ACORDOS E CONVENÇÕES
COLETIVAS DE TRABALHO – PREVALÊNCIA SOBRE A LEGISLAÇÃO TRABALHISTA
Orlando José de Almeida
Sócio de Homero Costa Advogados
Daniel
de Oliveira Varandas
Estagiário de Direito no Homero Costa
Advogados
Encontra-se em tramitação o Projeto de nº Lei 6787/16, de iniciativa do
Poder Executivo, que além de outros assuntos, estabelece a prevalência de
acordos e convenções coletivas de trabalho sobre a legislação trabalhista. A
proposta faz parte das mudanças no cenário trabalhista anunciadas pelo Governo
Federal em 22 de dezembro de 2016.
Caso aprovado o Projeto de Lei, será acrescentado ao artigo 611, da CLT,
a seguinte redação:
“Art. 611-A. A convenção ou o acordo coletivo de trabalho tem
força de lei quando dispuser sobre:
I - parcelamento de período de férias anuais em até três
vezes, com pagamento proporcional às parcelas, de maneira que uma das frações
necessariamente corresponda a, no mínimo, duas semanas ininterruptas de
trabalho;
II - pacto quanto à de cumprimento da jornada de trabalho,
limitada a duzentas e vinte horas mensais;
III - participação nos lucros e resultados da empresa, de
forma a incluir seu parcelamento no limite dos prazos do balanço patrimonial
e/ou dos balancetes legalmente exigidos, não inferiores a duas parcelas;
IV - horas in itinere;
V - intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de
trinta minutos;
VI - ultratividade da norma ou do instrumento coletivo de
trabalho da categoria;
VII - adesão ao Programa de Seguro-Emprego - PSE, de que
trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de 2015;
VIII - plano de cargos e salários;
IX - regulamento empresarial;
X - banco de horas, garantida a conversão da hora que exceder
a jornada normal de trabalho com acréscimo de, no mínimo, cinquenta por cento;
XI - trabalho remoto;
XII - remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas
percebidas pelo empregado; e
XIII - registro de jornada de trabalho.”
O Projeto tem
provocado polêmicas e, inclusive, com o objetivo de que seja realizada uma
maior discussão a respeito da matéria, algumas centrais sindicais entregaram no
dia 17/01/2017 requerimento ao
presidente Michel Temer para que o mesmo não tramite no Congresso Nacional em
regime de urgência.
Aliás, no dia
03/01/2017, em audiência pública na Comissão de Trabalho da Câmara dos
Deputados, o representante da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do
Brasil (CTB), Pascoal Carneiro, defendeu o arquivamento do Projeto de Lei em
questão. Ele afirmou que vai haver um “caos no País se o que for negociado numa
convenção coletiva de trabalho ficar acima da legislação, como a Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT)”.
Todavia, ao que nos
parece, o que não pode prevalecer é a situação atual.
De fato, é bastante
comum o ajuizamento de ações na esfera trabalhista buscando o reconhecimento de
nulidade de
acordos e convenções coletivas de trabalho,
sendo muitas delas provocadas pelo Ministério Público do Trabalho, o que vem
gerando a ausência de tranquilidade aos interlocutores de tais ajustes,
notadamente os empresários.
E nesse contexto foi
mencionado na exposição de motivos do Projeto que “o Brasil vem desde a
redemocratização em 1985 evoluindo no diálogo social entre trabalhadores e
empregadores. A Constituição Federal de 1988 é um marco nesse processo, ao
reconhecer no inciso XXVI do art. 7º as convenções e acordos coletivos de
trabalho. O amadurecimento das relações entre capital e trabalho vem se dando
com as sucessivas negociações coletivas que ocorrem no ambiente das empresas a
cada data-base, ou fora dela. Categorias de trabalhadores como bancários,
metalúrgicos e petroleiros, dentre outras, prescindem há muito tempo da atuação
do Estado, para promover-lhes o entendimento com as empresas. Contudo, esses
pactos laborais vem tendo a sua autonomia questionada judicialmente, trazendo
insegurança jurídica às partes quanto ao que foi negociado. Decisões judiciais
vem, reiteradamente, revendo pactos laborais firmado entre empregadores e
trabalhadores, pois não se tem um marco legal claro dos limites da autonomia da
norma coletiva de trabalho.”
