Stanley
Martins Frasão
Advogado Sócio de Homero Costa
Advogados
Uma nova formação da Comissão Nacional das
Sociedades de Advogados do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil ocorreu recentemente, triênio 2025/2028, sob a presidência do advogado
Carlos Augusto Monteiro Nascimento, retomando-se o debate sobre a Uniformização
de Procedimentos das Sociedades de Advogados, com o objetivo de propor um novo
Provimento à diretoria da OAB. Os integrantes também trataram da criação
de um Perfil Nacional das Sociedades, para subsidiar políticas da entidade,
além de planejados eventos e um seminário sobre a Lei
14.365/2022.
Está previsto, ainda, um encontro nacional com as comissões seccionais e a
participação da CNSA na Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, em
Salvador (BA), em 2026. (https://www.oab.org.br/noticia/63208/confira-o-trabalho-das-comissoes-tematicas-da-oab-nacional-durante-a-semana).
A advocacia brasileira encontra-se em um
período de profunda transformação, impulsionada por mudanças demográficas,
avanços tecnológicos e a constante evolução das demandas sociais e econômicas.
Compreender esse cenário dinâmico é fundamental para advogados, sociedades de
advogados e, sobretudo, para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que
desempenha um papel central na regulamentação, fiscalização e apoio à
profissão. Este artigo sintetiza as principais conclusões e insights derivados
de análises recentes, incluindo o "Primeiro Perfil Nacional das Espécies
de Sociedades de Advogados - Conselho Federal OAB - 2021" ( https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/11/2C62754140343C_PerfilNacional.pdf ), o "1º Estudo Demográfico da Advocacia
Brasileira!" (2024) (https://www.oab.org.br/noticia/62188/perfil-adv-conheca-o-resultado-do-primeiro-estudo-demografico-da-advocacia-brasileira) e delineando um
panorama abrangente dos desafios e oportunidades, bem como as implicações para
o setor jurídico nacional.
O Cenário Atual da Advocacia Brasileira
A análise dos Estudo Demográficos e de Perfil
das Sociedades revela um ecossistema jurídico em constante expansão e
diversificação.
Tendências Demográficas da Advocacia
O panorama da advocacia brasileira destaca
características marcantes da população de advogados:
Crescimento Acelerado: O número de
advogados inscritos na OAB tem crescido exponencialmente, ultrapassando a marca
de 1,3 milhão de profissionais em todo o país. Esse crescimento, que tem sido
constante nas últimas décadas, resulta em um mercado de trabalho cada vez mais
competitivo e exigindo maior diferenciação profissional.
Feminização da Profissão: Observa-se uma
participação feminina crescente e significativa na advocacia. Dados recentes
indicam que as mulheres já representam mais de 50% dos novos inscritos em
diversas seccionais e se aproximam da paridade no quadro geral, com uma
presença marcante em todas as faixas etárias. Essa mudança demográfica impõe a
necessidade de políticas de equidade e inclusão.
Base Jovem: Uma parcela substancial dos advogados
é composta por profissionais em início de carreira. Estimativas apontaram que
cerca de 30% a 40% dos advogados ativos possuem menos de 5 anos de inscrição na
OAB, o que, por um lado, indica um grande potencial para inovação e adaptação,
e por outro, levanta desafios relacionados à inserção no mercado e à aquisição
de experiência.
Distribuição Geográfica: A concentração de
advogados ainda é maior nos grandes centros urbanos e capitais. Por exemplo,
estados como São Paulo e Rio de Janeiro concentram uma parcela significativa do
total de profissionais, embora a profissão demonstre capilaridade em municípios
de menor porte, refletindo a necessidade de serviços jurídicos em diversas
regiões.
Perfil e Dinâmica das Sociedades de Advogados
O perfil das sociedades de advogados
complementa essa visão, focando nas estruturas organizacionais:
Ascensão da Sociedade Unipessoal de Advocacia
(SUA): A
criação da Sociedade Unipessoal de Advocacia representou um divisor de águas.
Após sua regulamentação, as “SUAs” rapidamente se tornaram o tipo societário
mais comum para novas constituições, representando mais de 60% das novas
sociedades registradas em alguns períodos. Esse modelo permite que advogados
atuem de forma individualizada, mas com os benefícios da personificação
jurídica, refletindo a busca por autonomia e a desburocratização para o
advogado solo.
Predominância de Pequeno Porte: A vasta maioria das
sociedades de advogados no Brasil, sejam elas unipessoais ou pluripessoais, é
de pequeno porte em termos de número de sócios e colaboradores. Cerca de 80% a
90% das sociedades possuem até 5 advogados, incluindo os sócios. Isso indica um
mercado pulverizado, com muitas micro e pequenas sociedades de advogados.
