terça-feira, 22 de outubro de 2019

DO SALÁRIO E DO DIREITO DE IMAGEM - DIREITO DESPORTIVO

Orlando José de Almeida
Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

                                                                           Bernardo Gasparini Furman
Estagiário de Homero Costa Advogados

Rotineiramente, nos noticiários esportivos, são divulgadas notícias envolvendo atletas profissionais, notadamente vinculadas a jogadores de futebol e os seus clubes respectivos, como é o caso das transferências milionárias e salários astronômicos.

O certo é que os espectadores tecem os seus comentários, muitas das vezes com entusiasmo semelhante ao manifestado quando assistem ao próprio espetáculo. 

Entre esses assuntos podemos destacar os salários e o direito de imagem dos atletas.
Os direitos trabalhistas do atleta profissional encontram-se positivados, especialmente, na Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, e devido a algumas peculiaridades, coube tutela especifica na Lei nº 9.615/98, conhecida como Lei Pelé, que sofreu algumas alterações trazidas pelas Leis nº 12.935/11 e nº 13.155/15.

Uma vez presente os requisitos elencados no artigo 3º, da CLT, e as peculiaridades da legislação especial, o atleta profissional é considerado empregado do clube. Ele possui vários direitos trabalhistas que vão além do salário.

Relativamente ao direito de imagem, a sua relevância merece atenção especial, tanto é assim que a Constituição Federal dispõe que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (...)”, conforme inciso X, do artigo 5º. A sua violação enseja reparação, o que resta consagrado no inciso V.

No artigo 87-A, da Lei nº 9.615/98, com redação da Lei nº 12.395/11, consta que “o direito ao uso da imagem do atleta pode ser por ele cedido ou explorado, mediante ajuste contratual de natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo.”

Posteriormente, o legislador acresceu o parágrafo único ao artigo, ao editar a Lei nº 13.155/15, que estabeleceu: “Quando houver, por parte do atleta, a cessão de direitos ao uso de sua imagem para a entidade de prática desportiva detentora do contrato especial de trabalho desportivo, o valor correspondente ao uso da imagem não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total paga ao atleta, composta pela soma do salário e dos valores pagos pelo direito ao uso da imagem.”

Diante do exposto duas premissas foram fixadas: a) o direito ao uso da imagem do atleta pode ser por ele cedido ou explorado, mediante ajuste de natureza civil; e, b) o valor correspondente ao uso da imagem não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total paga ao atleta, na forma do parágrafo transcrito.

Assim, considerando que o contrato possui natureza civil, o pagamento do direito decorrente do uso de imagem não gera repercussão nas verbas de natureza trabalhista, como é caso de férias, com acréscimo de 1/3, 13º salário e FGTS.

No entanto, alguns clubes, sob o pretexto de que o direito ajustado tem natureza civil, vem utilizando está modalidade de contratação para quitar salário propriamente dito e não direito de imagem, o que revela fraude.

Nestas hipóteses, o clube faz dois contratos com o atleta profissional. Naquele de natureza trabalhista registra um baixo salário e no outro registra as condições para pagamento do direito de imagem, desrespeitando a norma acima citada.

O Colendo Tribunal Superior do Trabalho vem reconhecendo a nulidade da contratação realizada com o intuito de burlar a lei. A título de exemplo foi prolatada decisão nos autos da Reclamação Trabalhista, nº 358-48.2014.5.12.0055, movida pelo jogador Tiago Dutra contra Criciúma Esporte Clube.

O salário consignado na carteira de trabalho do atleta era de R$ 5.000,00, mas o valor mensal que auferia a título de direito de imagem era de R$ 20.000,00.

Como a parcela era paga habitualmente, em quantias mensais fixas e independentemente da utilização da imagem do atleta, concluiu-se que a natureza da verba era de fato salarial. Quando do julgamento a Col. 6ª Turma assim posicionou:

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N° 13.015/2014 E DA INSTRUÇÃO NORMATIVA N° 40 DO TST. ANTERIOR À LEI Nº 13.467/2017. RECLAMADO. DIREITO DE IMAGEM. NATUREZA SALARIAL. 1 - Foram preenchidas as exigências do art. 896, § 1°-A, da CLT. 2 - No caso dos autos, conforme consignou o TRT, a parcela recebida pelo reclamante a título de "direito de imagem", na realidade, tratava-se de salário mascarado, em razão da habitualidade com que era paga a referida parcela. 3 - A jurisprudência do TST não tem acatado o pagamento de remuneração ao atleta profissional sob a denominação de exploração do direito à imagem quando evidenciado que o pagamento tem como objetivo, na realidade, desvirtuar a aplicação da legislação trabalhista. (JULGADOS) 4 – Recurso de revista de que não se conhece.

Posteriormente, a matéria foi submetida à Subseção I, Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), que manteve o entendimento.
Nessa mesma linha o TST decidiu em outras oportunidades. Confira-se a título de exemplo:

RECURSO DE REVISTA (...) 2 - DIREITO DE IMAGEM. NATUREZA JURÍDICA. No que se refere ao direito de imagem, o Tribunal Regional ressaltou que referida parcela era paga com habitualidade, independentemente se houvesse ou não qualquer veiculação da imagem do atleta por parte da reclamada. Esta conduta revela, em verdade, o intuito de burlar os direitos trabalhistas do reclamante. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que verificada a fraude, deve-se declarar o contrato nulo de pleno direito, nos termos do art. 9.º da CLT, atribuindo-se caráter salarial à parcela recebida fraudulentamente a título de direito de imagem e consequente sua integração na remuneração do atleta para todos os efeitos. Precedentes. Recurso de revista não conhecido. (...).  (RR - 195300-71.2008.5.15.0002, Relatora Ministra Delaíde Miranda Arantes, 2ª Turma, DEJT 20/11/2015, Grifou-se).

RECURSO DE REVISTA. (...) DIREITO DE IMAGEM. NATUREZA JURÍDICA SALARIAL. VERBA DECORRENTE DO CONTRATO DE TRABALHO. FRAUDE. A jurisprudência não tem acatado o pagamento de remuneração ao atleta profissional sob a denominação de exploração do direito à imagem quando evidenciado que o pagamento tem como objetivo, na realidade, desvirtuar a aplicação da legislação trabalhista. Isso porque ocorria como praxe o pagamento do valor por meio de constituição de pessoa jurídica. Deve ser reconhecida a natureza salarial da parcela, diante da delimitação fática contida no v. acórdão regional, de que se tratava de contraprestação ao trabalho paga pela reclamada. Recurso de revista não conhecido. (RR - 610-95.2011.5.04.0017, Relator Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, DEJT 26/9/2014).

O contrato do direito de imagem do atleta profissional é de natureza civil, possuindo previsão expressa no ordenamento jurídico nesse sentido, devendo assim ser formalizado e observado.
O que vem sendo reprimido, portanto, é a sua utilização visando fraudar direitos trabalhistas do empregado/atleta. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário