segunda-feira, 25 de março de 2019

MORTE PRESUMIDA. OS EFEITOS DA DECLARAÇÃO POR DESAPARECIMENTO EM CATÁSTROFE



Bernardo José Drumond Gonçalves
Advogado e Sócio de Homero Costa Advogados, coordenador do Departamento Empresarial


De acordo com o artigo 7º do Código Civil, serão presumidamente consideradas mortas as pessoas desaparecidas, mesmo sem decretação de ausência (um procedimento processual bastante complexo e lento, que pode ser requerido por qualquer interessado ou pelo Ministério Público, nomeando-se um curador para o desaparecido), se for “extremamente provável” quando em perigo de vida. Ou seja, as circunstâncias do acidente serão determinantes para essa declaração judicial (TJSP; Ap 142.260-4/7; Revista dos Tribunais; vol. 781; p. 228; JRP\2000\1823).

Após o trânsito em julgado desta sentença, deve ser expedida uma certidão de óbito da pessoa desaparecida, seguindo-se a instrução do artigo 88 da Lei de Registros Públicos (“Poderão os Juízes togados admitir justificação para o assento de óbito de pessoas desaparecidas em naufrágio, inundação, incêndio, terremoto ou qualquer outra catástrofe, quando estiver provada a sua presença no local do desastre e não for possível encontrar-se o cadáver para exame”.)

Já o artigo 8º do Código Civil dispõe que, se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar quem morreu antes, presumir-se-á a simultaneidade do óbito. Chamada comoriência. Esse instituto não tem uma correlação direta com a declaração de morte presumida, mas da intelecção dos artigos citados, pode-se deduzir que há a possibilidade de haver comoriência em morte presumida.

Assim, familiares que tiverem desaparecido numa catástrofe, a exemplo do que ocorreu em Brumadinho/MG, poderão ser declarados simultaneamente mortos e, para fins sucessórios, isso tem ampla repercussão, em especial na definição da vocação hereditária. Ressalvada a hipótese de existir um testamento, sabe-se que a sucessão legítima é deferida sucessivamente em favor de a) descendentes, em concorrência com cônjuge sobrevivente, a menos que casado sob o regime de comunhão de bens ou, na hipótese de comunhão parcial, não haver bens particulares; b) ascendentes, em concorrência com o cônjuge, independente do regime de bens; c) cônjuge sobrevivente; e d) colaterais.

No que diz respeito ao companheiro, é bom lembrar que, apesar de haver previsão expressa no artigo 1.729 do Código Civil, o Supremo Tribunal Federal recentemente declarou a sua inconstitucionalidade para aplicar extensivamente também o disposto no artigo 1.829 (RE 878.694/MG). Nesse particular, em vista do eventual desaparecimento e consequente declaração de óbito de toda uma família, revela-se, portanto, importantíssima a definição de eventual simultaneidade (comoriência).

Também há repercussão para fins securitários e pagamento de benefícios previdenciários (TRF-4.ª Reg. | ApCiv 2009.70.99.003595-0 | Diário da Justiça Eletrônico | JRP\2010\328), principalmente os créditos derivados de previdência privada, seja quando houver prévia definição dos beneficiários, seja quando para quando não houver e couber o recebimento pelos “herdeiros legais”.

Em vista de todos esses riscos e variáveis, numa eventual circunstância de catástrofe ou comoriência, a existência de um testamento, seja em qualquer de suas modalidades legais, revela-se importantíssima para evitar a declaração de vacância e a consequente partilha de bens em favor de parentes remotos ou, até mesmo do Estado, conforme previsto no artigo 1.822 do Código Civil (“A declaração de vacância da herança não prejudicará os herdeiros que legalmente se habilitarem; mas, decorridos cinco anos da abertura da sucessão, os bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União quando situados em território federal”).


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