Desafios de Gestão: Muitas sociedades,
especialmente as menores, ainda enfrentam dificuldades na profissionalização da
gestão, priorizando a atividade-fim em detrimento da administração do negócio.
Áreas como gestão financeira, de pessoas e de marketing são frequentemente negligenciadas,
com menos de 30% das bancas investindo consistentemente em ferramentas de
gestão profissional.
Especialização Crescente: Há uma tendência
clara de especialização das sociedades em nichos específicos do direito,
buscando diferenciação e maior competitividade. Embora não haja um percentual
exato de sociedades especializadas, a demanda por expertise em áreas como
Direito Digital, Ambiental e Compliance tem impulsionado essa segmentação.
A Necessidade de um Marco Regulatório
Atualizado:
A complexidade e a diversidade das formas de atuação exigem que a OAB mantenha
um arcabouço regulatório que reflita a realidade atual da advocacia. É
fundamental que as normas que regem a constituição, o registro e o
funcionamento das sociedades de advogados e das sociedades unipessoais de
advocacia, bem como a figura do advogado associado, sejam claras, uniformes nas
27 Seccionais da OAB e modernizadas. Isso inclui a necessidade de um novo
Provimento do Conselho Federal da OAB, consolidando os Provimentos que tratam
sobre o assunto, para definir com precisão a natureza sui generis dessas
sociedades, a exclusividade de seu objeto social, a responsabilidade
subsidiária e ilimitada dos sócios ou titulares, e as regras para sua
denominação social, garantindo que não adotem características mercantis, nem
expressão fantasia. Da mesma forma, a regulamentação do advogado associado,
conforme artigos 17-A e 17-B da Lei 8.906, assegura sua autonomia profissional,
sem vínculo empregatício ou societário, estabelece diretrizes claras para a
partilha de resultados e a prevenção de conflitos de interesse.
Desafios e Oportunidades para a Advocacia
O cenário atual apresenta um conjunto de
desafios e, simultaneamente, um leque de oportunidades para os profissionais e
sociedades de advogados.
Desafios
Saturação do Mercado: O grande número de
profissionais intensifica a concorrência, exigindo constante aprimoramento e
diferenciação.
Adaptação Tecnológica: A incorporação de
LegalTechs, Inteligência Artificial e automação é um imperativo, mas representa
um desafio para muitas bancas, especialmente as menores, devido a recursos
limitados e a falta de conhecimento.
Gestão Empresarial: A carência de
habilidades de gestão entre os advogados pode comprometer a sustentabilidade e
o crescimento das sociedades.
Instabilidade Econômica: Muitos advogados, em
particular os mais jovens e autônomos, enfrentam instabilidade financeira,
demandando diversificação de fontes de renda e modelos de negócio mais
resilientes.
Manutenção da Qualidade e Ética: O crescimento
acelerado impõe o desafio de manter a excelência dos serviços e a observância
rigorosa dos preceitos éticos.
Oportunidades
Novas Áreas do Direito: O surgimento de
legislações como a LGPD, o Direito Digital e a crescente demanda por Compliance
criam novas e promissoras áreas de atuação.
Inovação e Tecnologia: A adoção estratégica
de ferramentas tecnológicas pode gerar ganhos significativos de produtividade,
otimizar a prestação de serviços e possibilitar novos modelos de negócio, como
consultorias online e serviços jurídicos por assinatura.
Nicho de Mercado: A especialização em
áreas menos exploradas ou a oferta de serviços para setores específicos da
economia podem ser estratégias eficazes para se destacar.
Advocacia Colaborativa: O modelo de advogado
associado e a colaboração entre sociedades permitem o compartilhamento de
recursos e expertises, promovendo sinergias sem a necessidade de grandes
estruturas.
Educação Continuada: A necessidade de
constante atualização e especialização abre um vasto campo para cursos,
pós-graduações e treinamentos focados nas novas demandas do mercado.
O Papel Estratégico da OAB: Apoio e
Fiscalização
Diante desse cenário complexo, a OAB emerge
como um ator central, com um duplo papel: apoiar o desenvolvimento da advocacia
e garantir a integridade da profissão por meio de uma fiscalização eficaz.
Apoio à Gestão de Pequenas Sociedades
A OAB e a ESA podem atuar como um catalisador
para a profissionalização da gestão das pequenas sociedades, que são a maioria
no Brasil:
Capacitação em Gestão: Oferecer cursos,
workshops e webinars práticos sobre gestão financeira, marketing jurídico
ético, gestão de pessoas, processos e projetos, por meio da Escola Superior de
Advocacia (ESA) e comissões temáticas.
