Luana Otoni de Paula
Advogada Sócia de Homero
Costa Advogados
A Constituição Federal de 1988 enumerou,
entre os direitos e as garantias fundamentais, a proteção à propriedade das
marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o
interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País (artigo
5º, inciso XXIX, CR/88).
O assunto que já era tratado nas
Constituições de 1824; 1891; 1934; 1946, sofreu evolução. Isso porque nas
referidas Constituições se previa que os inventos industriais pertenceriam aos
seus autores, aos quais ficariam garantido por lei um “privilégio temporário”, ou seria concedido pelo Congresso um “prêmio razoável” quando houvesse
conveniência de divulgação do invento perante a sociedade.
Na Constituição de 1967, alterada pela Emenda
Constitucional nº 01 de 1969, a questão se aperfeiçoou na medida em que o
legislador manteve a garantia de concessão do “privilégio temporário” para os autores de inventos industriais e
inovou, ao assegurar a propriedade das marcas de indústria e comércio, bem como
a exclusividade do nome comercial.
A marca é o sinal visualmente representado,
que é configurado para o fim específico de distinguir a origem dos produtos e
serviços. Símbolo voltado a um fim, sua existência fática depende da presença
desses dois requisitos: capacidade de simbolizar e capacidade de indicar uma
origem específica, sem confundir o destinatário do processo de comunicação em
que se insere: o consumidor.
Sua proteção jurídica depende de um fator a
mais: a apropriabilidade, ou seja, a possibilidade de se tornar um símbolo
exclusivo, ou legalmente unívoco do objeto simbolizado.
A doutrina nacional e estrangeira reconhece
que há, pelo menos, quatro funções das marcas: (i) identificar o produto ou
serviço, distinguindo-o do congênere existente no mercado; (ii) assinalar a
origem e a procedência do produto ou serviço; (iii) indicar que o produto ou
serviço identificado possui o mesmo padrão de qualidade; e (iv) funcionar como
instrumento de publicidade, configurando importante catalisador de vendas.
Ao individualizar um produto, distinguindo-o
das mercadorias concorrentes, a marca atua como verdadeiro investimento do
comerciante em seu negócio, permitindo a conquista da preferência e da
fidelidade do consumidor.
A proteção da marca tem como objetivos
primordiais afastar a concorrência desleal e proteger o consumidor de possíveis
erros. São essas as finalidades consagradas pela Lei n° 9.279/96 (Lei de
Propriedade Intelectual), em geral, assim como, em particular, no art.124,
inciso XIX da referida Lei[1].
A concorrência é própria do regime de
economia de mercado, havendo, naturalmente, que se considerar como intrínseca a
esse sistema econômico a disputa entre empresas, desde que respeitadas as
regras da competição.
O fundamento da proteção dos direitos
definidos como propriedade industrial, especialmente das marcas de indústria,
comércio e serviços, está na concorrência.
Em uma sociedade que tem como princípio
fundamental a livre iniciativa (art. 1º, IV, da CR/88), é imprescindível a
proteção à livre concorrência que, inclusive, constitui Princípio Geral da
Ordem Econômica da Sociedade Brasileira (art. 170, IV, CR/88).
Por outro lado, deve-se considerar que a
livre concorrência, como toda liberdade, não é absoluta e irrestrita. O seu
direito encontra limites nos preceitos dos outros concorrentes pressupondo um
exercício legal e honesto do direito próprio, expresso da probidade
profissional. Excedidos esses limites surge a concorrência desleal.
Isso significa que em determinado mercado há
regras a serem seguidas, as quais definem os limites entre os padrões
aceitáveis e os inadmissíveis de concorrência. Nesse contexto, quando um
concorrente utiliza métodos condenáveis de práticas de mercado, o Direito
intervém e atua para reprimir a concorrência desleal.
Algumas marcas possuem notoriedade, o que tem
o condão de alcança-la à categoria de marca notória, de alto renome.
A marca de alto renome é definida pelo INPI
como a marca devidamente registrada, "cujo
desempenho em distinguir os produtos ou serviços por ela designados e cuja eficácia
simbólica levam-na a extrapolar seu escopo primitivo, exorbitando, assim, o
chamado princípio da especialidade, em função de sua distintividade, de seu
reconhecimento por ampla parcela do público, da qualidade, reputação e
prestígio a ela associados e de sua flagrante capacidade de atrair os
consumidores em razão de sua simples presença" (Resolução INPI nº 107/2013).
Nas marcas de alto renome, sobressai a
ocorrência do fenômeno mercadológico denominado secondary meaning ("teoria do significado secundário da
marca"), mediante o qual um sinal fraco (como os de caráter genérico,
descritivo ou até evocativo) adquire eficácia distintiva (originariamente
inexistente) pelo uso continuado e massivo do produto ou do serviço.
A distinguibilidade nasce da perspectiva
psicológica do consumidor em relação ao produto e sua marca, cujo conteúdo
semântico passa a predominar sobre o sentido genérico originário.
A proteção à propriedade intelectual é
importantíssima, mas não é um fim em si mesmo, principalmente quando tratamos
de produtos e mercados aquecidos.
Às marcas, reitere-se: sua proteção não tem
apenas a finalidade de assegurar direitos ou interesses meramente individuais
do seu titular, mas objetiva, acima de tudo, proteger os adquirentes de
produtos ou serviços, conferindo-lhes subsídios para aferir a origem e a
qualidade do produto ou serviço, tendo por escopo, ainda, evitar o desvio
ilegal de clientela e a prática do proveito econômico parasitário. Assim pode
ser resumida a função social da marca à luz da Constituição Federal/88 e da Lei
9.279/96.
[1]
Art.
124. Não são registráveis como marca:
[...]
XIX - reprodução
ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia
registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico,
semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com marca
alheia;
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