Gustavo
Pires Maia da Silva
Advogado
Sócio de Homero Costa Advogados
De
acordo com a Primeira Turma do Colendo Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), é
possível a distribuição de juros sobre capital próprio no exercício financeiro
em que a empresa obteve lucro, ainda que exista prejuízo acumulado de outros
exercícios.
O
pronunciamento da Corte Superior sobre a matéria aconteceu em um caso em que
houve o provimento de Recurso Especial interposto por conselheiros e acionistas
do Banco do Estado de Sergipe (“Banese”).
O
placar foi apertado. O recurso foi decidido por 3 votos a 2 e serviu para solucionar
um aparente conflito entre a Lei das S.A. (Lei nº 6.404/76) e a Lei nº
9.249/95, que apresenta as regras para dedução dos juros sobre capital próprio.
Importante
esclarecer que os juros sobre capital próprio significam a remuneração que as
empresas pagam àqueles que investiram dinheiro na atividade exercida.
Nos
moldes do Artigo 9º, §1º, da Lei nº 9.249/1995, existem duas possibilidades
para dedução dos juros sobre o capital próprio: 1ª) a existência de lucros,
computados antes da dedução dos juros; 2ª) a existência de lucros acumulados e
reservas de lucros.
Nas
duas hipóteses acima identificadas, os lucros necessitam totalizar quantia
igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados.
O
Artigo 189 da Lei nº 6.404/76 impõe que, antes de qualquer participação no
resultado do exercício financeiro, sejam deduzidos os prejuízos acumulados e a
provisão para o Imposto de Renda.
No
caso julgado pelo STJ, conselheiros e acionistas do Banese assentiram a dedução
de juros sobre capital próprio nos exercícios de 2002/2003 antes de deduzir do
resultado financeiro os prejuízos acumulados.
A
atuação transgrediu o Artigo 189 da Lei das Sociedades Anônimas e produziu
multa aplicada pela Comissão de Valores Imobiliários (“CVM”), que restou
sustentada pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional.
Os
penalizados utilizaram-se do Poder Judiciário para contraditar a penalidade,
mas não tiveram sucesso, inicialmente. O Tribunal Regional Federal da 5ª Região
manteve a multa aplicada pela infração ao dispositivo da Lei das S.A.
O
assunto dissociou na 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Prevaleceu, o
entendimento do Ministro Gurgel de Faria, Relator, que foi acompanhado pelos
Ministros Sérgio Kukina e Benedito Gonçalves.
Para
os Ministros, o funcionamento de pagamento dos juros sobre capital próprio tem
uma previsão própria e especial na legislação que, por isso mesmo, se justapõe
ao Artigo 189 da Lei nº 6.404/76.
Isso
quer dizer que a dedução dos juros sobre capital próprio pode ser realizada
quando a empresa obteve lucro no exercício financeiro, apesar de ter acumulado
prejuízo nos anteriores; ou quando teve prejuízo no exercício financeiro, mas
conservou lucro acumulado previamente.
Afirmou
o Ministro Gurgel de Faria: “Caso o propósito legal fosse proibir o pagamento
dos juros sobre capital próprio por parte das empresas que amargassem prejuízo
acumulado, bastaria condicionar aquele (o pagamento) à existência de lucros
acumulados”.
“Diante
desse raciocínio, não se justifica a manutenção da multa aplicada pela prática
de conduta que era permitida pela lei”, constatou.
Restaram
vencidos a Ministra Regina Helena Costa e o Ministro Paulo Sérgio Domingues.
Segundo eles, os juros sobre o capital próprio são uma forma de destinação do
lucro líquido, o que torna aplicável o Artigo 189 da Lei das Sociedades
Anônimas.
Ou
melhor, é necessário fazer o abatimento das perdas havidas em exercícios
anteriores para oportunizar a remuneração dos acionistas.
Ponderou
a Ministra Regina: “A própria existência de lucro, arrolada pela Lei 9.249/1995
como elemento indispensável ao crédito de tal parcela, pressupõe antecedente
abatimento de perdas anteriormente amontoadas”.
Na
análise da Magistrada, o Artigo 9º, §1º, da Lei nº 9.249/1995 e o Artigo 189 da
Lei das S.A. são totalmente adequados e não carecem de superpor um ao outro.
Ainda
conforme a Ministra, compreender diferente seria contrariar a lógica da Lei nº
6.404/1976, que favorece a reorganização do capital social e a responsabilidade
financeira em prejuízo do mero pagamento de proventos aos acionistas.
Diante do exposto, conclui-se facilmente que não há ilegalidade se existe pagamento de juros sobre capital próprio quando da ocorrência de lucros no exercício, mas prejuízos acumulados.
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