Orlando José de Almeida
Advogado Sócio de Homero Costa Advogados
Bernardo Gasparini Furman
Advogado Associado de Homero Costa Advogados
Em
recente artigo[1],
enfatizamos que no dia 11 de março do ano em curso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a
existência de uma pandemia global decorrente do Novo Coronavírus.
Destacamos, naquela oportunidade, que os efeitos da crise nas relações
do trabalho restaram sentidos.
De fato, várias normas já foram editadas
tendo como pressuposto fundamental a aplicação do artigo 501, da CLT, ao
estabelecer que “entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em
relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não
concorreu, direta ou indiretamente”.
Objetivando a implementação, de modo mais
célere, procurou-se flexibilizar ou simplificar procedimentos exigidos em
normas existentes ou naquelas instituídas, para serem aplicadas durante o
estado de calamidade pública, reconhecido pelo Decreto
Legislativo 06/2020, ou seja, até 31.12.2020.
Nessa direção, em 01.04.2020, foi
publicada a Medida Provisória 936, que criou o Programa Emergencial de
Manutenção do Emprego e da Renda.
E
para atingir a finalidade, resumidamente, foi autorizada a
celebração de acordo entre empregador e empregado, ou entre empregador e
sindicato, de forma a permitir a redução
proporcional da jornada de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do
contrato de trabalho, com a participação do governo, mediante pagamento de
Benefício Emergencial que será custeado com recursos da União.
É importante esclarecer
que as medidas provisórias produzem efeitos imediatos, ou seja, após a
publicação, mas dependem de aprovação do Congresso Nacional para transformação
definitiva em lei. O prazo de vigência é de sessenta dias, prorrogáveis uma vez
por igual período. Além do mais estão também sujeitas ao controle de
constitucionalidade.
A
Medida Provisória 936/2020, consoante apontado, instituiu o Programa
Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, e dispôs sobre medidas
trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública em
virtude do coronavírus (covid-19).
O Programa Emergencial
tem como objetivo: I - preservar o emprego e a renda; II - garantir a
continuidade das atividades laborais e empresariais; e, III - reduzir o impacto
social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e de
emergência de saúde pública.
As
ações a serem adotadas para atingir as finalidades são: I
- o pagamento do Benefício Emergencial;
II - a redução
proporcional de jornada de trabalho e de salário; e,
III - a suspensão
temporária do contrato de trabalho.
Consta expressamente na
Medida Provisória que as suas normas não tem incidência “no âmbito da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aos órgãos da administração
pública direta e indireta, às empresas públicas e sociedades de economia mista,
inclusive às suas subsidiárias, e aos organismos internacionais”.
Ademais, o Benefício
Emergencial não será devido ao
empregado que esteja ocupando cargo ou emprego público, cargo em comissão de
livre nomeação e exoneração ou a titular de mandato eletivo. Também não alcança empregado em gozo de: a)
benefício de prestação continuada do Regime Geral de Previdência Social ou dos
Regimes Próprios de Previdência Social, ressalvado o recebimento de pensão ou auxílio acidente; b) seguro-desemprego, em
qualquer de suas modalidades; e, c) bolsa de qualificação profissional de que
trata o art. 2º-A da Lei n° 7.998, de 1990.
O empregado com mais de
um vínculo formal de emprego poderá receber, cumulativamente, o Benefício
Emergencial para cada vínculo com redução proporcional de jornada de trabalho e
de salário ou com suspensão temporária do contrato de trabalho.
E especificamente quanto
ao empregado com contrato de trabalho intermitente, ele fará jus ao benefício
emergencial mensal, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), pelo período de
três meses, mas referente a apenas um contrato nessa modalidade e não pode ser
acumulado com o pagamento de outro auxílio emergencial.
O Benefício Emergencial
será custeado com recursos da União e quitado nas hipóteses em que ocorrer a
redução proporcional de jornada de trabalho e de salário, ou da suspensão
temporária do contrato de trabalho, observando-se as ressalvas acima.
A benesse será paga mensalmente enquanto durar uma ou outra das
situações mencionadas.
Para tanto, o empregador deverá informar ao Ministério da Economia, no
prazo de dez dias, que foi firmado o ajuste com o empregado. A primeira parcela
será paga em trinta dias. Os prazos indicados serão contados da data da
celebração do acordo.
Se o empregador não
prestar a informação dentro do prazo indicado, ficará responsável pelo
pagamento da remuneração no valor anterior à redução da jornada de trabalho e
de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho. Neste caso, a
data de início da concessão do Benefício Emergencial será a da informação e o
mesmo será devido pelo restante do período.
O Benefício Emergencial terá como base de cálculo o valor mensal do
seguro-desemprego a que o empregado teria direito.
Quando se tratar de
redução de jornada de trabalho e de salário, será calculado aplicando-se sobre
a base de cálculo o percentual da redução.
Já na suspensão temporária
do contrato de trabalho o valor mensal corresponderá, em regra, a cem por cento
do montante do seguro-desemprego a que o empregado teria direito.
Porém, a quantia será
equivalente a setenta por cento do seguro-desemprego, quando a empresa que
tiver obtido, em 2019, receita bruta superior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões
e oitocentos mil reais). Em contrapartida, o empregador
concederá ajuda compensatória mensal de trinta por cento do valor do salário do
empregado, durante o período da suspensão temporária de trabalho.
A redução proporcional
da jornada de trabalho e de salário pode ser pactuada no máximo em até noventa
dias, ainda que em ajustes sucessivos, desde que: a) seja preservado o valor do
salário-hora; b) seja firmada por acordo individual escrito entre empregador e
empregado, ressalvada determinação abaixo, o qual deverá ser encaminhado ao
empregado com antecedência de, no mínimo, dois dias corridos; e, c) sejam
observados os percentuais de vinte e cinco por cento, ou de cinquenta por
cento, ou de setenta por cento.
De outro lado, a suspensão temporária do contrato de trabalho pode ser ajustada por até sessenta dias, fracionada em dois
períodos de trinta dias, desde que seja celebrada por acordo individual escrito
entre empregador e empregado, ressalvada determinação abaixo, o qual deverá ser
encaminhado ao empregado com antecedência de, no mínimo, dois dias corridos.
Merece ser enfatizado
que durante o período de suspensão temporária do contrato, o empregado tem
direito de auferir todos os benefícios concedidos pelo empregador e, ainda,
fica autorizado a recolher para o INSS na qualidade de segurado facultativo.
No interregno temporal
da suspensão temporária do contrato de trabalho é vedado ao empregado
desempenhar quaisquer atividades laborais, mesmo de forma parcial, inclusive se
estiver em regime de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho à distância, sob
pena de ser a mesma descaracterizada. Como se não bastasse, o empregador ficará
sujeito ao pagamento imediato da remuneração e dos encargos sociais referentes
a todo o período, além de incidir as penalidades previstas em lei, convenção ou
em acordo coletivo.
É importante destacar
que é estabelecido na norma que a jornada de trabalho e o salário pago
anteriormente, ou o contrato de trabalho, serão restabelecidos no prazo de dois
dias corridos contados da cessação do estado de calamidade pública, ou da data
prevista para encerramento da redução ou suspensão pactuadas, ou, ainda, da
data da comunicação do empregador informando ao empregado sobre a sua decisão
de antecipar o fim do período de redução ou da suspensão ajustadas.
O Benefício Emergencial
poderá ser acumulado com o pagamento, pelo empregador, de ajuda compensatória
mensal, em decorrência da redução de jornada de trabalho e de salário ou da
suspensão temporária de contrato de trabalho.
A ajuda compensatória
mensal: a) deverá ter o valor definido no acordo individual
pactuado ou em negociação coletiva (exceto na hipótese em que o seu percentual
foi fixado na norma em 30%); b) terá natureza indenizatória; c) não integrará a base de cálculo do imposto de renda
retido; d) não integrará a base de cálculo da contribuição previdenciária e dos
demais tributos incidentes sobre a folha de salários; e) não integrará a base de cálculo do valor devido ao
FGTS; e, f) poderá ser excluída do lucro líquido para fins de determinação do
imposto sobre a renda da pessoa jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido das pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real.
Além das disposições
indicadas no parágrafo anterior, quando se tratar de redução proporcional de
jornada e de salário, a ajuda compensatória não integrará ao salário do
empregado.
O empregado
que receber o Benefício
Emergencial será portador de garantia provisória no emprego durante a vigência
do ajuste e, ainda, por igual período após o término.
A garantia de emprego
não se aplica ao empregado que der motivo ao rompimento do contrato por pedido
dispensa ou por justa causa.
Mas se o empregador
promover a dispensa, sem justa causa, durante o período da garantia provisória
no emprego, além do pagamento das parcelas rescisórias previstas na legislação
em vigor, indenizará o empregado no valor de: a) cinquenta por cento do salário
a que o empregado teria direito no referido período, na hipótese de redução de
jornada de trabalho e de salário igual ou superior a vinte e cinco por cento e
inferior a cinquenta por cento; b) setenta e cinco por cento do salário a que o
empregado teria direito no referido período, na hipótese de redução de jornada
de trabalho e de salário igual ou superior a cinquenta por cento e inferior a
setenta por cento; ou, c) cem por cento do salário a que o empregado teria
direito no referido período, nas hipóteses de redução de jornada de trabalho e
de salário em percentual superior a setenta por cento ou de suspensão
temporária do contrato de trabalho.
As medidas de redução de
jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária de contrato de
trabalho poderão ser celebradas por meio de negociação coletiva, observados os
prazos já indicados anteriormente.
E se utilizada a via negocial apontada, na convenção ou no acordo
coletivo de trabalho, poderão ser estabelecidos percentuais de redução de
jornada de trabalho e de salário diversos daqueles fixados, ou seja, de vinte e
cinco, ou cinquenta, ou de setenta por cento.
Destaca-se, também, que se ajustados percentuais de redução de jornada
de trabalho e de salário diversos: a) não será devido o Benefício Emergencial para a redução de jornada e de salário
inferior a vinte e cinco por cento; b) o Benefício Emergencial será de vinte e
cinco por cento sobre a base de cálculo prevista no art. 6º
(seguro-desemprego), para a redução de jornada e de salário igual ou superior a
vinte e cinco por cento e inferior a cinquenta por cento; c) o Benefício
Emergencial será de cinquenta por cento sobre a base de cálculo prevista no
art. 6º (seguro-desemprego), para a redução de jornada e de salário igual ou
superior a cinquenta por cento e inferior a setenta por cento; e, d) o
Benefício Emergencial será de setenta por cento sobre a base de cálculo
prevista no art. 6º (seguro-desemprego), para a redução de jornada e de salário
superior a setenta por cento.
Restou indicado na
Medida Provisória que as convenções ou os acordos coletivos de trabalho celebrados
anteriormente poderão ser renegociados para adequação de seus termos, no prazo
de dez dias corridos, contado da data da publicação da MP.
Em qualquer situação,
vale dizer, se for adotada a redução proporcional de jornada
de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho,
deve ser resguardado o exercício e o funcionamento dos serviços públicos e das
atividades essenciais.
As disposições previstas
na Medida Provisória se aplicam também aos contratos de trabalho de
aprendizagem e de jornada parcial.
Consta da Medida
Provisória que poderão ser utilizados os meios eletrônicos para atendimento dos
requisitos formais previstos no Título VI, da CLT, ao tratar das
negociações coletivas, inclusive para convocação, deliberação, decisão, formalização e
publicidade de convenção ou de acordo coletivo de trabalho. Foi também fixado
que os prazos previstos no mencionado Título VI ficam reduzidos pela metade.
Por
fim, restou estabelecido que o empregador poderá oferecer curso ou o programa
de qualificação profissional, previsto no artigo 476-A, da CLT, exclusivamente
na modalidade não presencial, que terá duração não inferior a um mês e nem
superior a três meses.
Estes,
portanto, são os pontos de maior relevância contidos na Medida Provisória.
2. Discussão a Respeito da
Constitucionalidade da Medida Provisória.
No
§ 4º, do artigo 11, da MP, resta indicado que “os
acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de
suspensão temporária do contrato de trabalho, pactuados nos termos desta Medida
Provisória, deverão ser comunicados pelos empregadores ao respectivo sindicato
laboral, no prazo de até dez dias corridos, contado da data de sua celebração”.
Essa modalidade de
ajuste foi autorizada para determinados grupos de trabalhadores, o que será
adiante abordado.
E quanto ao tema
esclarecemos a titulo exemplificativo, que o partido político, Rede Sustentabilidade, ajuizou Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI 6363), perante o Supremo Tribunal Federal para
tentar afastar a possibilidade de redução de jornada e salário ou de suspensão
temporária do contrato de trabalho, mediante acordo individual, alegando ofensa
aos artigos 7º e 8º da Constituição Federal.
No dia 17.04.2020, o Plenário do Supremo Tribunal
Federal (STF), por maioria de votos, negou
referendo à liminar concedida pelo ministro Ricardo Lewandowski, que
estabelecia que após a comunicação dos acordos individuais, os
sindicatos poderiam manifestar sobre a validade deles e deflagrar negociação
coletiva.
Consequentemente, ficou mantida a eficácia
da Medida Provisória 936/2020,
em sua integralidade. Para ter validade os acordos individuais não dependem de
anuência do sindicato da categoria profissional.
