quarta-feira, 1 de outubro de 2025

DA DESNECESSIDADE DE ALTERAÇÃO DA LEI 8.906 PARA PERMITIR CONSÓRCIOS ENTRE SOCIEDADES DE ADVOGADOS

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

O Projeto de Lei 3716/2019, atualmente aguardando pauta na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), de autoria da Deputada Federal Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), propõe a inclusão dos §§ 8º, 9º e 10 ao art. 15 da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil). O texto sugerido é o seguinte:

Art.15
§ 8º As sociedades de advogados podem firmar entre si consórcio para prestação de serviços jurídicos, delimitando cada qual o âmbito de atuação e as responsabilidades perante si e perante terceiros.

§ 9º Somente podem participar do consórcio a que se refere o § 8º, a sociedade de advogados com registro dos seus atos constitutivos aprovado no Conselho Seccional da OAB, em cuja base territorial tiver sede.

§ 10 O disposto nos §§ 8º e 9º se aplica à sociedade unipessoal de advocacia. (NR)

A Comissão Nacional de Sociedades de Advogados do Conselho Federal da OAB, sob relatoria do advogado Antônio Chaves Abdalla, emitiu uma Nota Técnica contrária à aprovação do projeto, apontando que a legislação vigente já contempla mecanismos adequados para parcerias entre sociedades de advogados. A seguir, apresento uma análise detalhada dos principais pontos abordados.

Natureza Jurídica do Consórcio

O consórcio, conforme disposto nos artigos 278 e 279 da Lei nº 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações), é caracterizado como um contrato entre sociedades para a execução de determinado empreendimento. Não se trata de uma sociedade propriamente dita, porque o consórcio não possui personalidade jurídica. As consorciadas se obrigam apenas nas condições previstas no contrato.

Por outro lado, o art. 16 da Lei 8.906/1994 veda o registro e funcionamento de sociedades de advogados que apresentem características de sociedades empresárias. Assim, a previsão de consórcios, como proposta no PL 3716/2019, não se alinha à natureza jurídica das sociedades de advogados, que não podem adotar práticas empresariais.

Mecanismos Já Previstos na Legislação

A legislação atual há muito oferece instrumentos robustos para a colaboração entre sociedades de advogados, sem a necessidade de criação de consórcios. O Provimento 112/2006 e o Provimento 170/2016 da OAB regulamentam ajustes e distratos de associação ou colaboração entre sociedades de advogados, que devem ser averbados à margem do registro da sociedade.

Além disso, a Lei 14.365/2022, sancionada em 2 de junho de 2022, trouxe alterações significativas ao Estatuto da Advocacia, incluindo o § 9º ao art. 15, que estabelece:

Art.15,§9º
A sociedade de advogados e a sociedade unipessoal de advocacia deverão recolher seus tributos sobre a parcela da receita que efetivamente lhes couber, com a exclusão da receita que for transferida a outros advogados ou a sociedades que atuem em forma de parceria para o atendimento do cliente.

Essa disposição é suficiente e resolve a questão tributária mencionada na justificativa do PL 3716/2019, permitindo que as sociedades colaborem sem incorrer em bitributação. Além disso, o § 8º do art. 22 considera como honorários convencionados aqueles decorrentes da indicação de clientes entre advogados ou sociedades de advogados, reforçando a viabilidade de parcerias formais.

Redundância e Inadequação do PL 3716/2019

O PL 3716/2019 apresenta uma redação que, além de ser anterior à Lei 14.365/2022, não traz inovações práticas para o regime jurídico das sociedades de advogados. A proposta é redundante, porque:

  • A legislação já permite associações e parcerias entre sociedades de advogados, com registro e transparência garantidos pela OAB.
  • A responsabilidade civil e disciplinar dos advogados e das sociedades está claramente definida no Estatuto da Advocacia, não havendo necessidade de delimitação adicional no âmbito de consórcios.

A questão tributária foi solucionada pela Lei 14.365/2022, que assegura a tributação proporcional à receita efetivamente recebida individualizada por sociedade.

A aprovação do PL 3716/2019 seria inócua e desnecessária, configurando um caso de bis in idem legislativo.

Considerações Finais

Conforme bem apontado na Nota Técnica da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados, a legislação vigente já atende às necessidades de colaboração entre sociedades de advogados, sem comprometer a transparência, a responsabilidade ou a segurança jurídica. A recente atualização trazida pela Lei 14.365/2022 reforça ainda mais a desnecessidade de alterações no Estatuto da Advocacia para permitir consórcios.

Dessa forma, conclui-se que o Projeto de Lei 3716/2019 não deve ser aprovado, porque não apresenta justificativa suficiente para modificar a Lei 8.906/1994.

ISENÇÃO DE IPI PARA PESSOA COM AUTISMO QUE RECEBE BPC


 

Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

A 2ª Turma do Colendo Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) definiu que é ilegal o indeferimento do pedido de isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (“IPI”) na aquisição de veículo por pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) sob o fundamento de que o requerente já recebe o Benefício de Contraprestação Continuada, mais conhecido como BPC.

A 2ª Turma do STJ, à unanimidade, negou provimento ao Recurso Especial nº 1.993.981/PE, interposto pela Fazenda Nacional.

O episódio cuida de um evidente conflito de legislações. A isenção do IPI nos veículos destinados a pessoas autistas tem amparo no Artigo 1º, Inciso IV, da Lei nº 8.989/1995, que dispõe sobre a isenção do tributo na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros, bem como por pessoas com deficiência.

O BPC está previsto no Artigo 20 da Lei nº 8.742/1993, que discorre sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências, em cujo parágrafo 4º afirma que não pode ser acumulado com qualquer outro benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime.

De acordo com o entendimento da Receita Federal do Brasil, o dispositivo acima citado, proíbe que a pessoa que receba o BPC possa adquirir veículos com a isenção do IPI, o que deu origem ao Mandado de Segurança impetrado por contribuinte em face do indeferimento do pedido de isenção formulado.