Ferramentas e Modelos: Disponibilizar
modelos de contratos, incluindo aqueles para a associação de advogados, bem
como guias práticos, planilhas de controle financeiro e checklists de
compliance. É crucial que a OAB mantenha à disposição dos advogados minutas
padronizadas de Contrato Social e Ato Constitutivo, servindo como orientação
para a elaboração de documentos em conformidade com a legislação vigente.
Fomento ao Networking e Mentoria: Criar programas de
mentoria e grupos de estudo que conectem advogados experientes com gestores de
pequenas sociedades, facilitando a troca de conhecimentos e experiências.
Desburocratização e Orientação: É imperativo que a
OAB continue simplificando os processos de registro e averbação, tornando-os
mais ágeis e transparentes. Isso inclui a plena aceitação de documentos
digitais e assinaturas eletrônicas, e a promoção da digitalização dos processos
de registro e averbação pelas Seccionais, buscando a integração entre os
sistemas de cadastro da OAB e outros sistemas relevantes. As Comissões de
Sociedades de Advogados devem ter competência para registros e averbações,
exercendo funções cartorárias, o que agiliza e centraliza os procedimentos.
Incentivo à Inovação: Promover a
conscientização sobre o uso de LegalTechs e, se possível, estabelecer parcerias
com startups para oferecer soluções acessíveis às pequenas sociedades.
Aprimoramento da Fiscalização das Sociedades
A fiscalização pela OAB é essencial para
manter a ética e a conformidade. Para aprimorá-la, a OAB pode:
Proatividade e Uso Inteligente de Dados:
Centralização e Integração de Bases de Dados: Desenvolver um
sistema robusto que centralize informações das sociedades, permitindo uma visão
em tempo real e a identificação de irregularidades. A digitalização dos
processos e a integração de sistemas são cruciais para que a OAB tenha o perfil
das sociedades com dados que possam subsidiar ações prioritárias.
Análise Preditiva: Utilizar análise de
dados para identificar padrões de comportamento que possam indicar não
conformidade, direcionando a fiscalização de forma mais eficiente.
Fortalecimento dos Mecanismos Disciplinares:
Capacitação Especializada: Oferecer treinamento
contínuo para fiscais e conselheiros sobre as particularidades das sociedades,
incluindo a correta interpretação das normas sobre objeto social,
responsabilidade e a natureza da associação de advogados.
Canais de Denúncia Acessíveis: Manter e aprimorar
canais de denúncia seguros e confidenciais.
Agilidade Processual: Otimizar os fluxos
dos processos disciplinares para maior celeridade, sem comprometer o devido
processo legal.
Transparência e Orientação Preventiva:
Publicidade Transparente: Disponibilizar
informações básicas sobre as sociedades registradas em um portal público,
aumentando a confiança e servindo como controle social.
Orientações Claras e Didáticas: Produzir e
disseminar materiais que expliquem as regras de constituição e funcionamento
das sociedades, incluindo as vedações a características mercantis e a
importância da exclusividade do objeto social, prevenindo irregularidades por
falta de conhecimento.
Campanhas de Conscientização: Realizar campanhas
para reforçar a cultura de ética e responsabilidade na advocacia.
Colaboração Interinstitucional: Estabelecer canais
de comunicação e troca de informações com outros órgãos reguladores (ex:
Receita Federal), e promover o intercâmbio de melhores práticas entre as
Seccionais.
Investimento em Recursos: Alocar orçamento e
pessoal qualificado para as atividades de fiscalização, garantindo a
infraestrutura necessária.
Conclusão
A advocacia brasileira está em um ponto de
inflexão, caracterizada por um crescimento robusto, uma demografia em mutação e
a ascensão de uma forma recente de constituição, a Sociedade Unipessoal de
Advocacia. Os desafios da saturação do mercado, da adaptação tecnológica e da
profissionalização da gestão são inegáveis, mas as oportunidades de inovação,
especialização e colaboração são igualmente vastas.
Nesse contexto, a OAB desempenha um papel
insubstituível. Ao modernizar seus procedimentos de registro e averbação, ao
estabelecer diretrizes claras para a constituição e funcionamento das
sociedades e para a figura do advogado associado, e ao investir proativamente
no apoio à gestão das pequenas sociedades e no aprimoramento de sua
fiscalização, a Ordem não apenas garante a conformidade e a ética, mas também
impulsiona a sustentabilidade e a excelência da Advocacia nacional.