segunda-feira, 4 de agosto de 2025

A ADVOCACIA BRASILEIRA EM TRANSFORMAÇÃO: DESAFIOS, OPORTUNIDADES E O PAPEL ESTRATÉGICO DA OAB

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

                               

 

 

Uma nova formação da Comissão Nacional das Sociedades de Advogados do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil ocorreu recentemente, triênio 2025/2028, sob a presidência do advogado Carlos Augusto Monteiro Nascimento, retomando-se o debate sobre a Uniformização de Procedimentos das Sociedades de Advogados, com o objetivo de propor um novo Provimento à diretoria da OAB. Os integrantes também trataram da criação de um Perfil Nacional das Sociedades, para subsidiar políticas da entidade, além de planejados eventos e um seminário sobre a Lei 14.365/2022. Está previsto, ainda, um encontro nacional com as comissões seccionais e a participação da CNSA na Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, em Salvador (BA), em 2026. (https://www.oab.org.br/noticia/63208/confira-o-trabalho-das-comissoes-tematicas-da-oab-nacional-durante-a-semana).

A advocacia brasileira encontra-se em um período de profunda transformação, impulsionada por mudanças demográficas, avanços tecnológicos e a constante evolução das demandas sociais e econômicas. Compreender esse cenário dinâmico é fundamental para advogados, sociedades de advogados e, sobretudo, para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que desempenha um papel central na regulamentação, fiscalização e apoio à profissão. Este artigo sintetiza as principais conclusões e insights derivados de análises recentes, incluindo o "Primeiro Perfil Nacional das Espécies de Sociedades de Advogados - Conselho Federal OAB - 2021" ( https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/11/2C62754140343C_PerfilNacional.pdf  ), o "1º Estudo Demográfico da Advocacia Brasileira!" (2024) (https://www.oab.org.br/noticia/62188/perfil-adv-conheca-o-resultado-do-primeiro-estudo-demografico-da-advocacia-brasileira) e delineando um panorama abrangente dos desafios e oportunidades, bem como as implicações para o setor jurídico nacional.

O Cenário Atual da Advocacia Brasileira

A análise dos Estudo Demográficos e de Perfil das Sociedades revela um ecossistema jurídico em constante expansão e diversificação.

Tendências Demográficas da Advocacia

O panorama da advocacia brasileira destaca características marcantes da população de advogados:

Crescimento Acelerado: O número de advogados inscritos na OAB tem crescido exponencialmente, ultrapassando a marca de 1,3 milhão de profissionais em todo o país. Esse crescimento, que tem sido constante nas últimas décadas, resulta em um mercado de trabalho cada vez mais competitivo e exigindo maior diferenciação profissional.

Feminização da Profissão: Observa-se uma participação feminina crescente e significativa na advocacia. Dados recentes indicam que as mulheres já representam mais de 50% dos novos inscritos em diversas seccionais e se aproximam da paridade no quadro geral, com uma presença marcante em todas as faixas etárias. Essa mudança demográfica impõe a necessidade de políticas de equidade e inclusão.

Base Jovem: Uma parcela substancial dos advogados é composta por profissionais em início de carreira. Estimativas apontaram que cerca de 30% a 40% dos advogados ativos possuem menos de 5 anos de inscrição na OAB, o que, por um lado, indica um grande potencial para inovação e adaptação, e por outro, levanta desafios relacionados à inserção no mercado e à aquisição de experiência.

Distribuição Geográfica: A concentração de advogados ainda é maior nos grandes centros urbanos e capitais. Por exemplo, estados como São Paulo e Rio de Janeiro concentram uma parcela significativa do total de profissionais, embora a profissão demonstre capilaridade em municípios de menor porte, refletindo a necessidade de serviços jurídicos em diversas regiões.

Perfil e Dinâmica das Sociedades de Advogados

O perfil das sociedades de advogados complementa essa visão, focando nas estruturas organizacionais:

Ascensão da Sociedade Unipessoal de Advocacia (SUA): A criação da Sociedade Unipessoal de Advocacia representou um divisor de águas. Após sua regulamentação, as “SUAs” rapidamente se tornaram o tipo societário mais comum para novas constituições, representando mais de 60% das novas sociedades registradas em alguns períodos. Esse modelo permite que advogados atuem de forma individualizada, mas com os benefícios da personificação jurídica, refletindo a busca por autonomia e a desburocratização para o advogado solo.

Predominância de Pequeno Porte: A vasta maioria das sociedades de advogados no Brasil, sejam elas unipessoais ou pluripessoais, é de pequeno porte em termos de número de sócios e colaboradores. Cerca de 80% a 90% das sociedades possuem até 5 advogados, incluindo os sócios. Isso indica um mercado pulverizado, com muitas micro e pequenas sociedades de advogados.

Desafios de Gestão: Muitas sociedades, especialmente as menores, ainda enfrentam dificuldades na profissionalização da gestão, priorizando a atividade-fim em detrimento da administração do negócio. Áreas como gestão financeira, de pessoas e de marketing são frequentemente negligenciadas, com menos de 30% das bancas investindo consistentemente em ferramentas de gestão profissional.

Especialização Crescente: Há uma tendência clara de especialização das sociedades em nichos específicos do direito, buscando diferenciação e maior competitividade. Embora não haja um percentual exato de sociedades especializadas, a demanda por expertise em áreas como Direito Digital, Ambiental e Compliance tem impulsionado essa segmentação.

A Necessidade de um Marco Regulatório Atualizado: A complexidade e a diversidade das formas de atuação exigem que a OAB mantenha um arcabouço regulatório que reflita a realidade atual da advocacia. É fundamental que as normas que regem a constituição, o registro e o funcionamento das sociedades de advogados e das sociedades unipessoais de advocacia, bem como a figura do advogado associado, sejam claras, uniformes nas 27 Seccionais da OAB e modernizadas. Isso inclui a necessidade de um novo Provimento do Conselho Federal da OAB, consolidando os Provimentos que tratam sobre o assunto, para definir com precisão a natureza sui generis dessas sociedades, a exclusividade de seu objeto social, a responsabilidade subsidiária e ilimitada dos sócios ou titulares, e as regras para sua denominação social, garantindo que não adotem características mercantis, nem expressão fantasia. Da mesma forma, a regulamentação do advogado associado, conforme artigos 17-A e 17-B da Lei 8.906, assegura sua autonomia profissional, sem vínculo empregatício ou societário, estabelece diretrizes claras para a partilha de resultados e a prevenção de conflitos de interesse.

Desafios e Oportunidades para a Advocacia

O cenário atual apresenta um conjunto de desafios e, simultaneamente, um leque de oportunidades para os profissionais e sociedades de advogados.

Desafios

Saturação do Mercado: O grande número de profissionais intensifica a concorrência, exigindo constante aprimoramento e diferenciação.

