terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

IMPLEMENTAÇÃO DE MOEDA COMUM NO MERCOSUL: VALE A PENA?

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

Nathália Caixeta Pereira de Castro

Colaboradora de Homero Costa Advogados

 

 

Logo na primeira semana do governo Lula, em 3 de janeiro de 2023, o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se reuniu com o Embaixador da Argentina no Brasil, Daniel Scioli, para discutir a possível criação de uma moeda comum entre os países do Mercosul, que seria chamada de Sur.

 

De acordo com Scioli, o objetivo não é criar uma moeda única, como o Euro, e sim uma moeda comum, que possa facilitar o intercâmbio e as relações comerciais entre os países membros. Assim, importante ressaltar que Brasil e Argentina seguiriam com as respectivas moedas, Real e Peso.

 

Segundo Scioli, “Sobre a moeda comum, nós trabalharemos. Não significa que cada país não tem sua moeda, significa uma unidade para integração e aumento do intercâmbio comercial em todo este bloco regional. E, como disse o presidente Lula, fortalecer o Mercosul, ampliar a união latino-americana, é muito importante”.

 

Entretanto, essa ideia de uma moeda conjunta para o bloco Mercosul já surgiu anteriormente em outras ocasiões. O ex-ministro da economia, Paulo Guedes, já considerou a ideia durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. O presidente Lula também já trouxe à tona o tema em seu mandato passado. Ainda, há mais tempo, no final do século XX, alguns economistas defendiam a unificação monetária do Mercosul, assim como havia acabado de ocorrer na União Europeia.

 

Em comitiva presidencial em Buenos Aires, juntamente com o presidente do país Alberto Fernandez, Lula defendeu a proposta: “Se dependesse de mim, a gente teria comércio exterior sempre nas moedas dos outros países para que a gente não tenha que depender do dólar. Por que não tentar criar uma moeda comum entre os países do Mercosul? Por que não tentar criar uma moeda comum entre os países do BRICS?

(...)

“Eu acho que com o tempo isso vai acontecer e é necessário que aconteça, porque muitas vezes países têm dificuldade de adquirir o dólar e você pode fazer acordos, estabelecer um tipo de moda para o comércio que os bancos centrais possam, todo mês ou no tempo que quiserem, fazer um acerto de contas para que os países possam continuar fazendo negócio”

 

Segundo o presidente Lula, tal implementação fortaleceria a relação e a parceria comercial entre Brasil e Argentina, além de reduzir custos operacionais e vulnerabilidades externas.

 

Especialistas divergem sobre o assunto, apresentando vantagens e desvantagens. “O problema é que a Argentina tem pouca liquidez em dólares e não consegue incrementar significativamente o volume de operações com o Brasil”. “Então, caso haja essa moeda internacional, as negociações entre os dois países ficarão menos sensíveis às variações do dólar. Mas isso não significa que os preços das mercadorias ficarão imunes a variações do dólar”, afirma o advogado Rodrigo Jansen.

 

O economista e professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Marcos Rambalducci, diz que "essas transações econômicas seriam facilitadas, além de baratear os custos, é um incentivo para que estas economias aprofundem relações comerciais, melhorando o desempenho econômico dos participantes." Assim, as exportações do Brasil para a Argentina seriam facilitadas e a economia brasileira fomentada.

 

Já no que concerne às desvantagens, o principal ponto abordado por especialistas abrange a instabilidade econômica da Argentina. O professor Mauro Rochlin, professor e coordenador do curso de MBA de Gestão Estratégica e Econômica de Negócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV) se apresenta cético em relação à proposta: “Eles (argentinos) enfrentam um processo inflacionário agudo, e por conta disso, não é raro eles assistirem a episódios de forte volatilidade da moeda deles, ou seja, variações muito profundas em um espaço muito curto. Então, essa volatilidade mais extremada da moeda argentina torna muito difícil se estabelecer uma moeda comum”. O professor ainda afirma que, caso a proposta tenha seguimento, será necessário dar alguma garantia aos credores a fim de amenizar essa volubilidade.

 

O economista da Eleven Financial Thomaz Sarquis segue a mesma linha de raciocínio e afirma, “O grande problema é a falta de autonomia monetária. Quando o Banco Central Europeu sobe os juros, por exemplo, a alta vale para toda a moeda euro. No nosso caso, em uma política como esta, o Brasil estaria dependente da situação fiscal da Argentina para definir o aumento dos juros, visto que o risco seria percebido como sendo do bloco.

(...)

Ainda que nossa política fiscal não seja um exemplo para os demais países, temos uma moeda mais estável do que a da Argentina.”

 

A discussão sobre a criação da moeda comum entre os países do Mercosul aborda várias vertentes e deve ser minuciosamente analisada e, se implementada, é importante que sua integração e transição ocorram de forma a dirimir quaisquer danos que possam surgir.

 

Para o deputado Kim Kataguiri (União-SP), autor do Projeto de Lei Complementar (PLP) 11/23, que proíbe o Brasil de adotar moeda comum com outros países ou organismos internacionais (https://www.camara.leg.br/noticias/939120-projeto-veda-adocao-de-moeda-unica-com-outros-paises/ ):

 

“É uma temeridade querer instituir uma nova moeda apenas por questões de afinidade ideológica, sem maior estudo a respeito de viabilidade técnica. É necessário que o Congresso Nacional aja a fim de evitar que o bem-estar econômico brasileiro seja colocado em risco apenas por conta de uma pauta radical do governo.”

 

O assunto deve ser bem acompanhado!

 

 

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