O Impetrante teve êxito nas instâncias inferiores. No Colendo Superior Tribunal de Justiça, a Fazenda Nacional argumentou que a lei do BPC, ao fazer alusão à proibição à concentração de benefícios de qualquer “outro regime”, engloba o regime tributário.

O Ministro Marco Aurélio Bellizze, Relator do Recurso Especial, compreendeu que a expressão “outro regime” faz referência a regime previdenciário (Regime Geral da Previdência Social, os Regimes Próprios de Previdência Social e o Regime de Previdência Complementar).

Esse entendimento se justifica porque o BPC tem por objetivo dotar o mínimo existencial do beneficiário, o que já seria atingido se ele tivesse outros benefícios previdenciários e assistenciais.

Cumpre esclarecer que os benefícios tributários não têm qualquer associação com o mínimo existencial do contribuinte. Para o Ministro Relator, a perspectiva da Fazenda Nacional inclusive afronta os princípios da capacidade econômica do contribuinte e da igualdade.

Alegou, ainda, a Fazenda Nacional, que a Lei nº 10.690/2003, estabeleceu que o benefício do IPI somente pode ser oferecido ao adquirente que demonstrar a disponibilidade financeira ou patrimonial coadunável com o preço do veículo a ser obtido.

Foi também afastado pela 2ª Turma do STJ, o pressuposto de que se o Impetrante necessita do BPC para seu mínimo existencial, então não teria como alcançar o requisito para conseguir a isenção tributária.

De acordo com o Ministro, o fato de o indivíduo evidenciar a disponibilidade financeira adaptável com o preço do veículo a ser comprado não significa, obrigatoriamente, ter capacidade financeira bastante para assegurar a sua sobrevivência sem o Benefício de Prestação Continuada.

Isso por causa de que se vislumbra a possibilidade, exemplificativamente, de o veículo ser obtido com doações ou auxílio de familiares. Assim sendo, a fictícia carência poderia ser argumento para cancelar ou rejeitar o BPC, mas não a isenção do imposto.

Por fim, afirmou o Relator: “Essa questão, contudo, conforme explanado, desborda por completo do escopo legal, para efeito de concessão da isenção de IPI, sendo, pois, indevida, e mesmo ilegal, a incursão na matéria, tal como procedeu a autoridade reputada coatora”.

O FUTURO NÃO ESTÁ ESCRITO


 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

A encruzilhada do agora são as escolhas coletivas que moldarão nosso futuro.

A pandemia de COVID-19 não foi apenas uma crise sanitária global; foi um espelho impiedoso, refletindo a verdade inegável de nossa era: vivemos em um mundo profundamente interdependente. Como um vírus que não reconhece fronteiras, a crise expôs como nossas decisões, tanto individuais quanto coletivas, ecoam através de continentes e gerações. Este foi um lembrete brutal de que a indiferença tem um custo e que a omissão é, em si, uma ação com consequências devastadoras.

Hoje, nos encontramos em uma encruzilhada histórica. As fundações do nosso tecido social estão sob tensão, fragilizadas não apenas pela pandemia, mas por crises que se alimentam mutuamente: a crescente desigualdade econômica, a praga da desinformação que corrói a confiança e a degradação ambiental que ameaça nossa própria existência. Cada uma dessas ameaças é um sintoma da mesma doença: uma falha em reconhecer e agir de acordo com nossa responsabilidade mútua.

O Legado da Inação e do Egoísmo

O caminho da inércia é sedutoramente simples, mas leva a um futuro sombrio. Quando o individualismo extremo prevalece, as sementes da polarização encontram terreno fértil. A desinformação, amplificada por algoritmos que priorizam o engajamento sobre a verdade, cria realidades paralelas onde o diálogo se torna impossível e o compromisso é visto como fraqueza.

Nesse cenário, a desigualdade deixa de ser apenas uma falha moral para se tornar um motor de instabilidade e conflito. A degradação ambiental avança sem controle, pois os custos de longo prazo são sacrificados por ganhos de curto prazo. Este é o caminho que aprofunda as fraturas existentes, construindo um amanhã marcado por muros mais altos, maior desconfiança e uma luta por recursos cada vez mais escassos. É um futuro onde a sobrevivência dos mais privilegiados se dá às custas do sofrimento de muitos.

O Imperativo da Cooperação e da Responsabilidade

A alternativa, embora mais exigente, é a única viável para um futuro sustentável e justo. Este caminho é pavimentado pela cooperação, equidade e uma profunda noção de responsabilidade compartilhada. Ele exige que enxerguemos além de nossos interesses imediatos e reconheçamos que o bem-estar do vizinho, seja ele próximo ou distante, está intrinsecamente ligado ao nosso.

Construir este futuro significa:

  1. Reivindicar a Verdade: Combater ativamente a desinformação, promovendo a literacia midiática e apoiando um jornalismo robusto e independente. A confiança é a moeda da cooperação, e ela só pode florescer em um ambiente de fatos compartilhados.
  2. Reduzir a Desigualdade: Implementar políticas que promovam a justiça econômica, garantindo acesso universal à saúde, educação de qualidade e oportunidades dignas. Uma sociedade mais equitativa é uma sociedade mais resiliente e estável.
  3. Agir pelo Planeta: Tratar a crise climática com a urgência que ela exige, acelerando a transição para energias renováveis, protegendo ecossistemas vitais e adotando modelos de produção e consumo sustentáveis. A responsabilidade ambiental não é uma opção, mas uma precondição para a sobrevivência das futuras gerações.

De Espectadores a Arquitetos do Futuro

O momento atual não é para reflexão passiva, mas para ação consciente e urgente. As escolhas que fazemos hoje — como consumidores, como cidadãos, como comunidades e como nações — são os blocos de construção do amanhã. A indiferença é um luxo que não podemos mais nos permitir.