Adaptação Tecnológica: A incorporação de LegalTechs, Inteligência Artificial e automação é um imperativo, mas representa um desafio para muitas bancas, especialmente as menores, devido a recursos limitados e a falta de conhecimento.

Gestão Empresarial: A carência de habilidades de gestão entre os advogados pode comprometer a sustentabilidade e o crescimento das sociedades.

Instabilidade Econômica: Muitos advogados, em particular os mais jovens e autônomos, enfrentam instabilidade financeira, demandando diversificação de fontes de renda e modelos de negócio mais resilientes.

Manutenção da Qualidade e Ética: O crescimento acelerado impõe o desafio de manter a excelência dos serviços e a observância rigorosa dos preceitos éticos.

Oportunidades

Novas Áreas do Direito: O surgimento de legislações como a LGPD, o Direito Digital e a crescente demanda por Compliance criam novas e promissoras áreas de atuação.

Inovação e Tecnologia: A adoção estratégica de ferramentas tecnológicas pode gerar ganhos significativos de produtividade, otimizar a prestação de serviços e possibilitar novos modelos de negócio, como consultorias online e serviços jurídicos por assinatura.

Nicho de Mercado: A especialização em áreas menos exploradas ou a oferta de serviços para setores específicos da economia podem ser estratégias eficazes para se destacar.

Advocacia Colaborativa: O modelo de advogado associado e a colaboração entre sociedades permitem o compartilhamento de recursos e expertises, promovendo sinergias sem a necessidade de grandes estruturas.

Educação Continuada: A necessidade de constante atualização e especialização abre um vasto campo para cursos, pós-graduações e treinamentos focados nas novas demandas do mercado.

O Papel Estratégico da OAB: Apoio e Fiscalização

Diante desse cenário complexo, a OAB emerge como um ator central, com um duplo papel: apoiar o desenvolvimento da advocacia e garantir a integridade da profissão por meio de uma fiscalização eficaz.

Apoio à Gestão de Pequenas Sociedades

A OAB e a ESA podem atuar como um catalisador para a profissionalização da gestão das pequenas sociedades, que são a maioria no Brasil:

Capacitação em Gestão: Oferecer cursos, workshops e webinars práticos sobre gestão financeira, marketing jurídico ético, gestão de pessoas, processos e projetos, por meio da Escola Superior de Advocacia (ESA) e comissões temáticas.

Ferramentas e Modelos: Disponibilizar modelos de contratos, incluindo aqueles para a associação de advogados, bem como guias práticos, planilhas de controle financeiro e checklists de compliance. É crucial que a OAB mantenha à disposição dos advogados minutas padronizadas de Contrato Social e Ato Constitutivo, servindo como orientação para a elaboração de documentos em conformidade com a legislação vigente.

Fomento ao Networking e Mentoria: Criar programas de mentoria e grupos de estudo que conectem advogados experientes com gestores de pequenas sociedades, facilitando a troca de conhecimentos e experiências.

Desburocratização e Orientação: É imperativo que a OAB continue simplificando os processos de registro e averbação, tornando-os mais ágeis e transparentes. Isso inclui a plena aceitação de documentos digitais e assinaturas eletrônicas, e a promoção da digitalização dos processos de registro e averbação pelas Seccionais, buscando a integração entre os sistemas de cadastro da OAB e outros sistemas relevantes. As Comissões de Sociedades de Advogados devem ter competência para registros e averbações, exercendo funções cartorárias, o que agiliza e centraliza os procedimentos.

Incentivo à Inovação: Promover a conscientização sobre o uso de LegalTechs e, se possível, estabelecer parcerias com startups para oferecer soluções acessíveis às pequenas sociedades.

Aprimoramento da Fiscalização das Sociedades

A fiscalização pela OAB é essencial para manter a ética e a conformidade. Para aprimorá-la, a OAB pode:

Proatividade e Uso Inteligente de Dados:

Centralização e Integração de Bases de Dados: Desenvolver um sistema robusto que centralize informações das sociedades, permitindo uma visão em tempo real e a identificação de irregularidades. A digitalização dos processos e a integração de sistemas são cruciais para que a OAB tenha o perfil das sociedades com dados que possam subsidiar ações prioritárias.

Análise Preditiva: Utilizar análise de dados para identificar padrões de comportamento que possam indicar não conformidade, direcionando a fiscalização de forma mais eficiente.

Fortalecimento dos Mecanismos Disciplinares:

Capacitação Especializada: Oferecer treinamento contínuo para fiscais e conselheiros sobre as particularidades das sociedades, incluindo a correta interpretação das normas sobre objeto social, responsabilidade e a natureza da associação de advogados.

Canais de Denúncia Acessíveis: Manter e aprimorar canais de denúncia seguros e confidenciais.

Agilidade Processual: Otimizar os fluxos dos processos disciplinares para maior celeridade, sem comprometer o devido processo legal.

Transparência e Orientação Preventiva:

Publicidade Transparente: Disponibilizar informações básicas sobre as sociedades registradas em um portal público, aumentando a confiança e servindo como controle social.

Orientações Claras e Didáticas: Produzir e disseminar materiais que expliquem as regras de constituição e funcionamento das sociedades, incluindo as vedações a características mercantis e a importância da exclusividade do objeto social, prevenindo irregularidades por falta de conhecimento.

Campanhas de Conscientização: Realizar campanhas para reforçar a cultura de ética e responsabilidade na advocacia.

Colaboração Interinstitucional: Estabelecer canais de comunicação e troca de informações com outros órgãos reguladores (ex: Receita Federal), e promover o intercâmbio de melhores práticas entre as Seccionais.

Investimento em Recursos: Alocar orçamento e pessoal qualificado para as atividades de fiscalização, garantindo a infraestrutura necessária.

Conclusão

A advocacia brasileira está em um ponto de inflexão, caracterizada por um crescimento robusto, uma demografia em mutação e a ascensão de uma forma recente de constituição, a Sociedade Unipessoal de Advocacia. Os desafios da saturação do mercado, da adaptação tecnológica e da profissionalização da gestão são inegáveis, mas as oportunidades de inovação, especialização e colaboração são igualmente vastas.

Nesse contexto, a OAB desempenha um papel insubstituível. Ao modernizar seus procedimentos de registro e averbação, ao estabelecer diretrizes claras para a constituição e funcionamento das sociedades e para a figura do advogado associado, e ao investir proativamente no apoio à gestão das pequenas sociedades e no aprimoramento de sua fiscalização, a Ordem não apenas garante a conformidade e a ética, mas também impulsiona a sustentabilidade e a excelência da Advocacia nacional.

O futuro da profissão dependerá da capacidade de advogados e sociedades de advogados se adaptarem, inovarem e buscarem o apoio necessário, em um esforço conjunto com uma OAB cada vez mais estratégica e atuante, que compreenda e responda às necessidades de uma Advocacia em constante evolução.

