualizando os acontecimentos de acordo com as orientações do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ, observa-se que no caso dos autos ocorreu o seguinte: a) o quadro de pessoal era composto por 11 mulheres técnicas de enfermagem e 42 homens técnicos de enfermagem; b) foram dispensadas todas as mulheres e apenas 3 homens, sob o argumento de que só poderia permanecer no emprego quem tivesse o curso de bombeiro civil; c) a empresa ofertou o curso de bombeiro civil (condição imposta para manutenção no emprego) a 28 homens e apenas 2 mulheres (mas nenhuma permaneceu no emprego); d) para as vagas das mulheres dispensadas foram contratados homens.”

 

Nas instâncias inferiores não houve o reconhecimento do caráter discriminatório das dispensas, sendo indeferidos os pedidos de indenização, sob alegação de que não existe “expressa previsão legal que estabeleça seja observada pelo empregador eventual proporcionalidade na dispensa entre homens e mulheres de seus quadros como também, por não está a reclamada obrigada legalmente, a "... oportunizar a realização de cursos às reclamantes, uma vez que no poder diretivo do empregador, este não apenas pode, como deve, buscar obter o melhor quadro de funcionários possíveis, aqueles que consigam acumular diversas tarefas...".”

 

A Sexta Turma do TST, em decisão unânime, deu parcial provimento ao Recurso de Revista das reclamantes e reconheceu o caráter discriminatório das dispensas realizadas e condenou a reclamada a indenizá-las, na forma prevista no art. 4º, II, da Lei nº 9.029/95 (percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais), bem como ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 5.000,00 para cada trabalhadora.

 

Os julgadores realizaram uma análise detalhada dos fatos descritos nas decisões anteriores e destacaram que o direito potestativo do empregador não está acima dos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição da República. Interpretaram várias normas do ordenamento jurídico nacional e internacional.

 

A Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho – OIT (ratificada pelo Brasil), preceitua no art. 1º que se trata de discriminação "toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão".

 

A Constituição Federal estabelece em seu art. 5º, I, que "homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição" e, no art. 7º, XXX, registra a “proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”.

 

O art. 1º, da Lei nº 9.029/95, preceitua: "É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do art. 7o da Constituição Federal."

 

Lembre-se que a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT traz nos incisos II e III, do art. 373-A, que é vedado ao empregador: “II - recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez, salvo quando a natureza da atividade seja notória e publicamente incompatível; III - considerar o sexo, a idade, a cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional”.

 

Por fim, nas razões de decidir foi feita referência ao Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça - CNJ.

 

Ao final e para formar o convencimento a Turma Julgadora posicionou na direção de que na hipótese houve “inequívoco marcador de gênero como componente da dispensa de todas as mulheres do quadro de pessoal da empresa”, sendo que “é inegável que as mulheres foram atingidas de forma desproporcional pela dispensa coletiva e de maneira discriminatória tiveram obstados a manutenção do emprego e o acesso a melhores oportunidades.”

 

Em conclusão, nas instâncias inferiores, foi considerado que ao proceder as dispensas o empregador utilizou-se do seu poder potestativo, que é o direito de alterar a situação jurídica dos empregados.

 

No entanto, a Sexta Turma do TST procedeu uma relativização do mencionado poder potestativo, considerando-se o alcance das normas acima apontadas, notadamente de índole Constitucional.

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