terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho – Prevalência sobre a Legislação Trabalhista

ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVAS DE TRABALHO – PREVALÊNCIA SOBRE A LEGISLAÇÃO TRABALHISTA

    Orlando José de Almeida
Sócio de Homero Costa Advogados

Daniel de Oliveira Varandas
 Estagiário de Direito no Homero Costa Advogados

Encontra-se em tramitação o Projeto de nº Lei 6787/16, de iniciativa do Poder Executivo, que além de outros assuntos, estabelece a prevalência de acordos e convenções coletivas de trabalho sobre a legislação trabalhista. A proposta faz parte das mudanças no cenário trabalhista anunciadas pelo Governo Federal em 22 de dezembro de 2016.

Caso aprovado o Projeto de Lei, será acrescentado ao artigo 611, da CLT, a seguinte redação:

“Art. 611-A. A convenção ou o acordo coletivo de trabalho tem força de lei quando dispuser sobre:
I - parcelamento de período de férias anuais em até três vezes, com pagamento proporcional às parcelas, de maneira que uma das frações necessariamente corresponda a, no mínimo, duas semanas ininterruptas de trabalho;
II - pacto quanto à de cumprimento da jornada de trabalho, limitada a duzentas e vinte horas mensais;
III - participação nos lucros e resultados da empresa, de forma a incluir seu parcelamento no limite dos prazos do balanço patrimonial e/ou dos balancetes legalmente exigidos, não inferiores a duas parcelas;
IV - horas in itinere;
V - intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos;
VI - ultratividade da norma ou do instrumento coletivo de trabalho da categoria;
VII - adesão ao Programa de Seguro-Emprego - PSE, de que trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de 2015;
VIII - plano de cargos e salários;
IX - regulamento empresarial;
X - banco de horas, garantida a conversão da hora que exceder a jornada normal de trabalho com acréscimo de, no mínimo, cinquenta por cento;
XI - trabalho remoto;
XII - remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado; e
XIII - registro de jornada de trabalho.”

O Projeto tem provocado polêmicas e, inclusive, com o objetivo de que seja realizada uma maior discussão a respeito da matéria, algumas centrais sindicais entregaram no dia 17/01/2017 requerimento ao presidente Michel Temer para que o mesmo não tramite no Congresso Nacional em regime de urgência.

Aliás, no dia 03/01/2017, em audiência pública na Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados, o representante da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Pascoal Carneiro, defendeu o arquivamento do Projeto de Lei em questão. Ele afirmou que vai haver um “caos no País se o que for negociado numa convenção coletiva de trabalho ficar acima da legislação, como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)”.

Todavia, ao que nos parece, o que não pode prevalecer é a situação atual.

De fato, é bastante comum o ajuizamento de ações na esfera trabalhista buscando o reconhecimento de nulidade de acordos e convenções coletivas de trabalho, sendo muitas delas provocadas pelo Ministério Público do Trabalho, o que vem gerando a ausência de tranquilidade aos interlocutores de tais ajustes, notadamente os empresários.

E nesse contexto foi mencionado na exposição de motivos do Projeto que “o Brasil vem desde a redemocratização em 1985 evoluindo no diálogo social entre trabalhadores e empregadores. A Constituição Federal de 1988 é um marco nesse processo, ao reconhecer no inciso XXVI do art. 7º as convenções e acordos coletivos de trabalho. O amadurecimento das relações entre capital e trabalho vem se dando com as sucessivas negociações coletivas que ocorrem no ambiente das empresas a cada data-base, ou fora dela. Categorias de trabalhadores como bancários, metalúrgicos e petroleiros, dentre outras, prescindem há muito tempo da atuação do Estado, para promover-lhes o entendimento com as empresas. Contudo, esses pactos laborais vem tendo a sua autonomia questionada judicialmente, trazendo insegurança jurídica às partes quanto ao que foi negociado. Decisões judiciais vem, reiteradamente, revendo pactos laborais firmado entre empregadores e trabalhadores, pois não se tem um marco legal claro dos limites da autonomia da norma coletiva de trabalho.”

Realmente, a respeito das discussões judiciais sobre a validade de acordos ou convenções coletivas de trabalho prevendo a flexibilização das leis trabalhistas, é digno de nota que o Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre tal possiblidade.

De fato, ao Recurso Extraordinário nº 895.759, em que a relatoria coube ao Ministro Teori Zavascki, foi dado provimento para afastar a condenação de uma empresa ao pagamento das horas in itinere e dos respectivos reflexos salariais. 

Ressalte-se que na fundamentação desse julgamento foi feita referência ao RE 590.415, cujo Relator foi o Ministro Roberto Barroso, onde era discutida a validade de quitação ampla do contrato de trabalho, constante de plano de dispensa incentivada.

Em seu voto o Ministro Roberto Barroso enfatizou que: “a) a Constituição reconheceu as convenções e os acordos coletivos como instrumentos legítimos de prevenção e de autocomposição de conflitos trabalhistas; tornou explícita a possibilidade de utilização desses instrumentos, inclusive para a redução de direitos trabalhistas; atribuiu ao sindicato a representação da categoria; impôs a participação dos sindicatos nas negociações coletivas; e assegurou, em alguma medida, a liberdade sindical (...)”; (b) “a Constituição de 1988 (...) prestigiou a autonomia coletiva da vontade como mecanismo pelo qual o trabalhador contribuirá para a formulação das normas que regerão a sua própria vida, inclusive no trabalho (art. 7º, XXVI, CF)”; (c) “no âmbito do direito coletivo, não se verifica (...) a mesma assimetria de poder presente nas relações individuais de trabalho. Por consequência, a autonomia coletiva da vontade não se encontra sujeita aos mesmos limites que a autonomia individual”; (d) “(...) não deve ser vista com bons olhos a sistemática invalidação dos acordos coletivos de trabalho com base em uma lógica de limitação da autonomia da vontade exclusivamente aplicável às relações individuais de trabalho”.

Noutro norte, merece destaque, ainda, outros pontos contidos no Projeto, referentes ao assunto em debate.

Restou indicado que “na hipótese de flexibilização de norma legal relativa a salário e jornada de trabalho, observado o disposto nos incisos VI, XIII e XIV do caput do art. 7º da Constituição, a convenção ou o acordo coletivo de trabalho firmado deverá explicitar a vantagem compensatória concedida em relação a cada cláusula redutora de direito legalmente assegurado.”

Em contrapartida, foi vedada a alteração por meio de convenção ou acordo coletivo de norma de segurança e de medicina do trabalho.

Foi também previsto que os acordos ou as convenções coletivas de trabalho, podem ser submetidos a exame pela Justiça do Trabalho.

Todavia, esta analisará, preferencialmente, a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico previsto nos referidos instrumentos, ficando “balizada sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva”, restringindo, consequentemente, a amplitude em que a questão vem sendo enfrentada nos dias atuais.

Com isso, o que se busca, é efetivamente alcançar uma segurança jurídica para os envolvidos no negócio, bem como para aqueles que procuram trazer novos investimentos para o Brasil.

Portanto, muito embora existam preocupações quanto ao tema, é importante que dentro dos limites da legalidade, deve-se permitir a flexibilização da legislação trabalhista para uma melhor valorização da negociação coletiva entre trabalhadores e empregadores, propiciando a esperada segurança jurídica.




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