segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

VALE A PENA SEGUIR CARREIRA COMO ADVOGADO NO BRASIL?

 

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

Sim — desde que com posicionamento estratégico, conformidade rigorosa à regulação da OAB e alta adaptabilidade tecnológica. A profissão permanece atrativa para quem combina expertise jurídica profunda com gestão, dados e foco no cliente. Sociedades e profissionais que dominarem o portfólio híbrido de precificação, operarem com eficiência mensurável e entregarem aconselhamento de alto impacto tendem a capturar valor sustentável no Mercado Jurídico brasileiro.

O Mercado Jurídico brasileiro combina contencioso volumoso com novas demandas de LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados)ESG (Environmental, Social and Governance – Ambiental, Social e Governança) e digitalização processual (PJe – Processo Judicial Eletrônico). Nesse ambiente, a advocacia é atrativa para quem migra do “contar horas” para a entrega de valor mensurável: gestão de risco, estratégia e previsibilidade de custos. Sociedades que operam com métricas e experiência do cliente superior preservam margens e relacionamentos.

A Precificação híbrida orientada a valor deve ser aplicada.

A automação de legaltechs (empresas de tecnologia jurídica) e a escala de ALSPs (Alternative Legal Service Providers – Provedores Alternativos de Serviços Jurídicos) comprimem preços em tarefas padronizáveis, impulsionando um portfólio de modelos:

  • Fixed fee (preço fixo)/retainer (mensalidade) para rotinas previsíveis (governança contratual e conformidade).
  • Value-based pricing (precificação por valor) em trabalhos estratégicos (M&A – Mergers and Acquisitions – Fusões e Aquisições, arbitragem).
  • Managed services (serviços gerenciados) com SLAs (Service Level Agreements – Acordos de Nível de Serviço) e KPIs (Key Performance Indicators – Indicadores‑Chave de Desempenho).
  • Assinaturas para operações contínuas (programas de compliance – conformidade regulatória e CLM – Contract Lifecycle Management – Gestão do Ciclo de Vida de Contratos).
  • Success fee (honorários de êxito)/holdback (retenção condicional) em contencioso, respeitando limites éticos.

Exemplo: revisão anual de milhares de contratos pode migrar de hora-avulsa para tarifa por documento, com SLA (Acordo de Nível de Serviço) de 72h e métricas de qualidade; a banca foca cláusulas críticas e pareceres.


Operação, dados e tecnologia como alavancas. A vantagem competitiva nasce de legal ops (operações jurídicas) e da integração entre pessoas, processos e tecnologia:

  • Padronização e automação: listas de verificação, modelos versionados e “esteiras” de produção.
  • Analytics (análises de dados)dashboards (painéis) de produtividade, qualidade e risco para decidir preço, prazos e staffing (alocação de equipe).
  • Integração de sistemasCLM (Gestão do Ciclo de Vida de Contratos)BI (Business Intelligence – Inteligência de Negócios) e plataformas judiciais, com trilhas de auditoria e segurança da informação.
  • IA (Inteligência Artificial) como copilot (copiloto): acelera pesquisa, triagem, e‑discovery (descoberta eletrônica) e análise documental; o diferencial humano permanece na estratégia, no julgamento jurídico e na negociação.

Ética, regulação e reputação (OAB), o tripé necessário.

A inovação deve observar o Estatuto da Advocacia, o Código de Ética e os Provimentos do CFOAB (Conselho Federal da OAB), como o de publicidade informativa. Pontos críticos:

  • Transparência de escopo, preço e performance contratada.
  • Vedação à captação indevida e limites a comunicação mercadológica.
  • Proteção de dados (LGPD), confidencialidade e governança de fornecedores/terceiros.
  • Estrutura societária compatível com as regras profissionais, preservando independência técnica.

Competências essenciais para o sucesso:

  • Técnicas: domínio regulatório setorial e redação de alto nível.
  • Operacionaislegal ops (operações jurídicas)SLAs (Acordos de Nível de Serviço)KPIs (Indicadores‑Chave de Desempenho) e controle estatístico de qualidade.
  • Tecnologia e dados: automação, IA (Inteligência Artificial) aplicada e visualização de indicadores.
  • Negócios: precificação, proposta de valor e experiência do cliente.
  • Soft skills (competências comportamentais): comunicação clara, negociação, mediação e ética aplicada.
  • PMO (Project Management Office – Escritório de Gerenciamento de Projetos) jurídico para governança de projetos complexos.

Caminhos práticos para profissionais e Sociedades:

  1. Mapeie o portfólio por eixo complexidade × padronização; automatize o “repeatable (recorrente)” com legaltechs/ALSPs.
  2. Redesenhe ofertas em camadas: plataforma por assinatura, managed services (serviços gerenciados) e consultoria premium.
  3. Implemente governança de qualidade e ética para uso de IA (Inteligência Artificial) e dados.
  4. Mensure valor: relate ganhos de tempo, redução de risco e previsibilidade orçamentária.
  5. Revisite “rate cards (tabelas de tarifas)” com descontos por volume e métricas de desempenho.