HONORÁRIOS INDEVIDOS À FAZENDA PÚBLICA APÓS ADESÃO À TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA


 

Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados


 

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), os Ministros que compõem a 1ª Turma, definiram que empresas que desistem de ações judiciais para aderirem aos acordos de transação tributária não devem suportar o ônus do pagamento dos honorários de sucumbência em prol da Fazenda Nacional. Ao julgar o Recurso Especial nº 2.032.814/RS, a Turma compreendeu que como a renúncia ao direito debatido na demanda é uma exigência legal para a validação da transação, e a legislação que orienta essa ferramenta não supõe o pagamento de honorários, a sua exigência infringiria a lógica da concessão mútua que configura essa espécie de pacto.

No caso, predominou o voto-vista do Ministro Paulo Sérgio Domingues, que reconheceu que, ainda que não haja hipótese legal acerca da condenação em honorários nas situações de transação, a imposição dessa pena depois da renúncia do contribuinte desrespeita a boa-fé e o propósito consensual dos programas. A decisão foi tomada pela maioria dos julgadores.

Para o Julgador, a aderência à transação é condicionada à renúncia ao direito discutido na ação, e obrigar, ademais, o encargo dos honorários, sem que a norma própria da transação a prenuncie, retrata a produção de uma aplicação acessória não conhecida. Os Ministros Regina Helena Costa e Sérgio Kukina seguiram o mesmo entendimento.

No decorrer do julgamento, a Ministra Regina Helena Costa assinalou que a não condenação aos honorários é uma consequência lógica do fato de que a renúncia é condição para a admissibilidade da transação. Afirmou, ainda, que aceitar o pagamento de honorários nessas circunstâncias, desencorajaria a adesão ao benefício, contrariando o sentido de consensualidade encontrada nesses exemplares de programas.

Restaram vencidos o Relator, Ministro Gurgel de Faria, e o Ministro Benedito Gonçalves, para quem, perante o vazio da legislação da transação quanto aos honorários, teria que ser empregado o Artigo 90 do Código de Processo Civil (CPC), que dispõe sobre a condenação em honorários quando há desistência da ação.

Em pregressa defesa oral, a Fazenda Nacional ponderou que os casos de desistência por adesão à transação tributária não devem ter o mesmo acolhimento que a desistência de ação por adesão a parcelamento especial, porque “para os parcelamentos, houve previsões específicas da legislação que excluíam os honorários”.

A discussão teve início em Ação Anulatória de Débito Fiscal ajuizada por uma empresa que, posteriormente, aderiu à transação prevista na Portaria PGFN nº 14.402/2020 — norma destinada a contribuintes afetados pela pandemia da Covid-19.

Com essa decisão, o Colendo Superior Tribunal de Justiça fortifica a atratividade da transação tributária como peça de resolução amigável de contendas tributárias, impedindo custos adicionais aos contribuintes que elegem esse rumo legal.

A DIPLOMACIA NO SÉCULO XXI


 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

                                   

 

A Diplomacia, frequentemente descrita como a arte de representar e negociar sem recorrer à violência, enfrenta desafios inéditos no Século XXI. Em um mundo cada vez mais interconectado, globalizado e digitalizado, os conflitos não se limitam mais a disputas territoriais ou ideológicas tradicionais. Emergiram novas formas de tensão, como guerras cibernéticas, crises ambientais e, notadamente, disputas tarifárias (aliás, em 1929, o presidente dos USA, Herbert Hoover, sancionou a Lei Tarifária Smoot-Hawley, que majorou as tarifas sobre produtos importados, gerando retaliação de outros países, resultando em queda no comércio internacional e aprofundando a crise econômica) que afetam o comércio global. Essas disputas, exemplificadas pelas guerras comerciais entre potências como Estados Unidos e China, destacam a necessidade de uma diplomacia adaptável e proativa.

Espera-se que a Diplomacia tenha as competências essenciais para que seja eficaz na gestão e resolução desses conflitos contemporâneos, com estratégias inovadoras que podem ser empregadas para fortalecer sua atuação. A Diplomacia não é apenas uma ferramenta de estados; é um instrumento vital para a paz global, e sua evolução é crucial em um cenário onde o multilateralismo é testado diariamente.

Segundo relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU), o número de conflitos armados diminuiu desde o fim da Guerra Fria, mas os conflitos não armados, como embargos econômicos e tarifas punitivas, aumentaram nas últimas duas décadas. Disputas tarifárias, por exemplo, podem escalar para crises econômicas globais, afetando cadeias de suprimentos e empregos em múltiplos países. Assim, a Diplomacia deve estar em constante evolução para lidar com esses "conflitos híbridos", que misturam elementos econômicos, tecnológicos e geopolíticos, ouvindo-se, necessariamente, o chefe de Governo/Estado.

A eficácia na resolução de conflitos no Século XXI, acredito que exigirá da Diplomacia um conjunto diversificado de competências, não se limitando a habilidades tradicionais de negociação, certamente incorporando elementos modernos como inteligência digital e sensibilidade cultural.

A negociação é o cerne da Diplomacia. No contexto de disputas tarifárias, como as impostas pelos EUA sobre produtos chineses em 2018-2019, diplomatas tinham domínio de técnicas de barganha que equilibraram interesses econômicos com as considerações políticas.

As negociações "ganha-ganha", onde concessões mútuas evitam escaladas, é a regra, com o uso de "pacotes de negociação", que permite trocar tarifas por acordos em outras áreas, como propriedade intelectual.

 No Acordo de Fase Um entre EUA e China em 2020, negociadores americanos e chineses empregaram a Mediação para reduzir tarifas em bilhões de dólares, demonstrando como a paciência e a construção de confiança podem desarmar tensões.

Uma limitação é o viés cognitivo, como o "efeito de ancoragem", onde uma oferta inicial distorce percepções. Para mitigar, treinamentos em psicologia comportamental são essenciais. Essa competência é vital porque, sem ela, conflitos tarifários podem evoluir para boicotes totais, como visto na disputa entre Austrália e China sobre vinhos em 2020-2023.

Registro, que no dia 22/07/2025 foi anunciado um Acordo Comercial entre os USA e o Japão, que irá gerar centenas de emprego, tarifas recíprocas de 15%, com investimentos de US$ 550 bilhões e repartição de lucros, 90% para USA, o que prova o acerto das negociações ganha-ganha.

Em um mundo multicultural, entender nuances culturais é crucial. Disputas tarifárias frequentemente envolvem diferenças culturais, como visões sobre comércio livre versus protecionismo.

Diplomatas precisam de conhecimento profundo de costumes, valores e linguagens. Na Ásia, o conceito de "face" (manter a dignidade) influencia negociações, enquanto no Ocidente, a franqueza é valorizada.

Na guerra comercial EUA-China, mal-entendidos culturais sobre "reciprocidade" prolongaram as tensões. Diplomatas com inteligência cultural poderiam ter acelerado as resoluções ao adaptar abordagens.