A história nos julgará não pelas crises que enfrentamos, mas pela forma como respondemos a elas nesta encruzilhada. Podemos ser a geração que, por omissão, permitiu que o tecido social se rompesse, ou podemos ser a geração que, com coragem e visão, escolheu o caminho da solidariedade e reconstruiu o mundo sobre fundações mais fortes, justas e humanas.

O futuro não está escrito. Ele será o reflexo direto das escolhas coletivas que fizermos agora. A hora de escolher é esta.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR EM RAZÃO DE ACIDENTE OU DOENÇA DO TRABALHO - INDENIZAÇÃO – FILHOS DA VÍTIMA – TERMO FINAL 25 ANOS

 

Orlando José de Almeida

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

No dia 29/08/2025 foi publicada notícia no site do Tribunal Superior do Trabalho - TST, referente ao julgamento proferido nos autos do processo nº TST-Ag-RR-1049-43.2015.5.12.0050, cujo acórdão foi publicado no dia 09/06/2025.

A matéria foi intitulada: “Filhos de empregado vítima de acidente só receberão pensão até completarem 25 anos”.

A Turma de julgadores do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, reformou decisão de primeira instância que havia julgado improcedente o pedido de indenização por dano material e condenou a Reclamada ao pagamento de pensão mensal à viúva e aos filhos menores, desde a data do óbito até a idade em que o trabalhador completaria 75 anos. 

Na sequência, a Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, diante de Recurso da Empregadora, decidiu que os filhos da vítima de acidente de trabalho deveriam receber pensão até alcançarem 25 anos.

A Ministra Morgana Richa realçou “que, embora a lei estabeleça como marco da maioridade a idade de 21 anos, a jurisprudência consolidada do TST fixou como limite para o fim do pensionamento a idade de 25 anos. Esse período é considerado suficiente para proporcionar aos jovens pensionistas a independência econômica.” Destaca-se que em cerca ocasião já foi mencionado que “o pensionamento não tem conotação de direito hereditário, mas de reparação dos prejuízos”.

E para justificar o posicionamento foram transcritas decisões proferidas pelas 08 (oito) Turmas do TST, dentre elas:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO DO APELO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.015/2014 E DO NOVO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. FILHO MENOR DE IDADE. TERMO FINAL. A indenização por danos materiais, decorrentes da responsabilidade civil pela morte de empregado, possui natureza alimentar, de caráter especial, com o objetivo de proporcionar a sobrevivência, bem como a qualidade de vida do dependente reclamante. Não havendo na legislação a previsão do termo final para a obrigação alimentar, é viável a determinação do pagamento da pensão até que o filho do de cujus complete vinte e cinco anos de idade. Agravo de Instrumento conhecido e não provido.” (AIRR-273200-14.2005.5.02.0030, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz José Dezena da Silva, DEJT 26/4/2019).

"DANOS MATERIAIS. PENSÃO ARBITRADA. Quanto à pensão da filha menor, o artigo 950 do Código Civil, ao estabelecer a obrigação do pagamento de pensão mensal em decorrência de dano que implique perda ou diminuição da capacidade produtiva da vítima não fixa nenhuma limitação em relação ao período em que o citado auxílio deve perdurar. Na hipótese em discussão, o Regional buscou garantir o pensionamento mensal à filha do de cujus até a idade de 25 anos por presumir que estará concluída, naquela idade, a formação universitária da beneficiária, entendimento esse que se coaduna com a jurisprudência desta Corte superior. Quanto ao pagamento de pensão à viúva, no art. 201 da Constituição Federal, indicado como violado, não se dispõe acerca da limitação de pagamento pelo empregador de pensão por morte decorrente de acidente de trabalho. Assim, não cabe falar em violação da sua literalidade. Recurso de revista não conhecido." (RR-33900-61.2009.5.15.0051, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, 2ª Turma, DEJT 30/4/2015)

"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. [...] TERMO FINAL DE PENSÃO MENSAL AO FILHO DE EMPREGADO FALECIDO EM ACIDENTE DE TRABALHO. TRAUMA CRÂNIOENCEFÁLICO. COLHEITA MANUAL DOS CACHOS DE DENDÊ. DANOS MATERIAIS. MANUTENÇÃO DA PENSÃO DOS FILHOS ATÉ COMPLETAREM 25 ANOS. A jurisprudência desta Corte adota, como termo final, a data em que o filho dependente completar 25 (vinte e cinco) anos de idade, presumindo a sua dependência econômica, visto que, nesta idade, naturalmente e em regra, já estariam profissionalmente independentes e aptos aos cuidados com o próprio sustento. Agravo desprovido. [...].” (Ag-RRAg-1292-07.2018.5.08.0110, 3ª Turma, Relator Desembargador Convocado Marcelo Lamego Pertence, DEJT 10/5/2024).

“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA (APRESENTADO EM FACE DO TEOR DA INSTRUÇÃO NORMATIVA N.º 40/2016 DO TST). APELO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO NOVO CPC. [...] RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO NOVO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. FILHO MENOR DE IDADE. TERMO FINAL. A indenização por danos materiais, decorrentes da responsabilidade civil pela morte de empregado, possui natureza alimentar, de caráter especial, com o objetivo de proporcionar a sobrevivência, bem como a qualidade de vida do dependente reclamante. Não havendo na legislação a determinação do termo final para a obrigação alimentar, é viável a determinação do pagamento da pensão até que o Autor complete vinte e cinco anos de idade. Recurso de Revista não conhecido.” (ARR-1452- 50.2014.5.03.0065, 4ª Turma, Relatora Ministra Maria de Assis Calsing, DEJT 19/12/2016).

“AGRAVO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RÉ. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. PAGAMENTO DE PENSÃO MENSAL PARA DESCENDENTES. TERMO FINAL. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE MATRÍCULA EM CURSO SUPERIOR OU SIMILAR. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. Hipótese em que a decisão regional está em sintonia com a iterativa, notória e atual jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que não há necessidade de comprovar matrícula em curso superior ou similar para o pagamento da pensão mensal aos descendentes do de cujus até que completem 25 anos, momento em que se presume a independência financeira pela ausência de limite de idade fixado no art. 950 do Código Civil, aplicável ao caso. Precedentes do TST e STJ. Incidência da Súmula 333 do TST e do art. 896, § 7º, da CLT. Mantém-se a decisão recorrida, com imposição à parte agravante de multa de 4% sobre o valor atualizado da causa, com esteio no art. 1.021, § 4º, do CPC. Agravo conhecido e desprovido.” (Ag-ED-RRAg-24745- 23.2018.5.24.0001, 5ª Turma, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 22/3/2024).

“I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DAS RECLAMADAS. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.467/2017. [...] INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. PENSÃO. LIMITE DE 25 ANOS PARA OS FILHOS E EXPECTATIVA DE VIDA DO DE CUJUS PARA A ESPOSA. 1 - Deve ser reconhecida a transcendência jurídica quando se mostra aconselhável o exame mais detido da controvérsia devido às peculiaridades do caso concreto. O enfoque exegético da aferição dos indicadores de transcendência em princípio deve ser positivo, especialmente nos casos de alguma complexidade, em que se torna aconselhável o debate mais aprofundado da matéria. 2 - O TRT fixou o limite para percepção da pensão pelos filhos do empregado falecido a idade de 25 anos, observado o direito de acrescer, e, para a esposa, até os 74,9 anos de idade do de cujus. 3 - A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a pensão mensal devida aos familiares dependentes econômicos do empregado falecido deve obedecer ao disposto no art. 948, II, do CC, quando dispõe sobre ser devido o pagamento de alimentos levando-se em conta a expectativa de vida do empregado falecido, no caso. Julgados. 4 - Em relação ao termo final da pensão dos filhos, a jurisprudência desta Corte adota, como termo final, a data em que o filho dependente completar 25 anos de idade, observado o direito de acrescer. Julgados. 5 - Dessa forma, estando a decisão regional em consonância com a jurisprudência desta Corte, não cabe a reforma nos termos em que pretendida. 6 - Agravo de instrumento a que se nega provimento. [...].” (AIRR-10034-61.2015.5.15.0100, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhães Arruda, DEJT 8/9/2023).

“AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA PARTE RÉ. LEI Nº 13.467/2017. [...] 4. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PENSÃO MENSAL. PARÂMETROS DE FIXAÇÃO. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA CONSTATADA. Na esteira do que vem sendo decidido pelo e. STJ, a pensão devida a cada um dos filhos possui, como termo final, o dia em que completar 25 anos de idade, quando, presumidamente, já deverá ter alcançado a independência econômica ou constituído família e, por consequência, cessa a manutenção pelos pais. Precedentes. De igual modo, correta a fixação do termo final da pensão devida à ex-companheira do de cujus com base na expectativa de vida deste na data do acidente, conforme entendimento pacificado pela jurisprudência desta Corte. Precedentes. Agravo conhecido e não provido.” (Ag-RRAg-10091-76.2021.5.03.0141, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandão, Publicação: DEJT 16/2/2024).

“I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014. [...]. INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. PENSÃO MENSAL. LIMITE ETÁRIO DOS FILHOS MENORES. No que se refere ao termo final da pensão aos filhos menores, a jurisprudência tem adotado, como termo final, a data em que o filho dependente do ex-empregado falecido em acidente de trabalho completar 25 anos de idade. Julgados. Recurso de revista não conhecido. [...].” (RR-330-20.2012.5.15.0103, 8ª Turma, Relator Ministro Marcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 15/3/2019).

O que pode ser constatado é que o Tribunal Superior do Trabalho firmou posicionamento em relação à fixação temporal de pensionamento para os filhos de vítimas de acidente ou de doença irreversível, decorrentes do trabalho.

O marco é até atingirem 25 anos de idade quando, presumidamente, já alcançaram a independência econômica. Para buscar a consolidação de entendimento no Tribunal foram excluídas da delimitação do pensionamento: a) a maioridade civil (21 anos); b) a expectativa de vida “obtida a partir da tábua completa de mortalidade construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos” (§ 8º, do art. 29, da Lei 8.213/91); c) a pensão vitalícia.   

 

PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO NO BRASIL: COMO PROTEGER O LEGADO DE UMA VIDA E UNIR SUA FAMÍLIA

 

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

Imagine acordar amanhã e descobrir que todo o patrimônio que você construiu ao longo de décadas pode simplesmente desaparecer em disputas familiares intermináveis e impostos exorbitantes. Parece um cenário distante? Infelizmente, é a dura realidade de milhares de famílias brasileiras todos os anos.

Perguntas cruciais:

  • O que acontecerá com meu patrimônio quando eu não estiver mais aqui?
  • Como posso garantir que meus filhos não brigarão por herança?
  • É possível reduzir legalmente os impostos na transmissão de bens?
  • Como manter minha empresa familiar funcionando após minha partida?

Se essas questões ressoam com você, saiba que pode haver solução acessível. Os segredos do planejamento sucessório, uma ferramenta poderosa não apenas para proteger seus bens, mas para preservar o que você mais valoriza: a harmonia e o futuro da sua família.

Os 7 Pilares Essenciais para um Planejamento Sucessório de Sucesso

O planejamento sucessório bem-sucedido se apoia em fundamentos que integram aspectos jurídicos, financeiros e, crucialmente, emocionais. Explorar-se-á cada um deles.

Pilar 1: Os Fundamentos Além do Óbvio

O primeiro grande erro é acreditar que planejamento sucessório se resume a "fazer um testamento". É muito mais. Trata-se de um conjunto de ações legais e financeiras com três objetivos claros:

  1. Preservação Patrimonial: Manter e fazer o patrimônio crescer ao longo das gerações.
  2. Redução de Conflitos: Evitar as destrutivas brigas familiares por herança.
  3. Otimização Fiscal: Pagar o mínimo de impostos possível, dentro da legalidade.

No Brasil, a complexidade tributária, os aspectos culturais e a instabilidade jurídica tornam um planejamento personalizado não apenas recomendável, mas essencial.

Pilar 2: Navegando no Labirinto Legal Brasileiro

A legislação brasileira de sucessões é um campo minado para os desavisados. Dominar certos conceitos é vital para proteger seu patrimônio:

  • Princípio da Saisine: A transmissão automática da herança aos herdeiros acontece no momento do falecimento (Art. 1.784 do Código Civil).
  • Vocação Hereditária: A ordem legal que define quem tem preferência na sucessão.
  • Holdings Familiares: Estruturas empresariais criadas para centralizar e proteger a gestão do patrimônio familiar.

Há decisões judiciais que definiram a concorrência do cônjuge na sucessão mesmo em regime de separação convencional de bens, o que mostra como o cenário legal está em constante evolução, exigindo atenção contínua.

Pilar 3: A Reforma Tributária e Seus Impactos Ocultos

Com as constantes mudanças tributárias no Brasil, antecipar-se é uma estratégia vencedora. Uma família que reestrutura seu patrimônio antes de novas regras fiscais pode obter uma economia significativa em impostos sucessórios, como o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação). A diversificação patrimonial, inclusive internacional, surge como uma ferramenta chave para mitigar riscos nesse cenário volátil.

Pilar 4: As Ferramentas Estratégicas dos Bem-Sucedidos

Para um planejamento eficaz, é preciso conhecer as ferramentas que as famílias mais bem-sucedidas utilizam:

  • Testamentos Estratégicos: Com cláusulas específicas para proteger a vontade do testador.
  • Doações em Vida: Com reserva de usufruto, uma forma inteligente de antecipar a sucessão e reduzir a carga tributária futura.
  • Holdings Familiares: Que oferecem benefícios fiscais e de governança incomparáveis.
  • Estratégias de Investimento: Focadas na proteção e perpetuação do patrimônio.

Alerta: Um alerta necessário é a inviolabilidade da legítima (50% do patrimônio reservado aos herdeiros necessários), um limite que deve ser sempre respeitado.

Pilar 5: O Fator Humano — O Mais Importante e Negligenciado

Aqui reside a alma de um planejamento bem-sucedido. Ignorar os aspectos emocionais é a receita para o desastre. As chaves são:

  • Comunicação Familiar Efetiva: Criar um ambiente seguro para discutir o futuro sem gerar conflitos.
  • Mediação de Conflitos: Utilizar técnicas para alinhar expectativas e resolver divergências.
  • Educação Financeira para Herdeiros: Preparar a próxima geração para gerir o patrimônio que receberão.

Um acordo familiar em contexto sucessório, prova que o diálogo e o consenso podem ser mais poderosos que qualquer estratégia jurídica isolada.

Pilar 6: Um Roteiro Prático para a Ação

A teoria só tem valor quando aplicada. Um plano eficaz segue um processo claro e sequencial:

  1. Avaliação Patrimonial Detalhada: Um diagnóstico completo de todos os ativos e passivos.
  2. Definição de Objetivos Familiares: O que a família deseja para o futuro do negócio e do patrimônio?
  3. Consultoria Multidisciplinar: Envolver advogados, contadores e consultores financeiros.
  4. Elaboração e Implementação: Criar os documentos (testamentos, contratos, etc.) e colocar o plano em prática.
  5. Revisão Periódica: O plano sucessório é um organismo vivo e deve ser revisado regularmente.

Pilar 7: Aprendendo com a Prática

Analisar erros comuns e casos de sucesso é fundamental. O maior erro de todos é a procrastinação. Iniciar o planejamento enquanto os patriarcas estão em plena capacidade de decisão, manter a comunicação aberta e preparar a próxima geração são lições que se repetem em todas as histórias de sucesso.

O Legado Que Você Deixará: Uma Questão de Escolha

Planejamento sucessório é muito mais que uma estratégia financeira; é um ato de amor e responsabilidade. É sobre honrar o trabalho de uma vida inteira e garantir que seu legado seja de união e prosperidade, não de conflito e perdas.

A pergunta final não é se você precisa de um planejamento, mas quando você vai começar a construir o futuro seguro que sua família merece.

A resposta está nas suas mãos, mas o tempo, como sabemos, é para frente.

Que tipo de história sua família contará sobre o legado que você deixou?

 

segunda-feira, 1 de setembro de 2025

DEFESA DA MANUTENÇÃO DO MODELO SOCIETÁRIO EXCLUSIVO NA ADVOCACIA: UM ALERTA CONTRA A EXTENSÃO ÀS COOPERATIVAS


 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

A Proposição 49.0000.2024.005075-5/COP, que tem por origem o Instituto dos Advogados do Brasil – IAB (Ofício n. PR/COM/50/2024), em trâmite no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, sob a Relatoria do Conselheiro Federal Francisco Mauricio Rabelo de Albuquerque Silva (PE), de modificar o Provimento 112/2006 do Conselho Federal da OAB, ao arrepio da Lei 8.906/1994, a fim de permitir que advogados possam se organizar sob a forma de cooperativas, representa um grave equívoco jurídico, ético e institucional, com potencial de comprometer as bases que sustentam a Advocacia como função essencial à justiça.

1. A NATUREZA PERSONALÍSSIMA E A ÉTICA DA ADVOCACIA

A Advocacia é atividade de caráter personalíssimo e vocacionada à defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, com previsão constitucional no art. 133 da Constituição Federal. Ao permitir a formação de cooperativas, transfere-se o foco da responsabilidade individual para uma estrutura em que o vínculo cooperado-cooperativa pode diluir o comprometimento ético pessoal do advogado com o cliente. A relação de confiança — que é o pilar da Advocacia — não pode ser fragmentada ou flexibilizada por um modelo jurídico criado para fins essencialmente econômicos e produtivos, como é o caso das cooperativas.

