segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

NÃO INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO (ITCD) DE BENS RECEBIDOS POR HERANÇA OU DOAÇÃO LOCALIZADOS NO EXTERIOR



Gustavo Pires Maia da Silva        
Advogado Sócio do Homero Costa Advogados

O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCD) é um tributo que incide sobre a doação ou sobre a transmissão hereditária ou testamentária de bens móveis, inclusive semoventes, títulos e créditos, e direitos a eles relativos ou bens imóveis situados em território do Estado, na transmissão da propriedade plena ou da nua propriedade e na instituição onerosa de usufruto.
A Fazenda Pública de alguns estados da federação tem entendido ser possível a cobrança do ITCD de bens localizados no estrangeiro.
Em um caso concreto, o Fisco Paulista notificou um contribuinte para que procedesse ao recolhimento do ITCD, acrescido de multa e juros, com fundamento no Artigo 4º, II, “b”, da Lei Estadual nº 10.705/00, exibido também no Decreto Estadual nº 46.555/02.
As normas acima mencionadas foram editadas pelo legislador estadual paulista com o objetivo de prover omissão do Congresso Nacional em disciplinar a matéria, porque, consoante expresso no Artigo 155, §1º, III, “b” da Constituição da República de 1988, a incidência do ITCD é reservada à lei complementar.
A Fazenda Pública do Estado de São Paulo entende ser cabível a incidência do ITCD mesmo sem lei complementar específica, porque compreende encontrar suporte no §3º do Artigo 24 da CF/88 e no §3º do Artigo 34 do ADCT, que conferem aos Estados da Federação competência integral e concreta.
Os dispositivos constitucionais acima mencionados demonstram que não existindo lei federal sobre as normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender suas peculiaridades e que promulgada a Constituição, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão editar lei necessárias à aplicação do sistema tributário nacional.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a lei complementar adquiriu importância jurídica suficiente a justificar o quórum qualificado, isto porque, coube a ela criar diretrizes gerais sobre matéria de maior importância jurídica e social.
O Constituinte concedeu à Lei Complementar o mister de dispor, dentre outras matérias, regras de isonomia do Sistema Tributário do Brasil. Isto porque, possuímos mais de 6 (seis) mil entes federados, de maneira que, se a cada um fosse concedido a possibilidade de criar normas gerais e distintas, viveríamos um verdadeiro “inferno” tributário, a despeito de não se precisar disso atualmente para que os contribuintes queimem no mármore do inferno com a atual carga tributária que reflete no denominado “custo Brasil”.
No caso da transmissão de bens localizados no exterior, a transmissão do patrimônio depende de um entendimento entre o direito brasileiro e o estrangeiro, o que ratifica a necessidade de harmonia entre os ordenamentos jurídicos. No caso do Brasil, apenas mediante a edição de lei complementar, conforme evidencia o Artigo 155, §1º, da CF/88.
A questão apontada foi levada à análise do Poder Judiciário paulista.
Um Acórdão da 6ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reconheceu o direito de um contribuinte não ser obrigado ao recolhimento do ITCD relativo a um imóvel localizado em Treviso, Itália, recebido por herança.
Insatisfeita com o Acórdão, a Fazenda Pública do Estado de São Paulo interpôs Recurso Extraordinário, que ascendeu ao Supremo Tribunal Federal.
O STF reconheceu em sede de repercussão geral, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 851.108/SP, tese de extrema importância para o Direito Tributário. No julgamento do mérito do recurso a Corte Suprema definirá se é ou não possível a exigência do ITCD de bens herdados ou recebidos em doação e que se encontram em outros países.
Particularmente, entendo que, na hipótese de transmissão de bens localizados no exterior, a transferência do patrimônio somente poderá ocorrer mediante a edição de lei complementar, conforme estabelece o Artigo 155, §1º, da CF/88. Enquanto não houver Lei Complementar específica sobre a matéria, não pode a Fazenda Pública cobrar o ITCD sobre bens localizados no exterior.
De acordo com o Artigo 8º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, para qualificar os bens e regular as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados. Também por este motivo, os bens recebidos por herança ou doação situados no estrangeiro, não podem ser tributados no Brasil pelo ITCD.
Conclui-se que, o julgamento do mérito do RE nº 851.108/SP é de extrema importância, porque acarretará na padronização da interpretação constitucional sobre a incidência ou não do ITCD sobre os bens estrangeiros herdados ou doados por brasileiros.

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