quarta-feira, 23 de junho de 2021

DIREITOS CREDITÓRIOS POR FACTORINGS – INCIDÊNCIA OU NÃO DO ISS?

 

Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

Nos moldes do Artigo 156, Inciso III, da Constituição da República de 1988, compete aos Municípios criar o Imposto Sobre Serviços (“ISS”), definido em lei complementar, não compreendidos na esfera dessa competência os serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.

A Lei Complementar nº 116/2003, que dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências, ao tratar do ISS, traçou nova lista de serviços, cujos itens 10.04 e 17.23 possuem, respectivamente, o seguinte conteúdo:

“10 – Serviços de intermediação e congêneres. (…)

 

10.04 – Agenciamento, corretagem ou intermediação de contratos de arrendamento mercantil (leasing), de franquia (franchising) e de faturização (“factoring”).”

 

 “17 – Serviços de apoio técnico, administrativo, jurídico, contábil, comercial e congêneres. (…)

 

17.23 – Assessoria, análise, avaliação, atendimento, consulta, cadastro, seleção, gerenciamento de informações, administração de contas a receber ou a pagar e em geral, relacionados a operações de faturização (“factoring”).”

 

Frente aos itens 10.04 e 17.23 contemplados na lista de serviços da Lei Complementar nº 116/2003, vários Municípios estão cobrando e autuando as empresas de factoring, reclamando o Imposto Sobre Serviços relativo a essas operações. Ocorre que o ISS não recai sobre operações de compra de direitos creditórios pela factoring.

A simples introdução da atividade de factoring no rol de serviços constantes da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003 não possui a capacidade de transmudar a natureza jurídica heterogênea do instituto, composto por um entrelaçamento de obrigações de dar, fazer e não fazer.

Cumpre esclarecer que, a compra e venda de direitos creditórios por uma empresa de factoring é estruturada por dois elementos:

1º) de prestação de serviços, que representa os serviços que obrigatoriamente devem ser realizados aos clientes, remunerada pela cobrança de uma comissão ad valorem, variável de 0,5% a 3% e contabilizada em receita de prestação de serviços; e,

 

2º) compra de créditos, que significa a diferença obtida na compra dos créditos mercantis representativos das vendas efetuadas pelos clientes e que devem ser contabilizadas como receita de operações de factoring.

 

Perceba que a prestação de serviços é remunerada mediante um preço ajustado sobre o qual incide o ISS a ser recolhido ao Município.

De outro modo, a compra de créditos não é prestação de serviços a terceiros, motivo pelo qual sobre esta parcela não pode existir a incidência do Imposto Sobre Serviços. A intermediação financeira de recursos, dentre as quais a aquisição de direitos creditórios é operação de crédito, nada tendo a ver com prestação de serviços.

A Primeira Turma do Colendo Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), no julgamento do Recurso Especial nº 998.566/RS, sob a relatoria do Ministro José Delgado, decidiu que:

(...) 1. Da interpretação sistemática das normas jurídicas acima, conclui-se que não incide o ISS sobre a compra de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços” (REsp 552.076/RS, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, DJ 02/08/1997). 2. “A intermediação financeira de recursos, dentre os quais a aquisição de direitos creditórios, é operação tipicamente bancária, nada tendo a ver com a atividade de “factoring” (...)

 

Vale elucidar que, há pouco tempo, o Excelso Supremo Tribunal Federal (“STF”), definiu que a compra de créditos por uma factoring é operação de crédito e sobre ela incide o Imposto Sobre Operações Financeiras (“IOF”), porque envolve, ao lado da prestação de serviços, a cessão de créditos, mediante alienação de faturamento (representado, como regra, por títulos de crédito) com vistas à antecipação de capital futuro para o emprego na atividade empresarial.

Ressalte-se que, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (“ADI”) nº 1763, julgada em junho de 2020 pelo Tribunal Pleno do STF, Relator o Ministro Dias Toffoli, restou definida a incidência do IOF, no caso do factoring convencional como na hipótese do maturity factoring, porque envolve uma operação de crédito ou uma operação relativa a títulos ou valores mobiliários.

Diante de todo o exposto, conclui-se que não incide o Imposto Sobre Serviços nas operações de compra de direitos creditórios pelas empresas de factoring, porque a natureza da operação é de crédito.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário