segunda-feira, 10 de março de 2025

VALIDADA A ESTRUTURA DE TRADING EM PARAÍSO FISCAL

 

 

Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

 

Recentemente, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”), preservou decisão favorável envolvendo operações entre uma empresa brasileira e sua filial (trading) localizada em um paraíso fiscal, em um processo (nº 16561.720119/2018-14) de extrema importância e que trata da tributação internacional. O “Tribunal Administrativo” removeu uma autuação de R$143 milhões ao constatar a legitimidade da operação de uma filial da empresa sediada nas Ilhas Turcos e Caicos, território britânico no Caribe. A decisão legitima a convicção de que a existência de uma trading em jurisdição de tributação protegida não acarreta, por si só, em prática abusiva ou inexistência do propósito negocial.

 

A desavença teve nascimento no desenrolar de um processo administrativo aduaneiro, no qual a empresa obteve veredito benéfico ao opor à tese de que sua filial atuava como uma interposição fraudulenta. No julgamento, a empresa conseguiu modificar uma autuação de cerca de R$10 bilhões. O CARF examinou nova cobrança da Fazenda Nacional, que defendia que a filial estrangeira não possuía substância econômica e era utilizada tão somente para alcançar benefícios fiscais.

 

O Conselheiro Relator do processo, salientou que a trading tinha funções legítimas, abrangendo a gestão de riscos cambiais, de crédito e de liquidez, além de facilitar a precificação de commodities. Evidenciou que a legislação pátria possui regras específicas para o controle de operações com empresas sediadas em paraísos fiscais, como normas de preços de transferência, subcapitalização e tributação de lucros no exterior. Por essa razão, de acordo com sua compreensão, não se pode retirar a legalidade dessas operações com base em conceitos subjetivos como “simulação”, notadamente quando existe correspondência com as orientações das jurisdições vinculadas.

 

A Receita Federal do Brasil (“RFB”) e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”) advogavam que a filial estrangeira era uma mera estrutura artificial, sem empregados e sem movimentação física de mercadorias. A alegação era de que as operações não demonstravam propósito negocial legítimo e buscavam especificamente a obtenção de proveito tributário. A PGFN indicava, ainda, que a filial autorizava a subtração de despesas cambiais que, no Brasil, seriam proibidas para fins do IR e da CSLL, mas eram permitidas pelas normas da jurisdição britânica.

 

Os Conselheiros, apesar disso, não levaram em consideração essas justificativas. O ponto de vista predominante foi de que o sistema jurídico brasileiro não veda, intrinsicamente, o emprego de regimes fiscais distintos no exterior, contanto que reconhecidos os critérios normativos admissíveis. A decisão robustece precedentes da “Corte Administrativa” em benefício dos contribuintes que demonstram a existência de uma operação legítima, ainda que planejada em jurisdições de tributação favorecida. Casos análogos já foram estudados e o CARF considerou a licitude de estruturas de trading utilizadas para controle de riscos financeiros e eficiência operacional.

 

A conclusão do caso é uma referência de como é necessária uma avaliação aprofundada das operações empresariais antes da aplicação de castigos fiscais. Para especialistas, a resolução confirma que a presença de uma empresa em um paraíso fiscal, tão somente, não caracteriza evasão tributária, sendo fundamental apreciar a função da filial inserida na estrutura do grupo e sua compatibilidade com os preceitos da tributação internacional.

 

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