quinta-feira, 19 de setembro de 2019

CONTROLE DE JORNADA E O REGISTRO DE PONTO POR EXCEÇÃO SOB A PERSPECTIVA DA MEDIDA PROVISÓRIA n° 881/2019


  Orlando José de Almeida
Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

                                                                           Bernardo Gasparini Furman
Estagiário de Homero Costa Advogados



A Medida Provisória nº 881/2019, conhecida como “Medida Provisória da Liberdade Econômica”, tem como objetivo principal melhorar o ambiente de negócios em nosso país, com a desburocratização das atividades empresariais.
Nessa seara, visando substancial redução da intervenção do Estado, trouxe “normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica”. Buscou-se, como regra, valorizar e dar credibilidade aos contratos celebrados, interpretando-os “em favor da liberdade econômica”, respeitando ao máximo o postulado da boa-fé.
O texto final da Medida Provisória foi encaminhado ao Presidente da República, que deverá sancioná-la, com a sua conversão em lei. Contém novidades em vários ramos do direito, inclusive, traz algumas mudanças em artigos da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.
O objeto do presente é a análise das alterações e acréscimos ao artigo 74, da CLT, que versa sobre o registro de horário de trabalho dos empregados.
Para melhor compreensão, segue quadro comparativo entre o que está previsto na CLT, atualmente, e a nova redação com as alterações e a inclusão do parágrafo 4°, pela Medida Provisória:


 Art. 74 CLT
Art. 74 - MP 881/2019

Caput: O horário do trabalho constará de quadro, organizado conforme modelo expedido pelo Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, e afixado em lugar bem visível. Esse quadro será discriminativo no caso de não ser o horário único para todos os empregados de uma mesma seção ou turma.

Caput: O horário de trabalho será anotado em registro de empregados.

§1° O horário de trabalho será anotado em registro de empregados com a indicação de acordos ou contratos coletivos porventura celebrados.

§1° REVOGADO

§2° Para os estabelecimentos de mais de dez trabalhadores será obrigatória à anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho, devendo haver pré-assinalação do período de repouso. 

§2° Para os estabelecimentos com mais de 20 (vinte) trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de entrada e saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções expedidas pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, permitida a pré-assinalação do período de repouso.  

§3° Se o trabalho for executado fora do estabelecimento, o horário dos empregados constará, explicitamente, de ficha ou papeleta em seu poder, sem prejuízo do que dispõe o § 1º deste artigo.


§3° Se o trabalho for executado fora do estabelecimento, o horário dos empregados constará do registro manual, mecânico ou eletrônico em seu poder, sem prejuízo do que dispõe o caput deste artigo.





§4° Fica permitida a utilização de registro de ponto por exceção à jornada regular de trabalho, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.

A primeira alteração, que ocorreu no caput, do artigo 74, indica que não será mais necessária a fixação de quadro em lugar visível, contendo o horário de trabalho. Com essa mudança, meramente administrativa, bastará a anotação do horário de trabalho em registro de empregados.
No parágrafo segundo, consta que o controle de jornada passará a ser obrigatório para estabelecimentos com mais de vinte empregados, sendo que essa imposição é para empresas com mais dez trabalhadores. A intenção, portanto, foi a de simplificar o controle de jornada abrangendo um número bem maior de empresas.
Sem dúvida, a modificação de maior impacto foi à inclusão do parágrafo quarto, que permite a adoção do “registro de ponto por exceção à jornada regular de trabalho, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho”.
Dessa forma, o empregado ficará dispensado de anotar sua entrada, saída e intervalos ou de fazer a pré-assinalação destes, registrando apenas as horas extras realizadas, ou eventos como afastamentos, atrasos, saídas antecipadas ou faltas.
De outro lado, devemos lembrar que a discussão sobre a possibilidade do registro de ponto por exceção não é nova.
A jurisprudência trabalhista se posicionava na direção de que não era válida cláusula admitindo essa modalidade, mesmo que ajustada em instrumentos normativos, tendo em vista que era contrária ao regramento previsto na CLT (artigo 74, § 2º).
No entanto, com a edição da Lei nº 13.467/2017 (conhecida como reforma trabalhista), foi previsto que a convenção e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei, quando dispuserem a respeito da “modalidade de registro de jornada de trabalho” (inciso X, do artigo, 611-A da CLT), o que, aliás, está em consonância com a sinalização do Supremo Tribunal Federal ao julgar os Recursos Extraordinários 590.415 e 895.759. Naquelas oportunidades o STF interpretou que a autonomia coletiva da vontade prevista no inciso XXVI (reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho), do artigo 7º, da Constituição Federal, deveria prevalecer.
A partir da nova legislação, o TST começou a reconhecer a validade da marcação de ponto por exceção em caso de expressa previsão em norma coletiva, como ocorreu quando dos julgamentos do RR 0002016-02.2011.5.03.0011 e do RR 1001704-59.2016.5.02.0076.
Na realidade, a MP 881/2019 busca a pacificação dessa matéria, para admitir o ponto por exceção através de autorização em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho e, ainda, por intermédio de acordo individual entre empregado e empregador.
Contextualizados os fatos, uma reflexão no que tange às consequências desse novo método se faz necessária.
Após a inclusão na MP 881/2019 das modificações ao artigo 74, da CLT, existem questionamentos de parte da doutrina, de alguns membros do Ministério Público do Trabalho e de alguns Magistrados integrantes da Justiça do Trabalho.
Destacam que nos casos em que o estabelecimento possui mais de vinte empregados, e em sendo adotado o controle de ponto por exceção, o ônus da prova em uma eventual reclamação trabalhista, contendo pleitos de horas extras, que até então era do empregador (Súmula 338 do TST), passará a ser do empregado, como acontece nas hipóteses em que não há obrigatoriedade dos controles de ponto. 
Aduzem que tais medidas poderão prejudicar a fiscalização quanto ao cumprimento de jornada de trabalho e o adimplemento de horas extras e, consequentemente, ensejarão o aumento das ações judiciais, o que de fato não pode ser desconsiderado e ignorado.
Mas se inseridas as alterações definitivamente no ordenamento jurídico, o que se espera para aqueles que adotarem o ponto por exceção, notadamente mediante acordo individual escrito, é que o façam dentro do espírito da MP 881/2019.
O Governo pretende é a simplificação dos procedimentos referentes aos registros de jornada, observando-se em especial o princípio da boa-fé entre as partes – empregador e empegado – de modo a evitar, se assim for feito, a formação de passivo trabalhista e desgastes na relação entre elas. 

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