Orlando José de Almeida
Advogado Sócio de Homero Costa
Advogados
No dia 29/05/2025 foi publicada notícia no site do
Tribunal Superior do Trabalho - TST, referente ao julgamento proferido nos
autos do processo nº TST-ARR-1504-21.2017.5.12.0023, cujo
acórdão foi publicado no dia 04/04/2025.
A
matéria foi intitulada “Justa causa é anulada por ter sido aplicada quatro
meses depois da falta cometida pelo empregado”.
A
Sétima Turma do TST, “reverteu a dispensa por justa causa de um empregado da
J.B.S. S.A. por não ter sido observado o requisito da imediatidade na aplicação
da penalidade. Para o colegiado, a demora de quatro meses entre a última
punição disciplinar e a rescisão contratual caracteriza perdão tácito e
invalida a justa causa.”
Um
fato que nos chamou atenção decorreu porque o Tribunal Regional do Trabalho da
12ª Região confirmou a justa causa que havia sido aplicada em primeira
instância, com suporte no histórico de faltas do trabalhador. De fato, “entre
fevereiro de 2015 e junho de 2017, ele recebeu quatro advertências e nove
suspensões”, motivo qual entendeu a Turma julgadora do TRT que embora a última
punição tenha “ocorrido em junho de 2017 e a dispensa só ter sido efetivada em
outubro do mesmo ano não configurava perdão tácito.”
No
entanto, quando da análise do recurso de revista interposto pelo empregado, “o
ministro Agra Belmonte não concordou com esse entendimento. Ele observou que,
apesar do histórico de sanções disciplinares, a última penalidade registrada
foi aplicada quatro meses antes da dispensa, sem nenhum procedimento
administrativo instaurado no período. Para ele, esse espaço de tempo excessivo
entre a falta e a punição final viola o princípio da imediatidade, essencial na
aplicação da justa causa.”
Na
fundamentação do acórdão foram trazidos posicionamentos doutrinários. Segundo
Maurício Godinho Delgado:
"A quantificação
do prazo tido como razoável a mediar a falta e a punição não é efetuada
expressamente pela legislação. Algumas regras, contudo, podem ser alinhavadas.
Em primeiro lugar, tal prazo conta-se não exatamente do fato irregular
ocorrido, mas do instante de seu conhecimento pelo empregador (ou seus
prepostos intraempresariais). Em segundo lugar, esse prazo pode ampliar-se ou
reduzir-se em função da existência (ou não) de algum procedimento
administrativo prévio à efetiva consumação da punição. Se houver instalação de
comissão de sindicância para apuração dos fatos envolventes à irregularidade detectada,
por exemplo, obviamente que disso resulta um alargamento do prazo para
consumação da penalidade, já que o próprio conhecimento pleno do fato, sua
autoria, culpa ou dolo incidentes, tudo irá concretizar-se apenas depois dos
resultados da sindicância efetivada. (…) Outro critério relevante é a ausência
de perdão tácito. A figura do perdão tácito ocorre quando certas faltas mais ou
menos graves cometidas pelo obreiro não são objeto de manifestação adversa por
parte do empregador. O silêncio empresarial prolongado, após conhecida uma
falta obreira, gera a presunção de que a infração foi implicitamente perdoada
pela contraparte contratual. O critério da ausência de perdão tácito
relaciona-se, de maneira geral, com o anterior critério (imediaticidade). Efetivamente,
se a falta não for imediatamente punida, tão logo conhecida pelo empregador,
presume-se que foi tacitamente perdoada. A falta de imediaticidade gera, desse
modo, a presunção de incidência do perdão tácito." (Curso de Direito do
Trabalho. 18ª edição. São Paulo: LTr, 2019, p. 1.427 e 1.428).
Ensina Alice Monteiro
de Barros que:
"Configura-se
renúncia ou o perdão tácito quando o empregador toma ciência do comportamento
faltoso do empregado e mesmo assim permite que ele trabalhe por um lapso de
tempo relativamente longo, não comprovando estivesse neste período aguardando
investigação contínua, cautelosa e criteriosa, a fim de, depois, romper o
ajuste. O prazo para aferição da atualidade ficará ao prudente arbítrio do
Juiz, esclarecendo-se que devem sopesar-se, na sua avaliação, as dimensões da
empresa e a sua complexidade organizacional" (Curso de Direito do
Trabalho. 11ª edição. São Paulo: LTr, 2017, p. 580).
Na realidade o TST possui jurisprudência
consolidada acerca do tema. Vejamos:
AGRAVO
DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI
N.º 13.015/2014.REVERSÃO
DA JUSTA CAUSA. APLICAÇÃO DA PENALIDADE DE DESÍDIA. AUSÊNCIA DE IMEDIATIDADE.
Hipótese em que o Tribunal Regional manteve a sentença que reverteu a dispensa
por justa causa aplicada ao empregado sob o fundamento de ausência de
imediatidade na aplicação da penalidade. Extrai-se do acórdão regional que o
empregado recebeu diversas advertências e suspensões por ausência de anotação
do intervalo intrajornadas e faltas injustificadas. Com efeito, verifica-se que
foram aplicadas: Advertência em 06/11/2012; Advertência em 26/08/2013;
Suspensão de 1 dia em 29/05/2014; Suspensão de 2 dias em 09/06/2014; Suspensão
de 3 dias em 14/07/2014; Suspensão de 3 dias em 26/08/2014 e por fim a justa
causa em 18/11/2014. No caso, observa-se que a justa causa aplicada em
18/11/2014 por ato de desídia decorre do histórico faltoso do empregado, porém,
ainda que se constate a correta gradação das penas, o procedimento da reclamada
carece de imediatidade na aplicação da penalidade, uma vez que a justa causa
deveria ter sido aplicada no período de ocorrência do último ato faltoso.