Realmente, a respeito
das discussões judiciais sobre a validade de acordos ou convenções coletivas de
trabalho prevendo a flexibilização das leis trabalhistas, é digno de nota que o
Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre tal possiblidade.
De fato, ao Recurso Extraordinário nº 895.759, em que
a relatoria coube ao Ministro Teori Zavascki, foi dado provimento para afastar
a condenação de uma empresa ao pagamento das horas in itinere e dos respectivos
reflexos salariais.
Ressalte-se que na fundamentação desse julgamento foi
feita referência ao RE 590.415, cujo Relator foi o Ministro Roberto Barroso,
onde era discutida a validade de quitação ampla do contrato de trabalho,
constante de plano de dispensa incentivada.
Em seu voto o Ministro Roberto Barroso enfatizou que:
“a) a Constituição reconheceu as convenções e os acordos coletivos como
instrumentos legítimos de prevenção e de autocomposição de conflitos
trabalhistas; tornou explícita a possibilidade de utilização desses
instrumentos, inclusive para a redução de direitos trabalhistas; atribuiu ao
sindicato a representação da categoria; impôs a participação dos sindicatos nas
negociações coletivas; e assegurou, em alguma medida, a liberdade sindical
(...)”; (b) “a Constituição de 1988 (...) prestigiou a autonomia coletiva da
vontade como mecanismo pelo qual o trabalhador contribuirá para a formulação
das normas que regerão a sua própria vida, inclusive no trabalho (art. 7º,
XXVI, CF)”; (c) “no âmbito do direito coletivo, não se verifica (...) a mesma
assimetria de poder presente nas relações individuais de trabalho. Por
consequência, a autonomia coletiva da vontade não se encontra sujeita aos
mesmos limites que a autonomia individual”; (d) “(...) não deve ser vista com
bons olhos a sistemática invalidação dos acordos coletivos de trabalho com base
em uma lógica de limitação da autonomia da vontade exclusivamente aplicável às
relações individuais de trabalho”.
Noutro norte, merece destaque, ainda, outros pontos contidos
no Projeto, referentes ao assunto em debate.
Restou indicado que “na hipótese de flexibilização de norma
legal relativa a salário e jornada de trabalho, observado o disposto nos
incisos VI, XIII e XIV do caput do art. 7º da Constituição,
a convenção ou o acordo coletivo de trabalho firmado deverá explicitar a
vantagem compensatória concedida em relação a cada cláusula redutora de direito
legalmente assegurado.”
Em contrapartida, foi vedada a alteração por meio de
convenção ou acordo coletivo de norma de segurança e de medicina do trabalho.
Foi também previsto que os acordos ou as convenções coletivas
de trabalho, podem ser submetidos a exame pela Justiça do Trabalho.
Todavia, esta analisará, preferencialmente, a conformidade
dos elementos essenciais do negócio jurídico previsto nos referidos
instrumentos, ficando “balizada sua atuação pelo princípio da intervenção
mínima na autonomia da vontade coletiva”, restringindo, consequentemente, a
amplitude em que a questão vem sendo enfrentada nos dias atuais.
Com isso, o que se busca, é efetivamente alcançar uma segurança
jurídica para os envolvidos no negócio, bem como para aqueles que procuram
trazer novos investimentos para o Brasil.
Portanto, muito
embora existam preocupações quanto ao tema, é importante que dentro dos limites
da legalidade, deve-se permitir a flexibilização da legislação trabalhista para
uma melhor valorização da negociação coletiva entre trabalhadores e
empregadores, propiciando a esperada segurança jurídica.
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