Conclusão

Vale a pena seguir carreira como advogado no Brasil — para quem combina expertise jurídica profunda com gestãodados e foco no cliente, sob conformidade estrita às normas da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). A profissão permanece relevante social e economicamente, e o prêmio recai sobre quem entrega resultado verificável, domina precificação híbrida e adota tecnologia com responsabilidade. Nesse equilíbrio entre técnica, ética e eficiência está o caminho para o valor sustentável no Mercado Jurídico brasileiro.

AUSÊNCIA DE PRAZO ESPECÍFICO PARA A ADESÃO DO CONTRIBUINTE À CPRB


 

Gustavo Pires Maia da Silva

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

A escolha do pagante pela Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (“CPRB”) pode ser realizada não somente pelo recolhimento oportuno do encargo, mas também pela transmissão natural da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (“DCFT”) ou da Declaração de Compensação.

A definição é da Colenda 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), que negou provimento ao Recurso Especial nº 1.990.050/CE, interposto pela Fazenda Nacional. O colegiado estabeleceu que nunca houve tempo específico para a aderência à CPRB.

O sistema voluntário da contribuição foi instituído pela Lei nº 13.161/2015, que introduziu o Parágrafo 13 no Artigo 9º da Lei nº 12.546/2011. A diretriz exprime que a eleição pela tributação substitutiva será declarada por intermédio do recolhimento da contribuição incidente sobre a receita bruta referente a janeiro de cada ano, ou à primeira competência imediata para a qual haja receita bruta calculada.

No ano de 2018, a Receita Federal do Brasil entendeu que a tempestividade do pagamento, em janeiro de cada ano, é uma premissa para a adesão ao regime da CPRB, o que eliminaria empresas que retardaram a contribuição e depois confessaram a dívida via DCFT, ou experimentaram compensá-la.

Esse posicionamento foi eleito na Solução de Consulta Interna Cosit/RFB nº 14/2018. No caso concreto, o contribuinte recorreu ao Poder Judiciário para tentar desobrigar-se da restrição e alcançou decisão favorável no Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

Ao examinar a matéria, a Corte compreendeu que a solução de consulta excedeu as fronteiras legais e infringiu o princípio da legalidade. A Fazenda Nacional recorreu e o processo chegou ao STJ no mês de março de 2022.

No entanto, dois meses após, a Receita Federal do Brasil retrocedeu ao publicar a Solução de Consulta Interna Cosit/RFB nº 3/2022, em que evidenciou que, assim como o pagamento extemporâneo, a entrega fora do prazo das declarações não desconsidera o direito de opção pela CPRB.

A abolição da solução de consulta precedente, provavelmente, assegurou a tarefa da 2ª Turma do STJ. O Ministro Marco Aurélio Bellizze, relator, votou por negar provimento ao Recurso Especial aviado pela Fazenda Nacional.

De acordo com o Magistrado, o pagamento oportuno da contribuição serve para demonstrar a vontade do contribuinte pelo regime da CPRB, mas a própria Lei nº 13.161/2015 não estabelece a tempestividade do pagamento como circunstância para essa finalidade.

Afirmou o Ministro: “O pagamento eventualmente realizado fora do prazo legalmente estipulado impõe ao contribuinte os consectários próprios da mora, e não a inviabilidade da escolha pelo regime tributário substitutivo por ele manifestada por outros meios legitimamente admitidos”.

Deste modo, é plausível utilizar a DCFT ou a declaração de compensação, mecanismos nos quais há a escolha de débito relativo à contribuição previdenciária patronal em consonância com a tributação substitutiva da CPRB.

São ferramentas adequadas a instituir o crédito tributário da CPRB, consoante uma confissão de dívida. Elas atribuem liquidez, certeza e exigibilidade ao débito, que se torna suscetível de ser direcionado para a inscrição na Dívida Ativa da União.

Dirigida a DCFT ou a declaração de compensação apontando o débito de acordo com a CPRB, a inadimplência permite à Fazenda Nacional viabilizar a Ação Executiva para exigir a dívida a partir do regime substitutivo revelado pelo contribuinte.

Sintetizou o Ministro Relator que: “A opção do contribuinte pela tributação substitutiva pode se dar não apenas pelo pagamento tempestivo da contribuição segundo tal sistemática, mas também pelo cumprimento da obrigação acessória de informar ao Fisco que pretende se utilizar da tributação substitutiva da CPRB”.

Concluiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça que esse entendimento da Receita Federal do Brasil ultrapassa a sua função regulamentar, configurando sanção política, isto é, meio repressivo indireto para a exigência de tributo.

A REALIDADE DAS CONTROVÉRSIAS

 

 

Stanley Martins Frasão

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

As controvérsias não são apenas brigas ou desentendimentos. Elas representam a pluralidade da experiência humana. Em uma sociedade democrática, o dissenso não é apenas permitido, mas essencial. É através do confronto de ideias que as perspectivas se ampliam, os interesses se revelam e as estruturas são desafiadas. O consenso permanente, quando ocorre, pode indicar conformismo, enquanto as controvérsias são um sinal de vitalidade social.

Ainda assim, é fundamental distinguir entre controvérsias saudáveis e conflitos improdutivos. O debate que nasce da escuta atenta e da argumentação construtiva edifica. Já a polêmica vazia, alimentada por desinformação e ataques pessoais, apenas desgasta. Reconhecer a realidade das controvérsias exige maturidade para aceitar o desconforto do desacordo sem cair na hostilidade.

No campo jurídico, a controvérsia é uma parte essencial e cotidiana. Não há justiça sem a existência de conflitos. O trabalho de advogados, juízes e legisladores acontece na complexa zona cinzenta entre normas e fatos. Interpretar, ponderar e decidir são processos que surgem das controvérsias. Diferentemente do senso comum, o Direito não busca eliminar os conflitos, mas tratá-los de forma racional e institucionalizada.

Na política, o mesmo princípio se aplica. Quando o debate dá lugar à imposição e a divergência é silenciada em prol de uma suposta "unidade", há retrocesso. Democracias fortes não temem controvérsias; pelo contrário, elas as acolhem, processam e, quando possível, as transformam em avanços coletivos.

O mundo contemporâneo enfrenta um desafio que deturpa a essência das controvérsias: a polarização. Em um ambiente radicalizado, o dissenso perde sua capacidade de enriquecer e se transforma em trincheira. As redes sociais, com seus algoritmos voltados ao engajamento, intensificam esse fenômeno. Isso gera uma lógica de "nós contra eles", onde a complexidade é reduzida a slogans, e a empatia cede espaço para caricaturas do outro.

Essa cultura de antagonismo absoluto sufoca o diálogo e prejudica o pensamento crítico. O problema não está na existência de opiniões divergentes, mas na incapacidade de reconhecer qualquer importância na perspectiva alheia. Quando todo debate assume o formato de uma guerra, todos saem perdendo.

Reconhecer a realidade das controvérsias significa aceitar que não há uma única verdade ou uma única forma de enxergar o mundo. Em muitas questões, mais importante do que "vencer" um argumento é construir pontes entre perspectivas legítimas, ainda que incompatíveis. Para isso, são imprescindíveis:

  • Humildade intelectual: admitir que podemos estar errados ou ter conhecimento incompleto;
  • Disposição ao diálogo: ouvir com atenção, argumentar com respeito;
  • Compromisso com a verdade: buscar informações confiáveis e combater a desinformação;
  • Apreço pela diversidade: compreender que a diferença é parte essencial da vida em sociedade.

A realidade das controvérsias não é um problema a ser eliminado. É uma característica inerente à liberdade, uma expressão da Democracia e um motor para o progresso humano. Lidar com ela exige, acima de tudo, maturidade coletiva.

 

RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR POR ACIDENTE DE TRABALHO – EMPREGADO EM DESVIO DE FUNÇÃO

 

 

Orlando José de Almeida

Advogado Sócio de Homero Costa Advogados

 

 

 

No dia 14/11/2025 foi publicada notícia no site do Tribunal Superior do Trabalho - TST, referente ao julgamento proferido nos autos do processo nº TSTAg-AIRR-0010717-77.2022.5.03.0071, cujo acórdão foi publicado no dia 24/09/2025.

Consta da matéria que a Turma de julgadores do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, confirmou a decisão de primeira instância que julgou improcedente o pedido de reparação civil, ao fundamento de que foi configurada a culpa exclusiva do Autor.

De outro lado, a Oitiva Turma do Tribunal Superior do Trabalho - TST, diante de Recurso interposto pelo empregado, entendeu por bem em dar provimento ao apelo “para declarar a responsabilidade civil das reclamadas decorrente do acidente de trabalho e determinar o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem, a fim de que prossiga no julgamento dos pleitos da parte reclamante atrelados à declaração da responsabilidade civil das reclamadas, como entender de direito.”

A Relatora, Ministra Delaíde Miranda Arantes, ao apreciar a questão aduziu que “em regra, a responsabilidade civil do empregador pelos danos sofridos pelo empregado é subjetiva, exigindo a caracterização do dolo e culpa e do nexo causal, nos termos dos artigos 186 do Código Civil.”

Mas asseverou, adiante, que “todavia, a jurisprudência desta Corte Superior se consolidou por admitir a aplicação da responsabilidade objetiva, com fundamento no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, especialmente quando a atividade desenvolvida pelo empregador for considerada como atividade de risco, ensejando risco potencial à integridade física e psíquica do trabalhador. Com efeito, este Tribunal Superior tem se posicionado no sentido de que o exercício da função de motorista de caminhão configura atividade de risco potencial à integridade física e psíquica do trabalhador, atraindo a responsabilidade objetiva do empregador.”

O parágrafo único, do artigo 927, do Código Civil Brasileiro, possui a seguinte redação:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.  

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Na fundamentação do v. acórdão foi também salientado: “Contudo, considerando as premissas fáticas transcritas no acórdão recorrido, tem-se que a matéria comporta enquadramento jurídico diverso. No caso em exame, convém ressaltar que o desvio de função foi crucial para a caracterização do acidente – que não teria ocorrido se o Obreiro se encontrasse trabalhando como mecânico, função para a qual foi contratado, cujas atividades eram realizadas na sede da 1ª reclamada – sendo certo que o acidente ocorreu em via pública.”

Para justificar o entendimento foram transcritas as seguintes ementas:

(...) ACIDENTE DE TRABALHO TÍPICO. CULPA PATRONAL CONFIGURADA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR RECONHECIDA. 1. O Tribunal Regional delineia a existência de culpa da reclamada, por não inibir o desvio funcional do reclamante - que, no momento do infortúnio, desenvolvia atividade incompatível com as atribuições meramente burocráticas inerentes à sua função - e por não proporcionar um ambiente seguro ao trabalhador. Registra, com efeito, que" o evento danoso - rotura completa do tendão do bíceps braquial direito, rotura parcial do tendão supra-espinhal e bursite – não teria ocorrido diante de eventual e esperada conduta positiva e regular da ré, seja no sentido de evitar o desvio de função, para outra incompatível com as atribuições meramente burocráticas desempenhadas pelo autor, seja de adotar medidas preventivas, inclusive com a orientação de seus empregados quanto à postura a ser adotada no manuseio de peso". Conclui, assim, que "a falta de tais cautelas configura o ato ilícito que contribuiu de forma efetiva para instalação do dano que incapacitou o autor parcialmente, em especial para atividades que exijam esforço físico e exposição a traumatismo". 2. Assim, frente ao contexto ofertado pelo acórdão regional, a partir do qual demonstrados o acidente, o nexo de causalidade e a culpa da empregadora, o deferimento de indenização por danos morais e materiais não implica afronta ao art. 7º, XXVIII, da Lei Maior. 3. O acórdão recorrido não permite concluir pela alegada culpa exclusiva da vítima. O acolhimento das alegações recursais nesse sentido tende à reavaliação do conjunto probatório, o que encontra óbice em recursos de natureza extraordinária, a teor da Súmula 126 desta Corte Superior. 4 . Ressalte-se que quem dirige a prestação dos serviços é o empregador - que não se exonera da responsabilidade pelo desvio funcional sob o argumento de ter ocorrido por iniciativa do trabalhador, sem imposição da empresa. 5. Não impulsiona o recurso de revista a apontada violação do art. 5º, II, da Carta Magna, visto que, consoante o entendimento do STF (Súmula 636), a ofensa ao referido dispositivo constitucional não se dá, em regra, de forma direta, como exige o artigo 896, "c", da CLT, enquanto consagrador de princípio genérico cuja vulneração ocorre por via reflexa, a partir de afronta a norma de natureza infraconstitucional. 6. Aresto inespecífico. (...)". (AIRR-4300-05.2011.5.07.0000, 1ª Turma, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 25/04/2016).