Dessa
forma, segundo posicionamento do Supremo Tribunal Federal, a Medida Provisória,
nos termos em que fora editada, não fere dispositivos da Constituição Federal.
O acórdão ainda não foi publicado, mas acerca do
julgamento consta em notícia veiculada no site do STF[2], que prevaleceu a divergência aberta
pelo ministro Alexandre de Moraes, indicando em síntese:
a) “Ele
entende que, em razão do momento excepcional, a previsão de acordo individual é
razoável, pois garante uma renda mínima
ao trabalhador e preserva o vínculo de emprego ao fim da crise. Segundo
ele, a exigência de atuação do sindicato, abrindo negociação coletiva ou não se
manifestando no prazo legal, geraria insegurança jurídica e aumentaria o risco
de desemprego”;
b) “Para o ministro, a regra não fere
princípios constitucionais, pois não há conflito entre empregados e
empregadores, mas uma convergência sobre a necessidade de manutenção da
atividade empresarial e do emprego. Ele considera que, diante da
excepcionalidade e da limitação temporal, a regra está em consonância com a
proteção constitucional à dignidade do trabalho e à manutenção do emprego”;
e,
c) “O
ministro Alexandre de Moraes destacou ainda a proteção ao trabalhador que
firmar acordo. De acordo com a MP, além da garantia do retorno ao salário
normal após 90 dias, ele terá estabilidade por mais 90 dias.”
Pelo que pode ser
constatado as medidas relativas ao pagamento do Benefício Emergencial, da
redução proporcional de jornada de trabalho e de salário, e da suspensão
temporária do contrato de trabalho, serão implementadas por meio de acordo
individual ou de negociação coletiva
quando se tratar de empregados: I - com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00
(três mil cento e trinta e cinco reais); ou, II - portadores de diploma de
nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite
dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Assim, quando for a hipótese, basta a simples comunicação ao Sindicato no prazo de
10 (dez) dias após a celebração dos referidos acordos individuais.
Todavia, quanto for o caso de empregados não enquadrados nos limites
acima, as medidas somente poderão ser estabelecidas por convenção ou acordo
coletivo, ressalvada a redução de jornada de trabalho e de salário de vinte e
cinco por cento, que poderá ser pactuada por acordo individual.
Na
decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, ao que nos parecer, buscou-se
proteger o emprego e, especialmente o empregador. Afinal, se não existir o
empregador não existirá o emprego.
3. Considerações Finais.
Conforme
pode ser verificado acima são várias as hipóteses fixadas na Medida Provisória
936/2020, que autorizam a celebração de acordo entre empregador e empregado, ou
entre empregador e sindicato, através de redução
da jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de
trabalho.
O certo é que as
medidas, em regra, contarão com a participação de todos os envolvidos, ou seja,
do Governo, dos empregadores e dos empregados.
Os
empregados que recebem salários no valor de até R$ 3.135,00, sofrerão um
impacto menor na renda mensal. Mas até para estes o montante a ser concedido
pelo Governo não cobrirá o salário pago normalmente, uma vez que o Benefício Emergencial é atrelado ao
seguro-desemprego.
Entretanto,
na Medida Provisória é permitida a concessão por parte das empresas, cumulativamente ao pagamento do Benefício
Emergencial, de uma ajuda compensatória mensal, a qual deverá ser definida por
acordo individual ou coletivo.
Assim, o empregador se desejar e se possível for,
por mera liberalidade, poderá fazer a complementação da parte do Governo,
permitindo que o empregado venha receber até o valor integral do seu salário.
Lembre-se que a ajuda compensatória mensal: a) terá natureza
indenizatória; b) não integrará a base de cálculo do imposto de renda
retido; c) não integrará a base de cálculo da contribuição previdenciária e dos
demais tributos incidentes sobre a folha de salários; d) não integrará a base de
cálculo do valor devido ao FGTS; e) poderá ser excluída do lucro líquido para
fins de determinação do imposto sobre a renda da pessoa jurídica e da
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das pessoas jurídicas tributadas pelo
lucro real; e, f) quando se tratar e redução proporcional de jornada e de
salário, ela não integrará ao salário do empregado.
Dúvidas
não restam de que o momento exige união, mediante estabelecimento de um
verdadeiro pacto social, com a efetiva participação e colaboração de toda
sociedade para que possamos superar a crise. E a edição da Medida Provisória, sob
análise, contribuirá para que tal propósito seja atingido.
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