2. INCOMPATIBILIDADE ESTRUTURAL ENTRE ADVOCACIA E COOPERATIVISMO

As duas espécies de sociedades de advogados, conforme disciplinado pelo Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94) e pelos Provimento 112/2006 e Provimento 170/2016, são formadas por profissionais que prestam serviços em nome próprio ou em conjunto, mas sempre com responsabilidade direta e solidária pelas consequências éticas e jurídicas de seus atos:

  • Sociedade de Advogados: Constituída exclusivamente por advogados, com regras rígidas para responsabilidade societária, ingresso e retirada de sócios, além da proibição de capital externo e sócios de indústria (Provimento 112/2006).
  • Sociedade Unipessoal de Advocacia: Modelo que permite ao advogado atuar como titular de sua própria sociedade, com benefícios tributários e maior formalização (Provimento 170/2016).

O Presidente da Comissão Nacional das Sociedades de Advogados, Carlos Augusto Monteiro Nascimento, em reunião realizada, em 4 de agosto de 2025, no CESA Centro de Estudos das Sociedades de Advogados, durante sua exposição no Comitê de Ética e Disciplina – CADEP, informou que há 183.836 espécies de sociedades de advogados registradas no Brasil, sendo 75.789 (41,23%) plúrimas e 108.039 (58,77%) unipessoais.

O Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, prescreve:

Art. 37. Os advogados podem constituir sociedade simples, unipessoal ou pluripessoal, de prestação de serviços de advocacia, a qual deve ser regularmente registrada no Conselho Seccional da OAB em cuja base territorial tiver sede.

Art. 43. “O registro da sociedade de advogados observa os requisitos e procedimentos previstos em Provimento do Conselho Federal.”

A Lei 8.906/1994 prescreve:

Art. 34. “Constitui infração disciplinar:

II - manter sociedade profissional fora das normas e preceitos estabelecidos nesta lei;”

A mudança do Provimento, como pretendida, viola a Lei 8.906/1994.

Mas tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2424/2023, que tem por ementa: “Acrescenta dispositivo à Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), para criar a sociedade cooperativa de advogados.” (https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2360887).

O movimento para se permitir criar sociedade cooperativa de advogados está em duas frentes, no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e no Congresso Nacional.

As cooperativas, nos termos da Lei nº 5.764/71, são sociedades de pessoas com forma e natureza jurídica próprias, organizadas para prestar serviços aos seus associados. O modelo cooperativista tem por finalidade a união de esforços para obtenção de vantagens econômicas, com divisão de resultados — conceitos incompatíveis com a forma como o serviço advocatício deve ser exercido.

A lógica cooperativista, orientada por objetivos econômicos e produtivos, tende a transformar a Advocacia em atividade mercantil, o que é expressamente vedado pelo art. 16 da Lei 8.906/1994. A Advocacia não é e não deve ser tratada como serviço comum de mercado.

3. RISCOS À FISCALIZAÇÃO E À RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL

O modelo de sociedades de advogados permite à OAB um controle mais rigoroso sobre a atuação profissional, a composição societária e o cumprimento dos deveres éticos. Ao se autorizar a constituição de cooperativas, abre-se margem para uma pulverização da responsabilidade, tornando mais difícil a fiscalização da atividade, a apuração de infrações e o cumprimento dos preceitos do Estatuto da Advocacia.

Além disso, o modelo cooperativo permitiria a entrada disfarçada de interesses alheios à Advocacia, por meio de estruturas complexas de gestão ou financiamento que escapem ao controle da Ordem, ferindo o princípio da intransigente defesa da independência profissional do advogado.

4. DESVIRTUAMENTO DO PAPEL SOCIAL DA OAB

A OAB, ao longo de sua história, tem defendido com firmeza que a Advocacia não pode ser confundida com qualquer outra atividade econômica. A permissão para constituição de cooperativas entre advogados representaria uma inflexão perigosa desse posicionamento institucional, colocando em risco a identidade profissional da classe e contribuindo para a precarização da profissão — especialmente diante do risco de que as cooperativas funcionem como “escritórios de fachada”, promovendo uma intermediação de mão de obra incompatível com a dignidade da Advocacia.

CONCLUSÃO

Modificar o Provimento 112/2006, além de ferir a Lei 8.906/1994, para permitir cooperativas de advogados é caminhar em sentido contrário à preservação da ética, da responsabilidade individual e da independência da Advocacia. É transformar o exercício profissional em atividade empresarial comum, abrindo brechas perigosas à mercantilização da profissão. O modelo atual de sociedades de advogados, embora possa ser aprimorado, preserva a essência da profissão e deve ser mantido como o único admissível sob a legislação da OAB.

Com a palavra, o Conselho Federal da OAB.

O AFASTAMENTO DE TRIBUTOS SOBRE A INDENIZAÇÃO POR SINISTRO DE BENS DO ATIVO IMOBILIZADO


 Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

A Segunda Turma do colendo Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), em decisão unânime, definiu no julgamento do Agravo Interno no Recurso Especial nº 2.140.074/SP, que não incidem IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, sobre valores recebidos a título de indenização securitária por sinistros com veículos do ativo imobilizado de locadora de automóveis. Na ocasião, compreendeu a Corte, que esses valores possuem natureza de recomposição patrimonial, e não de acréscimo patrimonial ou receita, removendo-os da regra matriz de incidência dos tributos mencionados. Ainda que contabilmente lançados como receita, essas quantias não caracterizam renda tributável de acordo com o Artigo 43 do Código Tributário Nacional (“CTN”), nem se delimitam como faturamento ou receita bruta, devendo, por esta razão, ser excluídos da base de cálculo dos tributos federais em referência.