Organizações como a União Europeia investem em programas que treinam diplomatas para navegar em contextos multiculturais, reduzindo mal-entendidos em 40%, segundo estudos da Comissão Europeia. Sem essa competência, a Diplomacia corre o risco de alienar partes, exacerbando conflitos em vez de resolvê-los.

O Século XXI introduziu a "Diplomacia Digital", onde ferramentas como redes sociais e IA moldam narrativas.

Uso de big data para prever impactos de tarifas e plataformas como o Twitter para Diplomacia Pública. Por exemplo, durante a pandemia de COVID-19, diplomatas usaram Zoom para negociações virtuais sobre suprimentos médicos.

Na disputa entre Índia e EUA sobre tarifas de aço em 2018, análises de dados ajudaram a quantificar perdas econômicas, facilitando acordos.

Prós incluem maior alcance; Contras envolvem desinformação cibernética. Diplomatas devem ser treinados em cibersegurança para combater fake news que inflamam conflitos.

O Decreto Nº 11.491, de 12 de abril de 2023, promulgou a Convenção sobre o Crime Cibernético, firmada pela República Federativa do Brasil, em Budapeste, em 23 de novembro de 2001 (https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/decreto/d11491.htm).

Essa competência transformará a diplomacia de reativa para preditiva, usando IA para simular cenários de resolução.

Diplomatas precisam entender economia global para lidar com disputas tarifárias, que afetam PIBs e empregos.

Análise de cadeias de valor e modelagem econômica, como por exemplo, saber que tarifas sobre semicondutores podem disruptir indústrias de tecnologia global.

A imposição de tarifas pela União Europeia sobre produtos americanos em retaliação às tarifas de aço de Trump em 2018 exigiu expertise em economia para negociar exceções.

Combinar com sustentabilidade, porque tarifas podem ser usadas para punir práticas ambientais ruins, como no Acordo de Paris.

Enfrentar o estresse em negociações prolongadas é patente, necessitando de resiliência.

Em conflitos como o Brexit, resiliência ajudou a manter diálogos abertos apesar de frustrações.

A importância de treinamentos em mindfulness (atenção plena) e ética para manter imparcialidade.

Essas competências formam um arsenal holístico, permitindo que a Diplomacia aborde conflitos multifacetados com precisão.

Além de competências individuais, estratégias institucionais e globais podem elevar a eficácia da Diplomacia.

Envolver organizações como a OMC (Organização Mundial do Comércio) para mediar disputas tarifárias. Reformar a OMC para incluir painéis de resolução mais rápidos, como proposto em 2024. Há Prós e Contras: Prós: Legitimidade coletiva; Contras: Paralisia por vetos, como visto no bloqueio americano ao Órgão de Apelação da OMC. A resolução da disputa tarifária entre Coreia do Sul e Japão em 2023 via OMC demonstrou sucesso multilateral.

Usar IA para negociações virtuais e monitoramento em tempo real, pode ser uma boa solução, inclusive com uso de plataformas para colaboração digital, devendo ter atenção para as vulnerabilidades cibernéticas, mitigadas por protocolos de segurança.

Durante a cúpula G7 de 2021, ferramentas digitais facilitaram acordos sobre impostos mínimos globais.

O envolvimento de empresas em negociações, como na diplomacia de vacinas durante a COVID-19.

Em disputas tarifárias, parcerias com multinacionais podem revelar impactos reais, acelerando resoluções.

A UE usou diplomacia preventiva para evitar escaladas tarifárias com o Reino Unido pós-Brexit.

Essas estratégias, quando combinadas, criam uma diplomacia robusta e adaptável.

Em resumo, a Diplomacia eficaz no Século XXI exige competências como negociação avançada, inteligência cultural, proficiência tecnológica, conhecimento econômico e resiliência emocional. Estratégias como multilateralismo fortalecido, diplomacia digital e parcerias inovadoras podem melhorar a atuação, especialmente em disputas tarifárias que ameaçam a estabilidade global.

Agradecendo a amiga Carolina Mesquita, uma futura Diplomata, pelas conversas a respeito do tema deste artigo, finalizo recomendando o livro, referência mundial para líderes e mediadores, “SIM, É POSSÍVEL: sobreviver e prosperar em uma era de conflitos”, de William Ury.

TRANSFERÊNCIAS DE EMPREGADOS – DEFINITIVAS E TEMPORÁRIAS - ADICIONAL


  

Orlando José de Almeida

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

                                  

 

 

No dia 29/07/2025 foi publicada notícia no site do Tribunal Superior do Trabalho - TST, referente ao julgamento proferido nos autos do processo nº TST-RR-931-05.2014.5.09.0303, cujo acórdão foi publicado no dia 27/05/2025.

A matéria foi intitulada “gerente de banco transferido quatro vezes em 29 anos não receberá adicional”.

O tema em discussão está vinculado ao tempo de duração da transferência para ser considerada definitiva ou provisória, para fins de pagamento do adicional respectivo.

A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, dispõe no artigo 469 e parágrafos:

“Art. 469 - Ao empregador é vedado transferir o empregado, sem a sua anuência, para localidade diversa da que resultar do contrato, não se considerando transferência a que não acarretar necessariamente a mudança do seu domicílio.

§ 1º - Não estão compreendidos na proibição deste artigo: os empregados que exerçam cargo de confiança e aqueles cujos contratos tenham como condição, implícita ou explícita, a transferência, quando esta decorra de real necessidade de serviço.  

(...)

 § 3º - Em caso de necessidade de serviço o empregador poderá transferir o empregado para localidade diversa da que resultar do contrato, não obstante as restrições do artigo anterior, mas, nesse caso, ficará obrigado a um pagamento suplementar, nunca inferior a 25% (vinte e cinco por cento) dos salários que o empregado percebia naquela localidade, enquanto durar essa situação.”

Ao interpretar o dispositivo legal o TST editou a Orientação Jurisprudencial 113, cuja redação é a seguinte:

“O fato de o empregado exercer cargo de confiança ou a existência de previsão de transferência no contrato de trabalho não exclui o direito ao adicional. O pressuposto legal apto a legitimar a percepção do mencionado adicional é a transferência provisória.”

Dessa forma, o TST considera que “o pressuposto legal apto a legitimar a percepção do mencionado adicional é a transferência provisória”.

No caso em tela a Terceira Turma do TST reverteu a decisão prolatada por Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região.

No acórdão regional constou que:

“A existência de previsão contratual e a aceitação da condição pelo empregado apenas tornam lícita a transferência, não desonerada a obrigatoriedade do pagamento do adicional respectivo.

Nesse sentido, a SDI-1 do TST, na Orientação Jurisprudencial 113: "O fato de o empregado exercer cargo de confiança ou a existência de previsão de transferência no contrato de trabalho não exclui o direito ao adicional".

Se o empregador faz uso do direito potestativo de transferir o empregado para localidade diversa à da contratação, obriga-se ao pagamento do adicional previsto em lei, como forma de compensar pecuniariamente os inconvenientes decorrentes da mudança de domicílio.

