Gustavo Pires Maia da Silva
Advogado Sócio de Homero Costa
Advogados
Recentemente,
o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”), preservou decisão
favorável envolvendo operações entre uma empresa brasileira e sua filial
(trading) localizada em um paraíso fiscal, em um processo (nº
16561.720119/2018-14) de extrema importância e que trata da tributação
internacional. O “Tribunal Administrativo” removeu uma autuação de R$143
milhões ao constatar a legitimidade da operação de uma filial da empresa
sediada nas Ilhas Turcos e Caicos, território britânico no Caribe. A decisão
legitima a convicção de que a existência de uma trading em jurisdição de
tributação protegida não acarreta, por si só, em prática abusiva ou
inexistência do propósito negocial.
A
desavença teve nascimento no desenrolar de um processo administrativo
aduaneiro, no qual a empresa obteve veredito benéfico ao opor à tese de que sua
filial atuava como uma interposição fraudulenta. No julgamento, a empresa
conseguiu modificar uma autuação de cerca de R$10 bilhões. O CARF examinou nova
cobrança da Fazenda Nacional, que defendia que a filial estrangeira não possuía
substância econômica e era utilizada tão somente para alcançar benefícios
fiscais.
O
Conselheiro Relator do processo, salientou que a trading tinha funções
legítimas, abrangendo a gestão de riscos cambiais, de crédito e de liquidez,
além de facilitar a precificação de commodities. Evidenciou que a legislação
pátria possui regras específicas para o controle de operações com empresas
sediadas em paraísos fiscais, como normas de preços de transferência,
subcapitalização e tributação de lucros no exterior. Por essa razão, de acordo
com sua compreensão, não se pode retirar a legalidade dessas operações com base
em conceitos subjetivos como “simulação”, notadamente quando existe
correspondência com as orientações das jurisdições vinculadas.
A
Receita Federal do Brasil (“RFB”) e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
(“PGFN”) advogavam que a filial estrangeira era uma mera estrutura artificial,
sem empregados e sem movimentação física de mercadorias. A alegação era de que
as operações não demonstravam propósito negocial legítimo e buscavam especificamente
a obtenção de proveito tributário. A PGFN indicava, ainda, que a filial
autorizava a subtração de despesas cambiais que, no Brasil, seriam proibidas
para fins do IR e da CSLL, mas eram permitidas pelas normas da jurisdição
britânica.
Os
Conselheiros, apesar disso, não levaram em consideração essas justificativas. O
ponto de vista predominante foi de que o sistema jurídico brasileiro não veda,
intrinsicamente, o emprego de regimes fiscais distintos no exterior, contanto
que reconhecidos os critérios normativos admissíveis. A decisão robustece
precedentes da “Corte Administrativa” em benefício dos contribuintes que
demonstram a existência de uma operação legítima, ainda que planejada em
jurisdições de tributação favorecida. Casos análogos já foram estudados e o
CARF considerou a licitude de estruturas de trading utilizadas para controle de
riscos financeiros e eficiência operacional.
A
conclusão do caso é uma referência de como é necessária uma avaliação
aprofundada das operações empresariais antes da aplicação de castigos fiscais.
Para especialistas, a resolução confirma que a presença de uma empresa em um
paraíso fiscal, tão somente, não caracteriza evasão tributária, sendo
fundamental apreciar a função da filial inserida na estrutura do grupo e sua
compatibilidade com os preceitos da tributação internacional.
Nenhum comentário:
Postar um comentário