"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI Nº 13.467/2017. 1. PRELIMINAR DE NULIDADE DO JULGADO POR CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. 2. ACIDENTE DE TRABALHO. INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL E PERMANENTE DO EMPREGADO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS COM O USO DE MOTOCICLETA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. LUCROS CESSANTES. PENSÃO MENSAL. 3. PENSÃO MENSAL VITALÍCIA. LIMITAÇÃO ETÁRIA PARA 65 ANOS DE IDADE. IMPOSSIBILIDADE. 4. INCAPACIDADE PERMANENTE. PENSÃO MENSAL VITALÍCIA. PAGAMENTO EM PARCELA ÚNICA. POSSIBILIDADE. 5. PENSÃO MENSAL VITALÍCIA. BASE DE CÁLCULO. 6. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VALOR ARBITRADO. 7. ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA. BASE DE CÁLCULO DA INDENIZAÇÃO. O pleito de indenização por dano moral e material resultante de acidente do trabalho e/ou doença profissional ou ocupacional supõe a presença de três requisitos: a) ocorrência do fato deflagrador do dano ou do próprio dano, que se constata pelo fato da doença ou do acidente, os quais, por si sós, agridem o patrimônio moral e emocional da pessoa trabalhadora (nesse sentido, o dano moral, em tais casos, verifica-se pela própria circunstância da ocorrência do malefício físico ou psíquico); b) nexo causal ou concausal, que se evidencia pela circunstância de o malefício ter ocorrido em face das circunstâncias laborativas; c) culpa empresarial, excetuadas as hipóteses de responsabilidade objetiva. Embora não se possa presumir a culpa em diversos casos de dano moral - em que a culpa tem de ser provada pelo autor da ação -, tratando-se de doença ocupacional, profissional ou de acidente do trabalho, essa culpa é presumida, em virtude de o empregador ter o controle e a direção sobre a estrutura, a dinâmica, a gestão e a operação do estabelecimento em que ocorreu o malefício. A regra geral do ordenamento jurídico, no tocante à responsabilidade civil do autor do dano, mantém-se com a noção da responsabilidade subjetiva (arts. 186 e 927, caput, CC). Contudo, tratando-se de atividade empresarial, ou de dinâmica laborativa (independentemente da atividade da empresa), fixadoras de risco para os trabalhadores envolvidos, desponta a exceção ressaltada pelo parágrafo único do art. 927 do Código Civil, tornando objetiva a responsabilidade empresarial por danos acidentários (responsabilidade em face do risco). No caso em tela, é incontroverso o acidente de trabalho típico sofrido pelo Autor e, de acordo com o acórdão recorrido, o Obreiro" sofreu fratura exposta no antebraço direito, o que lhe causou limitação da força com o membro superior direito. (...) o reclamante não tem condições de continuar no exercício profissional na mesma função que exercia para a reclamada sem perda ou redução de sua capacidade laborativa". Além disso, o Reclamante teve que se submeter à cirurgia para implantação de 17 parafusos de fixação e possui redução da sua capacidade para atividades que exijam o carregamento de peso com o membro superior direito. O TRT, ratificando a sentença de origem, assentou a incidência da responsabilidade objetiva (art. 927, parágrafo único, CCB/2002) à hipótese dos autos, por consignar ser "inegável que a prestação de serviços com uso de motocicleta, caso do reclamante, é de alto risco, atraindo responsabilidade objetiva (§1º do artigo 927 do Código Civil), tornando desnecessária a comprovação da existência de culpa ou dolo das reclamadas para fins de reparação". A partir dos elementos fáticos consignados na decisão recorrida, ficaram comprovados o dano e o nexo de causalidade entre o acidente de trabalho típico (acidente automobilístico) e a atividade desenvolvida. Ademais, a controvérsia foi examinada sob o enfoque da responsabilidade objetiva da empregadora, ante o risco acentuado a que estava exposto o Reclamante (art. 927, parágrafo único, do CCB c/c art. 7º, caput, da CF). Não há dúvida de que a atividade desenvolvida por meio de motocicleta, com a anuência da empregadora, expõe o trabalhador a riscos mais acentuados do que aquele a que se submete a coletividade. No exercício de tais atividades, o empregado desloca-se de um ponto a outro pelas ruas da cidade, o que potencializa o risco de acidentes provenientes de trânsito. Esta Corte tem adotado o entendimento da responsabilidade objetiva pelo risco profissional em atividades similares. De todo modo, o Tribunal Regional assentou que o elemento culpa emergiu da conduta negligente da Reclamada em relação ao dever de cuidado à saúde, higiene, segurança e integridade física do trabalhador (art. 6º e 7º, XXII, da CF, 186 do CCB/02), deveres anexos ao contrato de trabalho. A esse respeito, foi pontuado no acórdão recorrido que, ainda que não se entendesse pela responsabilidade objetiva, "seria o caso de responsabilizar a empregadora pelo acidente ocorrido, uma vez que o reclamante foi contratado como gerente, realizando vendas, mas também realizava a entrega de produtos, em nítido desvio de função". Além disso, o prejuízo material é nítido, uma vez que o Reclamante teve comprometida sua capacidade laborativa. Como visto, a decisão recorrida está devidamente fundamentada na prova dos autos, sendo, portanto, inadmissíveis as assertivas recursais de que o Reclamante não comprovou a existência de dano ou a conduta atribuída ao empregador. Por outro lado, o objeto de irresignação da Reclamada está assente no conjunto probatório dos autos e a análise deste se esgota nas instâncias ordinárias. Entender de forma diversa da adotada pelo Tribunal Regional implicaria, necessariamente, o revolvimento de fatos e provas, inadmissível nesta instância de natureza extraordinária, diante do óbice da Súmula 126/TST. Agravo desprovido" (Ag-AIRR-175- 45.2012.5.15.0029, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 19/08 /2022).