A tese firmada pela Segunda Turma afeta, de maneira instantânea, a empresas locadoras de veículos que trabalham com frotas próprias e contratam seguros para cobertura de danos aos bens do ativo imobilizado. Ao rechaçar a incidência de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, sobre os valores recebidos a título de indenização securitária, o Tribunal Superior limita com mais exatidão o que pode e o que não pode ser encarado como receita tributável no ambiente de operações patrimoniais não negociais. Essa diretriz inclina-se a refletir particularmente sobre estruturas empresariais que fazem da proteção securitária uma frente importante de abrandamento de ameaças operacionais, como nos casos das holdings patrimoniais, das concessionárias de frota e das companhias com grande evidenciação física ao sinistro de bens duráveis.

Igualmente importa a outros campos empresariais nos quais os ativos são protegidos por seguros de danos e que, perante perdas materiais, obtêm valores indenizatórios avantajados. Alguns segmentos corporativos, como indústrias, empresas de transporte e armazenagem, shoppings e empreendimentos imobiliários, a título de exemplo, têm na decisão um precedente que auxilia a afugentar autuações fiscais apoiadas exclusivamente nos registros contábeis. O predomínio do critério jurídico-tributário sobre a categorização contábil outorga maior segurança jurídica à administração de passivos fiscais decorrentes de sinistros, singularmente quando as importâncias em questão afetam rigorosamente a demonstração de resultados das empresas.

A discussão acerca da tributação de indenizações securitárias em casos de sinistro envolvendo bens do ativo imobilizado não é recente, mas voltou a ganhar popularidade frente as autuações fiscais que adotam como parâmetro a classificação contábil dos valores recebidos. Comumente, empresas que padecem de perdas materiais, como veículos destruídos ou equipamentos sinistrados, obtêm da seguradora quantias compensatórias para restaurar o dano. Na perspectiva contábil, essas entradas costumam ser anotadas como receita, o que, simplesmente, tem sido razoável para a Receita Federal do Brasil qualifica-los como fatos geradores de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

A polêmica se expandiu à proporção que as fiscalizações passaram a desprezar a natureza jurídica desses valores, sustentando-os como se representassem acréscimos patrimoniais líquidos ou faturamento. Essa dialética tributária, amparada unicamente na técnica contábil, não leva em consideração que a indenização securitária, por definição, não incrementa o patrimônio do segurado, mas tão somente o ressarce ao estado anterior ao sinistro. A separação entre a representação contábil e o conceito jurídico-tributário tornou-se, assim, um dos principais pontos de objeção nos âmbitos administrativo e judicial.

Sob o ângulo normativo, o CTN, no seu Artigo 43, impõe, para a incidência do imposto de renda, a existência de disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos de qualquer natureza. Na hipótese da CSLL, que segue os parâmetros do IRPJ, o pensamento é equivalente. Já para as contribuições ao PIS e à COFINS, o ordenamento jurídico obriga que o fato gerador esteja vinculado a receita bruta ou faturamento, regras que presumem o comportamento de uma atividade econômica remunerada. A inexistência desses componentes no recebimento da indenização securitária é o que justifica o segregamento dessas quantias da base de cálculo dos tributos citados.

Defronte desse embaraço teórico, o Colendo Superior Tribunal de Justiça foi chamado a examinar se a maneira como tais importâncias são lançadas pela contabilidade deve predominar sobre os critérios jurídicos que norteiam a incidência tributária.

Ao encarar o conflito, a Segunda Turma saiu da diferenciação elementar entre a classificação jurídica de renda e o registro contábil de receitas. O exame se organizou sobre o pensamento de que a indenização securitária recebida em razão de sinistros sobre bens do ativo imobilizado não caracteriza manifestação de riqueza nova, mas compensação por uma perda patrimonial precedentemente consumada. Com amparo nesse ponto de vista, o Tribunal ratificou que o método de disponibilidade econômica ou jurídica — posto pelo Artigo 43 do Código Tributário Nacional para definição da renda tributável — não se constata em circunstâncias de reorganização patrimonial.

A Corte também destacou a hegemonia da dialética tributária sobre a classificação contábil quando se trata de balizar os elementos da central de incidência. Mesmo na eventualidade de que a entrada esteja nos demonstrativos financeiros como receita, esse dimensionamento técnico não pode, por si só, validar a incidência de tributos cuja hipótese de incidência reclama, materialmente, a presença de acréscimo patrimonial no caso do IRPJ e da CSLL ou de receita proveniente do exercício da atividade econômica como previsto para o PIS e a COFINS. A atribuição educadora da contabilidade é importante, mas não altera o conteúdo normativo da legislação tributária.

Nessa conjuntura, o STJ salientou que a indenização securitária, principalmente nos contratos de seguro de dano, tem como objetivo restaurar perdas materiais, configurando-se como verba indenizatória de um dano emergente, e não como consequência positiva de uma atividade lucrativa. Afugentou, assim, qualquer tentativa de enquadrar esses valores no conceito de receita bruta ou faturamento, porque não significam operação mercantil nem importam em contraprestação econômica por bens ou serviços fornecidos ao mercado.

A decisão, ao empregar a regra mãe a partir da substância jurídica das importâncias recebidas, comprova a independência conceitual do direito tributário e define o alcance de interpretações fiscais embasadas somente em classificações formais ou em expedientes administrativos de cobrança.

A direção estipulada pela Segunda Turma robustece um posicionamento que se inclina a ecoar sem desvios sobre a forma como a Receita Federal do Brasil percebe os efeitos fiscais de indenizações securitárias em conjunturas. Companhias com patrimônio ativo considerável, passam a contar com um precedente que demarca de forma nítida a natureza jurídica desses ingressos, enxotando a incidência de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, sobre verbas que objetivem tão somente à recomposição de perdas.

