segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Do momento processual para inversão do ônus da prova

Gustavo Campolina Silva Elias

Advogado, bacharelado em Direito pela PUC-MG

*publicado originalmente no Boletim Jurídico N.º 16 em 17/07/2009


O Código de Defesa do Consumidor estabelece, em seu artigo 6°, inciso VIII, como direito básico dos consumidores, a facilitação da defesa de seus direitos, através da inversão, em seu favor, do ônus probatório do processo civil.
Para isso, necessário apenas a verificação dos requisitos da verossimilhança das alegações ou, alternativamente, da hipossuficiência do consumidor, esta última caracterizada pela incapacidade para produção da prova, tornando-a, deste modo, extremamente onerosa ou até mesmo impossível ao consumidor. Cumpre pontuar que tal prova deve ser possível ao fornecedor, já que, se assim não fosse, estaríamos atribuindo a este dever inexequível.

Note-se que o objetivo do legislador foi apenas o de afastar evidente desequilíbrio na produção da prova que, demonstrando ser de difícil produção para o consumidor, esteja ao alcance do fornecedor para a apresentação no feito. A citada dificuldade de produção da prova não pode ser confundida com a ausência de recursos econômicos, já que não se pode confundir ônus da prova com ônus de custeio.

Já que a letra da lei não fixou qual a ocasião em que deve ser procedida a inversão do ônus probatório, existe grande divergência na doutrina, sendo que três correntes destacam-se dentro de nossa doutrina.

Para grande parcela da doutrina, a inversão do ônus da prova deve ocorrer até o saneamento do feito. Esta fase processual se inicia com as diligências preliminares do Juiz, visando a verificação de possíveis irregularidades ou nulidades sanáveis, abrindo a possibilidade para que a parte autora assim proceda, e finda com o início da instrução.

Alguns se posicionam no sentido de que, com o saneamento do feito, o Juiz já teria condições para avaliar a presença da verossimilhança das alegações do consumidor e determinar a inversão, através de seu despacho inicial.

Todavia, ainda que possua condições para efetivar esta avaliação, resta evidente que a inversão em tal momento seria prematura, considerando que, diante da ausência de manifestação da parte ré, não haveria como delimitar de maneira concreta os fatos controversos, e que por isto ainda demandariam a produção de prova.

A principal justificativa para inversão do ônus, nesta fase processual, seria o fato de que a fase instrutória se iniciaria com a prévia estipulação das cargas probatórias entre as partes.

Para outra corrente, a argumentação seria de que a inversão do ônus da prova seria uma regra de julgamento, cabendo ao Magistrado se utilizar dela apenas no momento de prolação da sentença.

A argumentação é de que, apenas em tal momento, estaria o Juiz apto a realizar a valoração das provas, e consequente análise acerca da verificação dos requisitos para inversão do ônus probatório, já que fazê-lo em momento anterior seria fazer prejulgamento do feito.

A principal crítica reside no fato de que a declaração da inversão do ônus na fase decisória representaria ofensa aos princípios da ampla defesa e contraditório, na medida em que o fornecedor não teria mais a possibilidade de trazer novos elementos de prova que possibilitassem o cumprimento do encargo. Para muitos, isso implica inclusive em clara ofensa aos princípios do contraditório e ampla defesa.

Na tentativa de afastar a alegação de cerceamento defesa, aqueles que defendem tal tese, sugerem que o Juiz no despacho saneador ou durante a fase de instrução processual advirta a parte da possibilidade de inversão do ônus probatório na sentença, a fim de que, ciente disso, produza todas as provas que julgar necessárias.

A última corrente, que parece ser a mais ponderada, é aquela que defende a fase de instrução como momento mais apropriado para a inversão do ônus, já que tal decisão seria de conhecimento das partes, possibilitando que aquele sobre o qual recaiu o ônus probatório, diligencie no cumprimento deste.

Some se a isto o fato de que, formado o contraditório, o Magistrado disporia de amplas condições para verificar as provas necessárias, evitando desta maneira qualquer tipo de diligência inúteis ou protelatórias.


Portanto, considerando o exposto, bem como a observância dos princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e economia processual, a inversão do ônus probatório na fase de instrução processual se afigura como momento mais adequado para que se tenha uma adequada prestação jurisidicional.

Nenhum comentário:

Postar um comentário