"RECURSO DE REVISTA. (...). RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. Embora o Tribunal Regional tenha tecido considerações a respeito da responsabilidade objetiva da empresa pelo acidente de trabalho ocorrido, restou consignado no acórdão regional o desvio de função, acarretando o dano (acidente). A função exercida de motorista por quem não foi contratado para tal mostrou-se essencial para a colocação do empregado em risco, envolvendo-o no acidente ocorrido, quando ele prestava socorro a outro ônibus da empresa. Ressalte-se, inclusive, a tentativa da reclamada em alterar, após o óbito do empregado, o cargo por ele ocupado, para motorista. Tal fato afasta a alegação de culpa exclusiva da vítima ou por fato de terceiro no evento danoso. Provado também o nexo causal entre o acidente ocorrido e o trabalho praticado pela vítima, não há de falar em afronta à literalidade do artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal. Assim, constatada a culpa da empresa no desvio de função e o nexo de causalidade do acidente com a atividade da vítima, a caracterizar os danos moral e material ensejadores da reparação respectiva. No mais, o aresto citado pelo recorrente é inespecífico, visto que não guarda identidade fática com a presente demanda, bem como a admissibilidade do apelo também encontra óbice na Súmula 126 do TST, pois conclusão contrária demandaria o revolvimento fático e probatório dos autos. Recurso de revista não conhecido. (...)" (RR-117800- 77.2006.5.01.0263, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 12/04/2013).

AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO. LEI Nº 13.015/2014. CPC /2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. PENSÃO VITALÍCIA. INDENIZAÇÃO POR SEGURO DE VIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESFUNDAMENTADO. Em atenção ao Princípio da Dialeticidade dos recursos, cabe à parte agravante questionar os fundamentos específicos declinados na decisão recorrida. Se não o faz, como na hipótese dos autos, considera-se desfundamentado o apelo. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. DANOS MORAIS CAUSADOS AO EMPREGADO. ACIDENTE DE TRABALHO. ACIDENTE DE TRÂNSITO, COM RESULTADO MORTE. CUMPRIMENTO DE ORDEM DA EMPREGADORA. O artigo 21, IV, "a", da Lei nº. 8.213 /91 equipara ao acidente de trabalho típico aquele ocorrido na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa: "Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos desta Lei: [...] IV - o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho: [...] na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa". A lei deixa evidente, ao qualificar o evento, que será aquele ocorrido durante a execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa. Nessa situação, o empregado encontra-se subordinado ao poder de comando do empregador e, nessas condições, sofre acidente. Duas são as situações: a) o empregado acha-se cumprindo ordens do empregador. Pouco importa se estiver excedendo a jornada de trabalho ou a atividade for relacionada às suas tarefas habituais; b) o empregado está realizando serviço sob a autoridade do empregador. É irrelevante a natureza da atividade que estiver sendo executada pelo empregado, quando do momento do acidente. Significa afirmar que será acidente mesmo que se encontre executando serviço distinto daquele que normalmente realiza, desde que a mando do empregador. Constam dos autos os seguintes registros fáticos: o autor prestava serviços para a ré e exercia a função de funileiro (fl. 12); no dia 09/04/2012, a ré determinou que o reclamante fosse, em seu próprio veículo, para a Usina localizada em Buritizal/SP, buscar as ferramentas e levá-las até a obra em Junqueirópolis/SP; nesse trajeto, sofreu acidente de trânsito que culminou em sua morte, conforme descrito na sentença (fl. 411), "na altura do Km 334, por motivos que fogem a esta perícia, o veículo Jetta derivou para a direita invadindo a porção gramada da via. Após aproximadamente 20 metros, o veículo chocou-se contra a proteção lateral da via (guard-rail), que serviu como uma rampa, lançando o veículo para cima. Ato contínuo houve o choque contra a placa de sinalização existente e o processo de capotamento do veículo" ; embora houvesse o fornecimento de transporte aos empregados, no dia do acidente, o autor utilizou o seu próprio veículo para atender uma ordem específica da ré. Nesse contexto, a hipótese dos autos não se enquadra como acidente de trajeto, mas, sim, como acidente de trabalho, pois, o infortúnio ocorreu durante a execução de ordem dada pelo empregador. Assim, o caso deve ser analisado à luz da responsabilidade subjetiva. Perante o Direito do Trabalho, a responsabilidade do empregador, pela reparação de dano, no seu sentido mais abrangente, derivante do acidente do trabalho ou e doença profissional a ele equiparada, sofrido pelo empregado, é subjetiva, conforme prescreve o artigo 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988. A responsabilidade civil do empregador pela reparação decorrente de danos morais causados ao empregado pressupõe a existência de três requisitos, quais sejam: a conduta (culposa, em regra), o dano propriamente dito (violação aos atributos da personalidade) e o nexo causal entre esses dois elementos. O primeiro é a ação ou omissão de alguém que produz consequências às quais o sistema jurídico reconhece relevância. É certo que esse agir de modo consciente é ainda caracterizado por ser contrário ao Direito, daí falar-se que, em princípio, a responsabilidade exige a presença da conduta culposa do agente, o que significa ação inicialmente de forma ilícita e que se distancia dos padrões socialmente adequados, muito embora possa haver o dever de ressarcimento dos danos, mesmo nos casos de conduta lícita. O segundo elemento é o dano que, nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, consiste na "[...] subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc. Em suma, dano é lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral". Finalmente, o último elemento é o nexo causal, a consequência que se afirma existir e a causa que a provocou; é o encadeamento dos acontecimentos derivados da ação humana e os efeitos por ela gerados. No caso dos autos, está caracterizado que o acidente de trânsito ocorreu quando do necessário deslocamento para desempenho de uma ordem específica, estando o então empregado, assim, atuando em prol da ré. Além disso, ficou demonstrada a conduta culposa da empresa, decorrente do desvio de função, que expôs o empregado a risco maior que o habitual, qual seja, o de dirigir em estrada para atender a uma ordem específica da empregadora. Desse modo, evidenciado o dano, assim como a conduta culposa do empregador e o nexo causal entre ambos, deve ser mantido o acórdão regional que condenou a reclamada a indenizar o espólio do autor, ainda que por fundamento diverso. Agravo conhecido e não provido" (Ag-ARR-607-18.2014.5.15.0054, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 07/04/2020).