A obrigação de pagar o adicional de transferência objetiva remunerar o empregado pelo desgaste por ele sofrido em virtude de alteração originária de seu domicílio, o que se verifica em face do local originário da contratação.”

Adiante no mencionado acórdão, relativamente à prescrição, restou indicado que “nada há a deferir, na medida em que, em se tratando o adicional de transferência de parcela de trato sucessivo com previsão em lei, não há que se falar em prescrição total”.

Acontece que a Terceira Turma do TST, de forma unânime, em acórdão da lavra do Ministro Alberto Bastos Balazeiro, caminhou na direção de que “no caso, tendo em vista que o contrato de trabalho perdurou por 29 anos, com apenas 4 transferências, e com duração entre 5 a 7 anos cada uma, e, principalmente, que não houve qualquer transferência no período imprescrito, tendo a última ocorrido há mais de 8 anos antes do desligamento, entendo que as transferências foram realmente definitivas, notadamente diante da ausência de sucessividade, merecendo reforma o acórdão regional que as considerou provisórias, deferindo o adicional.”

Para fundamentar o posicionamento foram transcritos os seguintes precedentes oriundos da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais:

“EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTOS PELO RECLAMANTE SOB A ÉGIDE DA LEI 11.496/2007. (...). 2. EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTOS PELO RECLAMADO. ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. Esta Corte Superior tem decidido que, para a avaliação da natureza da transferência, é necessário cotejar a frequência das mudanças de localidade de trabalho, bem como a duração de cada uma delas. O que se extrai do acórdão embargado é que o Reclamante, durante o período contratual de 30 anos, foi submetido a quatro alterações no local da prestação de serviço, tendo a última mudança de localidade perdurado por doze anos e se estendido até a rescisão contratual. Logo, tem-se que foi definitiva a transferência a que foi sujeito a Reclamante, pois, para o fim de aplicação da OJ 113 da SbDI-1 do TST, esta Subseção tem decidido que transferências com duração superior a 2 (dois) anos no período não prescrito não devem ser qualificadas como provisórias, mas sim definitivas. Recurso de embargos conhecido e provido.” (E-EDRR - 2448700-42.2007.5.09.0015, Relator Ministro: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 05/09/2019, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 13/09/2019)

“AGRAVO (...). ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL CONFIGURADA. No caso, o fundamento adotado para manter a condenação no pagamento do adicional de transferência foi a existência de sucessivas transferências que ocasionaram a mudança do local de trabalho. Em sentido divergente é o aresto paradigma originário desta Subseção que, ao tratar do mesmo tema referente ao adicional de transferência, após relatar quatro transferências ocorridas durante vinte e um anos de contrato de trabalho, concluiu que a última se deu de forma definitiva tendo em vista o tempo de permanência de oito anos, o qual é o mesmo tempo em que o reclamante, no presente feito, perdurou no local da última transferência. Configurado o dissenso jurisprudencial nos termos das Súmulas 296, I, e 337 do TST, deve ser processado o recurso de embargos. Agravo conhecido e provido, no tema. RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 13.467/2017. ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. A natureza da transferência ser provisória ou definitiva é aferido levando-se em conta algumas variáveis, não bastando o exame de um único fator, como o tempo, mas, sim, a conjugação de ao menos três requisitos: o ânimo (provisório ou definitivo), a sucessividade de transferências e o tempo de duração. Em recente decisão prolatada pela maioria no âmbito desta Subseção, prevaleceu a tese de que, no exame da sucessividade das transferências para fins do pagamento do adicional de transferência adota-se como parâmetro o tempo inferior a dois anos, verificado o período não alcançado pela prescrição. No caso, houve a permanência por mais de oito anos na última localidade e registro de cinco sucessivas transferências durante a contratualidade que perdurou de 1978 a 2007. Em circunstâncias tais, a atual jurisprudência desta Subseção considera definitiva a transferência a impedir o recebimento do respectivo adicional. Ressalva de entendimento do relator. Recurso de embargos conhecido e provido”. (E-ED-RR - 3204300- 36.2007.5.09.0652, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 09/05/2019, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 17/05/2019)