Mesmo que não se trate de hipótese de julgamento de recurso repetitivo, a decisão propõe efeitos interpretativos sobre autuações fiscais amparadas estritamente na qualificação contábil dessas quantias como receitas. Ao admitir que a categorização contábil não tem preferência na definição da regra matriz de incidência, o Tribunal tonifica uma conduta que pode ser citada como critério técnico em contenciosos administrativos e judiciais. Para os contribuintes, isso denota a possibilidade de responder exigências fiscais que, até então, vinham se apoiando só no protocolo do lançamento contábil, sem relação com a realidade jurídica do fato gerador.

Ademais, o precedente reitera uma questão estrutural do sistema: a impossibilidade de que eventos que não geram riquezas novas sejam utilizados como base de incidência de tributos sobre renda ou faturamento. Em um círculo tributário constantemente envolvido por interpretações fiscalistas, esse entendimento recobra a relevância do conceito jurídico-material na execução das normas de incidência, particularmente em quadros em que o ingresso patrimonial deriva de sinistros e não de operações econômicas voluntárias.

A decisão opera como uma trava à ampliação com que a Receita Federal do Brasil vinha tratando valores resultantes de seguros. Ao diferenciar, com suporte jurídico, a recomposição patrimonial da geração de riqueza, o Superior Tribunal de Justiça determina uma limitação à ambição de amplificar a base de cálculo de tributos sobre a renda e a receita, ao mesmo tempo em que fortifica a exigência de que as incidências se mantenham ligadas aos critérios constitucionais e legais que as validam.

PL 75/2025: FORTALECENDO A PROTEÇÃO DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES ATRAVÉS DA CRIMINALIZAÇÃO MAIS RIGOROSA

 

 Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

Introdução: O Problema da Subtração de Menores no Brasil

A subtração ilícita de crianças e adolescentes, seja para fins de adoção irregular, tráfico de pessoas ou outras violações, é um problema grave e persistente no Brasil. Segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em 2023, mais de 2.300 casos de desaparecimento de crianças foram registrados no país, muitos dos quais associados diretamente a redes clandestinas de subtração parental ou adoção ilegal[^1]. A insuficiência de penalidades severas e falhas na fiscalização contribuem para a perpetuação desse cenário alarmante.

Contextualização e Proposta Legislativa

No dia 18 de agosto de 2025, a Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 75/2025, de autoria do deputado [Nome do Deputado, se disponível], sob relatoria de [Nome do Relator]. O projeto propõe tornar a subtração de menores um crime hediondo, endurecendo a punição e restringindo benefícios penais aos envolvidos.

Dados Estatísticos e Contexto Internacional

O tráfico de crianças e adolescentes é uma preocupação global. Estima-se que crianças e adolescentes representam cerca de 30% das vítimas de tráfico internacional. Países como os Estados Unidos e a Espanha já tipificam como crimes hediondos a subtração e tráfico de menores, adotando penas rigorosas e sistemas integrados de proteção, além de campanhas permanentes de prevenção.

No âmbito nacional, o artigo 227 da Constituição Federal assegura prioridade absoluta à proteção dos direitos da criança e do adolescente. Já o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei n.º 8.069/1990, prevê a proteção integral e mecanismos de responsabilização em casos de violação desses direitos.

Avanço Jurídico e Dialogando com o ECA e a Constituição Federal

O PL 75/2025 se alinha às determinações constitucionais e às diretrizes do ECA ao buscar punir de forma mais severa quem atenta contra direitos fundamentais de crianças e adolescentes. A transformação do ato de subtrair menores em crime hediondo reforça o mandato constitucional da prioridade absoluta, restringindo benefícios como progressão de regime e anistia para os condenados, em consonância com o artigo 5.º, XLIII, da Constituição Federal.

Desafios Práticos e Implicações

Apesar do avanço, desafios práticos se impõem: a investigação desses delitos requer capacitação e integração entre órgãos (conselhos tutelares, polícias, Ministério Público), além de políticas públicas que priorizem prevenção, denúncia e acolhimento das vítimas. A dificuldade de comprovar intenção e autoria, especialmente quando envolvem redes familiares ou internacionais, também exige respostas inovadoras e integração internacional, em consonância com tratados de cooperação.

Participação e Monitoramento pela Sociedade Civil

A sociedade civil tem papel crucial tanto na fiscalização quanto na formulação de políticas: audiências públicas, denúncias anônimas, participação em conselhos tutelares e acompanhamento de tramitação legislativa são espaços possíveis de engajamento. Organizações não governamentais, como a Fundação Abrinq (https://www.fadc.org.br/) e a Childhood Brasil (https://www.childhood.org.br/), também oferecem canais de informação e participação.

Para acompanhar a tramitação do PL 75/2025 e participar do debate, qualquer cidadão pode acessar o www.camara.leg.br e enviar opiniões, participar de consultas públicas e solicitar posicionamentos de parlamentares.

Prevenção e Políticas Públicas Integradas

Mais do que endurecer penas, políticas de prevenção e acolhimento devem ser fortalecidas: campanhas educativas sobre desaparecimento, canais de denúncia mais acessíveis, fortalecimento do Sistema de Garantia dos Direitos e apoio psicossocial às famílias são essenciais. Integração intersetorial (assistência social, saúde, educação e segurança) torna-se chave para reduzir a exposição de crianças e adolescentes a riscos.

Conclusão

O PL 75/2025 representa um avanço importante no combate à subtração de crianças e adolescentes, ao endurecer o tratamento penal desses crimes. Entretanto, seu êxito dependerá da implementação conjunta de políticas integradas de prevenção, investimento na rede de proteção e do envolvimento contínuo da sociedade civil na fiscalização e proposição de melhorias.

Finalizo lembrando do lançamento do Movimento Violência Sexual Zero, no dia 23/03/2025, em São Paulo (https://www.migalhas.com.br/depeso/429329/movimento-violencia-sexual-zero).