Com efeito, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho caminha na direção de que o acidente de trabalho, ocorrido quando o empregado se encontra em desvio de função, em regra, leva a presunção de culpa do empregador pelo sinistro e, consequentemente, gera o dever de indenizar.

Destaca-se, ainda, que na hipótese em análise existe uma agravante, levando-se em conta que no momento do acidente o empregado exercia a função de motorista de caminhão, que é considerada de risco, pelo TST, e atrai a responsabilidade objetiva do empregador para fins de reparação.

segunda-feira, 3 de novembro de 2025

O CÓDIGO FLORESTAL E OS DESAFIOS DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO: SUSTENTABILIDADE, INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE

  

Por Stanley Martins Frasão e Nathália Caixeta Pereira de Castro

 

 

O agronegócio brasileiro é um dos pilares da economia nacional, sendo responsável por grande parte do PIB, das exportações e da geração de empregos. No entanto, para além da produção em larga escala e da alta tecnologia no campo, o setor enfrenta desafios cada vez mais complexos que exigem um equilíbrio delicado entre crescimento econômico e preservação ambiental. Nesse contexto, o Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651/2012) surge como um marco regulatório crucial, influenciando diretamente as práticas agrícolas, o uso da terra e a imagem do Brasil no cenário internacional.

O Código Florestal e seus impactos no agro

A legislação ambiental estabelece diretrizes para a preservação de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reservas Legais (RLs), o que impacta diretamente a gestão das propriedades rurais. Para muitos produtores, isso significa uma redução da área disponível para cultivo, exigindo maior eficiência produtiva e investimentos em tecnologias que possibilitem o uso sustentável do solo.

O Código também impôs a obrigatoriedade do Cadastro Ambiental Rural (CAR), um instrumento de controle, monitoramento e planejamento ambiental das propriedades. A adesão ao CAR é pré-requisito para que os produtores tenham acesso a linhas de crédito e programas de regularização. Apesar de representar um desafio inicial, essa exigência promove maior segurança jurídica e incentiva a adoção de práticas sustentáveis no campo.

Sustentabilidade como vetor de inovação

Ao limitar a expansão indiscriminada da fronteira agrícola, o Código Florestal estimula o aumento da produtividade dentro das áreas já consolidadas. Isso tem impulsionado a adoção de novas tecnologias, como agricultura de precisão, uso racional de insumos e práticas regenerativas, que não só aumentam a eficiência como também reduzem impactos ambientais.

As novas tecnologias e práticas sustentáveis têm promovido ganhos expressivos de produtividade e ampliado a competitividade internacional do setor. A agricultura de precisão permite o uso eficiente de insumos como água, fertilizantes e defensivos, enquanto drones, sensores e softwares ajudam no monitoramento das lavouras e na tomada de decisões em tempo real.

Práticas como integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), plantio direto, rotação de culturas e recuperação de áreas degradadas fortalecem a conservação dos recursos naturais e reduzem a emissão de gases de efeito estufa. Com isso, o Brasil ganha destaque como produtor agrícola sustentável, atendendo às exigências de mercados internacionais cada vez mais atentos à responsabilidade socioambiental.

Conexão com compromissos internacionais e mercados

O cumprimento do Código Florestal também reforça a posição do Brasil frente a acordos internacionais, como o Acordo de Paris, em que o nosso país se comprometeu a reduzir emissões e ampliar a recuperação de vegetação nativa. A efetividade da legislação torna-se, portanto, não apenas uma obrigação interna, mas também um elemento essencial para a diplomacia ambiental e para a manutenção de mercados estratégicos que exigem cadeias de produção livres de desmatamento.