“AGRAVO REGIMENTAL EM EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA - ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL CONFIGURADA. No caso, o acórdão que deu provimento ao recurso de revista da empresa reclamada, complementado pelo acórdão que negou provimento aos embargos de declaração opostos pelo reclamante, demonstra que o fundamento adotado para excluir da condenação o pagamento do adicional de transferência foi a existência de apenas uma transferência, no período não prescrito, a qual rendeu ensejo a permanência no local de destino por mais de cinco anos até o final do contrato de trabalho. Essa tese diverge de outros julgados desta Subseção, trazidos a cotejo, que reconhecem o direito ao adicional de transferência em razão das sucessivas transferências ocorridas durante o contrato de trabalho, com período de duração superior a dois anos, sem excluir aquelas ocorridas no período prescrito. Configurado o dissenso jurisprudencial nos termos das Súmulas 296, I, e 337 do TST, deve ser processado o recurso de embargos. Agravo regimental provido". RECURSO DE EMBARGOS. ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA - SUCESSIVIDADE E PROVISORIEDADE - ÚLTIMA TRANSFERÊNCIA OCORRIDA NO PERÍODO IMPRESCRITO - DEFINITIVIDADE. Dispõe o artigo 469, caput, da CLT que é vedado ao empregador transferir o empregado sem a sua anuência, para localidade diversa da que resultar do contrato, não se considerando transferência a que não acarretar necessariamente a mudança do seu domicílio. O §3º do mencionado dispositivo possibilita a transferência do empregado em caso de "necessidade de serviço", contudo determina o pagamento, pelo empregador, de pagamento suplementar "nunca inferior a 25% (vinte e cinco por cento), dos salários que o empregado percebia naquela localidade, enquanto durar essa situação.". A matéria relacionada ao adicional de transferência foi amplamente discutida nesta Corte, que, ao final, pacificou seu entendimento sobre o tema mediante a edição da Orientação Jurisprudencial nº 113 da SBDI-1, nestes termos: "O fato de o empregado exercer cargo de confiança ou a existência de previsão de transferência no contrato de trabalho não exclui o direito ao adicional. O pressuposto legal apto a legitimar a percepção do mencionado adicional é a transferência provisória." No entanto, referida Orientação Jurisprudencial contempla apenas explicitação e definição conceitual, denominando de transferência provisória o que, como visto, a lei não dispõe de forma clara - "enquanto durar essa situação". Neste passo, em face da ausência de critério numérico legal, a jurisprudência acabou se balizando pela realidade vivenciada em carreiras similares as dos bancários, tais como as de diplomatas e militares, que, guardadas as devidas diferenças, adotam um período mínimo de 2 anos em cada posto, com ajuda de custo, mas sem adicional, fundando-se em tal critério temporal para as transferências. Dessa forma, não é o número de transferências que dita o direito ao adicional, mas a sua duração. Neste aspecto, portanto, a jurisprudência desta Corte já está pacificada, a partir do entendimento majoritário dos membros que compõem a Egrégia SBDI-1, no sentido de se adotar como critério temporal da transferência provisória, ser ela por tempo inferior a 2 anos, razão pela qual não pode ser reputada provisória transferência que perdurou por mais de 5 anos. Além disso, no presente caso, cabe analisar a questão atinente à sucessividade das transferências, como fator definidor do pagamento do respectivo adicional, haja vista que a jurisprudência desta Corte Superior vem se consolidando no sentido de reconhecer devido o adicional de transferência quando verificadas sucessivas transferências ocorridas durante o contrato de trabalho. É fato incontroverso nos autos que o reclamante foi submetido a diversas transferências, as quais ocorreram, quase que em sua totalidade, no período prescrito. Observe-se, no entanto, que a Turma limitou-se a analisar a única transferência ocorrida no período imprescrito, tendo disposto sobre a questão que "a única transferência realizada no período imprescrito 'ocorreu com animus de definitividade, na medida em que o autor continuou trabalhando no local para o qual foi transferido até o final da contratação.", e que essa transferência "perdurou por mais de cinco anos, até o final do liame empregatício.". Desta forma, conclui-se que o acórdão da Turma emitiu tese no sentido de que para efeito de aferição do direito à percepção do adicional de transferência, o exame da sucessividade das transferências não deve levar em consideração àquelas ocorridas no período prescrito, entendimento este que se mostra irrepreensível. Ora, se determinada transferência ocorreu no período alcançado pela prescrição, a exigibilidade da pretensão relativa ao pagamento do adicional correspondente àquela transferência encontra-se tragada pela prescrição. Logo, caso subsistam transferências ocorridas no período imprescrito, a questão atinente à sucessividade destas transferências, para efeito de verificação da ocorrência do fato gerador do pagamento do respectivo adicional, deve ser examinada sem levar em consideração àquelas que se deram no período prescrito, sob pena de que os efeitos jurídicos advindo de uma transferência já abarcada pela prescrição repercutam na pretensão relativa ao adicional correspondente à uma ou mais transferências ocorridas no período imprescrito, fazendo com que situações jurídicas já consolidadas pela prescrição acabem possibilitando o deferimento do pedido vindicado. Assim, partindo-se da premissa de que a transferência provisória é o pressuposto legal apto a legitimar a percepção do respectivo adicional, conforme estabelecido na parte final da Orientação Jurisprudencial da SBDI-1/TST nº 113, na presente hipótese, não obstante tenham ocorrido sucessivas transferências no período prescrito, quatro no total, o fato é que no período imprescrito houve apenas uma, a qual ocorreu com "animus de definitividade", conforme expressamente consignado no acórdão impugnado, tendo perdurado por mais de cinco anos, até a rescisão do contrato laboral, razão pela qual não pode ser reputada transitória. Recurso de embargos conhecido e desprovido.” (E-ED-RR - 3767900-20.2008.5.09.0011, Redator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, Data de Julgamento: 28/06/2018, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 17/08/2018)

É de ser observado nos julgamentos citados que as “transferências com duração superior a 2 (dois) anos no período não prescrito não devem ser qualificadas como provisórias, mas sim definitivas.”

Considerando que não existe fixação em lei, o que tem predominado na jurisprudência é a interpretação de que única transferência perde o caráter provisório, não havendo que se falar em pagamento do adicional decorrente, quando superar a 02 (dois) anos.

Porém, não se encontra pacificada a jurisprudência na situação de sucessividade de transferências. A título de exemplo, e de forma diversa ao decidido no julgamento que ensejou a matéria sob análise, no acórdão proferido nos autos TST-Ag-E-RRAg - 929-53.2017.5.09.0069, publicado em 31/03/2023, considerou-se que: “Assim, à luz do entendimento predominante no âmbito desta Subseção, o qual repristina decisão anterior preferida em quórum completo, demonstrada a sucessividade nas transferências, nove no total, ainda que no período alcançado pela prescrição, não há como se furtar à configuração da provisoriedade, mesmo que algumas delas tenham sido por tempo superiores a três anos. No plano lógico, não se podem presumir provisórias transferências que se revelem múltiplas e sucessivas, antes o contrário. E é igualmente certo que a prescrição está relacionada à exigibilidade da pretensão, não importa a data de seu fato gerador. A não ser assim, resultariam esvaziados o antigo direito à indenização de antiguidade ...”.

COP30: UM TESTE DECISIVO PARA O COMPROMISSO DO BRASIL COM O CLIMA

 

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

A incerteza sobre a realização da COP30 na Amazônia expõe desafios logísticos e políticos que comprometem o papel do Brasil na luta contra as mudanças climáticas.

As mudanças climáticas não esperam por crises locais, nem toleram desculpas.

A COP30, planejada para ocorrer em Manaus em 2025, tem tudo para simbolizar o protagonismo do Brasil na agenda climática global: será um marco histórico ao colocar a maior floresta tropical do planeta, a Amazônia, no centro das discussões globais. Entretanto, os recentes rumores sobre uma possível mudança de sede para São Paulo ou Brasília, devido a problemas logísticos e aos preços exorbitantes dos hotéis em Manaus, estão transformando essa oportunidade crucial em uma crise sem precedentes.

Uma Oportunidade em Risco. Anunciada como o espaço ideal para discussões sobre mitigação climática, preservação ambiental e inclusão social, a COP30 em Manaus representará não só o Brasil, mas especialmente a Amazônia e suas comunidades. Um investimento inicial de mais de R$ 5 milhões já foi realizado, enquanto esforços para preparar a infraestrutura local começaram há meses.

Agora, com a possibilidade de que o evento seja deslocado por desorganização e interesses oportunistas, as projeções positivas começam a desaparecer. Além do impacto financeiro, o Brasil se arrisca a perder algo mais valioso: sua credibilidade climática no cenário internacional. Realizar a COP em São Paulo ou Brasília, por mais conveniente que pareça, enfraqueceria o impacto simbólico de sediar o evento em uma região que é tão vital para a estabilidade climática quanto vulnerável às alterações do planeta.

Razões Para Permanecer na Amazônia. O valor de realizar a COP30 em Manaus transcende questões logísticas. A floresta amazônica é responsável por capturar aproximadamente 2 bilhões de toneladas de CO₂ ao ano e desempenha um papel essencial na regulação do clima global. No entanto, 17% da floresta já foi desmatada, com a ameaça de atingir um ponto de inflexão que mudaria para sempre sua dinâmica ecológica, transformando-a de sumidouro de carbono em uma emissora de CO₂.

Realizar este evento no coração da floresta enviaria uma poderosa mensagem: o Brasil está comprometido com a preservação da Amazônia e com soluções climáticas globais. Além disso, daria voz às comunidades indígenas, ribeirinhas e locais que historicamente têm sido os verdadeiros guardiões da floresta, mas que frequentemente são deixados fora das grandes conferências internacionais.

Um Déjà Vu Preocupante. O caso do Chile em 2019, que teve que abrir mão da sede da COP25 devido a protestos e crises sociais, oferece lições claras sobre as consequências da incapacidade organizacional. A mudança para Madrid permitiu que a conferência ocorresse, mas diluiu o foco no contexto específico do país originalmente escolhido. O Brasil enfrenta um cenário similar — mas com fatores que poderiam ter sido evitados, como a explosão nos preços da hotelaria ou a falta de planejamento centralizado.

Diferentemente do Chile, onde fatores externos fizeram a sede se tornar inviável, no caso brasileiro, os problemas são fruto de desorganização interna e de interesses locais que favoreceram o ganho de curto prazo em detrimento da relevância global do evento.

Soluções Ainda São Possíveis. Ainda há tempo para salvar a COP30 em Manaus. Algumas medidas práticas poderiam resolver os problemas atuais e garantir que a mensagem de compromisso do Brasil com o clima seja fortalecida:

Regulação dos preços: O governo pode intervir para estabelecer limites para os preços de hospedagem durante o evento, além de oferecer incentivos fiscais ou subsídios temporários para os hotéis.

Infraestrutura temporária: Habitações modulares sustentáveis, vilas ecológicas e soluções alternativas de estadia podem reduzir a pressão sobre o setor hoteleiro.

Engajamento público-privado: Parcerias entre o governo, locais e internacionais podem viabilizar a logística necessária, complementar o investimento público e evitar o desperdício de recursos já mobilizados.

Mensagem clara ao mercado: Governos devem alertar empresários que o abuso de preços não apenas prejudica a imagem do evento, mas também compromete futuros projetos na Amazônia.

Conclusão: Um Momento Decisivo Para o Brasil. A realização da COP30 na Amazônia é muito mais do que um evento diplomático: é uma oportunidade de impacto global para reafirmar o compromisso do Brasil com a preservação do meio ambiente e a liderança climática.

Governos, iniciativa privada e sociedade civil precisam agir agora para garantir que o evento permaneça no coração da floresta. Permitir que a falta de planejamento ou interesses econômicos locais ditem o futuro da Conferência seria não apenas um desperdício de recursos, mas também um retrocesso simbólico e prático.

A Amazônia é o centro da crise climática, e é exatamente ali que as soluções devem ser discutidas. Líderes brasileiros ainda têm a chance de provar ao mundo que o compromisso com o clima é mais forte do que a desorganização ou anseios argentários. Mas o tempo está se esgotando: como a própria floresta, a COP30 também exige ação imediata.

segunda-feira, 7 de julho de 2025

ADVOCACIA E O “O DILEMA DA INOVAÇÃO”

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

   

“O Dilema da Inovação” (The Innovator’s Dilemma), de Clayton M. Christensen, é um marco na literatura de negócios e inovação, publicado pela primeira vez em 1997, mas somente li o livro recentemente. Christensen introduz o conceito de inovação disruptiva (disruptive innovation), que descreve como empresas consolidadas, líderes em seus mercados, frequentemente falham ao ignorar novas tecnologias ou modelos de negócios que, inicialmente, parecem atender a mercados menores ou menos lucrativos.

Principais ideias do livro:

         1.       Inovação Sustentadora vs. Inovação Disruptiva:

                 Inovação Sustentadora: Melhora produtos ou serviços existentes para atender melhor os clientes atuais. Exemplo: TVs com maior resolução.

                 Inovação Disruptiva: Cria novos mercados ou transforma os existentes, geralmente começando com produtos mais simples, acessíveis ou menos sofisticados. Exemplo: serviços de streaming substituindo locadoras de vídeo.

         2.       Por que empresas líderes falham?

                 Empresas bem-sucedidas focam em atender seus clientes principais e maximizam lucros no curto prazo, negligenciando tecnologias emergentes que inicialmente não parecem promissoras.

                 Essa “miopia” estratégica pode levar empresas a perderem relevância quando a inovação disruptiva amadurece e conquista o mercado.

         3.       O ciclo da disrupção:

                 Inovações disruptivas começam em nichos de mercado ou em segmentos desvalorizados pelas grandes empresas.

                 Gradualmente, essas inovações evoluem e passam a atender a um público maior, deslocando as líderes tradicionais.

         4.       Exemplos clássicos:

                 A substituição de minicomputadores por computadores pessoais.

                 O impacto das câmeras digitais sobre o mercado de câmeras analógicas.

Relevância do livro:

“O Dilema da Inovação” tornou-se leitura essencial para empreendedores, gestores e inovadores, porque fornece ferramentas para identificar e lidar com mudanças tecnológicas e de mercado. Ele também incentiva empresas a criarem estruturas internas ou subsidiárias dedicadas a explorar tecnologias emergentes, reduzindo o risco de serem superadas por concorrentes.

As ideias de “O Dilema da Inovação” podem ser aplicadas na Advocacia para ajudar Sociedades de Advogados e profissionais a se adaptarem às mudanças tecnológicas e às novas demandas do mercado, evitando-se o risco de obsolescência. Vejam como as principais ideias do livro podem ser traduzidas para o setor:

1. Identificar inovações disruptivas no mercado jurídico

No setor jurídico, inovações disruptivas podem surgir como tecnologias ou serviços que inicialmente atendem a segmentos menos sofisticados ou negligenciados, mas que têm o potencial de transformar o mercado. Exemplos incluem:

                 Automação de contratos: Plataformas que criam contratos automaticamente podem parecer básicas, mas podem substituir serviços tradicionais de advocacia em larga escala.

                 Legaltechs: Startups que oferecem soluções jurídicas digitais, como consultoria automatizada ou sistemas de gestão de processos, podem atender clientes menores ou startups inicialmente, mas expandir rapidamente.

                 Inteligência Artificial (IA): Ferramentas de IA como análise preditiva de litígios ou revisão documental automatizada podem substituir parte do trabalho manual.

Aplicação:

Advogados e Sociedades de Advogados devem monitorar essas tendências e, em vez de ignorá-las, explorar como integrá-las ao seu modelo de negócios.

2. Criar estruturas paralelas para inovação

Empresas jurídicas tradicionais podem encontrar dificuldades em adotar inovações disruptivas, pois isso podem entrar em conflito com seu modelo de negócios atual. Uma solução é criar unidades ou equipes separadas dedicadas a experimentar novas abordagens e tecnologias.

Exemplos:

                 Criar uma área de inovação dentro do escritório para testar tecnologias como chatbots jurídicos ou plataformas de resolução de disputas online.

                 Investir em parcerias com legaltechs para oferecer serviços mais acessíveis e ágeis.

3. Focar em novos mercados e clientes negligenciados

A inovação disruptiva geralmente atende a clientes que as grandes empresas ignoram por serem menos lucrativos ou sofisticados. No direito, isso pode significar atender:

                 Pequenas e médias empresas que precisam de soluções jurídicas acessíveis.

                 Consumidores individuais que não podem pagar por serviços jurídicos tradicionais.

                 Nichos emergentes, como startups de tecnologia ou empresas de economia criativa.

Estratégia:

Desenvolver produtos ou serviços jurídicos acessíveis, como pacotes pré-formatados de consultoria ou assinaturas mensais para serviços recorrentes.

4. Adotar tecnologia para eficiência e competitividade

A advocacia tradicional é muitas vezes resistente à mudança, mas a adoção de tecnologia é crucial para permanecer competitiva. Exemplos incluem:

                 Automação de tarefas repetitivas, como revisão de documentos e due diligence.

                 Plataformas colaborativas para comunicação com clientes e gestão de casos.

                 Análise de dados jurídicos para estratégias mais assertivas em litígios.

Benefícios:

Reduzir custos operacionais, melhorar a experiência do cliente e liberar os advogados para tarefas mais estratégicas.

5. Educar e preparar equipes para o futuro

Assim como empresas de outros setores, Sociedades de Advogados devem investir em capacitação contínua para preparar suas equipes para o uso de novas ferramentas e abordagens.

Exemplos:

                 Treinamento em tecnologias jurídicas como sistemas de gestão de processos e análise de dados.

                 Incentivo à mentalidade inovadora, promovendo a cultura de experimentação e adaptação.

Conclusão

A aplicação das ideias de “O Dilema da Inovação” na Advocacia exige que os profissionais estejam atentos às mudanças no mercado e dispostos a experimentar novos modelos. Escritórios que incorporarem inovações disruptivas de forma estratégica poderão não apenas sobreviver, mas liderar a transformação do setor jurídico.

Abaixo exemplos práticos e estratégias específicas para aplicar as ideias de “O Dilema da Inovação” no setor da Advocacia, com foco em como Sociedades de Advogados e profissionais podem se preparar para a inovação disruptiva:

1. Monitorar e Adotar Legaltechs

Exemplo prático:

                 Parceria com plataformas de automação de contratos: Um escritório pode firmar parceria com uma legaltech que automatiza a criação de contratos padrão, como locações, acordos de confidencialidade (NDAs) ou contratos trabalhistas. Isso reduz custos e permite atender a um volume maior de clientes.

                 Uso de IA para revisão documental: Adotar ferramentas como e-Discovery (Descoberta eletrônica) ou softwares de revisão automatizada em processos de grande volume, reduzindo o tempo gasto em tarefas manuais.

Estratégia:

                 Criar um comitê de inovação no escritório para testar e avaliar tecnologias emergentes. Esse comitê pode incluir advogados, profissionais de TI e especialistas em inovação.

2. Oferecer Serviços Jurídicos Acessíveis e Escaláveis

Exemplo prático:

                 Pacotes de serviços pré-definidos: Criar soluções “prontas para uso”, como pacotes de regularização de pequenas empresas ou consultoria jurídica para startups.

                 Assinaturas jurídicas: Oferecer um modelo de assinatura mensal para pequenos negócios, garantindo suporte contínuo por um preço fixo.

Estratégia:

                 Mapear as demandas jurídicas mais comuns do público-alvo e criar produtos jurídicos específicos que possam ser oferecidos digitalmente.

                 Utilizar plataformas online para entregar serviços.

3. Criar Unidades de Negócio Dedicadas à Inovação

Exemplo prático:

                 Laboratório de inovação jurídica: Criar uma equipe dedicada a desenvolver e testar novos serviços jurídicos, como mediação online ou soluções de compliance automatizadas.

                 Incubação de startups jurídicas: Investir em startups do setor jurídico que possam complementar os serviços do escritório, como ferramentas de gestão de documentos ou plataformas de resolução de disputas.

Estratégia:

                 Alocar recursos e criar um ambiente separado do núcleo principal do escritório para evitar conflitos com o modelo de negócios tradicional.

4. Atender a Nichos e Mercados Emergentes

Exemplo prático:

                 Consultoria para startups de tecnologia: Oferecer serviços especializados em propriedade intelectual, proteção de dados e compliance digital.

                 Advocacia para economia criativa: Desenvolver expertise em contratos e direitos autorais para atender artistas, influenciadores e criadores de conteúdo.

Estratégia:

                 Identificar setores em crescimento que ainda não são amplamente atendidos por escritórios tradicionais e desenvolver expertise específica para se destacar.

5. Automatizar Processos Internos para Reduzir Custos

Exemplo prático:

                 Gestão de casos com ferramentas digitais: Usar plataformas como Clio ou Lawcus para organizar processos, acompanhar prazos e facilitar a comunicação com clientes.

                 Automação de due diligence: Utilizar softwares que analisam grandes volumes de dados para identificar riscos em fusões e aquisições.

Estratégia:

                 Realizar uma auditoria interna para identificar tarefas repetitivas que podem ser automatizadas, liberando advogados para atividades de maior valor agregado.

 

6. Capacitar a Equipe para a Transformação Digital

Exemplo prático:

                 Treinamento em tecnologias jurídicas: Promover workshops internos sobre uso de ferramentas de automação e IA no trabalho jurídico.

                 Educação contínua sobre inovação: Incentivar a equipe a participar de eventos e cursos sobre inovação no direito, como os promovidos por associações de Legaltechs.

Estratégia:

                 Criar um programa de desenvolvimento profissional contínuo, com foco em habilidades tecnológicas e estratégicas.

7. Explorar Novos Modelos de Resolução de Conflitos

Exemplo prático:

                 Plataformas de mediação online: Oferecer serviços de mediação e arbitragem online para disputas de menor complexidade, reduzindo custos e tempo para os clientes.

                 Consultoria preventiva digital: Criar ferramentas que ajudam empresas a identificar riscos legais antes que eles se tornem litígios.

Estratégia:

                 Desenvolver parcerias com plataformas de resolução de disputas ou criar uma solução própria, especialmente para áreas como direito do consumidor ou trabalhista.

8. Foco na Experiência do Cliente

Exemplo prático:

                 Portal do cliente: Criar um espaço online onde os clientes possam acompanhar o andamento de seus casos em tempo real, acessar documentos e se comunicar com o advogado.

                 Atendimento híbrido: Oferecer consultas virtuais para maior conveniência, especialmente para clientes que não podem se deslocar.

Estratégia:

                 Realizar pesquisas regulares de satisfação para entender as expectativas dos clientes e ajustar os serviços conforme necessário.

Acredito que essas sugestões de estratégias poderão ajudar Sociedades de Advogados e advogados a se posicionarem como líderes em um mercado em transformação, atendendo às demandas de clientes modernos e explorando novas oportunidades de crescimento.