Consoante jurisprudência pacífica do TST, a ausência de imediatidade na punição
de determinado ato faltoso constitui perdão tácito que descaracteriza a
rescisão por justa causa. O transcurso de 3 meses entre a última falta
injustificada, em 19/08/2014, e a aplicação da justa causa por ato de desídia,
em 18/11/2014, revela a remissão implícita da falta cometida pelo reclamante. Precedentes.
Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR-20789-02.2015.5.04.0020.
Relatora
Ministra: Maria Helen Mallmann, Data de Julgamento:
24/02/2021, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 26/02/2021)
REVERSÃO DA JUSTA
CAUSA. AUSÊNCIA DE IMEDIATIDADE ENTRE O CONHECIMENTO DOS ATOS FALTOSOS, O
INÍCIO DA APURAÇÃO POR AÇÃO DISCIPLINAR E A APLICAÇÃO DA PENA. PERDÃO TÁCITO.
TRANSCENDÊNCIA. Não há transcendência da causa relativa ao reconhecimento de
perdão tácito por ausência de imediatidade na dispensa por justa causa ocorrida
12 meses após o ato faltoso, por conclusão de inquérito disciplinar iniciado
mais de 9 meses após o conhecimento de referido ato. Transcendência do recurso
de revista não reconhecida e agravo de instrumento desprovido" (AIRR-488-32.2015.5.07.0026,
6ª Turma, Relator Ministro Aloysio Correa
"AGRAVO DE
INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. DISPENSA POR JUSTA CAUSA. FALTA GRAVE.
AUSÊNCIA DE IMEDIATIDADE. PERDÃO TÁCITO. REVERSÃO EM JUÍZO . Segundo o
Regional, a dispensa por justa causa do reclamante se deu em 15/04/2011, ou
seja, mais de três anos após a sua admissão, formalizada em 15/01/2008. Desse
modo, o Tribunal a quo concluiu não haver dúvida quanto à ausência de
imediatidade na aplicação da dispensa por justa causa, atraindo a ocorrência do
perdão tácito, tornando inválida, portanto, a justa causa aplicada pela
reclamada, uma vez que a falta do reclamante, que deu ensejo à incidência de
tal penalidade, foi praticada na época da admissão. Agravo de instrumento
conhecido e não provido" (AIRR-1062-84.2011.5.03.0033, 8ª Turma, Relatora
Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 07/08/2015).
AGRAVO. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. LEIS NOS 13.015/2014 E 13.467/2017. REVERSÃO DA JUSTA CAUSA. AUSÊNCIA DE
PROPORCIONALIDADE E IMEDIATIDADE DA PENALIDADE. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA Nº 126
DO TST. O Tribunal Regional, após avaliar as provas, asseverou que "O
que se extrai dos autos é que a reclamada não trouxe prova robusta e
suficientemente clara para dissipar qualquer dúvida razoável em prol da sua
tese que a autora teria praticado falta disciplinar punível com a justa causa,
bem como se constata que não houve imediatidade entre a ciência do ato faltoso
e a aplicação da pena de despedimento motivado por infração funcional "
e que " é incontroverso que se tratava de empregada que não havia
recebido penalidade anterior e que fora elogiada pelo trabalho executado em
favor da empresa", sendo desproporcional a penalidade imposta. A
controvérsia possui contornos fático-probatórios, uma vez que não consta no
acórdão regional a premissa alegada pelo agravante, de que se comprovou falta
grave apta a ensejar a aplicação da dispensa por justa causa. Assim, a aferição
das violações apontadas demandaria o reexame fático-probatório dos autos,
vedado em instância extraordinária, a teor da Súmula nº 126 do TST. (...)
Agravo a que se nega provimento. (TST: Ag-AIRR 0000061-84.2022.5.17.0002, 3ª
Turma, Relator Ministro Relator Alberto Bastos Balazeiro. DJE 08/11/2024).
Para
o TST o princípio da imediatidade constitui requisito fundamental para a
aplicação da justa causa, até porque vigora no Direito do Trabalho o princípio
da continuidade da relação de emprego.
Logo,
não poderá ocorrer demora sem justificativa, exceto quando o empregador, assim
que tiver conhecimento do ato faltoso, comece a apuração dos fatos, mediante
procedimentos de investigação, como é o caso de sindicância, cujos trabalhos
serão desenvolvidos por uma comissão por ele nomeada ou a instauração de
inquérito para apuração de falta grave. Os trabalhos devem ser feitos de forma
cuidadosa, para após proceder se for o caso, a dispensa por justa causa,
evitando-se, inclusive, punições injustas.
Em conclusão, recomenda-se que o empregador aplique a punição assim que tiver conhecimento da falta cometida pelo empregado, sob pena de configurar o perdão tácito, observadas, contudo, as ressalvas contidas no parágrafo anterior.
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