A crescente implementação de barreiras comerciais ambientais, como o regulamento da União Europeia sobre produtos livres de desmatamento, faz com que a conformidade com o Código Florestal se torne um diferencial competitivo. A rastreabilidade das cadeias produtivas e a comprovação da regularidade ambiental das propriedades serão cada vez mais decisivas para garantir acesso a mercados internacionais e mostrar o compromisso do Brasil com a sustentabilidade em nível extraterritorial.

Dimensão social e políticas públicas

Além da responsabilidade do produtor, é fundamental o papel do Estado na criação de políticas públicas efetivas para apoiar a implementação do Código Florestal. A ampliação de linhas de crédito verde, a redução da burocracia no processo de regularização e a aceleração da análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR) são medidas indispensáveis para reduzir a insegurança jurídica e ampliar a adesão.

Outro ponto que merece destaque é a necessidade de políticas diferenciadas para pequenos e médios produtores. A democratização do acesso à tecnologia, a expansão da assistência técnica e o fortalecimento de cooperativas rurais são instrumentos fundamentais para evitar que a adequação ao Código Florestal aumente desigualdades no campo. O futuro do agro sustentável passa não apenas pela preservação ambiental, mas também pela inclusão social e pela redução da concentração produtiva.

Também é importante considerar a criação de mecanismos de pagamento por serviços ambientais (PSA), que remunerem agricultores pela conservação de florestas e recuperação de áreas degradadas, valorizando economicamente práticas sustentáveis. Além disso, políticas públicas podem estimular parcerias público-privadas (PPPs) voltadas à inovação em biotecnologia, monitoramento e certificação ambiental, facilitando a transição para um agro competitivo e mais verde.

Outro eixo fundamental é o fortalecimento da educação rural, tanto na formação técnica de jovens agricultores quanto na capacitação continuada de profissionais do campo, assegurando que as novas gerações estejam preparadas para conciliar produtividade com responsabilidade ambiental. Ainda, é essencial que os cursos superiores de Agronomia estejam estruturados para oferecer uma formação acadêmica que valorize a adequação do setor agropecuário ao Código Florestal e a outras legislações ambientais, de modo a despertar, desde o início da jornada profissional dos futuros agricultores, a consciência sobre a relevância de uma agronomia sustentável.

Desafios e estratégias de adaptação

Mesmo com os avanços, os desafios permanecem. Muitos produtores ainda enfrentam dificuldades técnicas e financeiras para se adequarem às exigências legais. Falta de assistência técnica, morosidade na análise dos cadastros e a insegurança jurídica em algumas regiões também dificultam a plena efetividade da lei.

Além disso, o setor precisa lidar com fatores como:

  1. Volatilidade dos preços das commodities, influenciada por aspectos geopolíticos, climáticos e cambiais;
  2. Aumento dos custos de produção, especialmente com insumos importados;
  3. Insegurança jurídica e entraves na regularização fundiária e ambiental;
  4. Dificuldade ou até mesmo impossibilidade na obtenção ao crédito rural, eis que os pequenos e médios enfrentaram grandes obstáculos, notadamente em 2024, submetendo-os aos juros comerciais, inclusive das indústrias de insumos;
  5. Desigualdade no acesso à tecnologia, sobretudo entre pequenos e médios produtores.

Para enfrentar esses desafios, algumas estratégias têm se mostrado fundamentais:

  1. Diversificação da produção e das fontes de renda na propriedade rural;
  2. Uso de ferramentas de gestão de risco, como o seguro rural e contratos futuros;
  3. Capacitação técnica contínua, por meio da extensão rural e do acesso à informação;
  4. Fortalecimento de cooperativas, que promovem ganho de escala e poder de negociação;
  5. Investimento em rastreabilidade e certificações ambientais, agregando valor à produção.

Desse modo, percebe-se que o Código Florestal, longe de ser um obstáculo, representa uma oportunidade de transformação no agronegócio. Ele aponta para um futuro em que produção e preservação caminham juntas, em que a inovação é sinônimo de sustentabilidade e em que o Brasil se consolida como uma potência agroambiental. O desafio está em garantir que todos os produtores tenham condições de participar dessa mudança, com apoio técnico, segurança jurídica e incentivos adequados para fazer do campo um espaço de equilíbrio e prosperidade.

Mais do que uma exigência legal, trata-se de uma política estratégica de Estado, capaz de posicionar o Brasil em um patamar único: produzir em escala global sem abrir mão da preservação natural. O verdadeiro desafio não é escolher entre o agronegócio ou a floresta, mas construir pontes para que ambos coexistam de maneira integrada e colaborativa.